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PARASSEMACRESE<br />

O automóvel, para lá do transporte consignado, que o tempo,<br />

segundo todos os testemunhos, é de crise, oferece-lhe canções<br />

que o acompanham ao longo do trajecto. A voz que o soleva a<br />

regiões do gozo como do prazer é de Bill Callahan, e a música,<br />

como tantos o disseram ao longo do tempo, é um bálsamo.<br />

Alguns, literatos de trazer por casa, pensando introduzir alguma<br />

inventividade ao truísmo, até acrescentaram, um bálsamo<br />

epulótico. Que se pode fazer, vive-se, dizem, em democracia.<br />

Ele percorre as ruas do bairro a uma velocidade legal, depois<br />

da rotunda enfia-se numa estrada mais arejada, várias opções,<br />

mas uma só via é escolhida. São umas cinco horas da tarde. O<br />

sol explode no céu como uma imaginação do que poderá ser o<br />

apocalipse, engraçado, o cantor – palavra que detesta para os<br />

músicos contemporâneos – está mesmo agora a cantar, ‘my<br />

apocalypse’. Há coincidências que até coincidem. Outras não.<br />

Outra rotunda que nem sequer tem de contornar, vira para a<br />

direita e desce helicoidalmente até chegar a uma espécie de<br />

cruzamento, já que no país, de uma maneira geral, tudo permanece<br />

um pouco indefinido. Novamente a direita e depois é<br />

só seguir em frente até se incluir num parque improvisado e<br />

espaçoso, junto a um edifício que de qualquer maneira é uma<br />

instituição autárquica, embora ignore qual. Sai do automóvel,<br />

desaparece a música. Nenhum pobre lhe estendeu a mão para<br />

receber uma caridosa moeda. Possivelmente o seu horário de<br />

trabalho corresponde ao dos funcionários públicos. E até faz<br />

sentido. Afinal vive-se num estado de direito. Espicaçado por<br />

tais pensamentos aleatórios e um pouco absurdos, chega à clínica.<br />

Quase ninguém. Uma senhora simpática, levantando-se<br />

talvez do desconforto que é, ou será, permanecer por muito<br />

tempo sentada, depois de saber ao que ele vai, retira de uma<br />

máquina imbuída de uma tecnologia actualizada o talão que<br />

lhe será necessário dentro de alguns minutos. Estende-o com<br />

um sorriso nos lábios, ouvindo ao mesmo tempo um caloroso<br />

obrigado. Ele espera. Que dirão as análises?<br />

3/19/2012<br />

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