13.04.2013 Views

Em busca da infância perdida em Manhattan - Fonoteca Municipal ...

Em busca da infância perdida em Manhattan - Fonoteca Municipal ...

Em busca da infância perdida em Manhattan - Fonoteca Municipal ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

y Xido Angola com<br />

s universos paralelos<br />

esperança, medo e redenção. Ou virá a ser, quando tiver fi nanciamento garantido. Para já, “The<br />

ce”, com vídeo, texto e imagens de uma Angola que nos revela um mundo novo. Ana Dias Cordeiro<br />

Xido não sabe ain<strong>da</strong> se o seu<br />

filme será uma ficção, um<br />

documentário ou algo entre os<br />

dois<br />

pode ter no século XXI e o declínio<br />

<strong>da</strong> Europa e dos Estados Unidos como<br />

poderes heg<strong>em</strong>ónicos no mundo.<br />

Neste virar de mesa, nesta inversão<br />

de papéis, encontro uma sensação<br />

de liber<strong>da</strong>de que me fascina.”<br />

Se há esperança num território destruído<br />

por uma guerra do século XX,<br />

também haveria para o filme de Xido<br />

que ninguém ain<strong>da</strong> quis financiar.<br />

Como se Angola d<strong>em</strong>onstrasse que<br />

“há alternativas a tudo aquilo que havia<br />

no século XX”. Como se a História<br />

não tivesse s<strong>em</strong>pre que ser conta<strong>da</strong><br />

pelos vencedores (ou pelos que têm<br />

o dinheiro). Para isso, basta encontrar<br />

alternativas. O filme-ficção sobre os<br />

dois irmãos pode passar a ser um documentário,<br />

mais centrado <strong>em</strong> Simão<br />

Branco, se com isso houver mais hipóteses<br />

de financiamento. Mas tudo<br />

são ain<strong>da</strong> interrogações.<br />

Xido: “O meu objectivo é talvez fazer<br />

os dois [filme e documentário], ou um<br />

filme na fronteira entre o documentário<br />

e a ficção, que é o que nós, Cabula6,<br />

como companhia de teatro,<br />

faz<strong>em</strong>os, entre o que é real e o que é<br />

fabricado, jogando com o poder <strong>da</strong><br />

reali<strong>da</strong>de e o poder <strong>da</strong> ficção.”<br />

A companhia Cabula6, de Jer<strong>em</strong>y<br />

Xido e Claudia Heu, foi distingui<strong>da</strong><br />

como “Companhia do Ano de 2009”<br />

pela revista “Ballettanz” e galardoa<strong>da</strong><br />

com o “Outstanding Artist Award –<br />

Intercultural dialogue 2010”, pelo<br />

Ministério <strong>da</strong> Cultura austríaco. O seu<br />

trabalho, posto <strong>em</strong> cena e mostrado<br />

na Internet, é visto como criador de<br />

uma arte de distância do teatro e de<br />

aproximação à literatura.<br />

Século de oportuni<strong>da</strong>des<br />

O filme (ou documentário) vai tomando<br />

forma na cabeça de Xido (e é isso<br />

que ele mostra na sua “performance”).<br />

Passa pela história de Simão<br />

Branco nesse regresso à províncias<br />

do Huambo e do Bié, que também ele<br />

ajudou a destruir, e na sua procura<br />

de um <strong>em</strong>prego na <strong>em</strong>presa chinesa<br />

que está a reconstruir a mítica linha<br />

dos Caminhos-de-Ferro de Benguela.<br />

Essa linha é quase inversamente paralela<br />

à rota dos escravos que saíam<br />

do coração de África, levados para o<br />

outro lado do Atlântico.<br />

Xido: “Aqui estávamos nós na linha<br />

transcontinental de Benguela, construí<strong>da</strong><br />

pelos britânicos, a pedido dos<br />

portugueses, ao longo <strong>da</strong>s antigas<br />

rotas de caravanas de escravos por<br />

onde passaram antepassados de pessoas<br />

como as que viv<strong>em</strong> no meu bairro.<br />

A mesma linha que no século XX<br />

foi bombardea<strong>da</strong> e mina<strong>da</strong> pelas potências<br />

envolvi<strong>da</strong>s na Guerra Fria e<br />

que agora está a ser reconstruí<strong>da</strong> por<br />

<strong>em</strong>presas <strong>da</strong> China, a nova potência<br />

dominante <strong>em</strong>ergente no mundo.”<br />

Mais do que uma vez, na “performance”,<br />

Xido diz: “Estamos no século<br />

XXI.” Quase s<strong>em</strong>pre <strong>em</strong> sinal de<br />

esperança e a l<strong>em</strong>brar que o seu filme<br />

ain<strong>da</strong> virtual olha para o futuro. Se,<br />

no passado, não havia esperança de<br />

conseguir apoios para um filme com<br />

protagonistas negros, no século XXI<br />

isso não só é possível como é comum<br />

encontrar<strong>em</strong>-se e contar<strong>em</strong> “histórias<br />

<strong>em</strong> que os brancos são totalmente<br />

irrelevantes”. “É uma maneira importante<br />

e nova de contar o mundo”,<br />

acrescenta.<br />

Saloon futurista<br />

<strong>Em</strong> Benguela, ou mais para dentro do<br />

coração de Angola, Xido encontrou<br />

um mundo muito mais vibrante do<br />

“[<strong>Em</strong> Angola]<br />

encontrei um mundo<br />

muito à frente<br />

<strong>da</strong> Europa, como uma<br />

fronteira onde<br />

as identi<strong>da</strong>des<br />

e designações de<br />

identi<strong>da</strong>des são mais<br />

flui<strong>da</strong>s e as pessoas<br />

pod<strong>em</strong> ser coisas<br />

que não sabíamos<br />

que podiam ser”<br />

Jer<strong>em</strong>y Xido<br />

que imaginou. E muito mais “freaky”<br />

(bizarro e estranho), o que na cabeça<br />

de Xido é positivo, no sentido de<br />

“complexo e inesperado”, mesmo<br />

que o que encontrou <strong>em</strong> Luan<strong>da</strong> não<br />

lhe tenha inspirado um sorriso. Na<br />

capital angolana, Xido viu “coisas<br />

confusas”, como grandes edifícios de<br />

escritórios com as luzes indicadoras<br />

s<strong>em</strong>pre liga<strong>da</strong>s à noite, ao lado de<br />

bairros inteiros s<strong>em</strong> luz nas ruas e nas<br />

casas onde viv<strong>em</strong> as pessoas. A vibração,<br />

sentiu-a no resto do país.<br />

Xido: “<strong>Em</strong> Benguela conheci médicos<br />

russos e cubanos, construtores <strong>da</strong>s<br />

Filipinas, sol<strong>da</strong>dos e prostitutas e<br />

trabalhadores por conta própria vietnamitas,<br />

que me convi<strong>da</strong>ram a entrar<br />

na sua vi<strong>da</strong> nocturna homossexual<br />

de Benguela, que eu não fazia<br />

ideia de que existia. Bizarro. Encontrei<br />

um mundo muito à frente <strong>da</strong> Europa,<br />

como uma fronteira onde as<br />

identi<strong>da</strong>des e designações de identi<strong>da</strong>des<br />

são mais flui<strong>da</strong>s e as pessoas<br />

pod<strong>em</strong> ser coisas que não sabíamos<br />

que podiam ser. Havia gente de todo<br />

o mundo, suecos e dinamarqueses,<br />

al<strong>em</strong>ães <strong>da</strong> Baviera, com bigodes gigantes<br />

e planos para construir fábricas<br />

de cerveja. E chinesas que acabaram<br />

de se licenciar e estão a <strong>da</strong>r a<br />

volta ao mundo. Na China, a tradutora<br />

[a trabalhar no complexo de<br />

construtores] teria que corresponder<br />

a um certo papel enquanto mulher<br />

na socie<strong>da</strong>de. <strong>Em</strong> Angola, era a pessoa<br />

mais importante do complexo.”<br />

Num bar de kuduro, na última parag<strong>em</strong><br />

<strong>da</strong> linha dos Caminhos-de-Ferro<br />

de Benguela, Xido encontrou “pessoas<br />

a arrastar cabras, sol<strong>da</strong>dos bêbedos,<br />

uma mulher com uma feri<strong>da</strong> de bala<br />

na cabeça que batia no hom<strong>em</strong> ao seu<br />

lado, um travesti que falava sozinho”.<br />

Encontrou “o que imaginava ser a reali<strong>da</strong>de<br />

nos ‘westerns’ americanos,<br />

como um bar de fronteira”. Sentiu que<br />

estava num “saloon” futurista, do<br />

século XXI. O século de Angola?<br />

Ípsilon • Sexta-feira 16 Julho 2010 • 27

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!