ANDRADE, Carlos Drummond - A Rosa do Povo.pdf - Colégio Dom ...
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um pouco de mim algures?<br />
na consoante?<br />
no poço?<br />
Um pouco fica oscilan<strong>do</strong><br />
na embocadura <strong>do</strong>s rios<br />
e os peixes não o evitam,<br />
um pouco: não está nos livros.<br />
De tu<strong>do</strong> fica um pouco.<br />
Não muito: de uma torneira<br />
pinga esta gota absurda,<br />
meio sal e meio álcool,<br />
salta esta perna de rã,<br />
este vidro de relógio<br />
parti<strong>do</strong> em mil esperanças,<br />
este pescoço de cisne,<br />
este segre<strong>do</strong> infantil...<br />
De tu<strong>do</strong> ficou um pouco:<br />
de mim; de ti; de Abelar<strong>do</strong>.<br />
Cabelo na minha manga,<br />
de tu<strong>do</strong> ficou um pouco;<br />
vento nas orelhas minhas,<br />
simplório arroto, gemi<strong>do</strong><br />
de víscera inconformada,<br />
e minúsculos artefatos:<br />
campânula, alvéolo, cápsula<br />
de revólver... de aspirina.<br />
De tu<strong>do</strong> ficou um pouco.<br />
E de tu<strong>do</strong> fica um pouco.<br />
Oh abre os vidros de loção<br />
e abafa<br />
o insuportável mau cheiro da memória.