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AGONGLOSSOLOGIA<br />

Num infinito desprezo pelo que é, sem saber o que fazer, o<br />

que poderá fazer no preciso momento, olhando pela janela<br />

solitária, ninguém à vista, ele consente que desmentidos de<br />

pensamentos ascendam à consciência com a naturalidade e o<br />

realismo do que existe. Não se sente com uma particular disposição<br />

para esmiuçar o significado do verbo existir. Ele existe,<br />

deixá-lo existir. Mesmo se impreparado para referir a realidade<br />

ou a sua precariedade quase comovente. O globo onde<br />

vive parece que deixou de ser o mundo. O mundo é um alçapão<br />

de vozes abrindo a sensibilidade em percepções que se<br />

confundem muitas vezes com sensações. As sociedades fazem<br />

o que podem para subviver. Não há riqueza para partilhar. Diziam,<br />

os ideológicos historiadores, que os deuses eram fantasmagorias<br />

mitológicas de uma antiguidade ultrapassada, mas<br />

parece agora que outros deuses vindos de um futuro incompreensível<br />

chegam todos os dias com armas e bagagens. E impõem<br />

aos pobres mortais regras e comportamentos, metas e<br />

desfechos, fazendo-os ainda mais pobres do que já eram. Ah,<br />

não haver um ânimo colectivo, solidário, entre aqueles que se<br />

dizem povos, para combater esses seres que invadem a terra<br />

indiferente ao que acontece! Pelo contrário, tomados de uma<br />

vesânia tentacular, em vez de se unirem num esforço meditado,<br />

único, começam, essas gentes, a guerrear-se como se a<br />

injustiça que sentem tivesse uma razão de ser oriunda da presença<br />

dos outros. É vê-los trucidando-se em batalhas sanguinárias,<br />

perdendo vidas, exsudando ódios e raivas. Enquanto os<br />

renovados deuses sorriem no cúmulo das suas inteligências<br />

assustadoras. Ele não sabe o que poderá fazer. Ou melhor, ele<br />

sabe. Nada. A janela não é uma porta, um limiar, uma soleira.<br />

E mesmo que fosse, mesmo que pudesse sair de si ou do espaço<br />

que habita, que armas possui para defender o convívio e a<br />

companhia? Nenhumas. Só pode testemunhar o que acontece<br />

sem, na realidade, perceber o que é um acontecimento. Mas<br />

os deuses novos, fantasmas fiduciários, sabem. E fazem-no.<br />

29/9/2012<br />

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