You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
aos que assistem na casa das caldeiras e nas fornalhas; no fim de outra tarefa se dão<br />
às escravas que trabalham na casa da moenda e depois desta se dão aos que buscam<br />
caranguejos e marisco para se repartirem e aos barqueiros que trazem a cana e a lenha<br />
ao engenho. E sempre se repete a distribuição com a mesma ordem, para que to<strong>do</strong>s os<br />
que sentem o peso <strong>do</strong> trabalho cheguem também a ter o seu pote, que é a medida com que<br />
se reparte este seu deseja<strong>do</strong> néctar e ambrósia.<br />
Quan<strong>do</strong> se manda parar ou pejar o engenho aos <strong>do</strong>mingos e dias santos, tira-se <strong>do</strong>s<br />
fun<strong>do</strong>s das tachas com uma picadeira de ferro o mela<strong>do</strong> que ficou neles gruda<strong>do</strong>, porque<br />
com este não poderiam esfriar-se e, além disto, se lhes bota água, para que se não<br />
queimem os cobres e serve juntamente para os lavar e assim se deixam as ditas tachas<br />
até entrar nelas o mel que se há-de cozer.<br />
LIVRO III<br />
CAPITULO I<br />
Das formas <strong>do</strong> açúcar e sua passagem <strong>do</strong> tendal para a casa de purgar<br />
São as formas <strong>do</strong> açúcar uns vasos de barro queima<strong>do</strong> na fornalha das telhas e têm<br />
alguma semelhança com os sinos, altas três palmos e meio e proporcionadamente largas,<br />
com maior circunferência na boca e mais apertadas no fim, aonde são furadas, para se<br />
lavar e purgar o açúcar por este buraco. Vendiam-se por quatro vinténs, salvo se a<br />
falta delas e o descui<strong>do</strong> de as procurar a seu tempo lhes acrescentasse o valor.<br />
O serem de ruim barro e mal queimadas é defeito notável, como também o serem<br />
pequenas. As boas são capazes de dar pães de três arrobas e meia. Tem nas casas da<br />
caldeira seu tendal cheio de bagaço de cana que vem da bagaceira, o qual, cava<strong>do</strong> com<br />
um cava<strong>do</strong>r de ferro ou de pau, serve de cama ou cova para nele se assentarem as<br />
formas direitas em duas fileiras iguais e, como temos dito acima, de cada quatro ou<br />
cinco formas consta uma venda. Antes de botar nelas o açúcar, se lhes tapa o buraco<br />
que tem no fun<strong>do</strong> com seus tacos de folha de banana e se asseguram com arcos de cipó e<br />
cana brava, para que com a demasiada quantidade <strong>do</strong> açúcar não arrebentem. Logo se<br />
lhes bota o açúcar por temperas, como já temos dito, o qual no espaço de três dias<br />
endurece diversamente, um mais, outro menos, e ao que mais se endurece e<br />
dificultosamente se quebra chamam açúcar de cara fechada e ao que facilmente com<br />
qualquer pancada se quebra chamam açúcar de cara quebrada. Metáforas que também<br />
exprimem as diversas naturezas e condições <strong>do</strong>s homens: uns tão vidrentos e outros tão<br />
tolerantes. E de ser bom ou mau o açúcar depende o fazer as vendas de mais ou menos<br />
formas, porque para o bom, que coalha depressa, basta tomar quatro formas e para o<br />
que coalha mais devagar tomam-se seis, sete e oito formas, para que crie com o maior<br />
tempo que é necessário para as encher todas, mais grão. Daí passa às costas <strong>do</strong>s<br />
negros ou sobre padiolas para a casa de purgar, da qual logo falaremos.<br />
Faz um engenho real de <strong>do</strong>is ternos de tachas, se a cana render bem, cada semana<br />
solteira-perto e passante de duzentos pães de açúcar, mas, se não render, apenas dá<br />
cento e vinte. E o render pouco nasce, ou de ser a cana muito velha ou de ser muito<br />
aguacenta, prova bem clara de serem os extremos,<br />
quaisquer que sejam, viciosos.<br />
CAPITULO II<br />
Da casa de purgar o açúcar nas formas<br />
A casa de purgar é comummente separada <strong>do</strong> edifício <strong>do</strong> engenho e a melhor de quantas<br />
há no Recôncavo da Baía é sem dúvida a <strong>do</strong> engenho de Sergipe <strong>do</strong> Conde, fabricada de<br />
pedra e cal, emadeirada com paus de maçaranduba e coberta com to<strong>do</strong> o asseio de telhas<br />
de comprimento de quatrocentos e quarenta e seis palmos e oitenta e seis de largura<br />
dividida em três carreiras de andainas com vinte e seis pilares de tijolo no meio,<br />
altos quinze palmos e meio e largos quatro, para sustentarem o tecto que assenta ao<br />
re<strong>do</strong>r sobre paredes largas e fortes. Recebe esta casa a luz e ar necessário por<br />
cinquenta e duas janelas, altas oito palmos e largas seis, vinte e três de cada<br />
banda, três na fachada com sua porta e três na testada. Repartem-se as andainas por<br />
47