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Memória, patrimônio e identidade - TV Brasil

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memórias e valores, algo que só pode ser compartilhado de modo muito especial. A História da<br />

Medicina tem muitas relações com a História dos Museus, com a Antropologia, com a Sociologia, a<br />

Psicologia e a Psicanálise.<br />

No caso do “ homem que confundiu sua mulher com um chapéu”, Sacks relata com assombro o<br />

caso do Dr. P, que considera de importância fundamental, pois constitui um desafio radical a um dos<br />

mais arraigados axiomas ou suposições da neurologia clássica: “em especial, a concepção de que<br />

um dano cerebral, qualquer dano cerebral, reduz ou remove a ‘atitude abstrata e categórica' (no<br />

termo de Kurt Goldstein), reduzindo o indivíduo ao emocional e concreto. No caso do Dr. P., vemos<br />

exatamente o oposto disso: um homem que perdeu totalmente (embora apenas na esfera do visual) o<br />

emocional, o concreto, o pessoal, o ‘real'... e foi reduzido, por assim dizer, ao abstrato e categórico,<br />

com conseqüências de um tipo particularmente estapafúrdio” (Sacks, 1997, p. 21).<br />

O caso do Dr. P. é um caso muito especial de “ agnosia visual ” . Assim o descreve Oliver Sacks:<br />

“O Dr. P. era um músico excelente, fora célebre como cantor durante muitos anos e depois, na<br />

faculdade de música, como professor. Foi ali, no relacionamento com seus alunos, que certos<br />

problemas foram observados pela primeira vez. Às vezes um aluno se apresentava e o Dr. P. não o<br />

reconhecia ou, especificamente, não reconhecia seu rosto. No momento em que o aluno falava, o<br />

Dr. P. reconhecia-o pela voz. Incidentes como esse se multiplicaram, causando embaraço,<br />

perplexidade, medo e, às vezes, situações cômicas. Pois não só o Dr. P. deixava de reconhecer<br />

rostos, mas ainda por cima via rostos onde eles não existiam: na rua, jovialmente, ele afagava o topo<br />

de hidrantes e paquímetros pensando que eram cabeças de crianças; dirigia-se cordialmente aos<br />

puxadores esculpidos dos móveis e se espantava quando eles não respondiam. A princípio, as<br />

pessoas, e até mesmo o Dr. P., riam dessas confusões esquisitas, julgando que eram gracejos. [...]<br />

Suas capacidades musicais continuavam deslumbrantes como sempre; ele não se sentia doente –<br />

jamais se sentira melhor em sua vida –, e os enganos eram tão risíveis, e tão originais, que não<br />

poderiam ser sérios ou significar algo grave. A idéia de que havia ‘algo errado' só foi surgir uns três<br />

anos depois, quando o diabetes se manifestou. Ciente de que o diabetes poderia afetar-lhe a visão, o<br />

Dr. P. consultou um oftalmologista, que fez um histórico minucioso e lhe examinou atentamente os<br />

olhos. ‘Com seus olhos não há nada de errado', concluiu o médico. ‘Mas há problema nas partes<br />

visuais de seu cérebro. O senhor não precisa de meus serviços, precisa consultar um neurologista'. E<br />

assim, em conseqüência desse parecer, o Dr. P. me procurou”, relata Sacks.<br />

MEMÓRIA, PATRIMÔNIO E IDENTIDADE. 15

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