Memória, patrimônio e identidade - TV Brasil
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Como afirmamos no texto inicial, há muitos conceitos de “<strong>Memória</strong>”, e para lembrar apenas o<br />
tomado por Santo Agostinho, esta capacidade começa com uma frase: “ Eu me lembro de mim<br />
mesmo ” (...); por isso, ninguém pode ser privado de memória sem ser despossuído de <strong>identidade</strong>.<br />
Sem memória, uma pessoa não se reconhece. Ela se despedaça... Deixa de existir. Dessa forma, a<br />
compreensão e o estudo dos processos e dos sistemas da memória humana são indispensáveis aos<br />
educadores e a todos os agentes sociais preocupados com o desenvolvimento individual e coletivo.<br />
Os conceitos e conhecimentos aplicados aos processos individuais da memória e do reconhecimento<br />
podem ser transpostos, por analogia e contigüidade, aos processos da memória coletiva e social, aos<br />
mecanismos de sua transmissão e continuidade, aos problemas causados por sua ruptura e perda<br />
gradativa. Nesse aspecto, será mais clara a compreensão da relação da História com os processos de<br />
construção, registro e recuperação das memórias individuais, familiares, de grupos e de<br />
coletividades, e o reconhecimento da importância do “fazer história” como garantia da consolidação<br />
da consciência de si e do sentimento de <strong>identidade</strong> de um determinado grupo no tempo e no espaço.<br />
O homem que confundiu sua mulher com um chapéu<br />
O famoso caso relatado por Oliver Sacks em livro com o mesmo título, juntamente com outros<br />
casos clínicos sobre distúrbios e disfunções da memória, tornou-se peça de teatro encenada por um<br />
dramaturgo inglês, Peter Brook. Um outro caso narrado no livro, Nostalgia Incontinente , serviu de<br />
inspiração para a história de Rose, em Tempo de Despertar, livro do mesmo autor, depois<br />
transformado em filme que emocionou multidões, e a de Deborah, na peça teatral de Harold Pinter,<br />
em Um tipo de Alaska . Podemos nos perguntar porque os casos clínicos do professor Sacks<br />
despertam tanta emoção e interesse em platéias leigas, e não apenas nos neurocientistas. Ele próprio<br />
nos dá a explicação para isso no prefácio ao livro citado: “O ser essencial do paciente é muito<br />
relevante nas esferas superiores da neurologia e na psicologia, pois, nestas áreas, a individualidade<br />
do paciente está essencialmente envolvida, e o estudo da doença e da <strong>identidade</strong> não pode ser<br />
desarticulado. De fato, esses distúrbios, juntamente com sua descrição e estudo, exigem uma nova<br />
disciplina, que podemos denominar “ neurologia da <strong>identidade</strong> ”, pois lida com as bases neurais do<br />
eu, com o antiqüíssimo problema de mente e cérebro. É possível que deva existir, necessariamente,<br />
um abismo, um abismo categórico, entre o psíquico e o físico; mas os estudos e as histórias que<br />
concernem simultaneamente a ambos [...] podem, não obstante, servir para aproximá-los mais, para<br />
nos levar à própria intersecção de mecanismo e vida, à relação dos processos fisiológicos com a<br />
biografia” (Sacks, 1997, p.10). E o autor continua, apontando de modo curioso para o tema que nos<br />
MEMÓRIA, PATRIMÔNIO E IDENTIDADE. 13