You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
CAPITULO VI<br />
Do mestre <strong>do</strong> açúcar e soto-mestre, a quem chamam banqueiro, e <strong>do</strong> seu ajudante, a quem<br />
chamam ajuda-banqueiro<br />
A quem faz o açúcar com razão se dá o nome de mestre, porque o seu obrar pede<br />
inteligência, atenção e experiência e esta não basta que seja qualquer, mas é<br />
necessária a experiência local, a saber, <strong>do</strong> lugar e qualidade da cana, aonde se<br />
planta e se mói, porque os canaviais, de uma parte, dão cana muito forte e, de outra,<br />
muito fraca. Diverso sumo tem a cana das várzeas <strong>do</strong> que tem a <strong>do</strong>s outeiros: a das<br />
várzeas vem muito aguacenta e o cal<strong>do</strong> dela tem muito que purgar nas caldeiras e pede<br />
mais decoada; a <strong>do</strong>s outeiros vem mais açucarada e o seu cal<strong>do</strong> pede menos tempo e<br />
menos decoada para se purificar e clarificar. Nas tachas há mela<strong>do</strong> que quer maior<br />
cozimento e há outro de menor; um, logo se condensa na batedeira, outro, mais<br />
devagar.<br />
Das três temperas que se hão-de fazer para encher as formas depende o purgar-se o<br />
açúcar bem ou mal, conforme elas são. Se o mestre se fiar <strong>do</strong>s caldeireiros e <strong>do</strong>s<br />
tacheiros, umas vezes cansa<strong>do</strong>s, outras sonolentos e outras alegres mais <strong>do</strong> que convém<br />
e com a cabeça esquentada, acontecer-lhe-á ver perdida uma e outra meladura, sem lhe<br />
poder dar remédio. Por isso vigie em coisa de tanta importancia e se o banqueiro e o<br />
ajuda-banqueiro não tiverem a inteligência e a experiência necessárias para suprirem<br />
em sua ausência não descanse sobre eles: ensine-os, avise-os e, se for necessário,<br />
repreenda-os, pon<strong>do</strong>-lhes diante <strong>do</strong>s olhos o prejuízo <strong>do</strong> senhor <strong>do</strong> engenho e <strong>do</strong>s<br />
lavra<strong>do</strong>res se se perder o mela<strong>do</strong> nas tachas ou se for mal tempera<strong>do</strong> para as formas.<br />
Veja que o feitor da moenda modere de tal sorte o moer que lhe não venha ao parol<br />
mais cal<strong>do</strong> <strong>do</strong> que há mister, para lhe poder dar vazão antes que se comece a azedar,<br />
purgan<strong>do</strong>-o, cozen<strong>do</strong>-o e baten<strong>do</strong>-o quanto é necessário.<br />
Antes de se botar a decoada nas caldeiras <strong>do</strong> cal<strong>do</strong> experimente que tal ela é e depois<br />
veja como os caldeireiros a botam e quan<strong>do</strong> há-de parar, nem consinta que a meladura<br />
se coe antes de ver se o cal<strong>do</strong> está purifica<strong>do</strong> como há-de ser; e o mesmo digo da<br />
passagem de uma para outra tacha, quan<strong>do</strong> se há-de cozer e bater, sen<strong>do</strong> a alma de to<strong>do</strong><br />
o bom sucesso e diligente atenção.<br />
A justiça e a verdade o obrigam a não misturar o açúcar de um lavra<strong>do</strong>r com o de outro<br />
e, por isso, nas formas que manda pôr no tendal, faça que haja sinal com que se<br />
possam distinguir das outras que pertencem a outros <strong>do</strong>nos, para que o meu e o teu,<br />
inimigos da paz, não sejam causa de bulhas.<br />
E para que a sua obra seja perfeita tenha boa correspondência com o feitor da moenda<br />
que lhe envia o cal<strong>do</strong>, com o banqueiro e o soto-banqueiro que lhe sucedem de noite no<br />
ofício e com o purga<strong>do</strong>r <strong>do</strong> açúcar, para que vejam juntamente <strong>do</strong>nde nasce o purgar bem<br />
ou mal em as formas e sejam entre si como os olhos que igualmente vigiam e como as<br />
mãos que unidamente trabalham.<br />
O que até agora está dito pertence em grande parte ao banqueiro também, que é o sotomestre,<br />
e ao soto-banqueiro, seu ajudante. E além disso pertence a estes <strong>do</strong>is<br />
oficiais ter cuida<strong>do</strong> <strong>do</strong> tendal das formas, e tapar-lhes os buracos, cavar-lhes as<br />
covas de bagaço com cava<strong>do</strong>res, endireitá-las e botar nelas o açúcar feito com as três<br />
têmperas, das quais se falará em seu lugar e, depois de três dias, enviá-las para a<br />
casa de purgar, ou sobre paviolas, ou às costas <strong>do</strong>s negros, para que o purga<strong>do</strong>r trate<br />
delas.<br />
Devem também procurar que se faça a repartição justa <strong>do</strong>s claros entre os escravos<br />
conforme o senhor ordenar e que nesta casa haja toda a limpeza e claridade, água,<br />
decoada, e to<strong>do</strong>s os instrumentos <strong>do</strong>s quais nela se usa. E ao mestre pertence ver,<br />
antes de começar o engenho a moer, se os fun<strong>do</strong>s das caldeiras e das tachas têm<br />
necessidade de se refazerem e se os assentos delas pedem novo e mais firme conserto.<br />
16