ANDRADE, Carlos Drummond - A Rosa do Povo.pdf - Colégio Dom ...
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Mas a casa é um amor. Que paz nos móveis.<br />
Uma cadeira se renova ao meu desejo.<br />
A lã, o tapete, o liso. As coisas plácidas<br />
e confiantes. A casa vive.<br />
Confio em cada tábua. Ora, sucede<br />
que um incubo perturba<br />
nossa modesta, profunda confidencia.<br />
É irmão <strong>do</strong> corvo, mas faltam-lhe palavras,<br />
busto e humour. Uma <strong>do</strong>lência rígida,<br />
o reumatismo de noites imperiais, irritação<br />
de não ser mais um piano, ante o poético senti<strong>do</strong> da palavra,<br />
e tu<strong>do</strong> que deixam mudanças,<br />
viagens, afina<strong>do</strong>res,<br />
experimento de jovens,<br />
brilho fácil de rapsódia,<br />
outra vez mudanças,<br />
golpes de ar, madeira bichada,<br />
tu<strong>do</strong> que é morte de piano e o faz sinistro, inadaptável,<br />
meio grotesco também, nada pie<strong>do</strong>so.<br />
Uma família, como explicar? Pessoas, animais,<br />
objetos, mo<strong>do</strong> de <strong>do</strong>brar o Unho, gosto<br />
de usar este raio de sol e não aquele, certo copo e não outro,<br />
a coleção de retratos, também alguns livros,<br />
cartas, costumes, jeito de olhar, feitio de cabeça,<br />
antipatias e inclinações infalíveis: uma família,<br />
bem sei, mas e esse piano?<br />
Está no fun<strong>do</strong><br />
da casa, por baixo<br />
da zona sensível, muito<br />
por baixo <strong>do</strong> sangue.