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A FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO DE SUPERFÍCIE - Fadisp

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FACULDA<strong>DE</strong> AUTÔNOMA <strong>DE</strong> <strong>DIREITO</strong> - FADISP<br />

CESAR CALO PEGHINI<br />

A <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong><br />

PROGRAMA <strong>DE</strong> MESTRA<strong>DO</strong> EM <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong><br />

São Paulo<br />

2009


FACULDA<strong>DE</strong> AUTÔNOMA <strong>DE</strong> <strong>DIREITO</strong> - FADISP<br />

CESAR CALO PEGHINI<br />

A <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong><br />

Dissertação apresentada a Banca Examinadora da<br />

Faculdade Autônoma de Direito - FADISP, como<br />

exigência parcial para a obtenção do título de<br />

Mestre em Função Social do Direito.<br />

Orientador: Professor Dr. Luis Paulo Cotrim<br />

Guimarães<br />

São Paulo<br />

2009


CESAR CALO PEGHINI<br />

A <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong><br />

São Paulo<br />

2009<br />

Banca Examinadora:<br />

Professor Orientador: Professor Dr. Luis Paulo<br />

Cotrim Guimarães<br />

Examinador:<br />

Examinador:


Dedico esta monografia com todo o meu coração à<br />

minha querida mãe Jaci Aparecida Calo Peghini,<br />

que sempre me apoiou, mesmo quando tudo<br />

conspirava contra.


Prefacialmente e não menos importante agradeço<br />

a disposição e paciência do Professor Dr. Luis<br />

Paulo Cotrim Guimarães que sempre me atendeu<br />

de forma sublime, mesmo tendo, tantos outros e<br />

importantíssimos afazeres quotidianos. Agradeço<br />

em especial, a Professora Dra. Thereza Arruda<br />

Alvim, por todas as oportunidades ofertadas, bem<br />

como pela confiança deposita que nunca<br />

esquecerei. Agradeço o Professor Dr. Everaldo<br />

Augusto Cambler, que compartilhou comigo, meus<br />

primeiros e inaugurais momentos na docência.<br />

Não poderia deixar de citar ainda, Cleudir Lima<br />

Goos (Cléo) que contribuiu de forma significativa<br />

neste momento tão importante. Agradeço ainda<br />

todo o apoio, auxílio e colaboração do Marco<br />

Antonio Pedrosa Cardoso quando da minha<br />

ausência nos demais compromissos. Agradeço<br />

com todo o meu amor e carinho Aline Aparecida<br />

Santos Costa que esta sempre esta disposta e<br />

solicita nos meus momentos mais difíceis e por<br />

fim; àqueles que não acreditavam em um<br />

determinado momento, que eu poderia dar mais<br />

este “passo” importante na minha vida. Tal crença<br />

infundada, só me fez aumentar meu amor e minha<br />

dedicação à Advocacia, à Docência e ao Direito.


“Eu vejo o futuro repetir o passado<br />

Eu vejo um museu de grandes novidades<br />

O tempo não pára<br />

Não pára, não, não pára”<br />

Cazuza / Arnaldo Brandão


RESUMO<br />

O objeto do presente estudo, ou seja, o direito de superfície tem sua origem no<br />

império romano. Verifica-se que sua aplicabilidade foi pautada inicialmente no direito<br />

público como um instrumento de expansão do império e posteriormente – como não<br />

poderia deixar de ser –, passou a tecer usas teias em âmbito direito privado, tendo<br />

como finalidade o mantenimento das referidas terras estatais conquistadas.<br />

Patriado pelo no sistema jurídico brasileiro – de forma inegável –, prefacialmente<br />

pelo Estatuto da Cidade e posteriormente pelo Código Civil de 2002, contem forte<br />

influencia lusitana, bem como, retomando a este com o objetivo de atender “uma<br />

lacuna” aberta pelo novo perfil social, econômico e político do direito de propriedade.<br />

Nesta esteira, o direito de superfície, sendo ele, um direito real imobiliário de<br />

natureza complexa, diferente de qualquer outro direito real, tendo em vista suas<br />

peculiares, e em especial, sua nítida transmissibilidade.<br />

Assim, o superficiário, ou seja, o titular da concessão superficiária, é titular de um<br />

direito real, que nele, pode construir ou plantar e manter a construção ou plantação,<br />

com o respectivo valor econômico – tendo em vista que este, pode ser comercializado<br />

ou ainda gravado de ônus real – em caráter acessório e temporal.<br />

Tal hipótese, conforme se verifica, ao ser esculpido no ordenamento jurídico<br />

pátrio, reflete de forma inegável no atendimento da função social da propriedade,<br />

previsto tanto na Constituição Federal promulgada em 1988, como em vários outros<br />

dispositivos legais, porem em especial, no Código Civil de 2002.<br />

Sua aplicabilidade – pelo menos de inicio --, é desafiadora. Pois, este é um<br />

instituto recém introduzido no ordenamento jurídico pátrio, merecedor de reformas,<br />

tendo ainda, sido criticado quanto a sua aplicabilidade no passado e por fim, objeto de<br />

um aparente conflito de normas no ordenamento jurídico.<br />

Tais apontamentos merecem ser analisados, verificados e estudados, pois tão<br />

somente assim, pode ser verificado, que com base nos atuais instrumentos jurídicos<br />

vigentes, o direito de superfície é capaz de atender de forma clara e lidima o principio<br />

constitucional da função social da propriedade.<br />

Palavras-chave: Direito de Superfície. Propriedade. Principio da Socialidade<br />

Função Social da Propriedade.


ABSTRACT<br />

The object of this study, ie, the surface rights has its origin in the Roman Empire.<br />

It appears that its applicability was guided initially in public law as an instrument of<br />

expansion of the empire and later came to be applied under private law whose aim is to<br />

keep those state lands conquered.<br />

Approved by the Brazilian legal system, initially by the City Statute and<br />

subsequently by the Civil Code of 2002, contains strong Portuguese influence, ie,<br />

returns with the objective of meeting a "gap" opened by the new social profile, economic<br />

and political right to property.<br />

On this track, the surface rights, being a right real estate complex in nature, unlike<br />

any other real right, considering its peculiar, and in particular its strong transmissibility.<br />

Thus, the surface rights, or the concession holder surface, holds a real right which<br />

it may build or plant and maintain the building or planting, with its economic value, in<br />

order that it can be marketed or taped lien, in accessory character and temporal.<br />

This hypothesis, as shown, to be carved in native legal system reflects<br />

unmistakably the care of the social function of property, as provided in the Constitution<br />

promulgated in 1988, as in several other laws, however especially in the Civil Code<br />

2002.<br />

Its applicability, at least initially, is challenging. Well, this is an institute recently<br />

introduced in the native legal system worthy of reforms, which have also been criticized<br />

as to its applicability in the past and finally, the object of an apparent conflict of<br />

standards in the legal system.<br />

Such findings deserve to be analyzed, verified and studied since, as only thus,<br />

can be verified that based on current existing legal instruments, the right surface is able<br />

to meet a clear and just-the constitutional principle of the social function of property.<br />

Keywords: Surface Rights. Property. Principle of Sociality. Social Function of Property.


SUMÁRIO<br />

INTRODUÇÃO................................................................................................................12<br />

CAPÍTULO 1 – O <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong> E O <strong>DIREITO</strong> POSITIVA<strong>DO</strong>..................14<br />

1.1 Etimologia da palavra Superfície e o Direito de Superfície ......................................14<br />

1.2 Direito Romano: Origem do Instituto.........................................................................16<br />

1.3 O Direito de Superfície no Direito Medieval e Moderno............................................23<br />

1.4 O Direito de Superfície no Direito Pátrio...................................................................28<br />

1.4.1 O Direito de Superfície Pré-codificação nacional...................................................28<br />

1.4.1.1 Ordenações Afonsinas........................................................................................30<br />

1.4.1.2 Ordenações Manuelinas......................................................................................31<br />

1.4.1.3 Ordenações Filipinas...........................................................................................31<br />

1.4.2 O Direito de Superfície e sua codificação nacional ...............................................33<br />

1.5 O Direito de Superfície no Código Civil de 2002 e o Estatuto da Cidade (breve<br />

arrazoado).......................................................................................................................36<br />

CAPÍTULO 2 – A <strong>SUPERFÍCIE</strong> NA LEGISLAÇAO ALIENIGENA................................39<br />

2.1 Introdução e justificativa do estudo na Legislação Alienígena..................................39<br />

2.2 França........................................................................................................................41<br />

2.3 Alemanha...................................................................................................................44<br />

2.4 Itália...........................................................................................................................47<br />

2.5 Suíça..........................................................................................................................50<br />

2.6 Espanha.....................................................................................................................54<br />

2.7 Portugal.....................................................................................................................57<br />

2.8 Canadá: Província de Québec...................................................................................62<br />

2.9 Argentina...................................................................................................................64


CAPÍTULO 3 – <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> PROPRIEDA<strong>DE</strong> E O PRINCIPIO<br />

DA <strong>SOCIAL</strong>IDA<strong>DE</strong>..........................................................................................................66<br />

3.1 A Constitucionalização do Direito Civil......................................................................66<br />

3.2 Os Princípios Norteadores do Código Civil...............................................................81<br />

3.2.1 Principio da Operabilidade......................................................................................83<br />

3.2.2 Principio da Eticidade.............................................................................................86<br />

3.2.3 Principio da Socialidade.........................................................................................91<br />

3.3 A Função Social da Propriedade.............................................................................104<br />

3.3.1 O histórico e evolução da Função Social do Direito de Propriedade...................104<br />

3.3.2 Noção da Função Social da Propriedade.............................................................112<br />

3.4 Instrumentos e requisitos da função social da propriedade....................................115<br />

3.4.1 Instrumentos Constitucionais................................................................................115<br />

3.4.2 Instrumentos do novo Código Civil.......................................................................123<br />

3.4.3 Instrumentos Infraconstitucionais.........................................................................134<br />

3.5 Breve arrazoado sobre função social da posse.......................................................137<br />

CAPÍTULO 4 – A <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>.........................144<br />

4.1 Teoria Geral dos Direitos Reais: Principais pontos de correlação com o Direito de<br />

Superfície.......................................................................................................................144<br />

4.2 Teoria Geral do Direto de Superfície.......................................................................155<br />

4.2.1 Conceito................................................................................................................155<br />

4.2.2 Natureza Jurídica..................................................................................................158<br />

4.2.3 O Afastamento do principio superfícies solo cedit (a superfície acompanha o solo)<br />

.......................................................................................................................................163<br />

4.3 O Código Civil de 2002 e Estatuto da Cidade.........................................................165<br />

4.3.1 O Código Civil de 2002.........................................................................................165<br />

4.3.2 O Estatuto da Cidade...........................................................................................166<br />

4.3.3 Divergências legislativas entre o Estatuto da Cidade e o Código Civil de 2002..168<br />

4.3.4 Revogação do Estatuto da Cidade pelo Código Civil de 2002.............................170


4.4 Da Constituição e da transferência do direito de propriedade................................176<br />

4.4.1 Das modalidades do direito de superfície.............................................................176<br />

4.4.2 Modos de constituição da concessão do direito de superfície.............................177<br />

4.4.2.1 Modo derivado de concessão do direito de superfície......................................178<br />

4.4.2.2 Modo originário de concessão do direito de superfície (usucapião) ................182<br />

4.5 Elementos subjetivos: as partes do direito de superfície.........................................185<br />

4.6.1 Objeto do direito de superfície..............................................................................188<br />

4.6.1.1 Acessibilidade ao objeto da superfície .............................................................190<br />

4.6.1.2 A Superfície por cisão........................................................................................191<br />

4.6.1.3 Da superfície em segundo grau ou sobrelevação............................................193<br />

4.6.1.4 Da ocupação do subsolo e do espaço aéreo....................................................195<br />

4.6.1.5 Da impossibilidade de constituição do direito de superfície .............................198<br />

4.7. Da impossibilidade de pagamento do laudêmio.....................................................199<br />

4.8 Da duração do direito de superfície.........................................................................201<br />

4.9 O Cânon superficiário ou solarium..........................................................................204<br />

4.10 Dos encargos e contribuições...............................................................................206<br />

4.11 Do direito de preferência.......................................................................................210<br />

4.12 Extinção da Superfície...........................................................................................216<br />

4.12.1 Extinção pelo inadimplemento das obrigações assumidas pelas partes...........219<br />

4.12.2 Extinção pelo termo final....................................................................................224<br />

4.12.3 Extinção pela consolidação................................................................................225<br />

4.12.4 Extinção pelo distrato.........................................................................................226<br />

4.12.5 Extinção por denuncia de uma das partes.........................................................227<br />

4.12.6 Extinção pela desapropriação............................................................................229<br />

4.13 A Função Social do Direito de Superfície..............................................................232<br />

CONCLUSÃO................................................................................................................242<br />

ANEXO 01.....................................................................................................................261<br />

ABREVIATURAS UTILIZADAS....................................................................................263<br />

BIBLIOGRAFIA.............................................................................................................264<br />

LEGISLAÇÃO...............................................................................................................275


INTRODUÇÃO<br />

O presente trabalho tem como objeto a análise do direito de superfície na atual<br />

condição que se encontra, bem como o confrontar diante da temática do direito de<br />

propriedade sob uma visão constitucional.<br />

Tais cadeiras, segundo nosso ver são de grande relevância. Tal afirmativa, tem<br />

como fundamento o objeto do presente estudo, corriqueiramente colocado nas mesas<br />

de debates por diversas classes de estudiosos.<br />

Colocamos este relevante tema, ao cume das relações sociais, tendo em vista,<br />

que o direito de propriedade, assim como alguns outros ramos do estudo do direto,<br />

estão interligados intrinsecamente a outras matérias não relacionadas ao direito. Dentre<br />

estas cadeiras, podemos citar a Economia, a História, a Sociologia, a Ciência Política<br />

dentre muitas outras.<br />

Para ser tracejado um caminho assertivo, importante se faz constar que<br />

galgaremos alguns pontos fundamentais de tal forma, que entrelaçaremos tais<br />

elementos extraindo o objetivo fundamental do presente trabalho.<br />

Assim, inicialmente, será examinada a evolução legislativa dos referidos<br />

institutos, bem como a suas características gerais. Tal cortejo desse processo evolutivo<br />

permitirá a melhor compreensão do instituto e seus efeitos atuais.<br />

Superado a referida analise, serão averiguados ainda, o estudo do direito<br />

alienígena, fundamental para a verificação crítica da aplicação do direito de superfície<br />

em âmbito doméstico, diante da falta de cultura e experiência em relação da nova figura<br />

no sistema nacional.<br />

12


Após tal estudo adentraremos no paradigma da função social do direito de<br />

propriedade e o princípio da socialidade que permeia todo o direito e traz seus nítidos<br />

reflexos ao direito de superfície, observando ainda, as nítidas interferências dos<br />

princípios fundamentais do Código Civil.<br />

Por fim, verificaremos concomitantemente as características fundamentais e<br />

elementares do instituto de direito de superfície, bem como e seus reflexos e verificando<br />

ainda, seu atual enquadramento no sistema jurídico normativo.<br />

13


CAPÍTULO 1 - O <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong> E O <strong>DIREITO</strong> POSITIVA<strong>DO</strong><br />

1.1 Etimologia da palavra Superfície e o direito de superfície<br />

Para pontuar o presente estudo, devemos primeiramente analisar a etimologia 1<br />

da palavra superfície, para tão somente após verificarmos o direito de superfície. Tal<br />

justificativa tem como fundamento, que a utilização, – como nítido se faz ver – destas<br />

palavras empregadas separadamente se diferenciam conceitualmente. 2<br />

Desta forma, o Ricardo Pereira Lira leciona que 3 :<br />

“Os antigos discutiam o étimo da palavra latina superfícies. Em torno da questão não se<br />

puseram acordes. Para uns resultou a expressão da composição da preposição super ou<br />

supra e do substantivo fácies. Segundo outros tratar-se-ia da associação entre a mesma<br />

preposição e o verbo facere.”<br />

Ainda no mesmo sentido o Rima Gorayb se posiciona 4 :<br />

“A palavra superfície é composta em sua primeira parte pela preposição “super” ou<br />

“supra” que indica a idéia de uma situação superior externa. Quando à segunda parte do<br />

vocábulo, origina-se do substantivo fácies ou plano”<br />

Frederico Henrique Viegas de Lima 5 se posiciona:<br />

1<br />

Para o dicionário digital Priberam, a palavra etimologia significa: Parte da Gramática que trata da origem<br />

e formação das palavras. Priberan Informática, Língua portuguesa on-line, Disponível em:<br />

. Acesso em: 25/04/2009.<br />

2<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 54.<br />

3<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da<br />

Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 11.<br />

4<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 19.<br />

5<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 25.<br />

14


“Etimologicamente, da palavra superfície forma-se por dois elementos super e facere,<br />

que, num sentido rigoroso, que dizer tudo aquilo que está realizado, ou tudo aquilo que<br />

se levanta, por obra artificial do homem ou da natureza sobre um plano horizontal.”<br />

Porém, esmiúça o Ricardo Pereira Lira 6 :<br />

“... o sentido das duas palavras: a primeira é preposição iniciativa da existência de uma<br />

situação superior em relação a outra em plano mais baixo (assim sur na palavra francesa<br />

surface e ober na palavra alemã oberflache); a segunda é um substantivo destinado a<br />

indigitar a idéia de plano ou face (assim face ou flece nas palavras surfece e oberflache)”<br />

Já Maria Helena Diniz 7 : “O que se revela ou se encontra acima do solo, como por<br />

exemplo, construções e plantações, e que até prova em contrário se presume pertencer<br />

ao dono.“<br />

Corroborando, com esta idéia, mesmo que de forma bem simplória, podemos<br />

entender que a palavra, superfície, tem o caráter de algo ou alguma coisa exterior e<br />

superior a aquela, ou seja, diferenciar algo de sua composição interna e externa. 8<br />

Porém, tal posicionamento, refere-se ao senso comum, ou seja, o sentido mais<br />

amplo da palavra. E assim, como não poderíamos de deixar de fazer, devemos verificar<br />

ainda, qual seria o sentido jurídico da palavra superfície que esta atrelado aquele 9 .<br />

Nesta mesma posição, pontua ainda o Plácido e Silva 10 :<br />

“Do latim superficies (parte exterior, parte superior, cimo), em sentido gramatical designase<br />

a parte exterior ou a face externa da coisa. Geometricamente, entende-se a extensão<br />

6 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da<br />

Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 11.<br />

7 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico: Q - Z, v. 4. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 566 – 567.<br />

8 Neste sentido: o dicionário digital Priberam, superfície é: Parte exterior e visível dos corpos.<br />

Priberan Informática, Língua portuguesa on-line, Disponível em: .<br />

Acesso em: 25/04/2009.<br />

9 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da<br />

Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 12.<br />

10 SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico: A - C, v. I: 3 ed. Forense: São Paulo, 1973. p. 1501.<br />

15


de qualquer coisa, considerada exclusivamente em seu comprimento e largura, isto é,<br />

sem dependência de sua altura e espessura. Mas no sentido jurídico tradicional que<br />

provem do Direito Romano, a superfícies (superfície) é tudo aquilo que se eleva acima do<br />

solo. E, assim, a expressão conduz ao significado que não condiz com o sentido<br />

geométrico.<br />

Para Rima Gorayb 11 , podemos diferenciar a superfície de duas formas. A<br />

primeira delas como simples termo que é, ou seja, simplesmente superfície, este caso<br />

pode ser esta interpretada no mesmo sentido da linguagem usual já apresentada. Em<br />

um segundo momento, temos ainda, a superfície como instituto jurídico, que neste<br />

caso, emprega-se o termo direito de superfície.<br />

Neste mesmo sentido pontua a Diana Coelho Barbosa 12 : “A superfície, vista sob<br />

o ângulo de um direito real, não pode ser confundida com o sentido etimológico do<br />

vocábulo superfícies que deu origem à sua denominação”.<br />

Entendemos como assertiva tal diferenciação, pois conforme poderemos verificar<br />

no presente trabalho, o referido instituto, vai muito além do simples conceito comum ou<br />

jurídico geral aplicado.<br />

1.2 Direito Romano: Origem do Instituto<br />

A superfície tem origem inegavelmente no direito Romano 13 , onde o proprietário<br />

da terra era titular de um direito de propriedade praticamente absoluto, sem restrições<br />

ao seu uso e gozo, e assim beneficiava-se por tudo que fosse acrescido ao solo. 14<br />

11<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 20.<br />

12<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 73.<br />

13<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.; PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense,<br />

2004. p. 243.; CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de<br />

Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 396 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed.<br />

São Paulo: Atlas, 2003.p. 391; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das<br />

servidões. Arts. 1.277 a 1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários<br />

ao Código Civil Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256. SILVA, de Plácido e. Vocabulário<br />

16


Desta forma, o proprietário quando da acessão de qualquer benfeitoria sob o<br />

imóvel – seja na terra ou no seu espaço aéreo –, este encampado, como conseqüência<br />

lógica do direito de propriedade. Em decorrência desta rigidez, tornou-se inconveniente<br />

na medida da expansão do território romano o desenvolvimento das obras públicas. 15<br />

Pontua Marise Pessoa Cavalcanti: 16<br />

“Contudo, com a evolução dos tempos, necessário se fez abrandar tal principio para que<br />

houvesse adaptação às novas realidades socioeconômicas. Assim se começou a<br />

permitir, àqueles que construísse em solo alheio, o gozo sobre sua atividades. Pode-se<br />

dizer que a doutrina cita como origem da superfície as concessões de solo público a<br />

particulares que podiam usufruir das construções que realizassem em tais terras.”<br />

Neste mesmo sentido Marise Pessoa Cavalcanti arrola: 17 “Ao ocorrer tal fato,<br />

surgiu uma relação jurídica anormal e incerta, quando seria muito mais simples comprar<br />

Jurídico: A - C, v. I: 3 ed. Forense: São Paulo, 1973. p. 1501. LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais<br />

à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo: Editora Método, 2004. p. 272.; BARBOSA, Diana<br />

Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 17.<br />

CORREA, Osíris Leite. Direito de Superficie. Disponível em . Acesso em: 10/06/2008. GORAYB, Rima. O Direito de Superfície.<br />

São Paulo: Quartier Latin, 2007. p.22.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória:<br />

instrumento de efetivação da função social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 8.<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica. Conceito. Particularidades.<br />

Disponível em . Acesso em: 10/06/2009.; LIMA,<br />

Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana. Rio de<br />

Janeiro: Renovar, 2005. p. 15.; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São<br />

Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 16.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do<br />

Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 32.; MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O<br />

direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007. paginas 404. Dissertação (Mestrado) –<br />

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São Paulo, 2007. p. 19.; GRAMSTRUP, Erik F.<br />

Questões intrigantes Sobre o direito real de superfície. In: ALVES, Jones Fiqueiredo; Delgado, Mario Luiz.<br />

(Coords.). Novo Código Civil: questões controvertidas: Direito das Coisas, São Paulo; Método, 2008. p.<br />

244.; ALVES, José Carlos Moreira. Direito Romano, Rio de Janeiro: Forense, 1778. p. 471.<br />

14<br />

Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 20.; GORAYB,<br />

Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 24 e 25.; BENASSE, Paulo Roberto. O<br />

Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 16.<br />

15<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 20. CAVALCANTI, Marise Pessoa.<br />

Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da propriedade. Rio de Janeiro:<br />

Renovar. 2000. p. 8.<br />

16<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p.8.<br />

17


o solo. Mas a sua necessidade decorreu da impossibilidade de o dono do solo vende-lo<br />

quer por ser ele inalienável ou por outro motivo qualquer.”<br />

Conforme a doutrina, esta é a causa do surgimento do direito de superfície, ou<br />

seja, a sua criação foi motivada pela necessidade de adaptação às condições sociais<br />

dos novos tempos da conjectura da propriedade romana. 18<br />

O primeiro relato histórico do direito de superfície conforme aduz Ricardo Pereira<br />

Lira, foi a concessão de terreno de Cartago no século IX antes da era cristã, bem como<br />

no ano de 298 da Fundação de Roma que teria sido concebido à muitas famílias<br />

plebéias, por motivos de carência o direito de habitar o Avelino, cada um morando em<br />

um dos pavimentos de casas construídas. 19<br />

Não obstante a fase de sua origem diverge na doutrina, neste entender Cristiano<br />

Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 20 :<br />

“A superfície surge no direito romano, na fase derradeira do período clássico – período<br />

de intenso desenvolvimento urbano –, inicialmente por meio de relação de direito<br />

obrigacional e, posteriormente como direito real em coisa alheia. Em Roma, a superfície<br />

sempre foi um direito real em coisa alheia, sem que nunca fosse alcançada a noção de<br />

propriedade autônoma.”<br />

Há ainda, quem sustente que a superfície teve origem mais especificadamente<br />

no período pós-clássico ou romano-helênico 21 , possivelmente, em decorrência de<br />

arrendamentos de longos prazos (locati conducti rei).<br />

17 CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p.8.<br />

18 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 21.<br />

19 Neste sentido: GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 26; LIRA,<br />

Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da<br />

Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 21.<br />

20 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.; LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno<br />

direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do<br />

Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 19.<br />

18


Tal justificativa tem como fundamento, que em Roma, neste período houve a<br />

existência de um instituto com estas características, ou seja, um arrendamento de forma<br />

perpétua ou de longo prazo (ius in agro uectigal) 22 , que permitia a ocupação e cultivo<br />

pelos particulares em terra do Estado, Município e Associações religiosas, em contrapartida,<br />

mediante pagamento de cânon, porem naquele período de uectigal (para o<br />

cultivo) e solarium (para as construções). 23<br />

Referente esta contra-prestação, dispõe o seguinte José Guilherme Braga<br />

Teixeira: “Convém frisar que, mesmo na antiga Roma, o direito de superfície costumava<br />

ser remunerado por uma contraprestação consistente num cânon denominado solarium.<br />

Entretanto, podia ser a superfície concebida sem nenhuma retribuição, posto que não<br />

era o solarium essencial ao instituto.” 24<br />

Referido instituto, foi de grande valia para Roma, tendo em vista que este, foi<br />

utilizado para a expansão do império das terras adquiridas no transcurso de seu<br />

apogeu, bem como assegurando ainda, a posse em favor do Império. 25<br />

Nesta esteira, o Arnaldo Rizzarto 26 acrescenta:<br />

“No direito romano, em sua primeira fase, vingava o principio da associação estreita entre<br />

o solo e a superfície, sendo ambos partes da mesma coisa, o que levou a formar a<br />

expressão superficies solo cedit, ou seja, a superfície segue o solo. Quem fosse dono do<br />

21<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256.<br />

22<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 33.<br />

23<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256.<br />

24<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 277.<br />

25<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256.<br />

26<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 861.<br />

19


solo era dono de tudo aquilo que se erguesse ou existisse sobre ele, pois considera-se a<br />

superfície uma parte do solo, inicialmente a ele ligado, não se viabilizando a transferência<br />

de um elemento ou de outro.<br />

Desta monta, em decorrência da grande expansão romana, estes, não<br />

vislumbrando outra forma para manutenção das terras conquistadas, passaram a<br />

permitir a instalação e construção de hospedarias (aedes superficiarias) e lojas<br />

bancárias (tabernas argentarias) ao longo as estradas, enquanto estes, ou seja, os<br />

hospedadores e banqueiros se regularizavam. 27<br />

Neste sentido pontua o Silvio de Salvo Venosa 28<br />

“”a superfície é um instituto de origem exclusivamente romana. Decorreu da necessidade<br />

prática de se permitir a construção em solo alheio, principalmente sobre bens públicos.<br />

Os magistrados permitiam que comerciantes instalassem tabernas sobre as ruas,<br />

permanecendo o solo em poder do Estado. Entre particulares, o instituto estabelecia-se<br />

por contrato. É consagrado como direito real em coisa alheia na época clássica. Permitiase<br />

a plena atribuição do direito de superfície a quem, sob certas condições, construísse<br />

em terreno alheio. Assim, passou-se a permitir que o construtor tivesse obra separada do<br />

solo. No entanto, sob o ponto de vista romano, o direito de superfície somente era<br />

atribuído as construções, não se aplicando as plantações em terreno alheio.”<br />

Por fim, arrematando este entendimento, José Guilherme Braga Teixeira 29<br />

discorre:<br />

“As conquistas territoriais que foram sendo feitas pelos romanos acarretam enorme<br />

ampliação dos lindes do Império, aparecendo as grandes propriedades (latifundia). A<br />

necessidade de fixar pessoas nas terras conquistadas, a fim de garantir tais terras em<br />

favor de Roma, levou os romanos a facilitares a ocupação e o cultivo delas. Avista disso,<br />

enquanto se aplicava o ager vectigalis na parte ocidental do império, na sua parte oriental<br />

27<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256.<br />

28<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 390 e<br />

391.<br />

29<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 17.<br />

20


apareceram novas formas de arrendamento: o ius emphyteuticum, quando temporário, e<br />

o ius perpetuum, quando perpetuo, ambos concedidos mediante o pagamento de um<br />

cânon anual.”<br />

Assim, conforme podemos notar, tal concessão conforme pode-se verificar teria<br />

como objeto construir ou plantar um solo público. Sendo que quando estávamos de<br />

ante do direito de construir tratava-se de um direito denominado de (ius aedificandi de<br />

superfície) e quando do direito de cultivo (ius in agro uertigalis ou de ius perpetuum),<br />

porem em ambos os casos – conforme já exposto – deveria o arrendatário pagar<br />

monetariamente uma contra partida. 30<br />

Em decorrência disto, podemos afirmar, sem medo nos equivocarmos que o<br />

direito de superfície originariamente é um instrumento de direito público-administrativo,<br />

que com o tempo, se confunde com o direito privado conforme poderemos verificar no<br />

decorrer do presente estudo. 31<br />

Corroborando esta idéia Carlos Roberto Gonçalves elucida 32 :<br />

“Surgiu da necessidade prática de se permitir edificação sobre bens públicos,<br />

permanecendo o solo em poder do Estado. No direito romano o Estado arrematava suas<br />

terras a particulares, que se obrigavam ao pagamento dos vectigali, com o objetivo<br />

precípuo de manter a posse das largas terras conquistadas.”<br />

Com o tempo, o direito romano, passa a sofrer algumas alterações, -- porém<br />

quando tratamos do direito de superfície –, a mais significativa se relaciona ao direito de<br />

seqüela perante terceiros.<br />

30<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 257.; GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier<br />

Latin, 2007. p. 33.<br />

31<br />

Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 17.; BENASSE,<br />

Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 22.<br />

32<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.<br />

21


Neste sentido, o Arnaldo Rizzarto 33 :<br />

“no curso do Século II depois de Cristo, já se admitia aos particulares o uso do solo<br />

alheio, construindo moradias na superfície, ou estendendo plantações. Mereceu esta<br />

forma de utilização a proteção do pretor, que concedia ao superficiário, quando ofendido<br />

em sua posse, um interdito de afastamento da perturbação.<br />

Acrescenta ainda, José Guilherme Braga Teixeira 34 :<br />

“a proteção interdital que lhes foi conferida e que deu ao direito dos arrendatários (que<br />

era exclusivamente pessoal) o primeiro colorido do direito real (falamos aqui de direito<br />

real como concebemos hodiernamente esse tipo de direito, não desconhecendo, porem<br />

que os romanos não constituíram nenhuma teoria abstrata a cerca de sua noção). É<br />

certo, outrossim, que, no que concerne à superfície, a proteção interdital passou a ser<br />

feita pelo interdito de superfifiebus, semelhante ao uti possidetis, que tinha por escopo<br />

defender o arrendatário contra quem o turbasse no exercício do seu direito e uso e<br />

fruição da edificação.”<br />

Somente no período de Justiniano, o referido instituto criou das mesmas<br />

diretrizes delineadoras do direito real, ou seja, um direito de uso e gozo sobre imóvel<br />

alheio, transmissível, bem como provido de uma ação própria e demais ações a eles<br />

pertinentes (ações confessatórias e negatórias) 35 .<br />

Nesta esteira pondera Frederico Henrique Viegas de Lima 36 no seguinte sentido:<br />

33<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 861.<br />

34<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 257.<br />

35<br />

Neste sento; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts.<br />

1.277 a 1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil<br />

Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256 e 257; RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª<br />

ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 861.; LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio<br />

de uma teoria geral. Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.<br />

23.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 9.; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de<br />

Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 19.: ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos.<br />

Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 36.<br />

36<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005.<br />

22


“No período pós-classico, a partir da vulgarização do direito, a superfície experimenta<br />

grande evolução, existindo diversas manifestações do instituto na praticam ainda que,<br />

muitas vezes, não fosse possível em períodos anteriores do direito romano.”<br />

Conforme pode ser verificado ainda na doutrina é difícil precisar historicamente<br />

quando a superfície adquiriu seu caráter de direito real. Sabendo-se ainda que foi por<br />

mérito e obra do ius pratorium, que, com o objetivo de buscar a equidade, procurou<br />

amenizar a inflexibilidade do ius civile em relação da acessão. 37<br />

Por fim, pode-se concluir que em decorrência das novas conjecturas sociais<br />

romanas do direito de propriedade, ou seja, pelo rigor dos princípios reguladores do<br />

direito de propriedade, a necessidade de melhoramento quanto o aproveitamento das<br />

terras conquistadas, a adequação habitacional e a valorização do resultado laborativo<br />

de quem trabalha nas terras se fez necessária a criação do instituto do direito de<br />

propriedade. 38<br />

1.3 O Direito de Superfície no Direito Medieval<br />

Já no direito medieval, a interferência no presente instituto é oriundo de outro<br />

direito também europeu, direito este, mais especificadamente oriundo do povo<br />

germânico. Estes tinham, como elemento basilar social a peregrinação, e assim<br />

modificando alguns conceitos e critérios fundamentais referentes ao binômio<br />

construtor/produtor e proprietário do solo. 39<br />

37 GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 29.<br />

38 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 26.<br />

39 Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 27 e 28.;<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 149. CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função<br />

social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 9.; BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de<br />

Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 29.; TEIXEIRA, José Guilherme<br />

Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 22. ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus<br />

Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 37<br />

23


Era entendimento que o trabalhador que construía ou plantava sob o solo, tinha<br />

“maior valor” do que o proprietário da terra, pois conforme já podemos verificar, os<br />

bárbaros eram povos nômades que após das colheitas e do proveito tirado do solo,<br />

abandonavam estas. 40<br />

Neste sentido pontua com exatidão Diana Coelho Barbosa: 41 “O principio do<br />

trabalho, contraposto ao principio da acessão, caracterizaria o reconhecimento da<br />

propriedade superficiária não só na era medieval mas também nos codificações<br />

modernas.”<br />

Corroborando esta mesma idéia, Paulo Roberto Benasse 42 apregoa:<br />

“Segundo esse direito germânico, imóvel era somente a terra nua, sendo tudo o mais<br />

bem móvel, e assim, a incorporação por acessão não tinha campo de aplicação. (...) É<br />

desta forma que o direito germânico antigo, não construído no principio superfície solo<br />

cedit, ignora o direito de superfície romano, como jus in re aliena, e o pratica através da<br />

divisão da propriedade do solo daquela do subsolo.”<br />

Arrematando neste mesmo diapasão Marcus Vinicius dos Santos Andrade 43<br />

pontua em sua obra: “ Sobreveio, com a ocupação germânica o contraste entre os dois<br />

sistemas, quando à “propriedade fundiária” como um absoluto, coloca em valoração<br />

binária, a questão sobre diferente ângulo: “ter” a terra ou “explorar” a terra.”<br />

Contudo, não seria somente esta, uma das influencias que sofreram o referido<br />

instituto, podemos citar ainda, dois grandes interessados. 44 Inicialmente a igreja<br />

40 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 258<br />

41 BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 26.<br />

42 BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 29 e 30.<br />

43 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. 38<br />

44 Neste entendimento, José Guilherme Braga Teixeira, pondera que: “O direito Canônico também serviu<br />

amplamente da superfície para legitimar as construções realizadas sobre terrenos de propriedade<br />

24


proprietária de várias construções em solo alheio que objetivavam regularizar ou<br />

legitimar suas construções em solo alheio, e por fim, os senhores feudais 45 ,<br />

proprietários das terras doadas pelos os reis, bem como, trabalhada pelos os servos.<br />

Nestes termos, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 46 observam:<br />

“Com o aperfeiçoamento do modelo jurídico no direito medieval, pelo interesse da igreja<br />

em legitimar as construções feitas em seus terrenos, e, posteriormente, nas legislações<br />

modernas – sobremaneira na reforma do BGB de 1919 –, a superfície foi reconhecida<br />

como verdadeiro direito de propriedade, abrandando-se o rigor do principio da unicidade<br />

da titularidade, pois de forma inédita, a propriedade do solo se apartaria da propriedade<br />

das construções e plantações servindo como maneira de estancar situações de crise<br />

habitacional.<br />

Corroborando esta mesma ideal pontua o Ricardo Pereira Lira 47 :<br />

“Ao lado do direito de superfície secular, pode detectar-se a existência de um direito de<br />

superfície secular, com a igreja constantemente fazendo concessões dessa natureza.<br />

Como nota distintiva cabe esclarecer que o direito de superfície eclesiástico não era<br />

alienável. Admitia-se, porem, fosse cedido o exercício do direito. De outro lado, a<br />

concessão por breve tempo, quando se tratasse de bens da igreja, gerava em favor do<br />

locatário direito real, o que não se verificava no direito de superfície secular.”<br />

Em decorrência desta evolução histórica o direito de superfície se amoldou ao<br />

novo fato social transformando-se de um direito real para se tornar o instituto mais<br />

equânime ao apresentado inicialmente. 48<br />

Dispõe José Guilherme Braga Teixeira 49 :<br />

eclesiástica e para explorar suas terras incultas, mediante concessões superficiárias.” TEIXEIRA, José<br />

Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 25.<br />

45 45 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a<br />

1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil<br />

Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 258<br />

46 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

47 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 30.<br />

48 CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 84.<br />

25


“em razão dos fatos ocorridos na época medieval, sucintamente referidos atrás,<br />

superfície e enfiteuse passam a ter por objeto, intrinsecamente, o direito de construir e<br />

plantar, ademais de ambas terem deixado de ser um ius in re aliena, para se tornarem<br />

verdadeiras propriedades paralelas do dominus soli, já que tanto o superficiário quanto o<br />

enfiteuta passaram a ter o dominou útil.<br />

Não obstante, o avanço do instituto referido instituto ter ocorrido, este, em<br />

decorrência dos mesmos acontecimentos históricos já apresentado aqui, sofreu uma<br />

grande perda, e tornou-se repúdioso perante a sociedade em decorrência dos abusos<br />

cometidos pelos proprietários do solo. 50<br />

Conforme, José Guilherme Braga Teixeira 51 :<br />

“Tornadas odiosas por terem escravizado o homem à terra, em razão dos absurdamente<br />

altos preços dos censos que os superficiários e enfiteutas (e, principalmente, os inúmeros<br />

e incontáveis subsuperficiários e subenfiteutas) estavam obrigados a pagar a título de<br />

foros, solários, laudêmios etc., superfícies e enfiteuses foram banidas pela Revolução<br />

Francesa, cujo efeitos se estenderam além das fronteiras guilesas, promovendo a<br />

restauração da unidade do domínio na pessoa do senhor do solo.”<br />

Neste mesmo sentido, Paulo Roberto Benasse 52 :<br />

49<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 257.<br />

50<br />

Neste sentido; AZEVE<strong>DO</strong>, Adriano Barcelos de. O direito real de superfície e o seu reingresso no<br />

ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em .<br />

Acesso em: 10/06/2009. VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica.<br />

Conceito. Particularidades. Disponível em .<br />

Acesso em: 10/06/2009.; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo:<br />

Revista dos Tribunais, 1993. p. 25.; GRAMSTRUP, Erik F. Questões intrigantes Sobre o direito real de<br />

superfície. In: ALVES, Jones Fiqueiredo; Delgado, Mario Luiz. (Coords.). Novo Código Civil: questões<br />

controvertidas: Direito das Coisas, São Paulo; Método, 2008. p. 244.<br />

51<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 257 e 258.<br />

52<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 16.<br />

26


“Da idade média até o século XVIII, ele passou a ser considerado odioso pois criava,<br />

como na enfiteuse, os servos da terra, sendo que no direito de superficiário, eclesiástico,<br />

concedido pelo prazo de 19 ou 29 anos, o concessionário podia construir nas terras<br />

eclesiásticas para fins de moradia, bem como nela plantar, sem contudo ter direito à<br />

alienação, e constituída direito real, propriedade paralela, destacada da propriedade do<br />

solo, com direito à prelação por preço inferior ao mercado para o terreno. Visava a<br />

legitimar construções realizadas em terrenos de propriedade eclesiástica.<br />

Acrescentam ainda, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 53 :<br />

“Interessante saber que a superfície foi abandonada pelo Código Civil Napoleônico e<br />

pelos seus códigos que o seguiram, pois a concepção da propriedade absoluta não<br />

poderia suportar uma cisão na titularidade do imóvel.”<br />

Não obstante, a nítida repúdia da aplicação do instituto, tão vislumbrada pela<br />

sociedade naquele período, no o direito português isso não ocorrera. Pois Marquês de<br />

Pombal, verificando todos os excessos ocorridos em todos os territórios restringiu os<br />

poderes dos senhores feudais, limitando assim, as exigências vantajosas e outros<br />

abusos cometidos por estes. 54<br />

Esmiúça e pontua, José Guilherme Braga Teixeira 55 :<br />

“Efetivamente, o correu que o citado Marquês, procurando abater a aristocracia, quer a<br />

secular quer a eclesiástica, passou a regular os mesmos institutos pela Lei de 9 de julho<br />

de 1773, cujos §§ 11, 17 e 26 respeitavam construções arvores e plantações (isto é, à<br />

superfície não foi abolida em Portugal e suas colônias)”<br />

Desta forma, não obstante o direito se superfície ter evoluído até então, este<br />

sofrera uma grande perda em função da sua indevida utilização por parte dos<br />

53 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

54 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 257 e 258.<br />

55 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 259.<br />

27


proprietários dos solos. Todavia desde que devidamente, aplicado é um instituto<br />

adequado que atende vários preceitos de aplicabilidade que verificaremos a seguir.<br />

1.4 O Direito de Superfície no Direito Pátrio<br />

Inicialmente antes de adentramos ao objeto do presente estudo, verificamos que<br />

no direito moderno 56 , a figura do direito superfície reflete a realidade de sua evolução,<br />

no sentido que este encontrou sucedâneo na divisão propriedade (dominium utile)” 57<br />

Entendemos que para melhor apresentar o atual direito de superfície, devemos –<br />

mesmo que de forma sintática – analisar a sua evolução histórica dentro de nosso<br />

ordenamento. Observando assim, todos os seus reflexos e tendências absolvidas em<br />

transcurso do tempo.<br />

Desta forma, objetivando sistematizar o presente estudo faremos em dois<br />

momentos, ou seja, o primeiro período denominado por nós, como pré-codificado<br />

nacional enquanto o Brasil colônia até Lei n. 1.237 de 24 de setembro de 1864 (Teixeira<br />

de Freitas), que excluiu inicialmente o direito de superfície do direito nacional, e em<br />

segundo momento, do termo final do primeiro período, até um breve arrazoado dos dias<br />

atuais.<br />

1.4.1 O Direito de Superfície Pré-codificação nacional<br />

Desta forma, o Brasil enquanto colônia portuguesa, encontrava-se sobre a égide<br />

dos diplomas legais de Portugal, ou seja, a aplicação de toda a legislação lusitana, tinha<br />

seus devidos efeitos em vigor dentro do território brasileiro. 58<br />

56<br />

Importante observar para o Carlos Roberto Gonçalves56 o direito de superfície moderno é aludido,<br />

entre outros, no direito italiano (CC, arts. 952 a 956), no direito português (CC, arts. 1.524 a 1.242), no<br />

direito alemão (arts. 1.012 a 1.017), no direito austríaco (arts. 1.125, 1.147 a 1.150), no direito suíço (arts.<br />

675 e 779), no direito holandês (arts. 758 a 766) no direito belga (Lei de 10-1-1824). Confere a ele, em<br />

essência, a uma ou várias pessoas o direito de construir ou plantar em terreno alheio.” GONÇALVES,<br />

Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 409.<br />

57<br />

PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.<br />

p. 243.<br />

28


Aduz Frederico Henrique Viegas de Lima 59 que:<br />

“Ao descobrir o Brasil em 1500, Portugal levou para a sua nova colônia suas leis<br />

vigentes, sendo estas aplicadas durante muitos séculos. É consabido que a separação<br />

jurídica dos dois países somente ocorreu em 1822, justamente com a independência do<br />

Brasil.”<br />

Nesta linha Marise Pessoa Cavalcanti: 60 “Em Portugal, tal direito possuía outra<br />

designação e foi regulado, primeiramente no direito antigo, pela Lei Pombalina de<br />

09/07/1773, em relação a construções, árvores e plantações.”<br />

Todavia, não obstante a Independência do Brasil ter ocorrido, ainda assim, nos<br />

termos da Lei imperial de 20 de outubro de 1823, determinou o mantenimento da<br />

legislação do Reino de Portugal no Direito pátrio. 61<br />

Sendo assim, dividiremos o presente estudo em três momentos, o primeiros<br />

deles – em razão da ordem cronológica – será as Ordenações Afonsinas, já em um<br />

segundo momento analisaremos ainda as Ordenações Manuelinas e por fim Filipinas<br />

respectivamente.<br />

Com intuito de alocar o presente estudo temporalmente 62 , bem como fazendo um<br />

breve apontamento quanto a vigência das Ordenações no Brasil, verifica-se que as<br />

Ordenações Afonsinas teve seu inicio de vigência em 1500 com o descobrimento do<br />

58<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 45.<br />

59<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 56.<br />

60<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 29.<br />

61<br />

Neste sentido: TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts.<br />

1.277 a 1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil<br />

Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 260.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície<br />

compulsória: instrumento de efetivação da função social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000.<br />

p. 30.<br />

62<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p.92<br />

29


Brasil, não obstante ser datada de 1446. Por conseguinte com o seu termino, ou seja,<br />

em 1521, deu-se iniício as Ordenações Manuelinas que perduraram até 1521, onde<br />

ocorrera o inicio de vivencia das Ordenações Filipinas até a entrada em vigor do Código<br />

Civil de 1916, pois a Consolidação das Leis Civis aproveitou parte deste ultimo diploma<br />

legiferante português. 63<br />

1.4.1.1 Ordenações Afonsinas<br />

O direito português antigo, tem como influncia o direito romano, direito germânico<br />

e o direito canônico. Tais fontes, foram sustentáculos para elaboração do da primeira<br />

codificação portuguesa, ou seja, as Ordenações Afonsinas.<br />

Neste sentido pontua Marcus Vinicius dos Santos Andrade 64 :<br />

“O ordenamento português, a partir de então, teve como base cultural o direito romano e<br />

leis esparsa promulgadas pelos reis, além de normas consuetudinárias. Posteriormente,<br />

em 1446 ou 1447, veio a primeira codificação, conhecida por Ordenanças Afonsinas,<br />

congregando não só essa legislação nacional, esparsa, consolidando costumes, mas, de<br />

outro lado o direito romano subsidiariamente aplicado”<br />

Não obstante, conforme se verifica nos dispositivos apresentados pela referida<br />

codificação o direito de superfície não esta presente. 65<br />

A exclusão do direito de superfície segundo Frederico Henrique Viegas de Lima 66<br />

se justifica pois: “nas ordenações Afonsinas, em virtude da grande influencia recebida<br />

do direito romano dos glosadores, desconhecia-se o direito de superfície. Este se<br />

63 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 56.<br />

64 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 45.<br />

65 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 58 - 59.<br />

66 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 60.<br />

30


encontra assimilado pela enfiteuse e pelos arrendamentos, não tendo autonomia<br />

privada.”<br />

1.4.1.2 Ordenações Manuelinas<br />

Em continuidade, o então Rei de Portugal, D. Manuel em 1512, manda editar as<br />

Ordenações Manuelinas, trabalhos este que somente fora concluído em 1521. Pontua<br />

Marcus Vinicius dos Santos Andrade que foram editadas as Ordenações Manuelinas,<br />

com as mesmas influencias de um conjunto de normas locais, contudo com a<br />

participação dos glosadores 67<br />

Em decorrência disto, ou seja, tendo em vista a forte influência das Ordenações<br />

Afonsinas, o direito de superfície mais uma vez não esta previsto, bem como encoberto<br />

por outros direitos como a enfiteuse e os arredamentos. 68<br />

1.4.1.3 Ordenações Filipinas<br />

Por fim, em 1603 fora publicada as Ordenações Filipinas, quando Portugal se<br />

encontrava sob dominação espanhola, bem como toda as normas aplicadas a este<br />

foram encampadas por aquele. 69<br />

Analisando o presente estudo, verificamos que parte da doutrina 70 entende que<br />

desde então já estava previsto o direito de superfície. Nestes termos Diana Coelho<br />

67 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 46.<br />

68 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 60.<br />

69 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 62.<br />

70 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 46.<br />

31


Barbosa 71 que: “Enquanto colônia de Portugal vigeu no Brasil, o direito de superfície, já<br />

que o instituto se encontrava disciplinado nas ordenações filipinas.”<br />

Entretanto para uma parte da doutrina entende que não há previsão do direito de<br />

superfície no referido período, pois não obstante haver algumas evoluções não há<br />

previsão expressa do referido instituto. 72<br />

E assim, perdurou o direito de superfície, até a elaboração do esboço do Código<br />

Civil elaborado por Teixeira de Freitas 73 , que fora promulgado pela Lei n. 1.237 de 24<br />

de setembro de 1864, onde não constou o direito de superfície em seu artigo 6º 74<br />

referente ao rol dos direitos reais. 75<br />

Neste sentido manifesta-se o Ricardo Pereira Lira 76 : ”Diante da omissão do texto<br />

codificado, outra não pode ser a conclusão, entre nós se não a de que não existe no<br />

ordenamento jurídico o direito de superfície”<br />

Corroborando esta idéia nuclear, José Guilherme Braga Teixeira 77 :<br />

“o seu banimento de tal categoria, por exclusão do rol respectivo, é uma das aplicadores<br />

di sistema de que os direitos reais constituem um número taxativo, da competência do<br />

legislador (a propósito, é o que está ocorrendo atualmente com a enfiteuse no novo<br />

Código Civil ora sob comentário). Banida do elenco dos direitos reis da legislação vigente<br />

71 BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 60.<br />

72 MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 92<br />

73 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 47.<br />

74 Art. 6° Somente se consideram ônus reais: A servidão; O uso; A habitação; O anticrese; O usufruto; O<br />

foro.<br />

75 BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 16.<br />

76 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.81.<br />

77 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 260.<br />

32


no Pais reduziu-se a superfície a uma mera modalidade de arrendamento, deixando de<br />

ter maior importância na ocasião.”<br />

O entendimento utilizado por Frederico Henrique Viegas de Lima 78 se justifica<br />

pois: “Para o autor, o direito de superfície se encontra absolvido quase por completo<br />

pela enfiteuse”<br />

De acordo com o exposto, podemos verificar que a Lei n. º 1.237, de 24 de<br />

setembro de 1864, onde não constou o direito de superfície em seu artigo 6º referente<br />

ao rol dos direitos reais, o que a doutrina entendeu que e este foi reduzido, a uma mera<br />

modalidade de direito obrigacional, deixando de ter a mesma importância anterior.<br />

1.4.2 O Direito de Superfície e sua codificação nacional<br />

Superado este primeiro momento, ainda que sem ocorrer à expressa previsão do<br />

direito de superfície, podemos anotar que foram conseguintes, três as oportunidades de<br />

implementação do presente instituto na legislação nacional.<br />

O primeiro deles, foi a elaboração no Código Civil de 1916 que não obstante, a<br />

importância do instituto, este, foi descartado pelo legiferante nacional por não haver<br />

interesse ou utilidade do instituto. 79<br />

Neste sentido, ventila José Guilherme Braga Teixeira 80 :<br />

“Com a retomada dos trabalhos para a elaboração de um Código Civil para o Brasil, os<br />

primeiros projetos que apareceram depois do “Esboço” (o de Nabuco de Araujo, o de<br />

78<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 62.<br />

79<br />

Neste sentido: CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da<br />

função social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000.p. 30.; BENASSE, Paulo Roberto. O Direito<br />

de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 16.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius<br />

dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 49.<br />

80<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 260.<br />

33


Felício dos Santos, o de Coelho Rodrigues e o de Clovis de Beviláqua) também não<br />

inseriram a superfície dentre os direitos reais que elencavam. É certo que uma primeira<br />

tentativa de catalogar a superfície dentre os direitos reais do então futuro ordenamento<br />

pátrio surgiu com o “Projecto Revisto”, não tendo vingado entretanto tal tentativa”.<br />

Acrescenta ainda, o Arnaldo Rizzarto 81 sobre a temática em tela:<br />

“Não vinha, no art. 674 do Código Civil de 1916, incluído no rol dos direitos reais o direito<br />

de superfície. Embora constasse a previsão no projeto do então Código Civil, vingou uma<br />

emenda supressiva, que afastou a espécie na redação final. Lembra-se, no entanto, que<br />

no direito brasileiro primitivo previa-se a figura da superfície isolada do subsolo, até que a<br />

lei nº 1.237, de 24.09.1864 a suprimiu”<br />

Uma segunda tentativa, mais expressiva, com previsão expressa em seu projeto,<br />

entretanto rejeitada pelo legislativo 82 , foi o projeto de Orlando Gomes. Verificando tal<br />

ocorrência, discorre José Guilherme Braga Teixeira 83 : “Uma efetiva segunda tentativa<br />

ocorreu com anteprojeto de Código Civil de Orlando Gomes, em 1963, a qual também<br />

não vingou”<br />

81 RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 861.<br />

82 O ante projeto de Código civil elaborado por Orlando Gomes, apresentado, em 31 de marco de 1963,<br />

ao então Ministro da Justiça e Negócios Interiores, JOÃO MANGABEIRA, incluía no rol dos direito reais<br />

limitados a superfície (art. 513, II), tratando da disciplina da espécie em oito artigos: concessão<br />

temporária do direito de construir ou plantar, mediante escritura pública devidamente inscrita no registro<br />

imobiliário (art.524); transferibilidade do direito por negócio entre viços, a titulo oneroso ou gratuito, bem<br />

como por disposição de ato de ultima vontade (art. 525); objeto do direito podendo ser qualquer<br />

construção, ou plantação, suscetível de ser adquirida por acessão pelo dono do solo (art.526); a<br />

concessão podendo ser gratuita ou onerosa, a remuneração ao concedente pagável de uma só vez ou<br />

periodicamente, excluído o comisso, e ressalvada a pretensão de cobrança das prestações vencidas e<br />

não pagas, acrescidas de juros moratórios (art. 527, §§ 1º e 2º) reversão ao concedente, em principio<br />

sem indenização, salvo estipulação contraria, não podendo o decurso do prazo estabelecido para a<br />

construção passe ao domínio do concedente ser inferior a vinte e cinco anos (art. 528); responsablidade<br />

do superficiário pelos encargos e tributos que recaírem sobre o prédio (art.529); preferência conferida a<br />

ambos, em igualdade de condições, no caso de alienação dos correspondentes direitos, estabelecida a<br />

necessidade de intimação do concedente, sob pena de nulidade, no caso de penhora da construção ou<br />

plantação, para poder fazer valer o seu direito de preferência em hasta publica (art.531); vedação<br />

peremptória da estipulação do pagamento de qualquer quantia pela transferência da acessão (art. 532)<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da<br />

Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.85.<br />

83 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 260 261.<br />

34


Ademais faça-se constar o apregoado por Marcus Vinicius dos Santos<br />

Andrade 84 :<br />

“Após várias alterações tópicas, porem importantes, veio à tona a necessidade de uma<br />

revisão ampla do Código Civil e, mais precisamente, da elaboração de um novo projeto.<br />

A coordenação coube a Caio Mario da Silva pereira, a quem também foi conferida a<br />

elaboração do anteprojeto do Código de Obrigações. Orlando Gomes ficou com a<br />

formulação do anteprojeto do Código Civil de Direito Civil. O texto apresentado ao<br />

Ministro da Justiça, em 31.03.2963 (arts. 513, 524/531 e 685), por primeiro, posicionava o<br />

direito de superfície dentre os direito reais limitados. (...) A proposta de Orlando Gomes<br />

terminou por ser recusada pelos restantes membros da comissão revisora, Caio Mario da<br />

Silva Pereira e Orozinho Nonato. Vale acrescentar que o projeto, embora remetido pelo<br />

Poder Executivo ao Legislativo, através da Mensagem 804, de 12.10.1965, não teve<br />

seqüência e acabou arquivado.”<br />

Por fim -- não a primeira legislação vigente mas–, a terceira e vitoriosa pretensão<br />

fora a da segunda redação do Anteprojeto do Código Civil de 2002, criada por meio de<br />

uma Comissão elaboradora e revisora que fora, publicada no Diário Oficial da União,<br />

em 7 de agosto de 1972, tendo como Supervisor o Ilustre Miguel Reale e como<br />

colaboradores temáticos os ilustres juristas José Carlos Moreira Alves (Parte Geral),<br />

tendo, Agostinho de Arruda Alvim (Direito das Obrigações), Sylvio Marcondes (Atividade<br />

Negocial), Ebert Vianna Chamoun (Direito das Coisas), Clóvis do Couto e Silva (Direito<br />

de Família) e Torquato Castro (Direito das Sucessões).<br />

Observa-se que, no esboço elaborado pelo Ebert Vianna Chamoun, não estava<br />

previsto o direito de superfície, tendo sido este, somente introduzido posteriormente.<br />

Referida disposição já demonstrava a preocupação por parte da doutrina, com o<br />

aspecto social da propriedade, objetivado buscar uma solução para o crescimento<br />

desordenado das cidades. 85<br />

84<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 49 e 50.<br />

85<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 32 e 33.<br />

35


Referido Anteprojeto, modificou-se em projeto de Código Civil, sendo<br />

encaminhado ao Congresso nacional pelo Presidente da República por meio da<br />

mensagem nº 160, de 10 de junho de 1975 86 , e por fim, posteriormente promulgado<br />

após 27 anos de tramitação. 87<br />

1.5 O Direito de Superfície no Código Civil de 2002 e o Estatuto da Cidade (breve<br />

arrazoado)<br />

Em conseqüência, não obstante o grande lapso temporal sem a devida e<br />

pertinente previsão legal, antes mesmo da promulgação do Novo Código Civil, foi<br />

sancionada a Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, conhecida como Estatuto da<br />

Cidade.<br />

Observando os fatos ocorridos, o Arnaldo Rizzarto 88 relata:<br />

“Embora não incluído nos anteprojetos iniciais do novo Código Civil, que visavam mais<br />

uma reforma, o de 1975 obteve êxito ao introduzir a figura, que veio ser mantida nas<br />

tramitações do projeto, até a sua aprovação. O chamando Estatuto da Cidade,<br />

implantado pela Lei. 10.257, de 10.07.2001, regulou a matéria.”<br />

Nesta mesma esteira, esmiuçando as inovações, bem como apontando a<br />

importância do instituto Frederico Henrique Viegas de Lima 89 :<br />

“A lei n. 10. 257, de 10 de julho de 2001, desde logo conhecida como Estatuto da Cidade,<br />

tem como ponto de partida o Projeto Lei de n. 5.788/90, que buscava estabelecer<br />

diretrizes gerais sobre a política urbana. Tanto é assim que a regulamentação do direito<br />

de superfície que continha no antigo projeto 775/83, é muito superior ao que foi<br />

86<br />

Texto na integra da Mensagem nº 160, de 10 de junho de 1975. Disponível em:<br />

, Acesso em: 23/04/2009.<br />

87<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 51.<br />

88<br />

RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 861.<br />

89<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 202 e 203.<br />

36


estabelecido no pelo Estatuto da Cidade. (...) Contudo não se pode negar que o Estatuto<br />

da Cidade introduziu no ordenamento jurídico nacional algumas figuras importantes do<br />

urbanismo moderno.”<br />

Referido diploma legal, regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição<br />

Federal, e estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências.<br />

Importante observar que, em seu Capítulo II, dos instrumentos da política urbana, mais<br />

especificadamente na seção VII, em seus artigos 21 a 24 regulamenta e positiva o<br />

direito de superfície urbana. 90<br />

Neste esboço apresentado, Frederico Henrique Viegas de Rima 91 : “Atualmente,<br />

em virtude da concentração de grande parte da população nos grandes centros, têm<br />

sito elaboradas as leis com o propósito de solucionar os problemas urbanos de<br />

moradia.<br />

Arrematam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 92 no seguinte<br />

sentido:<br />

“No projeto do Código Civil de 1916 houve a inserção da matéria por Clovis Beviláqua,<br />

mas a Comissão Revisora suprimiu o ingresso da temática. Também estava a superfície<br />

alinhada no anteprojeto do Código Civil de Orlando Gomes de 1963. Mas, pioneiramente<br />

o Estatuto do Cidade (Lei 10.257/01) regulamentou os artigos 182 e 183 da Constituição<br />

Federal, introduziu no ordenamento jurídico pátrio o direito de superfície, No Código Civil<br />

de 2002 a disciplina se instala no Livro do Direito das Coisas (arts. 1.369 a 1.377 do CC)<br />

Assentando termo final na presente evolução histórica, após 27 anos, conforme<br />

já pontuado anteriormente, fora sancionado pelo presidente da república no novo<br />

Código Civil pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que regulamenta o direito de<br />

90<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 71.<br />

91<br />

RIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. 192.<br />

92<br />

Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

37


superfície em seus artigos 1.367 a 1.377, bem como elencando este no rol dos direitos<br />

reais no artigo 1.255, II. 93<br />

Para Carlos Roberto Gonçalves 94 :<br />

“O Código Civil de 2002 reintroduziu no direito brasileiro o direito de superfície, previsto<br />

na legislação do Reino de Portugal aqui aplicada no direito pré-codificado, mas não<br />

contemplado no diploma de 1916”<br />

Conforme podemos notar, depois de um longo hiato legislativo, o direito de<br />

superfície retorna ao direito positivado em dos diplomas distintos, existindo assim, um<br />

conflito de normas, ou seja, no caso em tela, temos em vigor, dois diplomas infraconstitucionais<br />

que regulam a mesma disciplina jurídica, sendo eles os artigos 1.367 a<br />

1.377 do Código Civil de 2002 e o Estatuto da Cidade em seus artigos 21 a 24.<br />

Não somente tal ocorrência, de suma importância, será elemento de um apurado<br />

estudo. O presente trabalho busca ainda em sua cadência lógica, verificar a incidência<br />

destes, ao direito pátrio bem como, a concorrência concomitante de outros<br />

importantíssimos elementos como a função social dos institutos privados e os próprios<br />

reflexos constitucionais no presente caso.<br />

93<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 261.<br />

94<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.<br />

38


CAPÍTULO 2 – A <strong>SUPERFÍCIE</strong> NA LEGISLAÇAO ALIENIGENA<br />

2.1 Introdução e justificativa do estudo da legislação alienígena<br />

Superado o estudo da etimologia do direito de superfície, bem como da evolução<br />

histórica deste, se faz necessário verificar ainda, a legislação alienígena.<br />

Corroborando com a importância deste estudo Carlos Roberto Gonçalves 95<br />

discorre:<br />

“No direito moderno o aludido instituto é regulado, entre outros, no direito italiano (CC,<br />

arts. 952 a 956), no direito português (CC, arts. 1.524 a 1.242), no direito alemão (arts.<br />

1.012 a 1.017), no direito austríaco (arts. 1.125, 1.147 a 1.150), no direito suíço (arts. 675<br />

e 779), no direito holandês (arts. 758 a 766) no direito belga (Lei de 10-1-1824). Confere<br />

a ele, em essência, a uma ou várias pessoas o direito de construir ou plantar em terreno<br />

alheio.”<br />

A análise do tema em pauta fundamenta-se na recente introduzido no sistema<br />

jurídico pátrio e sua prática pouco difundida até então. 96 Sendo assim, o objeto de<br />

estudo da legislação alienígena é de suma importância e tem apoio interpretativo nas<br />

questões controvertidas no direito doméstico. 97<br />

Prefacialmente, importante frisar, que independentemente a origem legislativa,<br />

ou seja, em todos os estes países que se seguiram, mesmo que indiretamente, verificase<br />

a intenção do legiferante no atendimento da função social da propriedade.<br />

95<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.<br />

96<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 42.<br />

97<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 43.<br />

39


Neste mesmo sentido Maria Helena Diniz 98 :<br />

“Trata-se de instituto benéfico ao proprietário e à coletividade, por atender ao principio<br />

constitucional da função social da propriedade, sendo também adotado, em razão de<br />

suas vantagens que Taz, pela legislação de vários países como: Bélgica, Portugal;<br />

China; Holanda; Suíça; Alemanha; Itália; Áustria; Espanha; Inglaterra etc..”<br />

Corroborando esta mesma idéia, Diana Coelho Barbosa 99 :<br />

“... sem duvida, ao relevante papel que esse instituto desempenha, nos países em que se<br />

encontra positivado, na implementação de uma nova concepção da propriedade<br />

imobiliária, que surge atrelada a uma função social, preconizado um aproveitamento mais<br />

efetivo e uma distribuição mais equânime das terras.”<br />

Outro aspecto salutar, verifica-se na metodologia que utilizaremos para enfrentar<br />

este tema. Inicialmente, não vamos analisar o direito de superfície como o fez o Ricardo<br />

Pereira Lira 100 e muitos outros respeitáveis doutrinadores.<br />

No presente trabalho, verificaremos tão somente, a legislação positiva no direito<br />

correlato. Referida decisão tem como base elementar que a análise do direito<br />

alienígena é muito mais profunda e complexa, contendo basicamente – mas não<br />

somente – a verificação obrigatória da jurisprudência de todos os tribunais locais, todas<br />

as vertentes doutrinárias, os costumes locais dentre outros aspectos.<br />

98<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 457.<br />

99<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 14.<br />

100<br />

“A visão sistemática dos vários ordenamentos em função do direito de superfície permite sua divisão<br />

em três grandes grupos. No primeiro, se incluem aqueles que disciplinam expressamente o instituto,<br />

como por exemplo, o direito alemão, o direito italiano, o direito espanhol, o direito holandês, o direito<br />

belga, o direito suíço. No segundo, se arrolem aqueles em que o direito de superfície é resultado de<br />

construção doutrinária, qualificando-o como exceção admitida ao princípio da acessão. É o caso, por<br />

exemplo, do direito francês e o direito italiano ao tempo do Código Civil de 1865. No terceiro, se<br />

encontram os que não reconhecem a existência do direito de superfície, por isso que ano está<br />

expressamente consagrado, prevalecendo nesses ordenamentos o critério do numerus clausus para os<br />

direitos reais, em razão de a taxatividade estar claramente determinada, havendo até mesmo o<br />

banimento declarado do instituto” LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma<br />

teoria geral. Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979.<br />

40


Em um segundo momento, não faremos neste capítulo a comparação das<br />

legislações correlatas, sob a luz do direito pátrio positivado. Pois entendemos como<br />

mais pertinente realizar esta tarefa, no discorrer do presente trabalho pontuando<br />

quando pertinente seus elementos no direito pátrio.<br />

Por fim, o último corte metodológico necessário e pertinente para o presente<br />

estudo, refere-se aos direitos socialistas, bem como, aos direitos pertencentes ao<br />

Common Law.<br />

Conforme pertinente apontamento da Rima Gorayb 101 , enquanto aquele tem o<br />

direito como base a estrutura econômica, o que reflete no direito de propriedade, este<br />

mais próximo, também tem suas peculiaridades muito distantes das nossas, sendo<br />

assim, necessário se afastamento para uma assertiva interpretação do presente estudo.<br />

Sendo assim, passamos a apregoar os aspectos que entendemos ser mais<br />

relevantes das seguintes legislações que seguem.<br />

2.2 França<br />

Conforme ventilado anteriormente, no Código Civil Francês, não há disposição<br />

expressa do direito de superfície 102 , não obstante, devido a importância do referido<br />

sistema jurídico alienígena, teceremos alguns considerandos. 103<br />

Referida ocorrência, ou seja, o afastamento do direto de superfície – conforme já<br />

apontado anteriormente –, deu-se pois, quando das revoluções francesa e industrial<br />

101<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 20.<br />

102<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 68<br />

103<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 56.<br />

41


tanto o direito de superfície como a enfiteuse se tornaram odiosas e foram excluídas de<br />

seus ordenamentos. 104<br />

Neste sentido pontua o Silvio de Salvo Venosa 105 : “O instituto não foi introduzido<br />

no Código Civil Frances, pois era visto como forma de manutenção da propriedade<br />

feudal.”<br />

Desta forma, inexiste até hoje, a regulamentação específica quanto do direito de<br />

superfície. Neste sentido conforme Frederico Henrique Viegas de Lima 106 : “... a<br />

legislação francesa silencia a respeito do direito de superfície. Somente acolhe o<br />

principio de que toda obra ou plantação realizada num imóvel alheiro pertence a seu<br />

proprietário enquanto não prove o contrario”<br />

Todavia parte da doutrina francesa e da jurisprudência, entendem que de acordo<br />

com uma interpretação inversa do Artigo 553 107 do Código Civil este seria possível 108 .<br />

Conforme pontua Ricardo Pereira Lira 109 :<br />

104<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 25.<br />

105<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 391.<br />

106<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 93.<br />

107<br />

Créé par Loi 1804-01-27 promulguée le 6 février 1804 Article 553 - Toutes constructions, plantations et<br />

ouvrages sur un terrain ou dans l'intérieur sont présumés faits par le propriétaire à ses frais et lui<br />

appartenir, si le contraire n'est prouvé ; sans préjudice de la propriété qu'un tiers pourrait avoir acquise ou<br />

pourrait acquérir par prescription soit d'un souterrain sous le bâtiment d'autrui, soit de toute autre partie du<br />

bâtiment. Tradução: Toda construção, plantações e obras em terra ou no interior se presume feita pelo<br />

proprietário a expensas suas e que pertencem, se for provado o contrário, sem prejuízo para a<br />

propriedade que um terceiro pode ter adquirido ou pode adquirir prescrição ou por uma passagem inferior<br />

sob o edifício do outro, ou em qualquer outra parte do edifício. Código Civil Frances. Legifrance, Le<br />

service public dele diffusion du droit, Disponível em: , Acesso em: 03/06/2009.<br />

108<br />

Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.32.; BARBOSA,<br />

Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 50.;<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 51 e 52.<br />

109<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.33.<br />

42


“Entende a doutrina francesa que se o proprietário pode dispor da coisa por partes, tem a<br />

faculdade de alienar “le dessus”, conservando “Le tréfonds et la surface”. Diz-se que ele<br />

“aliene le drit de superficie”. Conseqüentemente, em direito francês, o superficiário é<br />

proprietário das construções e plantações”<br />

Outro caso de aplicação do direito de superfície, no direito francês é o da Lei de<br />

12.05.1825 que dispõe a possibilidade da concessão de plantação de árvores particular<br />

ao longo das estradas públicas ou plantadas em propriedades públicas. 110<br />

Da mesma forma que ocorrera com o império romano, houveram alterações na<br />

sociedade francesa. Em decorrência disto, se fez necessária a criação de instrumentos<br />

que se adequassem a esta nova realidade. Assim foi criado pelo ordenamento jurídico<br />

francês dois tipos de arrendamentos regulamento pelas leis 16.12.1964 (bail avec<br />

permission de bâtir) 111 e lei 16.10.1947 (La bail à domaine congéable). 112<br />

Nesta esteira entende Frederico Henrique Viegas de Lima 113 :<br />

“Na atualidade, os problemas contemporâneos da construção e da urbanização,<br />

especialmente a partir dos prejuízos causados pelas guerras, o crescimento das cidades<br />

e o aumento demográfico da população, foram fatores determinantes paea mudança no<br />

enfoque do tema. Tentaram chegar a uma possibilidade pela qual se pudessem obter<br />

terrenos de forma barata a fim de fomentar a construção de moradias e realizar a<br />

urbanização. Isto originou a Lei de 16 de dezembro de 1964.”<br />

Assim, como não poderia deixar de ser, outra corrente doutrinária, tem como<br />

entendimento que a vigência ou a aplicabilidade da superfície – sem prejuízo a corrente<br />

anterior -- tem seu fundamento nestes dispositivos. 114<br />

110 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 35.<br />

111 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 43<br />

112 GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 55.<br />

113 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 93.<br />

114 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.35.<br />

43


2.3 Alemanha<br />

O Código Civil Alemão – importantíssimo codex jurídico –, promulgado em 18 de<br />

agosto de 1896, foi uma das primeiras codificações a regular o direito de superfície. 115<br />

Neste sentido, conforme pontua Rima Gorayb 116 : “O código Civil do Império<br />

Germânico, que entrou em vigor partir de 1 de janeiro de 1900, foi o primeiro dos<br />

Códigos modernos a regulamentar o direito de Superfície de forma apropriada e<br />

autônoma.”<br />

O direito de superfície tornou-se um dos instrumentos mais utilizados no<br />

movimento de reforma alemã, neste período adotou-se a política de não mais vender<br />

terrenos destinados a construção de moradias 117 , assim o Estado reservava para si o<br />

direito de propriedade, concedendo uma determinada área por um tempo limitado de<br />

50, 80 ou 100 anos, mediante uma renda atual e com a obrigação de construir as<br />

residências. 118<br />

Neste sentido, ventila Marise Pessoa Cavalcanti 119 :<br />

“O direito alemão foi um dos primeiros a regulamentar, expressamente, o instituto da<br />

superfície, no B.G.B (Código Civil Alemão), de 1896, utilizando-a como um instrumento<br />

para a reforma imobiliária, na época. Os terrenos públicos, em vez de serem alienados,<br />

tornavam-se objeto de superfície viabilizando a locação social, via associações de<br />

utilidade pública, ou construção da casa própria para as classes trabalhadoras e médias.<br />

115<br />

Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 30.; LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria<br />

geral. Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 35.; MAZZEI,<br />

Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007. paginas 404.<br />

Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São Paulo, 2007. p.46<br />

116<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 78.<br />

117<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 28 e 29.<br />

118<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.36.<br />

119<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 22.<br />

44


Nota-se as vantagens de: coibir a especulação imobiliária, tornar o Poder Público<br />

beneficiário da mais-valia, além de poder influenciar na maneira de construir ”<br />

A redação do B.G.B. conforme se verificou não atendia as necessidades do atual<br />

momento alemão basicamente pelos seguintes motivos: 1) Falta de regulamentação<br />

mais aprofundada quando as obrigações das partes; 2) Não se fixava o destino das<br />

benfeitorias acrescidas no terreno; e 3) Divergência da análise das disposições do<br />

B.G.B. nos estados da federação alemã. 120<br />

Para Frederico Henrique Viegas de Lima 121 : “As normas atuais de direito de<br />

superfície não são as mesmas do primitivo BGB. Baseiam-se em reformas posteriores,<br />

alterando o código para adequá-lo às finalidades perseguidas por este direito.”<br />

Em decorrência disto, bem como durante a primeira guerra mundial com o<br />

objetivo de fornecer meios de aquisição da casa própria aos ex-combatentes, foi<br />

elaborada a primeira grande reforma no Codex alemão 122 confirmada pela Lei 4 março<br />

de 1919. 123<br />

120<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 58.<br />

121<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p 74.<br />

122<br />

Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.36 e 37.; GORAYB,<br />

Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 79.<br />

123<br />

ZANIN, Jorge Luiz. Superfície: um novo/velho direito real. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo<br />

Fundo, 2007. BGB – Código Civil Alemão §§ 1012 - /* Ein Grundstück kann in der Weise belastet werden,<br />

daß demjenigen, zu dessen Gunsten die Belastung erfolgt, das veräu ßerliche und vererbliche Rwcht, auf<br />

oder Oberfläche dês Grundstücks ein Bauwerk zu haben (Erbbaurecht) §§ 1012 - /* Uma propriedade<br />

pode ser gravada de forma que a aquele em cujo benefício se estabelece o gravame corresponda o<br />

direito inalienável e hereditário de ter uma construção sobre ou abaixo de superfície daquela propriedade.<br />

§§ 1013 - /* Das Erbbaurecht kann auf Benutzung eines für das Bauwerk nicht erforderlichen Teils dês<br />

Grundstücks erstreckt werden, wenn sie für die Benutzung dês Bauwerks Vorteil bietet. §§ 1013 - /* O<br />

direito de superfície pode estender-se ao aproveitamento de uma parte da propriedade não necessária<br />

para a construção, se dita parte oferecer vantagem para o aproveitamento da construção. §§ 1014 - /* Die<br />

Beschränkung des Erbbaurechts auf einen Teil eines Gebäudes, insbedondere ein Stockwerk, ist<br />

unzuläassig. §§ 1014 - /* A limitação do direito de superfície a uma parte de um edifício, em especial a um<br />

piso, é inadmissível. §§ 1015 - /* Die zur Bestellung des Erbbaurechts nach § 873 erforderliche Einigung<br />

des Eigentümers und des Erwerbers mu ß bei gleichzeitiger Anwesenheit beider Teile vor dem<br />

Grundbuchamt erklärt werden. §§ 1015 - /* O acordo entre proprietário e o adquirente necessário<br />

segundo o parágrafo 873 para a constituição do direito de superfície deve ser declarado perante o Oficial<br />

do Registro com a assistência simultânea de ambas as partes. §§ 1016 - /* Das Erbbaurechr erlischt nicht<br />

dadurch, das Bauwerk untergeht. §§ 1016 - /* O direito de superfície não se extingue pela circunstância<br />

45


Antes de adentrarmos à análise do instituto propriamente dito, de suma<br />

importância, é se salutar que a constituição – como teoria geral do direito –, em especial<br />

o de superfície, alemão é similar ao sistema jurídico pátrio, ou seja, para que ocorra a<br />

constituição do direito de superfície há duas fazes, sendo a primeira a estipulação do<br />

direito real em instrumento solene nos termos da legislação, bem como se faz<br />

necessário ainda um posterior ato de registro deste título, junto ao Cartório de Registro<br />

de Imóveis competente.<br />

Nesta esteira Luiz Guilherme Loureiro 124 `:<br />

“Os direitos reais sobre bens imóveis – aí incluído o direito de superfície – são<br />

constituídos, transmitidos ou onerados, nos atos ``entre vivos``, pelo inscrição do título no<br />

Registro de Imóveis. Há, portanto, duas fases na constituição ou aquisição do direito de<br />

superfície: a estipulação do direito real no contrato e o registro deste título, que serve de<br />

suporte ao direito real respectivo, no Ofício de Registro de Imóveis. (...) O direito<br />

brasileiro segue, assim, tal como ocorre com o direito alemão, o princípio da inscrição.<br />

Segundo esse princípio, a constituição, transmissão e extinção dos direitos reais sobre<br />

imóveis, por ato inter vivos, só se operam com a inscrição no Registro de Imóveis.”<br />

Superada esta verificação, veramos os principais pontos referentes ao direito de<br />

superfície em vigor no direito alemão.<br />

Conforme conceitua Ricardo Pereira Lira 125 :<br />

“O direito de superfície é o direito de ter uma edificação sobre o solo alheio. O direito há<br />

de referir-se à totalidade da edificação, não sendo possível restringi-lo a uma parte dela,<br />

nem mesmo a um pavimento do edifício. Ter a edificação, no caso, abrange em si a<br />

que destrói a construção. §§ 1017 - /* (1) Für das Erbbaurecht gelten die sich auf Grandstücke<br />

beziehenden Vorschiften. (2) Die für den Erwerb des Eigentums und die Ansprüche aus dem Eigentum<br />

geltenden Vorschriften fiden auf das Erbbaurecht entsprechende Anwendung. §§ 1017 - /* Para o direito<br />

de superfície valem as disposições referentes as propriedades. Se aplicam ao direito de superfície as<br />

disposições existentes para a aquisição da propriedade e para as pretensões derivadas da mesma.<br />

124 Loureiro, Luiz Guilherme. Direitos Reais, p.277.<br />

125 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.38.<br />

46


construção, a posse do edificado e do solo em que esta será erigida, seu gozo e a<br />

faculdade de reconstruir, em perecendo a edificação”<br />

Em decorrência deste conceito podemos extrair algumas conclusões<br />

importantes, tais como que inicialmente o direito de superfície tem como base<br />

elementar o objeto da edificação em solo alheio não sendo possível haver turbações<br />

quando de sua constituição, bem como ser possível sua instituição em terra “nua” ou já<br />

edificada quando do perecimento desta.<br />

Pode ainda, o direito de superfície Alemão, ser gravado de outros direitos<br />

imobiliários, e inclusive constituí-lo mediante negocio jurídico, ou por expropriação<br />

forçada e, finalmente ter sua extinção por abandono, renúncia, prescrição, expropriação<br />

e termo final. 126<br />

Por fim, outro ponto relevante para o presente estudo é o do artigo 900 do B.G.B.<br />

que regulamenta o direito e a possibilidade da usucapião quando o direito de superfície<br />

tenha estado indevidamente inscrito por 30 anos e o titular do direito tenha possuído o<br />

imóvel por esse tempo. 127<br />

2.4 Itália<br />

No primeiro Código Civil Italiano de 1865, não havia nenhuma menção direita<br />

quando ao direito de superfície 128 , seguindo praticamente o mesmo disposto no Código<br />

Civil Napoleônico no que se refere o artigo 553 dispõe: “Toda a construção, plantação<br />

ou obra existente acima ou abaixo do dolo presume feita pelo proprietário, ou às duas<br />

126<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 80 e 81.<br />

127<br />

Neste sentido: Loureiro, Luiz Guilherme. Direitos Reais, p.279.<br />

128<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 35<br />

47


expensas, e a ele pertencem, desde que nada conste ao contrario, e sem prejuízos dos<br />

direitos legitimamente adquiridos por terceiros.” 129<br />

Em decorrência disto -- assim como em outros países europeus –, a doutrina<br />

italiana no decorrer dos anos, trabalhou em conjunto com a jurisprudência 130 e teve<br />

como resultado a nova redação do Código Civil Italiano de 1942 que em seus artigos<br />

952 a 956 131 trata do direito de superfície. 132<br />

Importante observar que no direito italiano, os casos mais freqüentes do direito<br />

de superfície, são aqueles instituídos sobre área pública, como por exemplo, os<br />

edifícios balneários existentes ao longo da costa italiana. 133<br />

Conforme análise dos referidos dispositivos, Frederico Henrique Viegas de<br />

Lima 134 resume sucintamente:<br />

129<br />

Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 33.; LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria<br />

geral. Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.40.; LIMA,<br />

Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana. Rio de<br />

Janeiro: Renovar, 2005. p. 141.<br />

130<br />

Neste sentido: GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 88 e 89.;<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002.<br />

p. 35 e 36.<br />

131<br />

Art. 952 Costituzione del diritto di superficie Il proprietario può costituire il diritto di fare e mantenere al<br />

di sopra del suolo una costruzione a favore di altri che ne acquista la proprietà (934, 1350, 2643). Del pari<br />

può alienare la proprietà della costruzione già esistente, separatamente dalla proprietà del suolo. Art. 953<br />

Costituzione a tempo determinato Se la costituzione del diritto e stata fatta per un tempo determinato, allo<br />

scadere del termine il diritto di superficie si estingue e il proprietario del suolo diventa proprietario della<br />

costruzione (2816). Art. 954 Estinzione del diritto di superfície L'estinzione del diritto di superficie per<br />

scadenza del termine importa l'estinzione dei diritti reali imposti dal superficiario. I diritti gravanti sul suolo<br />

si estendono alla costruzione, salvo, per le ipoteche, il disposto del primo comma dell'art. 2816. I contratti<br />

di locazione (1596), che hanno per oggetto la costruzione, non durano se non per l'anno in corso alla<br />

scadenza del termine (999). Il perimento della costruzione non importa, salvo patto contrario, l'estinzione<br />

del diritto di superficie. Il diritto di fare la costruzione sul suolo altrui si estingue per prescrizione per effetto<br />

del non uso protratto per venti anni (2934 e seguenti, 2816). Art. 955 Costruzioni al disotto del suolo Le<br />

disposizioni precedenti si applicano anche nel caso in cui e concesso il diritto di fare e mantenere<br />

costruzioni al disotto del suolo altrui (840). Art. 956 Divieto di proprietà separata delle piantagioni Non può<br />

essere costituita o trasferita la proprietà delle piantagioni (821) separatamente dalla proprietà del suolo.<br />

Código Civil Italiano. The Cardozo Electronic Law Bulletin, Il Codice Civile Italiano, Disponível em: <<br />

http://www.jus. unitn.it/cardozo/Obiter_Dictum/codciv/Lib3.htm>, Acesso em: 04/06/2009.<br />

132<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 56.<br />

133<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 37.<br />

48


“Disposto nos artigos 952 a 956 do Códice Civile, o direito de superfície fundamenta-se<br />

na derrogação do principio de acessão. Ocorre, em primeiro lugar, através de uma<br />

concessão ad aedificandum sobre ou debaixo do solo de outra pessoa. Esta concessão<br />

efetiva-se por contrato, no qual o proprietário do solo permite que um terceiro execute<br />

uma construção em seu terreno, com contendo a tácita ou expressa de que a edificação<br />

passe a pertencer a este terceiro”<br />

O artigo 952 do Código Civil italiano trata na sua da Constituição o direito<br />

superfície. Sendo assim, da analise do referido dispositivo, verificamos que<br />

preliminarmente, o proprietário pode ter o direito de fazer e manter a construção acima<br />

do solo em favor de outras pessoas que compram o imóvel, bem como na segunda<br />

parte do mesmo dispositivo, nos defrontamos com a possibilidade da cisão da<br />

propriedade 135 , pois também pode o proprietário alienar o edifício existente, separada<br />

da propriedade da terra. 136<br />

Nesta mesma esteira pondera Paulo Roberto Benasse 137 :<br />

“O Proprietário pode constituir o direito de fazer e manter sobre seu solo uma construção,<br />

em favor de outro, que lhe adquire a propriedade. Pode, também, alienar a propriedade<br />

de construção já existente, separadamente da propriedade do solo.”<br />

Neste sentido, em especial quanto a possibilidade da cisão da propriedade<br />

aponta Rima Gorayb 138 :<br />

“Todo o sistema se apóia na expressa derrogação do principio da acessão. O código<br />

caracteriza, concebe e baseia o direito de superfície como uma forma especial de<br />

propriedade – a propriedade superficiária. Porem, não a define ou regulamenta, dá<br />

134<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 145 - 146.<br />

135<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 60 e 61.<br />

136<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.42.<br />

137<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 36.<br />

138<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 94.<br />

49


apenas as normas básicas para sua constituição, determina seu objeto (construção),<br />

proibindo que recaia sobre plantações”<br />

O segundo dispositivo regulamentador, ou seja, o artigo 953 do referido codex,<br />

refere-se ao prazo estabelecimento da concessão. 139 Conforme verifica-se este período<br />

é estipulado pela lei como um período determinado, bem como, após o termo do<br />

período, a superfície termina e o proprietário do terreno torna-se o proprietário do<br />

edifício. 140<br />

Quanto da análise da extinção da concessão superficiária, um dos dispositivos<br />

relevantes esta é o previsto no artigo 954, inciso III, que possibilita a ocorrência da<br />

decadência do não uso, pelo prazo de vinte anos. 141<br />

Outro dispositivo relevante é o do artigo 955 que regula a obrigação de se<br />

manter a construção no subsolo de outrem da mesma maneira que se aplica ao solo. 142<br />

E ainda o artigo 956, que prevê a proibição da concessão do direito de superfície sobre<br />

plantações, quer existentes ou não. 143<br />

2.5 Suíça<br />

Outro importante sistema jurídico que regula o direito de superfície é o suíço.<br />

Importante observar que o Código Civil suíço de 10.12.1907, disciplinou a matéria nos<br />

144 145<br />

seus artigos 675 e 779.<br />

139 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 61.<br />

140 BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 37.<br />

141 BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 36.<br />

142 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.40.<br />

143 Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 36.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de<br />

efetivação da função social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 24.<br />

144 Art. 675 1 Les constructions et autres ouvrages établis au-dessus ou au-dessous d’un fonds, ou unis<br />

avec lui de quelque autre manière durable, peuvent avoir un propriétaire distinct, à la condition d’être<br />

50


Conforme Ricardo Pereira Lira anota 146 :<br />

“Na concisa regulamentação originária fixou a natureza complexa caracterizada do direito<br />

de superfície moderno, sob o aspecto estrutural, consignado o direito de ter e fazer<br />

construções sobre o solo alheio, ou abaixo dele, contemplando a propriedade<br />

superficiária resultante do exercício desse direito. No tocante à natureza jurídica,<br />

configura o direito de superfície como servidão”<br />

Foi acrescentado a lei federal de 19 de março de 1965, ao artigo 799, mais 11<br />

(onze) alíneas 147 que esmiúçam e regulamentam o referido dispositivo de forma mais<br />

detalhada. 148<br />

inscrits comme servitudes au registre foncier. 2 Les divers étages d’une maison ne peuvent être l’objet<br />

d’un droit de superficie. Art. 779 1 Le propriétaire peut établir en faveur d’un tiers une servitude lui<br />

conférant le droit d’avoir ou de faire des constructions soit sur le fonds grevé, soit au-dessous.2 Sauf<br />

convention contraire, ce droit est cessible et passe aux héritiers. 3 Si cette servitude a le caractère d’un<br />

droit distinct et permanent, elle peut être immatriculée comme immeuble au registre foncier<br />

145 Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 46.; BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro.<br />

Campinas: Bookseller, 2002. p. 69.; LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como<br />

instrumento de planificação urbana. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 152.; TEIXEIRA, José Guilherme<br />

Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 27.<br />

146 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.38.<br />

147 Art. 779a382 Le contrat constitutif d’un droit de superficie distinct et permanent n’est valable que s’il a<br />

été fait par acte authentique. Art. 779b383 Les dispositions contractuelles sur les effets et l’étendue du<br />

droit de superficie, notamment sur la situation, la structure, le volume et la destination des constructions,<br />

ainsi que sur l’utilisation des surfaces non bâties mises à contribution par l’exercice du droit, sont<br />

obligatoires pour tout acquéreur du droit de superficie et de l’immeuble grevé. Art. 779c384 A l’expiration<br />

du droit de superficie, les constructions font retour au propriétaire du fonds et deviennent partie intégrante<br />

de ce fonds. Art. 779d385 1 Pour les constructions lui faisant retour, le propriétaire du fonds verse au<br />

superficiaire une indemnité équitable qui constitue cependant, pour les créanciers en faveur desquels le<br />

droit de superficie était grevé de gage, une garantie pour le solde de leurs créances et qui ne peut pas<br />

être versée au superficiaire sans leur consentement. 2 Si l’indemnité n’est ni versée ni garantie, le<br />

superficiaire ou um créancier en faveur duquel le droit de superficie était grevé de gage peut exiger qu’au<br />

lieu du droit de superficie radié une hypothèque de même rang soit inscrite en garantie de l’indemnité due.<br />

3 L’inscription doit se faire au plus tard trois mois après l’expiration du droit de superficie. Art. 779e386 Le<br />

montant de l’indemnité, la procédure à suivre pour le fixer, la suppression de l’indemnité et le<br />

rétablissement de l’état primitif du bienfonds peuvent être l’objet d’autres dispositions passées en la forme<br />

prescrite pour la constitution du droit de superficie et pouvant être annotées au registre foncier. Art.<br />

779f387 Si le superficiaire excède gravement son droit réel ou viole gravement des obligations<br />

contractuelles, le propriétaire peut provoquer le retour anticipé en demandant le transfert à son nom du<br />

Art. 779g388 1 Le droit de retour ne peut être exercé que moyennant une indemnité équitable pour les<br />

constructions qui font retour au propriétaire, la faute du superficiaire pouvant justifier la réduction de<br />

l’indemnité.2 Le droit de superficie n’est transféré au propriétaire que si l’indemnité a été versée ou<br />

garantie. Art. 779h389 Les dispositions concernant l’exercice du droit de retour s’appliquent à tout moyen<br />

que le propriétaire s’est réservé de mettre fin prématurément au droit de superficie ou d’en demander la<br />

51


Referidos dispositivos foram introduzidos no Código Civil Suíço, uma vez que a<br />

legislação originária não correspondia com as necessidades fáticas e com o posterior<br />

agravamento da primeira guerra mundial – em especial com a crise habitacional –,<br />

quanto mais se utilizava o referido instituto mais se concretizava a necessidade de um<br />

novo regulamento. 149<br />

Referente a importância e a necessidade da revisão do direito de superfície<br />

Suíço, Frederico Henrique Viegas de Lima afirma que este direito teve importância<br />

secundária, sendo aplicada em casos pontuais. Porém com a aplicação deste instituto<br />

com o passar dos anos, este se transformou em um instrumento eficaz e importante<br />

para a sociedade. 150<br />

Ao analisar os referidos dispositivos, verificamos algumas disposições relevante<br />

que merecem destaques. Dentre estes, verificamos inicialmente que inicialmente o<br />

código civil suíço, verifica a possibilidade de sobre-elevação do instituto.<br />

Inicialmente, em relação a renda, -- ou seja, se esta fazia parte ou não do direito<br />

de superfície --, a reforma nada o alterou, sendo mantida a sua natureza puramente<br />

rétrocession en cas dviolation de ses obligations par le superficiaire. Art. 779i390 1 Le propriétaire peut<br />

demander à tout superficiaire actuel de garantir la rente du droit de superficie au moyen d’une hypothèque<br />

grevant pour trois annuités au maximum le droit de superficie immatriculé au registre foncier. 2 Si la rente<br />

ne consiste pas en annuités égales, l’inscription de l’hypothèque légale peut être requise pour le montant<br />

qui, la rente étant uniformément répartie, représente trois annuités. Art. 779k391 1 L’hypothèque peut être<br />

inscrite en tout temps pendant la durée du droit de superficie et, en cas de réalisation forcée, elle n’est<br />

pas radiée. 2 Les dispositions relatives à la constitution de l’hypothèque des artisans et entrepreneurs<br />

s’appliquent par analogie. Art. 779l392 1 Le droit de superficie ne peut pas être constitué pour plus de<br />

cent ans comme droit distinct. Código Civil Suíço. Les autorités fédérales de la Confédération suisse :<br />

Code civil Suisse du 10 décembre 1907 (Etat le 5 décembre 2008) Disponível em:<br />

, Acesso em: 04/06/2009.<br />

148<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 68.<br />

149<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 46.<br />

150<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 157.<br />

52


obrigacional, mas permitiu a possibilidade de inscrição de hipoteca legal nos termos do<br />

art. 837 do Código Civil Suíço. 151<br />

O conceito do direito de superfície encontrado no artigo 799, dispõe no sentido<br />

de sua faculdade, ou seja, não pode ser imposto; se tratando de uma servidão com<br />

características especiais; e pode recair sobre bens construídos ou não, anulando o<br />

princípio da acessão. 152<br />

Neste mesmo sentido pontua Marise Pessoa Cavalcanti 153 que: “Convém<br />

ressaltar que, neste diploma legal, se atribui ao direito de superfície natureza jurídica de<br />

servidão”<br />

Já a segunda parte artigo 779 do referido diploma, determina a transmissibilidade<br />

do direito de superfície, se verificada, salvo disposição em contrário, ser este direito<br />

transferível, bem como passível de sucessão.<br />

Outro ponto de relevante interesse previsto no artigo 675, alínea 2, é o da<br />

permissão da constituição do direito de superfície em distintos pisos de um prédio e<br />

assim observam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald pontuam: 154<br />

“Ao contrario do Código Civil Suíço, a legislação brasileira não cuidou do direito de<br />

sobreelevação. Seria uma espécie de direito de superfície em segundo grau, na qual o<br />

superficiário estaria autorizado a contratualmente transmitir a um terceiro o direito de<br />

construir sobre a sua propriedade. Não se confunde com o condomínio edilício.”<br />

Outro dispositivo interessante, é o do artigo 779, alínea I, que disciplina<br />

diferentemente o prazo máximo da concessão superficiária. Reza o referido dispositivo<br />

que o direito área não pode ser estabelecido por mais de 100 (cem) anos de forma<br />

distinta.<br />

151 GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 47.<br />

152 GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 48.<br />

153 CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 23.<br />

154 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 404 e 405.<br />

53


Em fim, a alínea k, do Artigo 779, possibilita a viabilidade de gravar o direito de<br />

superfície por hipoteca durante o prazo da concessão.<br />

2.6 Espanha<br />

Conforme parte da doutrina aponta, direito de superfície espanhol não tem<br />

substantividade normativa prevista no seu Código Civil. 155<br />

Neste diapasão Frederico Henrique Viegas de Lima 156 se posiciona no seguinte<br />

sentido:<br />

“A influencia do direito alemão e do direito suíço é latente no Código Civil espanhol,<br />

quando em seu artigo 353 estabelece um principio de acessão rígido dizendo: “A<br />

propriedade dos bens de direito por acessão a tudo o que eles produzem, ou se lhe une<br />

ou incorpora, natural ou artificialmente.” De qualquer maneira, ao tratar do direito de<br />

acessão a respeito de imóveis, o artigo 539 estabelece que “todas as obras, semeaduras<br />

e plantações se presumem feitas pelo proprietário e a sua custa, enquanto não se prove<br />

o contrario.””<br />

Tal fato ocorreu conforme aponta Rima Goryb 157 : “sendo tradicionalista, e<br />

conservadora, a Espanha preservou valores e instituições da Idade Média, tal como o<br />

regime de senhorios, que era uma maneira de povoar as terras sem aliená-las, pois o<br />

ocupante ao se retirar só tinha o direito de levar os bens móveis.”<br />

155<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 47.<br />

156<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 25.<br />

157<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 63.<br />

54


Esta assertiva tem como fundamento ainda única disposição prevista<br />

expressamente no Código Civil espanhol encontrado no artigo 1611 158 que dispõe sobre<br />

o resgate dos censos constituídos antes da promulgação do Código Civil. 159<br />

Relata ainda Ricardo Pereira Lira, ao analisar o artigo 1655 160 do referido codex,<br />

que este refere-se implicitamente ao direito de superfície. 161<br />

Desta análise dos referidos dispositivos, podemos concluir que o Código Civil<br />

espanhol não recepcionou o direito de superfície, e ainda mais, em especial, do estudo<br />

do artigo 1611, podemos verificar que o direito de superfície já fora objeto de<br />

positivação no sistema 162 e deixou de fazer parte deste em um determinado<br />

momento. 163<br />

Não obstante estes apontamentos, em decorrência dos mesmos fenômenos<br />

sociais já relatados anteriormente 164 , foi necessária a promulgação da primeira lei<br />

positivada no sistema jurídico Espanhol denominada de Lei do Solo datada de 16 de<br />

maio de 1956 165 criou uma nova modalidade urbana do direito de superfície, previsto<br />

158. 166<br />

158<br />

Artículo 1611 - Lo dispuesto en este artículo no será aplicable a los foros, subforos, derechos de<br />

superficie y cualesquiera otros gravámenes semejantes, en los cuales el principio de la redención de los<br />

dominios será regulado por una ley especial. Código Civil Espanhol. Disponível em: < http://civil<br />

.udg.es/normacivil/estatal/CC/4T7.htm>, Acesso em: 04/06/2009.<br />

159<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 37.<br />

160<br />

Artículo 1655 - Los foros y cualesquiera otros gravámenes de naturaleza análoga que se establezcan<br />

desde la promulgación de este Código. Código Civil Español. Disponível em: < http://civil.udg.es/<br />

normacivil/estatal/CC/4T7.htm>, Acesso em: 04/06/2009.<br />

161<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 47.<br />

162<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 58.<br />

163<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 65.<br />

164<br />

Neste contexto, a legislação originária não correspondia as necessidades fáticas, bem como com o<br />

posterior agravamento da primeira guerra mundial, em especial com a crise habitacional vivida neste<br />

período.<br />

165<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 48.<br />

166<br />

ZANIN, Jorge Luiz. Superfície: um novo/velho direito real. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo<br />

Fundo, 2007. Lei do Solo de Galícia – Espanha Artigo 158 – Dereito de superfície. Artigo 158 – Direito de<br />

superfície 1. As entidades locais e as demais personas públicas poderán constituílo dereito de superfície<br />

55


Neste sentido corrobora Paulo Roberto Benasse 167 :<br />

“Na Espanha ficou excluído expressamente de seu Código Civil de 1889, que foi<br />

modificado pela lei de 16.05.1956, que reintroduziu o direito de superfície no seu<br />

ordenamento positivo, com fins de construir, pelo prazo máximo de 50 anos, com<br />

prescrição liberatória de 5 anos, para o caso de não uso da finalidade a que se destina,<br />

ou seja, não ser iniciada a edificação nesse prazo.”<br />

Conforme referida legislação, o superficiário tem a título gratuito ou oneroso, o<br />

direito de construir, plantar, conservar e usar terreno de outrem, podendo ainda<br />

transmitir este direito. 168<br />

Por fim e não menos importante, em 28/05/2007 foi editada a “Lei do Solo”” n.8,<br />

que regulamenta o direito de superfície em seus artigos 35 e 36 169 , com objetivo de<br />

em térreos da súa propiedade ou integrantes do patrimonio municipaldo solo, com destino á construcción<br />

de vivendas suxeitas a algún réxime de protección pública ou outros usos de interesse social; este dereito<br />

corresponderalle ó superficiário.1. As entidades locais e as demais pessoas públicas poderão constituir<br />

direito de superfície em terrenos de sua propriedade ou do solo integrante do patrimônio municipal, com<br />

destinação à construção de casas sujeitas algum regime de proteção pública ou outros usos de interesse<br />

social; este direito corresponde ao superficiário.2. O mesmo dereito asiste os particulares, sem a<br />

limitación de destino presvista no apartado anterior.2. O mesmo direito assiste aos particulares, sem a<br />

limitação de destinação prevista no artigo anterior.<br />

167 BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 69.<br />

168 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 66.<br />

169 Artículo 35. Contenido, constitución y régimen.1. El derecho real de superficie atribuye AL superficiario<br />

la facultad de realizar construcciones o edificaciones en la rasante y en el vuelo y el subsuelo de una<br />

finca ajena, manteniendo la propiedad temporal de las construcciones o edificaciones realizadas.<br />

También puede constituirse dicho derecho sobre construcciones o edificaciones ya realizadas o sobre<br />

viviendas, locales o elementos privativos de construcciones o edificaciones, atribuyendo al superficiario la<br />

propiedad temporal de las mismas, sin perjuicio de la propiedad separada del titular del suelo. 2. Para que<br />

el derecho de superficie quede válidamente constituido se requiere su formalización en escritura pública y<br />

la inscripción de ésta en el Registro de la Propiedad. En la escritura deberá fijarse necesariamente el<br />

plazo de duración del derecho de superficie, que no podrá exceder de noventa y nueve años.El derecho<br />

de superficie sólo puede ser constituido por el propietario del suelo, sea público o privado. 3. El derecho<br />

de superficie puede constituirse a título oneroso o gratuito. En el primer caso, la contraprestación del<br />

superficiario podrá consistir en el pago de una suma alzada o de un canon periódico, o en la adjudicación<br />

de viviendas o locales o derechos de arrendamiento de unos u otros a favor del propietario del suelo, o en<br />

varias de estas modalidades a la vez, sin perjuicio de la reversión total de lo edificado al finalizar el plazo<br />

pactado al constituir el derecho de superficie. 4. El derecho de superficie se rige por las disposiciones de<br />

este Capítulo, por la legislación civil en lo no previsto por él y por el título constitutivo del derecho. Artículo<br />

36. Transmisión, gravamen y extinción.1. El derecho de superficie es susceptible de transmisión y<br />

gravamen con las limitaciones fijadas al constituirlo. 2. Cuando las características de la construcción o<br />

56


abarcar a racionalização dos imóveis urbanos. 170 Referidos dispositivos, tratam<br />

basicamente da constituição do direito de superfície, transmissão e da extinção do do<br />

ferido direito.<br />

2.7 Portugal<br />

Historicamente o direito de superfície não estava previsto inicialmente no Código<br />

Civil de 1867, pois a referida codificação tinha grande influencia da acessão romana.<br />

Não obstante a referida disposição, insta salientar que a lei de 9 de julho de 1773, já<br />

previa em seus artigos 11, 17 e 26 o direito de superfície. 171<br />

Em continuidade, bem como atinente a presente temática, o direito português,<br />

regulamentou de forma minuciosa o direito de superfície, previsto nos artigos 1524 a<br />

1542 do Código Civil de 1967. 172<br />

edificación lo permitan, el superficiario podrá constituir la propiedad superficiaria en régimen de propiedad<br />

horizontal con separación del terreno correspondiente al propietario, y podrá transmitir y gravar como<br />

fincas independientes las viviendas, los locales y los elementos privativos de la propiedad horizontal,<br />

durante el plazo del derecho de superficie, sin necesidad del consentimiento del propietario del suelo. 3.<br />

En la constitución del derecho de superficie se podrán incluir cláusulas y pactos relativos a derechos de<br />

tanteo, retracto y retroventa a favor del propietario del suelo, para los casos de las transmisiones del<br />

derecho o de los elementos a que se refieren, respectivamente, los dos apartados anteriores. 4. El<br />

propietario del suelo podrá transmitir y gravar su derecho con separación del derecho del superficiario y<br />

sin necesidad de consentimiento de éste. El subsuelo corresponderá al propietario del suelo y será objeto<br />

de transmisión y gravamen juntamente con éste, salvo que haya sido incluido en el derecho de superficie.<br />

5. El derecho de superficie se extingue si no se edifica de conformidad con la ordenación territorial y<br />

urbanística en el plazo previsto en el título de constitución y, en todo caso, por el transcurso del plazo de<br />

duración del derecho. A la extinción del derecho de superficie por el transcurso de su plazo de duración,<br />

el propietario del suelo hace suya la propiedad de lo edificado, sin que deba satisfacer indemnización<br />

alguna cualquiera que sea el título en virtud del cual se hubiera constituido el derecho. No obstante,<br />

podrán pactarse normas sobre la liquidación del régimen del derecho de superficie.La extinción del<br />

derecho de superficie por el transcurso de su plazo de duración determina la de toda clase de derechos<br />

reales o personales impuestos por el superficiario. Si por cualquier otra causa se reunieran los derechos<br />

de propiedad del suelo y los del superficiario, las cargas que recayeren sobre uno y otro derecho<br />

continuarán gravándolos separadamente hasta el transcurso del plazo del derecho de superficie.<br />

ESPANHA. Ley 8/2007, de 28 de mayo, de suelo. Disponível em: < http://www.derecho.com/l/boe/ley-8-<br />

2007-suelo/#A35>, Acesso em: 10/06/2009.<br />

170 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 66.<br />

171 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 130 - 131.<br />

172 TÍTULO V Do direito de superfície CAPÍTULO I Disposições gerais Artigo 1524.º (Noção) - O direito<br />

de superfície consiste na faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, uma obra em<br />

57


terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações. Artigo 1525.º (Objecto) 1. Tendo por objecto a<br />

construção de uma obra, o direito de superfície pode abranger uma parte do solo não necessária à sua<br />

implantação, desde que ela tenha utilidade para o uso da obra. 2 - O direito de superfície pode ter por<br />

objecto a construção ou a manutenção de obra sob solo alheio. Artigo 1526.º (Direito de construir sobre<br />

edifício alheio) O direito de construir sobre edifício alheio está sujeito às disposições deste título e às<br />

limitações impostas à constituição da propriedade horizontal; levantado o edifício, são aplicáveis as<br />

regras da propriedade horizontal, passando o construtor a ser condómino das partes referidas no artigo<br />

1421.º. Artigo 1527.º (Direito de superfície constituído pelo Estado ou por pessoas colectivas públicas) O<br />

direito de superfície constituído pelo Estado ou por pessoas colectivas públicas em terrenos do seu<br />

domínio privado fica sujeito a legislação especial e, subsidiariamente, às disposições deste código.<br />

CAPÍTULO II Constituição do direito de superfície. Artigo 1528.º (Princípio geral) O direito de superfície<br />

pode ser constituído por contrato, testamento ou usucapião, e pode resultar da alienação de obra ou<br />

árvores já existentes, separadamente da propriedade do solo. Artigo 1529.º (Servidões) 1. A constituição<br />

do direito de superfície importa a constituição das servidões necessárias ao uso e fruição da obra ou das<br />

árvores; se no título não forem designados o local e as demais condições de exercício das servidões,<br />

serão fixados, na falta de acordo, pelo tribunal. 2. A constituição coerciva da servidão de passagem<br />

sobre prédio de terceiro só é possível se, à data da constituição do direito de superfície, já era encravado<br />

o prédio sobre que este direito recaía. CAPÍTULO III Direitos e encargos do superficiário e do proprietário<br />

Artigo 1530.º (Preço) 1. No acto de constituição do direito de superfície, pode convencionar-se, a título de<br />

preço, que o superficiário pague uma única prestação ou pague certa prestação anual, perpétua ou<br />

temporária. 2. O pagamento temporário de uma prestação anual é compatível com a constituição<br />

perpétua do direito de superfície. 3. As prestações são sempre em dinheiro. Artigo 1531.º (Pagamento<br />

das prestações anuais) 1. Ao pagamento das prestações anuais é aplicável o disposto nos artigos 1505.º<br />

e 1506.º, com as necessárias adaptações. 2. Havendo mora no cumprimento, o proprietário do solo tem o<br />

direito de exigir o triplo das prestações em dívida. Artigo 1532.º (Fruição do solo antes do início da obra)<br />

Enquanto não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, o uso e a fruição<br />

da superfície pertencem ao proprietário do solo, o qual, todavia, não pode impedir nem tornar mais<br />

onerosa a construção ou a plantação. Artigo 1533.º (Fruição do subsolo) O uso e a fruição do subsolo<br />

pertencem ao proprietário; este é, porém, responsável pelo prejuízo causado ao superficiário em<br />

consequência da exploração que dele fizer. Artigo 1534.º (Transmissibilidade dos direitos) O direito de<br />

superfície e o direito de propriedade do solo são transmissíveis por acto entre vivos ou por morte. Artigo<br />

1535.º (Direito de preferência) 1. O proprietário do solo goza do direito de preferência, em último lugar, na<br />

venda ou dação em cumprimento do direito de superfície; sendo, porém, enfitêutico o prédio incorporado<br />

no solo, prevalece o direito de preferência do proprietário. 2. É aplicável ao direito de preferência o<br />

disposto nos artigos 416.º a 418.º e 1410.º CAPÍTULO IV Extinção do direito de superfície Artigo 1536.º<br />

(Casos de extinção) 1. O direito de superfície extingue-se: a) Se o superficiário não concluir a obra ou não<br />

fizer a plantação dentro do prazo fixado ou, na falta de fixação, dentro do prazo de dez anos; b) Se,<br />

destruída a obra ou as árvores, o superficiário não reconstruir a obra ou não renovar a plantação, dentro<br />

dos mesmos prazos a contar da destruição; c) Pelo decurso do prazo, sendo constituído por certo tempo;<br />

d) Pela reunião na mesma pessoa do direito de superfície e do direito de propriedade;<br />

e) Pelo desaparecimento ou inutilização do solo; f) Pela expropriação por utilidade pública.<br />

2. No título constitutivo pode também estipular-se a extinção do direito de superfície em consequência da<br />

destruição da obra ou das árvores, ou da verificação de qualquer condição resolutiva. 3. À extinção do<br />

direito de superfície, nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1, são aplicáveis as regras da<br />

prescrição. Artigo 1537.º (Falta de pagamento das prestações anuais) 1. A falta de pagamento das<br />

prestações anuais durante vinte anos extingue a obrigação de as pagar, mas o superficiário não adquire a<br />

propriedade do solo, salvo se houver usucapião em seu benefício. 2. À extinção da obrigação de<br />

pagamento das prestações são aplicáveis as regras da prescrição. Artigo 1538.º (Extinção pelo decurso<br />

do prazo) 1. Sendo o direito de superfície constituído por certo tempo, o proprietário do solo, logo que<br />

expire o prazo, adquire a propriedade da obra ou das árvores. 2. Salvo estipulação em contrário, o<br />

superficiário tem, nesse caso, direito a uma indemnização, calculada segundo as regras do<br />

enriquecimento sem causa. 3. Não havendo lugar à indemnização, o superficiário responde pelas<br />

deteriorações da obra ou das plantações, quando haja culpa da sua parte. Artigo 1539.º (Extinção de<br />

direitos reais constituídos sobre o direito de superfície) 1. A extinção do direito de superfície pelo decurso<br />

do prazo fixado importa a extinção dos direitos reais de gozo ou de garantia constituídos pelo superficiário<br />

58


Esmiuçando o presente apontamento, o Silvio de Salvo Venosa descreve 173 :<br />

“Originariamente, o revogado Código Civil português também não reconheceu o direito<br />

de superfície, que somente foi introduzido na legislação lusitana por uma lei de 1948. No<br />

código português atual, uma vez abolida a enfiteuse, o Código Civil lusitano conceitua a<br />

superfície como “faculdade de construir ou manter, perpetua ou temporariamente, uma<br />

obra em terreno alheio ou nele fazer ou manter plantações” (art. 1.542)”<br />

Importante frisar, que o direito de superfície lusitano, conforme já verificado<br />

anteriormente, é muito importante para a interpretação de alguns dispositivos no direito<br />

pátrio. 174<br />

Desta forma, conforme o artigo 1524, o direito de superfície consiste na<br />

faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente, bem como tem por<br />

objeto uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações. 175<br />

Para Diana Coelho Barbosa 176 : “o direito de superfície, no ordenamento jurídico,<br />

português, pode consistir numa concessão ad aedificandum ou, ainda, incidir sobre<br />

construção já existente; pode ser perpétua ou temporária a sua concessão, podendo<br />

recair, também, sobre plantações preexistentes ou in fieri.”<br />

em benefício de terceiro. 2. Se, porém, o superficiário tiver a receber alguma indemnização nos termos<br />

do artigo anterior, aqueles direitos transferem-se para a indemnização, conforme o disposto nos lugares<br />

respectivos. (Artigo 1540.º (Direitos reais constituídos pelo proprietário)Os direitos reais constituídos pelo<br />

proprietário sobre o solo estendem-se à obra e às árvores adquiridas nos termos do artigo 1538.º Artigo<br />

1541.º (Permanência dos direitos reais) Extinguindo-se o direito de superfície perpétuo, ou o temporário<br />

antes do decurso do prazo, os direitos reais constituídos sobre a superfície ou sobre o solo continuam a<br />

onerar separadamente as duas parcelas, como se não tivesse havido extinção, sem prejuízo da aplicação<br />

das disposições dos artigos anteriores logo que o prazo decorra. Artigo 1542.º(Extinção por expropriação)<br />

Extinguindo-se o direito de superfície em consequência de expropriação por utilidade pública, cabe a<br />

cada um dos titulares a parte da indemnização que corresponder ao valor do respectivo direito. CÓDIGO<br />

CIVIL PORTUGUÊS: Actualizado até à Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubrov. Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2009.<br />

173<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 391.<br />

174<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 105.<br />

175<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 21 e 22.<br />

176<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 43.<br />

59


Ainda nesta mesma esteira, Paulo Roberto Benasse 177 pondera:<br />

“É o direito de uma pessoa ter a propriedade de edifícios ou plantações feitas em terreno<br />

alheio, com pleno consentimento do proprietário desse terreno. Esta noção não difere<br />

muito das idéias tradicionais sobre o instituto, segundo os quais, devemos entender o<br />

direito alienável e transmissível por herança, de fazer e ter uma construção sobre a<br />

superfície de um imóvel. o superficiário é proprietário da construção ou plantação<br />

emitente sobre o solo, enquanto este ultimo pertence a outro titular, o proprietário”<br />

Ainda analisando o referido dispositivo, e em especial a expressão da palavra<br />

“perpetua” discorre assertivamente Marcus Vinicius dos Santos Andrade 178 :<br />

“A expressão “perpetua” não significa que não possa ser desconstituído, mas sim, que<br />

persiste enquanto obedecidas as regulamentações contratuais e legais. Não há um termo<br />

fixo para a revogação da avença equivalendo à locução “tempo indeterminado”. O contra<br />

ponto esta no “tempo determinado”: quando vencido o prazo, encerra-se a relação”<br />

Referente ao objeto do direito de superfície lusitano, este, pode abranger parte<br />

do solo não necessária à sua implantação, desde que tenha ela a utilidade para o uso<br />

da obra, como prescreve o art. 1525 do Código Civil Português 179<br />

Observa Luiz Guilherme Loureiro 180 :<br />

``Aliás, também o direito português vedava a construção de obra no subsolo, a menos que<br />

fosse inerente à obra superficiária. Tal dispositivo (art. 1.525, p.2., do CC) foi fortemente<br />

criticado pela doutrina e foi derrogado pelo Dec. – lei 257 de 1991. Este diploma legal<br />

proclama que o direito de superfície pode ter por objetivo a construção ou a manutenção<br />

sob solo alheio”.<br />

177<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 65.<br />

178<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 58<br />

179<br />

Neste sentido: GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo:<br />

Saraiva, 2006. p. 409.; GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 106.<br />

180<br />

Loureiro, Luiz Guilherme. Direitos Reais, p.274.<br />

60


Outro aspecto relevante está previsto no Artigo 1535, que refere-se a<br />

transmissibilidade dos direitos. Prevê o referido artigo que o direito de superfície é<br />

transmitido por ato entre vivos ou por morte, e especifica o artigo 1534 a sua<br />

constituição por contrato, testamento ou usucapião. 181 Porém para que se efetive a<br />

concessão superficiária, será necessário registrar a mesma junto ao foro registral. Neste<br />

sentido para o Silvio de Salvo Venosa 182 : “a eficácia do direito real somente é obtida<br />

com o registro imobiliário”<br />

Pode ser ainda, constituído pelo estado ou por outras pessoas jurídicas de direito<br />

público em terrenos de sua propriedade. Neste caso, referida concessão, assim como<br />

no direito pátrio fica sujeito a legislação especial e subsidiariamente as disposições do<br />

código civil nos termos do artigo 1527. 183<br />

Referente às obrigações do superficiário há duas ponderações interessantes, na<br />

legislação portuguesa, a primeira delas prevista no Artigo 1531, segunda parte,<br />

regulamento que havendo mora no cumprimento, o proprietário tem o direito de exigir o<br />

triplo das prestações em dívida.<br />

Já em um segundo momento – assim como ocorre no direito pátrio – o direito de<br />

preferência também encontra guarida no Artigo 1535, pois o proprietário do solo goza<br />

do direito de preferência, em último lugar, na venda ou dação em cumprimento do<br />

direito de superfície.<br />

Ponto interessante, relaciona-se com a extinção do direito de superfície prevista<br />

no artigo 1536 do Código Civil Português. Diferentemente do direito nacional, o referido<br />

artigo arrola todas as de extinção do direito de superfície. 184<br />

181<br />

Neste mesmo sentido: GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São<br />

Paulo: Saraiva, 2006. p. 409.; BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da<br />

Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 43.<br />

182<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 393.<br />

183<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 44.<br />

184<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 59.<br />

61


Sendo assim, basicamente, o direito de superfície extingue-se: Caso o<br />

superficiário não concluir a obra ou não fizer a plantação dentro do prazo fixado ou, na<br />

falta de fixação, dentro do prazo de dez anos; Se, destruída a obra ou as árvores, o<br />

superficiário não reconstruir a obra ou não renovar a plantação, dentro dos mesmos<br />

prazos a contar da destruição; Pelo decurso do prazo, sendo constituído por certo<br />

tempo; Pela reunião na mesma pessoa do direito de superfície e do direito de<br />

propriedade; Pelo desaparecimento ou inutilização do solo; Pela expropriação por<br />

utilidade pública. No título constitutivo pode também estipular-se a extinção do direito de<br />

superfície em conseqüência da destruição da obra ou das árvores, ou da verificação de<br />

qualquer condição resolutiva.<br />

Por fim, importante frisar que nos termos do artigo 1539 do referido Código, a<br />

extinção do direito de superfície pelo transcurso do prazo fixado, decorre<br />

automaticamente a liberação dos direito reais de garantias constituídos pelo<br />

superficiário em benefícios de terceiros. 185<br />

2.8 Canadense: Província de Québec<br />

O Novo código civil da Província de Québec, que entrou em vigor na última<br />

década de 90, mais especificadamente em 1º de janeiro de 1994, regulamenta o<br />

instituto do direito de superfície no seu capítulo IV, subdivido em duas sessões. 186<br />

A primeira destas duas sessões, regula a constituição 187 do direito de superfície,<br />

enquanto a segunda parte trata da extinção 188 do referido instituto.<br />

185<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 45 e 46.<br />

186<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 48.<br />

187<br />

Section ii - De la fin de la propriété superficiaire. Chapitre quatrième - De la propriété superficiaire.<br />

Section i - De l'établissement de la propriété superficiaire. 1110. La propriété superficiaire résulte de la<br />

division de l'objet du droit de propriété portant sur un immeuble, de la cession du droit d'accession ou de<br />

la renonciation au bénéfice de l'accession. 1111. Le droit du propriétaire superficiaire à l'usage du tréfonds<br />

62


Nestes termos, conforme se verifica no artigo 1110 do referido dispositivo legal,<br />

o direito de superfície é oriundo de um fracionamento do direito de propriedade<br />

existente sobre um imóvel, da transferência do direito de acessão ou da renúncia ao<br />

benefício da acessão, ou ainda da renúncia deste. 189<br />

E assim entende Marcus Vinicius dos Santos Andrade 190 : “O art. 1.110<br />

estabelece que a propriedade superficiária resulta da divisão do objeto do direito de<br />

propriedade sobre um imóvel da cessão do direito de acessão ou da renuncia ao<br />

beneficio da acessão”<br />

Em continuidade, dois outros aspectos são relevantes quando da constituição do<br />

direito de superfície. O primeiro deles, é que o direito de superfície conforme artigo<br />

est réglé par la convention. À défaut, le tréfonds est grevé des servitudes nécessaires à l'exercice de ce<br />

droit; elles s'éteignent lorsqu'il prend fin. 1112. Le superficiaire et le tréfoncier supportent les charges<br />

grevant ce qui fait l'objet de leurs droits de propriété respectifs. 1113. La propriété superficiaire peut être<br />

perpétuelle, mais un terme peut être fixé par la convention qui établit la modalité superficiaire. Código Civil<br />

Canadense. Disponível em: , Acesso em: 10/06/2009.<br />

188<br />

Section ii - De la fin de la propriété superficiaire. 1114. La propriété superficiaire prend fin: 1° Par la<br />

réunion des qualités de tréfoncier et de superficiaire dans une même personne, sous réserve toutefois des<br />

droits des tiers; 2° Par l'avènement d'une condition résolutoire; 3° Par l'arrivée du terme. 1115. La perte<br />

totale des constructions, ouvrages ou plantations ne met fin à la propriété superficiaire que si celle-ci<br />

résulte de la division de l'objet du droit de propriété. L'expropriation des constructions, ouvrages ou<br />

plantations ou celle du tréfonds ne met pas fin à la propriété superficiaire. 1116. À l'expiration de la<br />

propriété superficiaire, le tréfoncier acquiert par accession la propriété des constructions, ouvrages ou<br />

plantations en en payant la valeur au superficiaire. Cependant, si la valeur est égale ou supérieure à celle<br />

du tréfonds, le superficiaire a le droit d'acquérir la propriété du tréfonds en en payant la valeur au<br />

tréfoncier, à moins qu'il ne préfère, à ses frais, enlever les constructions, ouvrages et plantations qu'il a<br />

faits et remettre le tréfonds dans son état antérieur. 1117. À défaut par le superficiaire d'exercer son droit<br />

d'acquérir la propriété du tréfonds, dans les 90 jours suivant la fin de la propriété superficiaire, le tréfoncier<br />

conserve la propriété des constructions, ouvrages et plantations. 1118. Le tréfoncier et le superficiaire qui<br />

ne s'entendent pas sur le prix et les autres conditions d'acquisition du tréfonds ou des constructions,<br />

ouvrages ou plantations, peuvent demander au tribunal de fixer le prix et les conditions d'acquisition. Le<br />

jugement vaut titre et en a tous les effets. Ils peuvent aussi, en cas de désaccord sur les conditions<br />

d'enlèvement de ces constructions, ouvrages ou plantations, demander au tribunal de les déterminer.<br />

Código Civil Canadense. Disponível em: , Acesso em: 10/06/2009.<br />

189<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 49.<br />

190<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 63.<br />

63


1113, pode ser perpétuo, salvo disposição em contrário 191 . Já em segundo momento,<br />

assim como verificado em outros países, se faz possível ofertar o direito de propriedade<br />

em garantia real nos termos do artigo 1112 do referido diploma.<br />

Quanto da extinção da direito de superfície canadense o artigo 1116, importante<br />

descreve que o proprietário do terreno, adquire todas as acessões nesta erigidas, salvo<br />

se este valor for igual ou superior a do terreno. Neste caso, o superficiário tem o direito<br />

de adquirir a propriedade do imóvel pagando o seu respectivo valor. 192<br />

2.9 Argentina<br />

Conforme podemos notar no Código Civil argentino de 1869, não havia previsão<br />

expressa do direito de superfície em seu artigo 2.614 193 , contudo recentemente a Lei<br />

25.509, de 11.12.2001 194 , reformou o Código Civil Argentino, incorporando o direito de<br />

superfície no rol do artigo 2.503 195 .<br />

191<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 49.<br />

192<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 49.<br />

193<br />

Art.2614.- Los propietarios de bienes raíces no pueden constituir sobre ellos derechos enfitéuticos, ni<br />

de superficie, ni imponerles censos, ni rentas que se extiendan a mayor término que el de cinco años,<br />

cualquiera que sea el fin de la imposición; ni hacer en ellos vinculación alguna. Código Civil Argentino.<br />

Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2009.<br />

194<br />

Texto de la ley de derecho real de superficie forestal Ley 25.509 Créase el derecho real de superficie<br />

forestal, constituido a favor de terceros, por los titulares de dominio o condomínio sobre un inmueble<br />

susceptible de forestación o silvicultura. Sancionada: Noviembre 14 de 2001. Promulgada de Hecho:<br />

Diciembre 11 de 2001. El Senado y Cámara de Diputados de la Nación Argentina reunidos en Congreso,<br />

Sancionan con fuerza de Ley: ARTICULO 1º - Créase el derecho real de superficie forestal, constituido a<br />

favor de terceros, por los titulares de dominio o condominio sobre un inmueble susceptible de forestación<br />

o silvicultura, de conformidad al régimen previsto en la Ley de Inversiones para Bosques Cultivados, y a<br />

lo establecido en la presente ley. ARTICULO 2º - El derecho real de superficie forestal es un derecho real<br />

autónomo sobre cosa propia temporario, que otorga el uso, goce y disposición jurídica de la superficie de<br />

un inmueble ajeno con la facultad de realizar forestación o silvicultura y hacer propio lo plantado o adquirir<br />

La propiedad de plantaciones ya existentes, pudiendo gravarla con derecho real de garantía. ARTICULO<br />

3º - El propietario del inmueble afectado a superficie forestal conserva el derecho de enajenar el mismo,<br />

debiendo el adquirente respetar el derecho real de superficie forestal constituido. ARTICULO 4º - El<br />

propietario del inmueble afectado a derecho real de superficie forestal no podrá constituir sobre él ningún<br />

outro derecho real de disfrute o garantía durante La vigencia del contrato, ni perturbar los derechos del<br />

superficiario; si lo hace el superficiario puede exigir el cese de La turbación. ARTICULO 5º - El derecho<br />

real de superficie forestal se adquiere por contrato, oneroso o gratuito, instrumentado por escritura pública<br />

y tradición de posesión. Deberá ser inscripto, a los efectos de su oponibilidad a terceros interesados en el<br />

64


Da análise do referido dispositivo, verifica-se que a instituição do direito de<br />

superfície ficou limitada aos imóveis rurais, para reflorestamento e silvicultura,<br />

formalizada por escritura publica, levada posteriormente a registro junto ao órgão<br />

competente. 196<br />

Verificamos ainda, a possibilidade da transferência do direito de propriedade,<br />

observado o direito de prelação, bem como esta prevista a indenização pelo<br />

enriquecimento do proprietário, em decorrência da valoração do imóvel. 197<br />

Registro de La Propiedad Inmueble de la jurisdicción correspondiente, el que abrirá un nuevo folio<br />

correlacionado con la inscripción dominial antecedente. ARTICULO 6º - El derecho real de superficie<br />

forestal tendrá un plazo máximo de duración por cincuenta años. En caso de convenirse plazos<br />

superiores, el excedente no valdrá a los efectos de esta ley. ARTICULO 7º - El derecho real de superficie<br />

forestal no se extingue por la destrucción total o parcial de lo plantado, cualquiera fuera su causa,<br />

siempre que el superficiario realice nuevas plantaciones dentro del plazo de tres años. ARTICULO 8º - El<br />

derecho real de superficie forestal se extingue por renuncia expresa, vencimiento del plazo contractual,<br />

cumplimiento de una condición resolutoria pactada, por consolidación en una misma persona de las<br />

calidades de propietario y superficiario o por el no uso durante tres años. ARTICULO 9º - La renuncia del<br />

derecho por el superficiario, o su desuso o abandono, no lo liberan de sus obligaciones. ARTICULO 10. -<br />

En el supuesto de extinción del derecho real de superficie forestal por consolidación, los derechos y<br />

obligaciones del propietario y del superficiario continuarán con sus mismos alcances y efectos.<br />

ARTICULO 11. - Producida la extinción del derecho real de superficie forestal, el propietario del inmueble<br />

afectado, extiende su dominio a las plantaciones que subsistan, debiendo indemnizar al superficiario,<br />

salvo pacto en contrario, en la medida de su enriquecimiento. ARTICULO 12. - Modifícase el artículo 2614<br />

del Código Civil, el que quedará redactado de la siguiente manera: Artículo 2614: Los propietarios de<br />

bienes raíces no pueden constituir sobre ellos derechos enfitéuticos, ni imponerles censos ni rentas que<br />

se extiendan a mayor término que el de cinco años, cualquiera sea el fin de la imposición; ni hacer en<br />

ellos vinculación alguna. ARTICULO 13. - Agrégase al artículo 2503 del Código Civil como inciso 8º “La<br />

Superfície Forestal”. ARTICULO 14. - La presente ley es complementaria del Código Civil. ARTICULO 15.<br />

- Comuníquese al Poder Ejecutivo. - REGISTRADA BAJO EL Nº 25.509-DADA EN LA SALA <strong>DE</strong><br />

SESIONES <strong>DE</strong>L CONGRESO ARGENTINO, EN BUENOS AIRES, A LOS CATORCE DIAS <strong>DE</strong>L MES <strong>DE</strong><br />

NOVIEMBRE <strong>DE</strong>L AÑO <strong>DO</strong>S MIL UNO. Rafael Pascual. - Eduardo Menem. - Guillermo Aramburu. - Juan<br />

C. Oyarzún. ITURRASPE, Juan Bernardo. XIX Jornadas Nacionales de Derecho Civil a celebrarse en<br />

Rosario desde el 25 al 27 de setiembre de 2003: Tema Nº4: "Derecho real de superficie forestal"<br />

Disponível em: http://www.eldial.com.ar/suplementos/ambiental/notaspublicadas/d_0087.asp#(*) Acesso<br />

em: 10/06/2009.<br />

195<br />

Art.2503.- Son derechos reales:1 - El dominio y el condominio; 2 - El usufructo; 3 - El uso y la<br />

habitación; 4 - Las servidumbres activas; 5 - El derecho de hipoteca; 6 - La prenda; 7 - La anticresis.<br />

Código Civil Argentino. Disponível em: , Acesso em: 10/06/2009.<br />

196<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 70.<br />

197<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 70.<br />

65


CAPÍTULO 3 – <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> PROPRIEDA<strong>DE</strong> E O PRINCIPIO<br />

DA <strong>SOCIAL</strong>IDA<strong>DE</strong><br />

3.1 A Constitucionalização do Direito Civil<br />

Antes de adentrar no estudo do da função social do direito ou do princípio da<br />

socialidade, devemos segundo nosso ver, tratar de um tema de suma importância.<br />

O fenômeno do título ora apresentado, ou seja, “A constitucionalização de Direito<br />

Civil” 198 concorre em profunda influência com o conteúdo que iremos desenvolver nesta<br />

pesquisa, uma vez que seu embasamento e aplicado lidimamente na regulamentação<br />

prevista no princípio da função social da propriedade e do direito de superfície em<br />

momento oportuno.<br />

Em decorrência de tal fato notório, é sublime tratar deste tema trazido à baila,<br />

bem como, discorrer em algumas laudas, a respeito de sua evolução histórica.<br />

Desta monta, houve uma época anterior às Revoluções Francesas 199 (1789) e<br />

Industrial 200 (1811) em que os proprietários das terras, eram os senhores feudais, terras<br />

estas, doadas pelos os reis, bem como, obrigatoriamente trabalhada pelos os servos.<br />

Os juristas, que se encarregavam em elaborar o Código Napoleônico e<br />

intimidados pelo extremismo vivenciado no Regime Absolutista, concederam como<br />

198 Temas de Direito Civil, p. 383.<br />

199 Wikipédia, a enciclopédia livre, Revolução Francesa, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

200 Wikipédia, a enciclopédia livre. Revolução Industrial, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

66


elemento basilar a possibilidade em permitir ao homem, ser proprietário de um bem,<br />

podendo contratar, circular sem que haja interferência do arbítrio feudal 201 .<br />

Tal momento segundo o nosso ver foi extremamente importante, pois estávamos<br />

diante da primeira “guinada do pêndulo” 202 , não somente quanto das questões<br />

relacionadas ao direito de propriedade, mas sim ao direito privado.<br />

A referida alteração teve seu embasamento fundamental em limitar a intenção do<br />

poder do Estado, que antes era condicionado aos domínios da monarquia, afastando<br />

completamente o conceito de direito de propriedade que conhecemos atualmente.<br />

Neste contexto, foi em 21 de marco de 1804 que entrou em vigor do Código Civil<br />

Francês, bem como, mesmo que de forma tardia, um século depois, o Código Civil<br />

Brasileiro de 1916 de Clovis de Bevilaqua, tendo ambos, ideais inspirados no<br />

liberalismo do século XIX, ou seja, no antigo status do liberalismo econômico, onde o<br />

“eu” era muito mais importante do que “nós” 203 .<br />

Todavia, antes mesmo da entrada em vigor do Código de 1916, já haviam várias<br />

críticas a este, como na visão do celebre San Tiago Dantas, que é citado por Gustavo<br />

Tepedino 204 :<br />

“Uma crítica aos fundamentos jurídicos, ao plano da obra ou a seus dispositivos<br />

principais, não teria a força de comover o Prestígio do projeto, a não ser perante ao<br />

número limitado de entendidos. A matéria jurídica, por sua natureza, ou é de acesso<br />

difícil a quem lhe não possua a chave gramatical, ou é de tal maneira opinativa, que uma<br />

201 Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 35.<br />

202 Quando citamos “guinada do pendulo”, o fazemos, a fim de demonstrar que o Direito na maioria das<br />

vezes é tendencioso a determinado acontecimento histórico e/ou político. Como exemplo, podemos citar<br />

a Constituinte Brasileira de 1988, naquela oportunidade, em decorrência de um recente governo ditatorial,<br />

concebeu várias prerrogativas em defesa de crimes políticos, o que tem desagradado à sociedade<br />

atualmente, conforme podemos notar em vários meios de comunicação.<br />

203 Flávio Tartuce,Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo<br />

a Nova Codificação, Disponível em: , Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

204 Temas de Direito Civil – Tomo II, p. 125.<br />

67


opinião vale a outra, aos olhos de quem não tenha, sobre o ponto de exame, uma<br />

experiência pessoal (...) A lenda da oposição irredutível de Rui Barbosa ao Projeto de<br />

Clovis de Beviláqua não resiste à leitura do Parecer Jurídico. O que se revela para nossa<br />

satisfação moral, mas também para nosso desapontamento, é que se Rui Barbosa o<br />

houvesse concluído, teríamos tido um Código mais moderno em algumas soluções, mais<br />

rico de pensamento, e mais próximo da pureza do projeto primitivo...”<br />

Da visão de Silvio Rodrigues, ao verificar a concepção do Código Civil de 1916,<br />

menciona Alessandra Elias de Quiroga 205 :<br />

“... Tenho escrito e repetido que tal código é o último código liberal do século XIX. É um<br />

código bem-comportado, feito para uma sociedade estratificada, de gente que esta bem<br />

de vida. Basta examinar o respeito quase sacrossanto com que trata o casamento, o<br />

amor, com que vê a família legitima e o desamor com que cuida a família ilegítima, a<br />

maneira que disciplina a tutela, como se esta só existisse para os órfãos endinheirados<br />

(...) Esses e outros elementos estão a indicar que se trata de uma sociedade estruturada,<br />

inteiramente diversa daquela que vivia num Brasil saído da escravidão e que abria as<br />

portas para a onda imigratória”.<br />

Não obstante às referidas críticas, que entendemos assertivas, há mais um<br />

agravante. Com as novas práticas das relações humanas oriundas dos séculos XIX e<br />

XX e com o decorrer deste lapso temporal, novas diretrizes sociais são criadas e<br />

profundas modificações incidiram sobre as relações sociais.<br />

Portando, aponta Alessandra Elias de Queiroga 206 :<br />

“Logo depois de ter entrado em vigor do Código Civil Brasileiro, o mundo sofreu<br />

profundas mudanças, em razão, principalmente, da crescente industrialização e da<br />

eclosão da Primeira Grande Gerra. Estes fatos históricos requisitaram, do Estado,<br />

intervenção direita visando regular circulação de riquezas e responder às necessidades<br />

prementes dos grupos sociais margizados, que foram construindo um espaço crescente<br />

de reivindicações”<br />

205 Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 35.<br />

206 Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 35.<br />

68


Perfeita a colocação da Alessandra Elias de Queiroga segundo o nosso ver, pois<br />

neste apontamento, constatamos com clareza que após um longo período de<br />

individualismo econômico, oriundo da situação política anterior apresentada, notamos a<br />

necessidade de adequação da norma para atender um novo clamor social.<br />

Assim, com toda aquela problemática apresentada no período da primeira grande<br />

guerra, bem como, todo o seu resultado casuístico, se fez necessária a intervenção<br />

Estatal para regulamentação das relações privadas.<br />

Intervenção esta, que apontamos como “a volta do pêndulo” nas relações<br />

privadas. Tal justificativa tem como fundamento, que neste momento histórico e político<br />

se faz o caminho inverso do individualismo econômico apregoado pelos juristas<br />

anteriores, ou seja, o objetivo naquele momento era afastar completamente a<br />

intervenção Estatal nas relações privadas.<br />

O clamor socia, que inicialmente foi atendido com normas excepcionais que<br />

divergiam dos princípios apregoados pelo Código Civil de 1916. Assim, aponta Gustavo<br />

Tepedino 207 :<br />

“assim chamadas por dissentirem dos princípios dominantes do corpo codificado. O<br />

Código Civil mantinha a fisionomia de ordenador único das relações privadas, e as leis<br />

extravagantes, se contrariavam os princípios do Código Civil, o faziam de maneira<br />

excepcional, de modo que não desmentiam o sentido de completude e de exclusividade<br />

pretendido pelo Código”<br />

Neste contexto Alessandra Elias de Queiroga, cita Álvaro Pessoa e aponta<br />

exatamente este novel contraste da legislação extravagante, bem como, a inevitável<br />

necessidade de regulamentação específica e da intervenção do Estado nas relações<br />

privadas 208 .<br />

207 Temas de Direito Civil, p.3<br />

208 Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 35. “Todavia, toda a gama de alterações pela<br />

69


Desta forma, antes mesmo da promulgação da Carta Magna de 1988, é claro e<br />

lídimo que o Código Civil de 1916 passou a ser caracterizado como “legislação comum<br />

e as demais lei que regulamentavam questões mais específicas e intrínsecas ao Direito<br />

Civil passam a ter o nível de leis especiais 209 210 . E acrescenta o Gustavo Tepedino 211 :<br />

“Tal modificação no papel do Código Cível representa uma profunda alteração na própria<br />

dogmática. Identificam-se sinais de esgotamento das categorias do direito privado,<br />

constatando-se uma ruptura que bem poderia ser definida, conforme a preciosa análise<br />

de Ascarilli, como uma crise entre o instrumental teórico e as formas jurídicas do<br />

individualismo pré-industrial, de um lado; e de outro, a realidade econômica industrial ou<br />

pós-industrial, que repelem o individualismo. Os novos fatos sociais dão ensejo a<br />

soluções objetivistas e não mais subjetivistas, exigem do legislador, do interprete e da<br />

doutrina uma preocupação com o conteúdo e com as finalidades das atividades”<br />

Porém, tais providências denominadas para parte de doutrina de Publicização 212<br />

apesar de assertivas e necessárias, não foram suficientes para consolidar e assegurar<br />

aos particulares os interesses individuais e coletivos na nova formatação social imposta.<br />

qual havia passado o direito de propriedade era do conhecimento de uma elite bem preparada, que<br />

assume o poder político em 1930. Tal elite, ainda fortemente marcada pela influencia francesa e pelo<br />

contato com os centros europeus mais desenvolvidos, vai ter papel decisivo. A ela coube o mérito<br />

indiscutível de, usando a Revolução de 1930 como instrumento, elevar a questão social – até então<br />

relegada à jurisdição da policia, nas correrias de rua – a dignidade de um problema fundamental do<br />

Estado. Mais Coube-lhe das – através de um conjunto de leis que honra a ciência jurídica pátria – solução<br />

equilibrada, não apenas à questão social, mas, sobretudo, ao uso social da propriedade, dentro de um<br />

alto espírito de harmonia. Datam de então leis que tanto causam admiração pelo avanço de concepção,<br />

como pelo arrojo em antecipar-se aos fenômenos sociais. Valem ser citadas entre outras,a as leis que,<br />

neste campo, tratam: a) da proteção ao fundo de comercio dos inquilinos comerciais; b) do regulamento<br />

das águas e mineração; c) da preservação do patrimônio histórico e artístico; d) de legislar sobre a<br />

utilização dos terrenos de marinha; e) de regular o loteamento e venda de lotes a prestação; f) de regular<br />

as relações de inquilinato; sem falar obviamente, nas edições dos Códigos de Processo Civil e Penal.”<br />

209 Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 37.<br />

210 Sobre este tema, indicamos a doutrina da Professora Claudia Lima Marques: Claudia Lima Marques;<br />

Antônio Herman V. Benjamin; Bruno Miragem, Código de Defesa ao Consumidor. 2ª ed., São Paulo:<br />

Revista dos Tribunais, 2006.<br />

211 Temas de Direito Civil, p.3.<br />

212 Paulo Luiz Netto Lobo, Constitucionalização do Direito Civil, Disponível em: , Acesso em: 10/06/2008.<br />

70


Assim, em decorrência de todos os fatos históricos, políticos e sociológicos<br />

apregoados no presente trabalho, no início do Século XIX, mais especificadamente,<br />

com as Constituições Mexicana (1917) e Alemã (1919) iniciou-se uma nova proposta<br />

legislativa intervencionista nas relações privadas, denominado de Constitucionalismo.<br />

Neste sentido explica Leo van Holthe que 213 :<br />

“inspirados nos princípios liberais, nos ideais de uma sociedade política fundada no<br />

contrato social (Locke e Rosseau), numa ordem jurídica inspirada na razão humana<br />

(Iluminismo) e nos postulados da liberdade e fraternidade, o movimento do<br />

constitucionalismo trouxe este novo formato de Constituição (um documento escrito e<br />

rígido, que estrutura o Estado e limita o seu poder através de princípio da separação dos<br />

poderes e da previsão de direitos fundamentais), fazendo surgir o chamado Estado<br />

Liberal, Estado de Direito ou Estado constitucional”.<br />

Neste contexto expõe Alessandra Elias de Queiroga 214 :<br />

“Essa conjuntura histórica, derivada do processo de industrialização da primeira metade<br />

do finado século XX, fez surgir Constituições, em diversos países, eivada de princípios<br />

que estabeleciam – e ainda estabelecem – compromissos sociais a serem levados a<br />

termo pelo legislador, como, por exemplo, o princípio da função social da propriedade. O<br />

legislador começa a trabalhar de maneira cada vez mais ativa, disciplinando, por<br />

completo, diversas matérias, intervindo na nova realidade econômica e política”.<br />

Não diferente a este cenário, bem como, a fim de quebrar um modelo de Estado<br />

militarista e ditatorial, a Constituinte de 1988 buscou e fez surgir o Estado Democrático<br />

de Direito, este, que prima ao mesmo tempo à lei e a soberania popular.<br />

Desta monta, em decorrência da Constituição de 1988, vários trabalhos foram<br />

elaborados a fim de estudar este novel e revolucionário diploma. Tal justificativa tem<br />

213 Direito Constitucional, p. 3.<br />

214 Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 38.<br />

71


como fundamento que ao entrar em vigor, a referida Carta Magna, modifica varias<br />

relações jurídicas públicas e privadas.<br />

Ao analisar a Constitucionalização do Direito, Liana Portilho Mattos dispõe que 215 :<br />

“Inúmeros e valiosos trabalhos têm sito publicados desde o advento da Constituição de<br />

1988, tendo como objeto da análise as alterações ocorridas no ordenamento jurídico<br />

brasileiro em decorrência da nova ordem constitucional em vigor. Esse contexto de<br />

mudança deve ser analisado sempre tendo em mira a particularidade dos momentos<br />

históricos e políticos que perpassaram a década de 80 no Brasil, fazendo com que essa<br />

ruptura com a ordem constitucional anterior – produzida num modelo de estado<br />

descomprometido com os ideais democráticos – ganhe contornos por vezes identificados<br />

como quase radicais”<br />

Flavio Tartuce como corriqueiramente o faz, complementa a análise dos efeitos<br />

da promulgação da Constituição de 1988 quanto segue216 :<br />

“Com o advento da Constituição de 1988, novas diretrizes foram impostas à vida social<br />

de nosso país, além de estabelecer novo parâmetro para interpretação e aplicação do<br />

Direito positivo pátrio. A Constituição brasileira, como norma máxima no âmbito de um<br />

Estado, e fruto de uma forte tendência à "socialização" do Direito que atinge os mais<br />

modernos ordenamentos ocidentais, criou novas regras e fixou novos paradigmas não só<br />

com relação à organização do Estado, mas também sobre outras áreas do Direito. (...)<br />

Além da busca pelo "Estado Social de Direito", a Constituição de 1988 foi fruto de um<br />

momento muito peculiar na História do Brasil, que marcou o fim de um período de<br />

exceção e o nascimento de uma esperança renovada no futuro, uma empolgação<br />

generalizada tomou conta do país, que depois de duas décadas de silêncio forçado,<br />

novamente voltava a sentir os ventos da Democracia.”<br />

Por fim, na obra de Alessandra Elias de Queiroga, ao citar o Jairo Bisol,<br />

observa 217 :<br />

215<br />

Nova ordem jurídico-urbanista, função social da propriedade na prática dos Tribunais, p.15.<br />

216<br />

Direito Civil e a Constituição, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

217<br />

Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 43.<br />

72


“Aplicar o direito, no Estado Constitucional, passa a significar aplicar a ordem jurídica<br />

vigente em sua totalidade, observando suas diretrizes verticalmente, ou seja, desde os<br />

seus princípios mais fundamentais e superiores, suas pautas hierárquicas<br />

constitucionalizadas, até suas regras mais específicas e ordinárias. Ademais, num<br />

sistema jurídico em franca descodificação e deslegalização sensibilizar o jurista para esta<br />

verticalidade do direito vigente passa a ser imprescindível, mesmo porque a função<br />

sistematizadora das partes gerais dos códigos de lei desloca-se para os princípios<br />

jurídicos, especialmente os positivados no corpo da constituição”<br />

É nesta linha, que se faz necessário entender um novo direito a ser aplicado nas<br />

relações privadas, ou seja, não podemos negar a existência da codificação<br />

Constitucional. Instituo este, que indiscutivelmente deve nortear das demais relações<br />

criando assim princípios e regras constitucionais norteadoras para as demais<br />

legislações infraconstitucionais 218 .<br />

Assim, outro adendo importante a ser arrazoado, são os fundamentos e objetivos<br />

da República Federativa do Brasil. Tais pontos são exatamente os alicerces<br />

Constitucionais contemporâneos, que encontram-se regulamentados nos artigos 1° 219 e<br />

3° 220 da Carta Magna Nacional.<br />

Desta forma, temos como fundamento República Federativa Brasileira cinco<br />

estruturas fundamentais que são: a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa<br />

humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e o pluralismo político.<br />

218 Ibid., p.41. “Para chegar à plenitude desta concepção, é necessário mudar a forma de raciocinar do<br />

operador do direito. Não se pode, de forma alguma, relegar à Constituição o papel da Carta de Intenções,<br />

ou de mera folha de papel, na imagem já referida, divulgada por Ferdinand Lassale. O interprete não<br />

pode continuar a vislumbrar os princípios constitucionais como meros princípios políticos, como produto<br />

de uma demagogia não concretizável. Deve-se voltar, aqui, ao conceito de vontade de Constituição, de<br />

força normativa da Constituição, reconhecendo-se o caráter auto-aplicável dos princípios constitucionais<br />

e a importância de realizá-los, de torná-los efetivos.”<br />

219 Art. 1º - “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e<br />

do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a<br />

soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da<br />

livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por<br />

meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”<br />

220 Art. 3º - “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma<br />

sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a<br />

marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem<br />

preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”<br />

73


Todavia, não obstante a importância dos demais elementos, bem como, de suas<br />

aplicabilidades, somente iremos discorrer sobre o fundamento da dignidade da pessoa<br />

humana, que segundo o nosso ver, é, e deve ser contemplado não somente nas<br />

relações patrimoniais, mas sim em todos os ramos do Direito.<br />

Segundo, Leo Van Holthe, a doutrina considera o referido princípio como 221 :<br />

“(...) valor supremo do Estado Democrático de Direito, além de ser fato de legitimação do<br />

exercício do poder estatal, exigindo que a atuação dos poderes públicos e de toda a<br />

sociedade tenha como finalidade precípua o respeito e a promoção da dignidade da<br />

pessoa humana.”<br />

Ululante a disposição que determina e garante a inafastabilidade dos direitos e<br />

garantias constitucionais. Dentre eles, temos a dignidade da pessoa humana, que na<br />

mesma esteira de ordenamentos jurídicos alienígenas, coloca o ser humano como eixo<br />

central do ordenamento jurídico, visando assim sua regulamentação e proteção. 222<br />

Conforme já apontado anteriormente, com a implementação deste fundamento, é<br />

insofismável que invertemos o “vértice do liberalismo econômico” apresentado<br />

anteriormente, pois a dignidade da pessoa humana, ou seja, o ser humano deve ser<br />

protegido e verificado diante de qualquer relação jurídica patrimonial.<br />

Neste mesmo sentido, na obra de Leo Van Holthe, ao citar o Ingo Wolfgang<br />

Sarlet, observa 223 :<br />

“pelo princípio em tela, o ser humano jamais poderá ser tratado como “coisa”, objeto ou<br />

mero instrumento de forma a negar sua condição humana. Constituem, ainda, exigências<br />

da dignidade da pessoa humana, dentre outros: o respeito à autonomia da vontade (i.e.,<br />

à Liberdade que o individuo possui de, ao menos potencialmente, construir sua própria<br />

221<br />

Direito Constitucional, p. 59.<br />

222<br />

Luiz Edson Fachin, Apreciação crítica do Código Civil de 2002 na perspectiva constitucional do direito<br />

civil contemporâneo, p. 17.<br />

223<br />

Direito Constitucional, p. 60.<br />

74


existência); o tratamento isonômico entre seres humanos (princípio da isonomia); a<br />

proteção da integridade física e psíquica; o respeito à identidade pessoal (incluindo a<br />

intimidade, a honra e a imagem dos indivíduos); o direito de propriedade e de uma<br />

moradia digna; o direito de não se submeter a tratamento desumano ou degradante; e<br />

finalmente, a prestação dos direitos sociais e econômicos e culturais ”<br />

Em continuidade do breve estudo principiológico Constitucional, a Carta<br />

Republicana em seu artigo 3° e incisos, arrola os objetivos fundamentais do Estado<br />

Democrático Brasileiro: 224 a) construir uma sociedade livre, justa e solidária; b) garantir o<br />

desenvolvimento nacional; c) erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as<br />

desigualdades sociais e regionais; e d) promover o bem de todos, sem preconceitos de<br />

origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.<br />

Insta salientar, que da mesma forma que trabalhamos os fundamentos da<br />

Republica Federativa, o faremos, da mesma forma com os objetivos fundamentais do<br />

Estado Brasileiro, ou seja, somente pontuaremos um deles, que entendemos mais<br />

relevante.<br />

O objetivo mais complacente para o nosso estudo é o principio da solidariedade,<br />

previsto no inciso primeiro, que objetiva “construir uma sociedade livre, justa e<br />

solidária.” 225<br />

Tal objetivo, visa construir uma sociedade livre, justa e solidária, assim como os<br />

outros demais objetivos, que buscam viabilizar a democracia, economia, social e<br />

cultura. Porem, todos eles como contumácia assegurar e efetividade do principio<br />

fundamental da dignidade da pessoa humana.<br />

Devendo assim, o Estado Brasileiro, seja pelo poder executivo, legislativo ou<br />

judiciário, implementar políticas, com o objetivo final de erradicar patologias<br />

224<br />

Direito Constitucional, p. 61.<br />

225<br />

Art. – “3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma<br />

sociedade livre, justa e solidária;”<br />

75


ocasionadas pela sociedade e promover assim, a aplicação de uma sociedade<br />

inspirada no Estado Democrático.<br />

Um exemplo lídimo desta aplicabilidade, ou seja, a previsão do princípio da<br />

solidariedade foi o Julgamento da Ação Direita de Inconstitucionalidade de relatoria do<br />

Ministro Celso de Mello que pontua:<br />

"O art. 7º da Lei n. 6.194/74, na redação que lhe deu o art. 1º da Lei n. 8.441/92, ao<br />

ampliar as hipóteses de responsabilidade civil objetiva, em tema de acidentes de trânsito<br />

nas vias terrestres, causados por veículo automotor, não parece transgredir os princípios<br />

constitucionais que vedam a prática de confisco, protegem o direito de propriedade e<br />

asseguram o livre exercício da atividade econômica. A Constituição da República, ao<br />

fixar as diretrizes que regem a atividade econômica e que tutelam o direito de<br />

propriedade, proclama, como valores fundamentais a serem respeitados, a supremacia<br />

do interesse público, os ditames da justiça social, a redução das desigualdades sociais,<br />

dando especial ênfase, dentro dessa perspectiva, ao princípio da solidariedade, cuja<br />

realização parece haver sido implementada pelo Congresso Nacional ao editar o art. 1º<br />

da Lei n. 8.441/92." (ADI 1.003-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 1º-8-94, DJ<br />

de 10-9-99)<br />

Por fim, mesmo sem esgotar o tema adequadamente, a Carta Magna de 1988,<br />

de forma inovadora, ou seja, com destaque não vislumbrado anteriormente em âmbito<br />

Nacional, fixou novas diretrizes que regem a atividade econômica e que tutelam as<br />

relações privadas, proclamando, valores fundamentais como a dignidade da pessoa<br />

humana, criando assim, um novo regramento jurídico social, a fim de assegurar o<br />

respeito nas relações humanas, antes de qualquer outro direito.<br />

Apresentada a Constitucionalização, mesmo que de forma superficial, insta<br />

salientar que passada mais de uma década de vigência da Carta Magna Republicana<br />

de 1988, entrou em vigor a Lei n.° 10.406 de 10 de janeiro de 2002, ou seja, o Código<br />

Civil de 2002.<br />

76


Não diferentemente de outros Códigos Civis alienígenas, a presente codificação,<br />

tem como unidade basilar, disciplinar os particulares em suas relações, todavia, como<br />

notório se faz, este, emplacou os mesmos aspectos principiológicos implementados<br />

pela Constituição Federal de 1988.<br />

Assim, não obstante a outros princípios norteadores que iremos discorrer nos<br />

próximos capítulos, podemos notar, como esta cristalino no Código Civil de 2002 a<br />

solidariedade social prevista na Carta Magna.<br />

Nesse sentido, completa o Flávio Tarturce 226 :<br />

“... a mesma onda de solidariedade social que se abateu sobre a Constituição também o<br />

fez sobre o Código Civil, fazendo com que os dois diplomas acabassem por interagir de<br />

uma forma totalmente nova, muito diferente da forma tradicional de convivência entre<br />

eles”<br />

Em decorrência disto, avistamos um novo diploma Civil, nunca visto antes<br />

nacionalmente. Um diploma, que interage com os princípios Constitucionais, ou seja,<br />

aplica e observa referências apregoadas na Carta Maior como a dignidade da pessoa<br />

humana.<br />

Com isso, se faz emergir um apropriado entusiasmo gritante nosso ordenamento<br />

jurídico pátrio, constatando-se uma nova interpretação e aplicação do Direito positivado,<br />

mais especificadamente ao tratarmos do Direito Público e Direto Privado.<br />

Neste raciocínio, no artigo publicado de Flávio Tartuce e Márcio Araújo<br />

Opromolla, ao citar o consagrado filósofo e Tércio Sampaio Ferraz, observam 227 :<br />

226<br />

Direito Civil e a Constituição, p.2, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

227<br />

Direito Civil e a Constituição, p.2, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

77


“A existência das grandes dicotomias em Direito permite que haja uma sistematização<br />

dogmática do ponto de vista do próprio Direito, concebido analiticamente como um<br />

conjunto de normas. Contudo, dada a superbundância dessas normas, uma organização<br />

teórica na forma de uma definição genérica que especifique lógica e rigorosamente seus<br />

diversos tipos, fica bastante prejudicada, para não dizer inviabilizada.”<br />

Antes o expressivo afastamento do direito público a frente do direito privado, e<br />

vice-versa se fazia notório em diversos apontamentos legais e doutrinários. Tal<br />

justificativa tem como fundamento o próprio objeto dos referidos ramos do direito.<br />

Flávio Tartuce e Márcio Araújo Opromolla, pontuam historicamente que 228 :<br />

“A distinção entre o Direito Publico e o Privado não é somente apenas um método<br />

classificatório de ordenação dos critérios de distinção de tipos normativos, mas sim um<br />

poderoso instrumento de sistematização. Tal distinção remonta ao Digesto, 1.1.1.2, no<br />

Corpus Júris Civilis de ULPIANO, que dividiu o Direito em jus publicum e jus privatum. Os<br />

Critérios utilizados para que fosse feita esse disticao se baseava na utilidade da lei: se<br />

fosse de utilidade publica, tratar-se-ia de uma lei de Direito Público; se fosse de utilidade<br />

particular, seria uma lei de Direito Privado.”<br />

Todavia, ao nos defrontar a essa nova realidade jurídica normativa, se fez<br />

necessária a convergência de ambos os ramos de Direito já citados, ou seja, o encontro<br />

naturalístico entre o Direito Constitucional e o Direito Civil.<br />

Tal convergência, ocorre como já pontuado, por mutações naturais condicionada<br />

à própria evolução humana, e como não poderia ser diferente, no próprio ordenamento<br />

jurídico, ocorreram alterações no Direito Privado e Direito Público.<br />

Nasce uma ideologia para o Direito Civil que merece destaque, e nos ensina<br />

Maria Celina Bodin de Moraes 229 :<br />

228<br />

Direito Civil e a Constituição, p.2, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

229<br />

A caminho de um Direito Civil Constitucional, p. 25.<br />

78


“... a separação do direito em público e privado, nos termos em que era posta pela<br />

doutrina tradicional, há de ser abandonada. A partição, que sobrevive desde os romanos,<br />

não mais traduz a realidade econômico-social, nem corresponde à lógica do sistema,<br />

tendo chegado o momento de empreender a sua reavaliação.”<br />

Com a referida anotação podemos extrair que os conceitos de relacionamento<br />

entre o direito público e privado antigos, estão ultrapassados uma vez que ambos, na<br />

sociedade contemporânea, não mais se compreendem em categorias distintas, mas sim<br />

compreender que elas se interpenetram.<br />

Por fim, com a agudeza costumeira de Flavio Tartuce e Marcio Araujo Opromolla,<br />

pontuam que 230 :<br />

“O Direito é um sistema lógico de normas, valores e princípios que regem a vida social,<br />

que interagem entre si de tal sorte que propicie segurança – em sentido lato – para os<br />

homens e mulheres que compõem uma sociedade. E assim sendo, momentos existem<br />

onde esses ramos do Direito se vêem tutelando quase que os mesmos direitos.”<br />

Em decorrência disto, o Direito Civil deixa de ser a base fundamental da<br />

regulação entre os particulares e o intérprete, passa a ter como estrutura basilar não<br />

somente o Direito Civil, mas também aos princípios constitucionais, para a perfeita<br />

harmonia da aplicação do sistema jurídico privado 231 .<br />

Para chegar ao ápice deste conceito, se faz imprescindível rever a forma de<br />

entender e aplicar o direito, não mais vislumbrar a Constituição como uma longe da<br />

realidade, mas trazer ao lado da humanidade os princípios basilares contidos na Carta<br />

Magna, uma vez que através do conteúdo principiológico que se encerra na<br />

Constituição, que é, inegavelmente, o vértice da pirâmide do sistema jurídico 232 .<br />

230<br />

Direito Civil e a Constituição, p.8, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

231<br />

Gustavo Tepedino, Normas Constitucionais e Relações de Direito Civil na Experiência Brasileira, p.<br />

332-3.<br />

232<br />

Alessandra Elias de Queiroga, Os parcelamentos ilegais do solo e a desapropriação como sanção, o<br />

caso dos condomínios irregulares no Distrito Federal, p. 43.<br />

79


Desta monta, concluem Flavio Tartuce e Marcio Araujo Opromolla que 233 :<br />

“A verdade é que o chamado “Direito Civil Constitucional” é apenas uma variação<br />

hermenêutica, uma atitude no ato de interpretar a Lei Civil em confronto com a Lei Maior.<br />

(...) Há assim, não uma inversão do Direito Constitucional sobre o Civil, mas sim uma<br />

interpretação simbiótica entre eles, funcionando ambos para melhor servir o todo<br />

“”Estado + Sociedade (...) Assim, o "Direito Civil Constitucional" nada mais é do que a<br />

harmonização entre os pontos de intersecção do Direito Público e o Direito Privado,<br />

mediante a adequação de institutos que são, em sua essência, elementos de Direito<br />

Privado mas que estão na Constituição, sobretudo em razão das mudanças sociais do<br />

último século e das transformações das sociedades ocidentais.”<br />

De toda esta dilação, podemos afirmar legitimamente que não estamos criando<br />

uma nova codificação, ou ainda, dilatando de forma negligente os liames obrigacionais<br />

privados. Estamos sim, buscando uma aplicabilidade hermenêutica cujo paradigma é o<br />

patamar constitucional, este, que visa garantias individuais e coletivas necessárias para<br />

a manutenção do atual status quo que se encontra a sociedade moderna.<br />

Flávio Tartuce e Márcio Araújo Opromolla, ao citar a Judit Martins Costa<br />

pontuam 234 :<br />

“(...) vivemos o “modelo da comunicação e da complementaridade” em detrimento do<br />

antigo “modelo da incomunicabilidade” entre o direito civil e constitucional. E assim<br />

sendo, Direito Constitucional e Direito Civil são interpretados dentro de um todo e não<br />

isoladamente. Todavia essa interpretação não quer dizer uma fusão de conceitos.”<br />

Assim, a Carta Magna de 1988 é a estrutura basilar do ordenamento jurídico<br />

brasileiro, cabendo assim, as demais leis infraconstitucionais se adequarem<br />

harmoniosamente com este diapasão.<br />

233<br />

Direito Civil e a Constituição, p.8, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

234<br />

Direito Civil e a Constituição, p.9, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

80


Na ocorrência de uma legislação que for claramente oponível aos princípios e<br />

regras constitucionais, tal legislação, deve ser sua aplicabilidade afastada e observando<br />

assim, os ditames constitucionais.<br />

Em poucas palavras, segundo o nosso ver, o “Direito Civil Constitucional” não é<br />

nada mais, que a aplicação de uma nova hermenêutica jurídica ao Direito Civil,<br />

buscando assim, aplicar a norma Constitucional nas relações privadas que se revelem<br />

viciadas pela atual situação social apresentada.<br />

3.2 Os Princípios Norteadores do Código Civil<br />

Apresentada a temática anterior, que segundo nosso ver, se fez necessária para<br />

dar continuidade lógica ao presente estudo, passaremos a tratar no presente momento,<br />

dos princípios fundamentais 235 do Código Civil de 2002.<br />

Objetivando ventilar a presente temática de forma assertiva, temos que citar apor<br />

mais de uma vez, conforme apresentaremos, o festejado Miguel Reale que fecundou os<br />

princípios da eticidade, socialidade e operabilidade na Lei 10.406, de 10 de janeiro de<br />

2002, bem como, o Flávio Tartuce que apresentou o referidos princípios de forma lídima<br />

e dinamizada em uma de suas obras 236 .<br />

Conforme demonstraremos, tais princípios estão intrinsecamente ligados a<br />

codificação constante na Carta Magna, ponto este, que já foi apresentada no Capítulo<br />

anterior.<br />

Insta salientar, como é sabido por todos os Civilistas, que Miguel Reale,<br />

diferentemente de Clóvis de Beviláqua Clóvis não redigiu sozinho o anteprojeto do<br />

Código Civil de 2002.<br />

235<br />

Miguel Reale, Visão Geral do Novo Código Civil, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

236<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002.<br />

81


Desta forma, para elaboração do Anteprojeto do Código Civil de 2002, foi criada<br />

uma Comissão elaboradora e revisora, publicada no Diário Oficial da União, em 7 de<br />

agosto de 1972, tendo como Supervisor o Miguel Reale e como colaboradores<br />

temáticos os ilustres juristas José Carlos Moreira Alves (Parte Geral), tendo, Agostinho<br />

de Arruda Alvim (Direito das Obrigações), Sylvio Marcondes (Atividade Negocial), Ebert<br />

Vianna Chamoun (Direito das Coisas), Clóvis do Couto e Silva (Direito de Família) e<br />

Torquato Castro (Direito das Sucessões).<br />

Assim, retomando ao marco inicial deste capítulo, o Miguel Reale ao tratar dos<br />

princípios fundamentas foi categórico em seu discurso da cerimônia especial à sanção<br />

da Lei que instituiu o novo Código Civil dispôs que 237 :<br />

“...É com a responsabilidade que me advém da longa idade e de aturado estudo que<br />

posso assegurar, senhor Presidente, que vai ser sancionada uma Lei Civil que será da<br />

maior valia para o País, sobretudo em razão dos princípios de eticidade, socialidade e<br />

operabilidade que presidiram a sua elaboração. Sei que não se trata de trabalho perfeito,<br />

tão limitada é a nossa capacidade intelectiva em todos os domínios da cultura, mas estou<br />

convencido de que as falhas ou omissões porventura existentes são de caráter<br />

secundário e de fácil correção. Faço questão de proclamar que os membros da<br />

“Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil” sempre estivemos abertos à<br />

recepção de novos aperfeiçoamentos, toda vez que fomos convidados a nos manifestar<br />

sobre a discussão do Projeto no seio da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.<br />

Após a aprovação de tantas emendas substitutivas e aditivas, trata-se, a bem ver, de<br />

obra transpessoal, fruto das contribuições recebidas de toda a comunidade jurídica<br />

brasileira.<br />

Desta forma, como podemos notar os referidos princípios fundamentais são de<br />

imensurável valia, pois sem a observação destes, não poderíamos interpretar e verificar<br />

de forma correta o Direito Civil 238 , bem como, os seus resultados casuísticos para a<br />

sociedade.<br />

237 Discurso perante Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

238 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002, p. 54.<br />

82


Acrescenta de forma sutil José Renato Nalini 239 :<br />

“É um código em que a ética deixa de ser retórica para se converter num ingrediente<br />

concreto de todas as relações. Substitui-se o rigor da lei pelo tempero da eqüidade, da<br />

boa-fé, da confiança, da solidariedade e de outros princípios éticos...”<br />

3.2.1 Princípio da operabilidade<br />

Observada a relevância do tema, passamos a pontuar os referidos princípios,<br />

iniciando assim pela operacionalidade, que tem como objeto naturalístico duas frentes.<br />

Preliminarmente, temos a frente da concretude que busca um novel sistema de<br />

hermenêutica baseado em cláusulas gerais, e em um segundo momento temos a<br />

concepção da simplicidade, que visa a simplificação da codificação.<br />

Objetivando elucidar prefacialmente a frente da simplicidade, transcrevo a<br />

anotação exemplificativa do Flavio Tartuce que esclarece e demonstra este principio 240 :<br />

“Como exemplo da adoção do principio da operabilidade ou simplicidade, podemos citar<br />

a distinção que consta na codificação novel em relação aos institutos da prescrição<br />

extintiva e da decadência (arts. 189 a 221 do CC), tópico que trazia grandes duvidas pela<br />

lei civil anterior. Agora, mais facilitadas as previsões legais destes institutos, poderá o<br />

estudioso do direito entender muito bem as distinções existentes e identificar com<br />

facilidade se determinado prazo é prescricional ou decadencial. A decadência ganhou um<br />

Tratamento especifico entre os arts. 207 a 211 do atual Código Civil.”<br />

Acrescenta ainda o Miguel Reale, que este princípio além de buscar a elucidação<br />

da legislação Civil, busca ainda, acabar com as disparidades interpretativas do referido<br />

texto legal 241 .<br />

239 “Novo tempo, novo código”, Jornal da Tarde, 08/01/03, p. A2<br />

240 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002, p. 65.<br />

83


Por fim, quanto à frente da simplicidade não há muitas críticas a serem<br />

pontuadas ou mesmo tecidas, todavia no que tange à linha da concretude, esta sim,<br />

passa a ser detentora de severas críticas referentes sua aplicabilidade.<br />

Conforme trasladado na obra de Flávio Tartuce 242 , bem como, em outras<br />

doutrinas, quanto tratamos deste princípio, encontrávamos uma das maiores críticas ao<br />

Código Civil. Assim ao lançarmos mão desta de codificação denominada por parte da<br />

doutrina de cláusulas gerais, criaríamos uma nova linhagem de juízes ditadores.<br />

Tal julgamento, não seria a interpretação mais assertiva segundo o nosso ver,<br />

pois em primeiro um momento a interpretação do codex em questão, deve ter como<br />

inspiração fundamental a visão já vastamente discursada pelo Miguel Reale na teoria<br />

tridimensional 243 do direito e do culturalismo jurídico.<br />

Neste mesmo sentido, acrescenta o Flavio Tartuce 244 :<br />

“...o atual Código Civil de 2002 deve ser tratado como uma nova realidade, inspirada na<br />

melhor teoria do seu principal idealizador. Em vários preceitos da condição, percebe-se o<br />

transbordamento da visão tridimensional do direito e do culturalismo jurídico. ”<br />

241 Visão Geral do Novo Código Civil, Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto .asp? id=<br />

2718>, Acesso em: 10/06/2008. “Por outro lado, pôs-se termo a sinonímias que possam dar lugar a<br />

dúvidas, fazendo-se, por exemplo distinção entre associação e sociedade, Destinando-se aquela para<br />

indicar as entidades de fins não econômicos, e esta para designar as de objetivos econômicos.”<br />

242 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002, p. 66.<br />

243 Acreditamos que se faz necessário, mesmo que de forma resumida, analisar o conceito da teoria<br />

tridimensional, do direito e assim, para o professor Miguel Reale: “Nas últimas quatro décadas o problema<br />

da tridimensionalidade do Direto tem sido objeto de estudos sistemáticos, até culminar numa teoria , à<br />

qual penso ter dado uma feição nova, sobretudo pela demonstração de que: a) onde quer que haja um<br />

fenômeno jurídico, há sempre e necessariamente, um fato subjacente (fato econômico, geográfico,<br />

demográfico, de ordem técnica e etc.); um valor que confere determina significação a esse fato,<br />

inclinando ou determinando a ação dos homens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou<br />

objetivo; e, finalmente uma regra ou norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles<br />

elementos ao outro, o fato ao valor; b) tais elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem<br />

separados um dos outros , mas coexistem numa unidade concreta; c) mais ainda, esses elementos ou<br />

fatores não só se exigem reciprocadamente, mas atuam como elos de um processo (já vimos que o<br />

Direito é uma realidade histórico- cultural) de tal modo que a vida do Direito resulta da intenção dinâmica<br />

e dialética dos três elementos que a integram.” Estudos Preliminares do Código Civil, p.65.<br />

244 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002, p. 66<br />

84


Já em um segundo momento, podemos notar que as cláusulas abertas, ou assim<br />

denominadas também de cláusulas gerais 245 , podem ser um instrumento eficaz para a<br />

aplicação da norma ao caso concreto 246 .<br />

Ao se deparar com a temática em tela, Judith Martins Costa pontua de forma<br />

brilhante que as cláusulas gerais são exatamente a flexibilidade possível e adequada<br />

para a aplicação do dispositivo legal, bem como, objetiva afastar o imobilismo da<br />

aplicação da norma e por fim, utiliza o mínimo o princípio da tipicidade 247 .<br />

Corroborando neste mesmo sentido, Ruy Rosado de Aguiar Júnior coloca 248 :<br />

"...do emprego da cláusula geral decorre o abandono do princípio da tipicidade e fica<br />

reforçado o poder revisionista do Juiz, a exigir uma magistratura preparada para o<br />

desempenho da função, que também deve estar atenta, mais do que antes, aos usos e<br />

costumes locais".<br />

Por fim, mas ainda reafirmando este entendimento, José Renato Nalini anota 249 :<br />

245<br />

Visão Geral do Novo Código Civil, Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2718>,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

246<br />

Discurso perante Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil. Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008. “Não faltaram, todavia, críticas à aprovação<br />

do novo Código, oriundas de três ordens de motivos. A primeira não merece senão breve alusão, porque<br />

relativa a jovens bacharéis, jejunos de experiência jurídica, que se aventuraram a formular juízos<br />

negativos sobre uma lei fundamental que nem sequer leram ou viram, somente pelo fato de seu projeto<br />

originário datar de cerca de trinta anos. Compreende-se que as inteligências juvenis, entusiasmadas com<br />

as novidades da Internet ou a descoberta do genoma, tenham decretado a velhice precoce do novo<br />

Código, por ter sido elaborado antes dessas realizações prodigiosas da ciência e da tecnologia, mas os<br />

juristas mais experientes deviam ter tido mais cautela em suas afirmações, levando em conta a natureza<br />

específica de uma codificação, a qual não pode abranger as contínuas inovações sociais, mas tão<br />

somente as dotadas de certa maturação e da devida “massa crítica”, ou já tenham sido objeto de lei. A<br />

experiência jurídica, como tudo que surge e se desenvolve no mundo histórico, está sujeita a imprevistas<br />

alterações que exigem desde logo a atenção do legislador, mas não no sistema de um código, mas sim<br />

graças a leis especiais, sobretudo quando estão envolvidas tanto questões de direito quanto de ciência<br />

médica, de engenharia genética, etc. exigindo medidas prudentes de caráter administrativo, tal como se<br />

dá, por exemplo, no caso da fecundação in vitro. Em todos os países desenvolvidos, tais fatos são<br />

disciplinados por uma legislação autônoma e específica, inclusive nos Estados Unidos da América e na<br />

Inglaterra, nações por sinal desprovidas de Código Civil, salvo o caso singular do Estado da Luisiana na<br />

grande república do norte, fiel à tradição do direito francês.”<br />

247<br />

Projeto do Código Civil – As obrigações e os contratos, p. 20.<br />

248<br />

O Direito Privado como um "Sistema em Construção" – As cláusulas gerais no Projeto do Código Civil<br />

Brasileiro, p. 29.<br />

249<br />

Novo tempo, novo código, Jornal da Tarde, 08/01/03, p. A2.<br />

85


“Não é por acaso que o código tenha adotado inúmeras cláusulas gerais, de conteúdo<br />

flexível, de plasticidade que terá forma definitiva a partir da consciência judicial. O juiz é<br />

que vai preencher essas cláusulas abertas, necessariamente fluidas, com o recheio da<br />

concreção. A realidade da vida precisa preencher as fórmulas e o juiz cuidará de<br />

solucionar as demandas atento à realidade circundante, nunca mais como um espectador<br />

inerte e frio da letra da lei”.<br />

Desta forma, em decorrência de todo o exposto, a nosso ver, a utilização das<br />

cláusulas gerais como instrumento legislativo, são ferramentas normativas que<br />

corrobora com o princípio ético orientador do juiz. Este, que deve ter um trabalho prévio<br />

e mais exaustivo, para determinar qual a melhor solução para o caso concreto, bem<br />

como, busca ainda este instituto, a reestruturação das normas jurídicas de acordo com<br />

a atividade social, com a evolução histórica.<br />

3.2.2 Princípio da Eticidade<br />

Com o intuito de elucidar os princípios fundamentais do Código Civil, passaremos<br />

a discorrer neste momento, sobre o princípio da eticidade. Este, que na mesma esteira<br />

do princípio anterior, encontra-se convergência na teoria tridimensional do direito, bem<br />

como, ao sistema de janelas abertas 250 na aplicação do codex em tela.<br />

Vale ressaltar, que este princípio está intrinsecamente ligado a aos valores<br />

éticos 251 aplicados ao Direito Civil 252 , bem como, com a boa-fé objetiva prevista no artigo<br />

113 do Código Civil de 2002.<br />

250<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002, p. 55.<br />

251<br />

O professor Rizzato Nunes, ao tratar da justiça em sua obra, acaba segundo o nosso ver, esbarrando<br />

na questão da ética e exemplifica com exatidão esta problemática “Jaider Lopes dos Reis Lemes,<br />

invalido, por intermédio de sua mãe requereu o beneficio que se assegura a Constituição Federal (art.<br />

203, V) de um salário mínimo mensal, que à época era de R$ 120,00 reais. A lei referida no texto<br />

Constitucional diz que a pessoa invalida pode receber o benéfico, desde que a renda per capita da família<br />

não exceda 25% do salário mínimo, ou, no caso, R$ 30,00 reais. Quando teve inicio o processo<br />

administrativo de Jaider junto ao INSS, seu pai recebia a “polpuda soma” de R$ 169,20 mensais. Com<br />

esses R$ 169,20 o pai de Jaider “sustentava” cinco pessoas incluindo ele próprio, invalido. O posto do<br />

86


Assim, ao analisarmos este instituto, acredita-se estar de frente com uma das<br />

maiores inovações do Código Civil no que tange as questões contratuais. Tal<br />

justificativa tem como fundamento, o desprendimento dos conceitos anteriores<br />

apregoados pelo individualismo privado baseado nos Códigos Civis Napoleônico<br />

Alemão 253 .<br />

Todavia, não estamos apregoando uma doutrina desprendimento total da<br />

aplicação da norma, alertamos para este fato, pois como é sabido há na atualidade uma<br />

escola denominada de Direito Alternativo, porém não com a mesmo ânimo da década<br />

de noventa.<br />

Segundo consta, o Direito Alternativo teve seu início público após um artigo<br />

veiculado em 25 de outubro de 1990, pelo Jornalista Luiz Makuf, que tinha como<br />

destaque “Juízes Gaúchos colocam o direito acima da Lei”. Porém, o seu início fático<br />

ocorreu em outubro de 1990, na realização do I Encontro Internacional de Direito<br />

Alternativo, na cidade de Florianópolis, Estado de Santa Catarina, nos dias 04 a 07 de<br />

setembro de 1991, bem como, com o lançamento posterior do livro Lições de Direito<br />

Alternativo pela editora Acadêmica. 254<br />

Tal escola, busca a aplicação do direito com base em outros elementos como<br />

desigualdade social, globalização, competição, população crescente e violência, com<br />

INSS, tão cioso de suas obrigações e prestador de serviço publico essencial, negou pleito, pois efetuado<br />

o calculo previsto na lei descobriu que 25% do salário do pai de Jaider montavam a – assombroso – R$<br />

33,08, acima, portando, do teto legal. Alias, muito acima: R$ 3,84! A mãe de Jaider recorreu a 5° Junta<br />

de Recursos do Distrito Federal e ganhou o Beneficio. Contudo, a divisão de recursos e benefícios do<br />

Ministério da Previdência – olha ai nosso cioso serviço publico... – recorreu à outra superior instancia. A<br />

2° Coordenadoria de Consultoria Jurídica, por incrível que isso possa parecer, entendeu que: “a família<br />

do autor (...) não é uma família miserável, ou seja, incapaz de promover a manutenção de pessoa<br />

portadora de deficiência ... ” Rizzatto Nunes, Manual de filosofia do direito, p. 238.<br />

252<br />

Miguel Reale, Visão Geral do Novo Código Civi. Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

253<br />

Miguel Reale, A Boa fé no Código Civil, Disponível em: , Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

254<br />

Rodrigo Klippel, Direito Alternativo, Disponível em ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

87


intuito final de atingir a justiça 255 . Porém, segundo o nosso ver, este, não seria o<br />

caminho mais correto a se trilhar, pois, em pouquíssimas palavras o conceito de justiça<br />

é um sentimento subjetivo e histórico 256 257 , bem como, a afastamento da aplicação<br />

normativa é um ultraje ao Estado de Democrático apregoado na Carta Magna 258 .<br />

Após esta intersecção, que segundo nosso ver se fez necessária, bem como,<br />

retomando ao princípio da eticidade, preceitua o referido artigo 113 do Código Civil: “os<br />

negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua<br />

celebração”.<br />

Assim, o dispositivo em tela deve ser interpretado no seguinte contexto segundo<br />

o Flávio Tartuce 259 :<br />

“Esse dispositivo repercute profundamente nos contratos, mantendo relação direta com o<br />

princípio da função social, pois, além da menção à boa-fé (função de interpretação), traz<br />

a idéia de que os negócios jurídicos devem ser interpretados de acordo com o meio<br />

social que os cerca.”<br />

Para Cezar Peluso 260 , este artigo:<br />

255<br />

Rodrigo Klippel, Direito Alternativo, Disponível em ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

256 Nestes termos professor Miguel Reale acrescenta: “...os neopositivistas ou neo-empiristas<br />

consideram que não se pode dizer que a procura do fundamento do Direito corresponda a um problema:<br />

a justiça é antes uma aspiração emocional suscetivel de inclinar os homens de lugar e de tempo. Sendo<br />

impossível decidir-se por qualquer delas com base em dados verificáveis, a justiça é, do ponto de vista da<br />

ciência, em pseudoproblema, o que não impede que, do ponto de vista da Moral, seja uma exigência de<br />

ordem pratica, da natureza afetiva ou ideológica. (...) Em virtude desta conexão entre a história e a<br />

justiça, pode-se dizer, sem pretensão de ter alcançado uma idéia definitiva de justiça, que esta implica<br />

“constante coordenação racial das relações intersubjetivas, para cada homem possa realizar livremente<br />

seus valores potenciais visando atingir a plenitude de seu ser pessoal, em sintonia com os da<br />

coletividade” Estudos Preliminares do Código Civil, p.376 – 379.<br />

257<br />

No mesmo sentido o festejado professor Tércio Sampaio Ferraz Junior conforme palestra ministrada<br />

no curso de mestrado realizada em 22 de agosto de 2007, na Faculdade Autônoma de Direito – FADISP<br />

afirma que a questão da justiça esta relacionada com a relação subjetiva pessoal e histórica.<br />

258<br />

Art. 1º - “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e<br />

do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a<br />

soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da<br />

livre iniciativa;V - o pluralismo político.”<br />

259<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002, p. 56.<br />

260<br />

Código Civil comentado, p. 86.<br />

88


“... Trata-se de regra de interpretação que milita a favor da segurança das relações<br />

jurídicas. (...) A manifestação da vontade não subsiste apenas sobre si mesma, pois<br />

subentende-se que a ela estão agregadas as conseqüências jurídicas decorrentes, ainda<br />

que as partes delas queiram afastar-se. Também isso compreende o dever de<br />

colaboração das partes, a fim de que o negocio jurídico produza efeitos que lhe são<br />

próprios, não podendo uma das partes impedir ou dificultar a ação da outra no<br />

cumprimento de suas obrigações, ou seja, devem as partes agir com lealdade e<br />

confiança.”<br />

Para a Maria Helena Diniz 261 :<br />

“Interpretação baseada na boa-fé e nos usos do local de sua celebração. O princípio da<br />

boa-fé está intimamente ligado não só à interpretação do negócio jurídico, pois, segundo<br />

ele, o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer sobre a intenção inferida da<br />

declaração de vontade das partes, mas também ao interesse social da segurança das<br />

relações jurídicas, uma vez que as partes devem agir com lealdade e também de<br />

conformidade com os usos do local em que o ato negocial foi por elas celebrado”<br />

Com efeito salientou Gustavo Tepedino ao citar Orlando Gomes 262 :<br />

“Consagra-se (...) a concepção objetivista da interpretação (...) explicada pela<br />

necessidade de proteger a legítima expectativa de cada um dos contraentes e de não<br />

perturbar a segurança (...). Deve-se investigar os possíveis sentidos da declaração e<br />

acolher o que o destinatário podia e devia atribuir-lhe com fundamento nas regras<br />

comuns da linguagem e no particular modo de se comunicar e se entender com a outra<br />

parte”.<br />

Na visão de Teresa Negreiros, no direito patrimonial o princípio basilar é o da<br />

dignidade humana, tal entendimento é citado por Gustavo Tepedino263 :<br />

“a boa-fé, como princípio que é, há de configurar-se abstratamente, ainda que reconheça<br />

que sua aplicação não admite um raciocínio do tipo lógico- subsuntivo, mas que será<br />

261 Código Civil Anotado, p. 118.<br />

262 Código Civil Interpretado, p. 230.<br />

263 Código Civil Interpretado, p. 230.<br />

89


necessariamente influenciada pelas circunstâncias que informem a relação concreta<br />

sobre a qual incida. (...) Nossa hipótese é a de que o quadro principiológico previsto<br />

constitucionalmente inverte, na medida em que elege a pessoa humana como ápice<br />

valorativo do sistema jurídico, a relação de subordinação entre o direito à autonomia<br />

privada e o dever de solidariedade contratual, passando o contrato a expressar uma<br />

ordem de cooperação em que os deveres se sobrepõem aos direitos; a pessoa solidária,<br />

ao indivíduo solitário”.<br />

Nesta monta como ponto de equilíbrio da interpretação entre os negócios<br />

jurídicos subjetivos ou objetivos, tem-se a boa-fé objetiva. Tal como discorre Gustavo<br />

Tepedino em sua obra, a boa-fé objetiva fora introduzida no nosso ordenamento<br />

jurídico, por meio do Código de Defesa do Consumidor este, implantado e solidificado<br />

paulatinamente por entendimento da doutrina e jurisprudência.<br />

O artigo em tela traz à baila, este longo processo de conscientização e com isto<br />

o nascedouro da teoria contratual, cujo suas funções elementares são: I - função<br />

interpretativa dos contratos; II - função restritiva do exercício abusivo de direitos<br />

contratuais; e III - função criadora de deveres anexos ou acessórios à prestação<br />

principal, como o dever de informação e o deveres anexos ou acessórios à prestação<br />

principal, como o dever de informação e o dever de lealdade. 264<br />

Poderíamos ainda, discorrer muitos outros artigos do Código Civil de 2002, como<br />

o artigo 422 265 , 187 266 e 307 267 , ou ainda, vários Enunciados 268 aprovados na Jornada de<br />

264<br />

Gustavo Tepedino, Código Civil Interpretado, p. 230 - 231.<br />

265<br />

Art. 422. – “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua<br />

execução, os princípios de probidade e boa-fé.”<br />

266<br />

Art. 187. – “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede<br />

manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons<br />

costumes.”<br />

267<br />

Art. 307. – “Só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade, quando feito por<br />

quem possa alienar o objeto em que ele consistiu.”<br />

268<br />

Enunciado n. 25 - CNJF: “o art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo julgador, do<br />

princípio da boa-fé nas fases pré e pós-contratual”; 24 - Art. 422: em virtude do princípio da boa-fé,<br />

positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de<br />

inadimplemento, independentemente de culpa; e 26 - Art. 422: a cláusula geral contida no art. 422 do<br />

novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a<br />

boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento leal dos contratantes.<br />

90


Direito Civil promovido pelo Conselho da Justiça Federal, que vão de encontro ao<br />

princípio da eticidade, ou seja, de frente ao princípio da boa-fé objetiva.<br />

Não obstante, bem como, sem esgotar devidamente o tema, entendemos que o<br />

princípio da eticidade é uma das mais importantes fontes interpretativas do novel Direito<br />

Civil inserido neste século.<br />

Tal justificativa, tem como fundamento, que estamos nos afastando da visão<br />

imperativa do Direito exclusivamente positivado ou “Kelseriana” 269 , bem como,<br />

aplicando todos os fundamentos já apregoados pelos Doutros Professores já citados,<br />

ou seja, a interpretação da Legis com base a relação direita com o princípio da função<br />

social, a relação de subordinação entre o direito à autonomia privada, o dever de<br />

colaboração das partes. Deve-se ainda, observar também, o interesse social da<br />

segurança das relações jurídicas, assim como, a eleição da pessoa humana estrutura<br />

basilar do atual sistema jurídico.<br />

3.2.3 Princípio da Socialidade<br />

Superado os dois princípios já apresentados, bem como, colocando termo final<br />

nos estudo principiológico fundamental do Código Civil de 2002, trataremos do princípio<br />

socialidade, este, que é uma das estruturas basilares da função social da propriedade<br />

no Direito Civil 270 .<br />

Insta salientar, que tal princípio traz consigo efeitos não somente para os Direitos<br />

de Reais, tema e objeto da presente monografia, mas sim, para todo o Direito Civil<br />

conforme demonstraremos abaixo 271 .<br />

269<br />

Flávio Tartuce.Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo<br />

a Nova Codificação Disponível em: Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

270<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002, p. 58.<br />

271<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007.<br />

91


Todavia, antes de arrolar qualquer conceito e/ou definição, devemos “ter em<br />

mente” que tal princípio fundamental, busca a valoração do coletivo em prejuízo ao<br />

individual, ou seja, estamos de ante de uma elevação das relações privadas, onde<br />

outros elementos sociais e econômicos são “pesados” dentro de um negócio jurídico<br />

privado que podemos denominar de “simples”.<br />

Neste mesmo contexto, afirma categoricamente Flávio Tartuce 272 :<br />

“(...) é interessante lembrar que o Código Civil de 2002 procura superar o caráter<br />

individualista que imperava na codificação anterior, valorizando a palavra dos nós, em<br />

detrimento da palavra eu.”<br />

Ao adentrar no estudo da socialidade, devemos obrigatoriamente fazer uma<br />

brevíssima passagem do segundo capítulo, ou seja, uma releitura do capítulo da<br />

“Constitucionalização do Direito Civil”.<br />

Tal justificativa tem como fundamento dois pontos relevantes, que vão de<br />

encontro ao princípio da socialidade e são convergentes entre si, ou seja, acabam<br />

obrigatoriamente indo de encontro um ao outro.<br />

Prefacialmente, temos o novo procedimento hermenêutico introduzido pela teoria<br />

da “Constitucionalização do Direito Civil”, instrumento este, que é obrigatório para a<br />

devida interpretação do codex em tela, a luz da Carta Magna.<br />

Em segundo momento, temos o princípio constitucional da solidariedade social,<br />

que inicialmente foi preconizado na Constituição de 1988 e emplacou no Código Civil de<br />

2002, tornando assim, praticamente obrigatória a interação do Direito Constitucional no<br />

Direito Civil. 273<br />

272<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002, p. 58.<br />

273<br />

Direito Civil e a Constituição, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008, p. 2.<br />

92


Neste sentido, em artigo publicado, Flávio Tartuce, ao citar Gustavo Tepedino<br />

pioneiro nesta temática, observa:<br />

“há que se ler atentamente o Código Civil de 2002 na perspectiva civil-constitucional,<br />

para se atribuir não só às cláusulas gerais, aqui realçadas por sua extraordinária<br />

importância no sistema, mas a todo o corpo codificado um significado coerente com as<br />

tábuas de valores do ordenamento, que pretende transformar efetivamente a realidade a<br />

partir das relações jurídicas privadas, segundo os ditames da solidariedade e da justiça<br />

social 274 ”<br />

Desta forma, conforme podemos notar, ambos os institutos supracitados buscam<br />

– neste ponto que alertamos convergência -- a aplicação dos princípios fundamentas do<br />

direito previstos na Constituição Federal de 1988, ainda sim, sem afastar<br />

arbitrariamente – conforme já apresentamos – os vínculos obrigacionais privados.<br />

Ultrapassada esta pequena releitura, podemos afirmar que em decorrência de<br />

todos os fatores apresentados até então, estamos diante de um “novo olhar” das<br />

privadas. Olhar este, que apesar de constar no ordenamento jurídico a longa data 275 ,<br />

somente foi enfatizado de forma lidíma e clara no Código Civil de 2002.<br />

Ao fazermos menção a todos os fatores apresentados até então, estamos<br />

pontuando vários elementos importantes, que ocorreram em momentos históricos<br />

diferentes – como as revoluções burguesas e a atual realidade econômica e social –<br />

porém necessários para o resultado casuístico e atual do principio da socialidade.<br />

274 Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo a Nova<br />

Codificação, Disponível em: Acesso em: 10/06/2008,<br />

p.12.<br />

275 Decreto- Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, Art. 5 o - Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins<br />

sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.<br />

93


Corroborando esta idéia, Flávio Tartuce, ao citar a Judith Martins-Costa,<br />

pontua 276 :<br />

“dúvidas não há de que o Direito Civil em nossos dias é também marcado pela<br />

socialidade, pela situação de suas regras no plano da vida comunitária. A relação entre a<br />

dimensão individual e a comunitária do ser humano constitui tema de debate que tem<br />

atravessado os séculos, desde, pelo menos, Aristóteles, constituindo, mais propriamente,<br />

um problema de filosofia política, por isso devendo ser apanhado pelo Direito posto<br />

conforme os valores da nossa – atual – experiência jurídica”<br />

Acrescenta ainda, o próprio Flavio Tartuce 277 :<br />

“Isso diante das inúmeras modificações pelas quais passou a sociedade: ouve o<br />

incremento dos meios de comunicação, a estandardização dos negócios, o surgimento<br />

da sociedade de consumo em massa a e valorização da pessoa humana como centro do<br />

Direito Privado, trazendo uma nova realidade que atingiu os alicerces de praticamente<br />

todos os instrumentos privados.”<br />

Desse modo, podemos verificar que tal princípio, foi o resultado natural das<br />

relações sociais. Onde, sem a observância deste, não podemos ter uma sociedade<br />

mais equilibrada para fins de desenvolvimento elementos inerentes da própria<br />

sociedade, como elementos econômico, social e cultural.<br />

Porém, para chegarmos ao ápice da importância deste princípio, devemos<br />

pontuar duas citações de autores distintos constantes no Livro do Flávio Tartuce,<br />

todavia ambas de muita relevância.<br />

A primeira é a do Miguel Reale, que acentua em sua célebre frase, a relevância<br />

da implementação deste princípio 278 :<br />

276 Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo a Nova<br />

Codificação, Disponível em: Acesso em: 10/06/2008,<br />

p.10.<br />

277 Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo a Nova<br />

Codificação, Disponível em: Acesso em: 10/06/2008,<br />

p.10.<br />

94


“...se não houve a vitória do socialismo, houve o triunfo da socialidade.”(nossos<br />

grifos)<br />

Já a segunda citação do Gerson Luiz Carlos Branco, que transcreve a<br />

importância da aplicabilidade presente temática de forma brilhante:<br />

“a socialização dos modelos jurídicos é uma das características mas marcantes do novo<br />

Código e seu significado é o da prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, e<br />

da revisão dos direitos e deveres dos cinco personagens do direito privado tradicionais:<br />

“o proprietário, o contratante, o empresário, o pai de família e o testado.”<br />

Destas duas citações, bem como, de todo o apresentado até então, podemos ter<br />

por entendimento correto que a socialidade é o “contra peso” imposto à sociedade, que<br />

deve ser implementado nos termos da sua inspiração, bem como, aplicado em todo o<br />

ordenamento jurídico civilista.<br />

Assim, objetivando demonstrar os reflexos do princípio da socialidade, não<br />

somente no direito de propriedade, mas sim no Direito Civil, passaremos a estudar, a<br />

presente temática – assim como fez o Flávio Tartuce – nos ramos mais importantes do<br />

Codex em tela.<br />

Desta forma, iniciaremos o estudo do liame principiológico da socialidade com os<br />

principais institutos do Direito Civil, correlacionando prefacialmente este, com a<br />

propriedade e a posse, todavia, sem esgotar adequadamente o tema, tendo em vista<br />

que aprofundaremos a presente temática no próximo capítulo.<br />

A propriedade está devidamente resguardada pelo princípio da socialidade, no<br />

Novo Código Civil, ou seja, há expressa disposição legal prevista no artigo 1228, § 1.°,<br />

da Lei 10.406/2002 quanto da função social da propriedade.<br />

278 O Projeto do Novo Código Civil, p. 7.<br />

95


Dispõe a referida legis:<br />

“Art. 1.228, § 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas<br />

finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade<br />

com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio<br />

ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das<br />

águas.”<br />

Desta forma, podemos afirmar que diferentemente do Código Civil de 1916 279 , a<br />

propriedade é exercida de forma limitada, com o intuito final, da observância das<br />

questões relacionadas às atividades econômicas e sociais que recaírem sobre este<br />

imóvel.<br />

Neste mesmo sentido, o Guilherme Calmon Nogueira da Gama 280 nos ensina:<br />

“Neste sentido, o art. 1228, do Código Civil de 2002, ao tratar dos poderes do<br />

proprietário, substituiu a noção de que “a lei assegura ao proprietário”, contida no art.<br />

524, do Código Civil revogado, de conteúdo jusnaturalista, em que a norma se limita a<br />

reconhecer o poder a ela preexistente, pela idéia de que “o proprietário tem a faculdade”,<br />

mais técnica e condizente com a idéia de limitação de poderes do proprietário. Ainda, §<br />

1 o do referido artigo, do texto codificado, ao vincular o exercício do direito de propriedade<br />

às suas finalidades econômicas e sociais, visa perseguir a tutela constitucional da função<br />

social, dando um conteúdo jurídico ao aspecto funcional das situações proprietárias”<br />

Porem acrescenta o Flávio Tartuce 281 :<br />

“Mais do que mera função social, o dispositivo prevê a função sócio-ambiental do<br />

domínio, não podendo o exercício do direito de propriedade gerar danos ao ambiente<br />

natural, cultural ou artístico.”<br />

279<br />

Art. 524 – “A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los<br />

do poder de quem quer que injustamente os possua.”<br />

280<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 56.<br />

281<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002, p. 56.<br />

96


Tal apontamento, segundo o nosso ver, é de alta relevância, bem com, está<br />

intrinsecamente ligado, ao dispositivo constitucional previsto no artigo 225, § 3 o , que<br />

estabelece as regras das regras aplicadas Constitucionalmente para as questões<br />

relacionadas ao Meio Ambiente 282 .<br />

Desta monta, como podemos notar o princípio da função social da propriedade,<br />

ou seja, o princípio da socialidade, está devidamente transladado no Código Civil, nos<br />

mesmos termos propostos na Cata Magna como nos artigos 5º, incisos XXII e XIII; 170,<br />

III e 225 do Texto Maior.<br />

Em um segundo momento, temos a função social da posse, que entendemos,<br />

assim como o Flavio Tartuce 283 , que esta é mera exteriorização do direito de<br />

propriedade e assim emplacando automaticamente ao princípio da socialidade.<br />

Neste mesmo diapasão, Guilherme Calmon Nogueira da Gama 284 :<br />

“Tradicionalmente só pode haver posse onde haja propriedade; se não houver<br />

propriedade, não poderá haver posse. A posse é a aparência de propriedade; o<br />

possuidor pratica atos inerentes ao de um proprietário, ainda que não o seja. (...) A<br />

função social da propriedade e a função social da posse, na verdade são os dois lados<br />

da de uma mesma moeda. A posse, como conteúdo do direito, é indispensável à<br />

propriedade para que esta cumpra sua função social e receba s proteção social. ”<br />

Não obstante, insta salientar, que apesar da posse e da propriedade serem<br />

correlatas entre si, elas são colocadas e tratadas de forma separadas, ou seja,<br />

devemos estudar ambos os institutos porém de forma autônoma. Tal justificativa tem<br />

como fundamento que podemos pontuar a função social da posse sem tratar da<br />

propriedade.<br />

282 Art. 225. – “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do<br />

povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de<br />

defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 3º - As condutas e atividades<br />

consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções<br />

penais e administrativas, independentemente.”<br />

283 Introdução Crítica ao Código Civil, p. 366.<br />

284 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 64 –<br />

65.<br />

97


Neste sentido, assim como nos ensina o Flávio Tartuce é possível que um<br />

determinado sujeito possa ter a posse de um determinado bem – sendo assim somente<br />

mero detentor – e tirar algum proveito deste 285 .<br />

Ademais temos artigos 1.238, parágrafo único 286 , e 1.242, parágrafo único 287 , do<br />

Código Civil de 2.002 que enfatizam a função social da posse pela diminuição dos<br />

prazos da usucapião, bem como, a previsão dos parágrafos 4º e 5º do artigo 1.228 288<br />

que inova trazendo a Desapropriação Judicial por Posse-Trabalho 289 .<br />

Neste diapasão, Flavio Tartuce pontua:<br />

“Mesmo a posse recebe uma função social, já que o Código prevê a diminuição dos<br />

prazos de usucapião quando estiver configurada a “posse-trabalho”, situação fática em<br />

que o possuidor despendeu tempo e labor na ocupação de determinado imóvel. A nova<br />

codificação valoriza aquele que “planta e colhe”, o trabalho da pessoa natural, do cidadão<br />

comum. Tais regras podem ser captadas pela leitura dos arts. 1.238, parágrafo único, e<br />

1.242, parágrafo único, do Código Civil de 2.002.”<br />

285 Introdução Crítica ao Código Civil., p. 366. “...na verdade , mesmo sendo exteriorização da<br />

propriedade, o que também comprova sua função social a posse com ela não se confunde. É cediço que<br />

determinada pessoa pode ter a posse sem ser proprietária do bem, já que ser proprietário é ter o domínio<br />

da coisa. A posse significa apenas ter a disposição do da coisa, utilizando-se dela e tirando-lhe os frutos<br />

com fins socioeconômicos”<br />

286 Art. 1.238. – “Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um<br />

imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que<br />

assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.<br />

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver<br />

estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.”<br />

287 Art. 1.242. - “Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente,<br />

com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos. Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto<br />

neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do<br />

respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua<br />

moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.”<br />

288 Art. 1.228. – “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do<br />

poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 4o O proprietário também pode ser privado<br />

da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais<br />

de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou<br />

separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5o<br />

No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço,<br />

valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.”<br />

289 Expressão defendida por Miguel Reale, Maria Helena Diniz e Flavio Tartuce, e por nós compartilhada.<br />

98


Superado os colóquios do direito e propriedade, passamos a pontuar as relações<br />

contratuais, mais especificadamente sobre a função social dos contratos.<br />

Assim, conforme aponta Flávio Tartuce 290 e Rodrigo Garcia da Fonseca 291 a<br />

função social dos contratos esta prevista nos artigos 421 e 2.035 do Código Civil.<br />

Dispõe a referida legis:<br />

“Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social<br />

do contrato. (...)<br />

Art. 2.035. A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da<br />

entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art.<br />

2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele<br />

se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de<br />

execução.<br />

Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem<br />

pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da<br />

propriedade e dos contratos.”<br />

Desta forma, assim como na função social da propriedade, a função social dos<br />

contratos esta devidamente tipificada na lei infraconstitucional, recaindo assim, sobre as<br />

relações jurídicas contratuais e limitada em razão da função social deste contrato.<br />

Ainda no estudo dos reflexos da socialidade, temos a função social da empresa,<br />

que também é amplamente discutida no Direito Civil.<br />

Assim, inicialmente conforme Fábio Konder Comparato 292 a aplicação da função<br />

social da empresa, foi abrangida pelo conceito constitucional da função social da<br />

propriedade já apresentada anteriormente.<br />

290 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002.<br />

291 A função social do contrato e o alcance do artigo 421 do Código Civil, p. 9.<br />

292 Carlos Eduardo de Castro Palermo, A função social da empresa e o novo Código Civil, Disponível em<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

99


Todavia, ainda observando o asilo Constitucional, entendemos que a geração de<br />

empregos oriundos das sociedades mercantis, podem ser considerados como função<br />

social da empresa à luz do preceito constitucional econômico.<br />

Adentrando ao campo infraconstitucional, podemos perceber o princípio da<br />

função social empresarial no artigo 421 do Código Civil que dispõe que “A liberdade de<br />

contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”. Tal<br />

apontamento tem como fundamento, que todas as sociedades nascem por um contrato,<br />

bem como, esta deve ser sobre a sua própria causa do negócio.<br />

Desta forma, não podemos afastar as limitações dos valores sociais e<br />

econômicas que ultrapassem ilegitimamente a lucratividade dos empresários. Neste<br />

sentido, bem como, por exemplo, podemos citar as intervenções do CA<strong>DE</strong> - Conselho<br />

Administrativo de Defesa Econômica, nas fusões empresarias que monopolizam um<br />

determinado ramo ou seguimento do mercado.<br />

Neste mesmo sentido, Flávio Tartuce ao citar o Roberto Senise Lisboa 293 ,<br />

apregoa:<br />

“a propriedade, inclusive a empresarial, deverá realmente atender a sua função social,<br />

sendo exercida a atividade de fornecimento de produtos e serviços no mercado de<br />

consumo em um sistema econômico no qual prevalece a livre concorrência sem abuso<br />

da posição dominante de mercado, proporcionando-se meios para a efetiva defesa do<br />

consumidor e a redução das desigualdades sociais”<br />

Por fim e não menos importante, temos a disposição constante do Enunciado 53,<br />

da I Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal realizada de<br />

11 a 13 setembro de 2002 que dispõe:<br />

293 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002. p. 62 –<br />

63.<br />

100


“Art. 966 294 : deve-se levar em consideração o princípio da função social na interpretação<br />

das normas relativas à empresa, a despeito da falta de referência expressa.”<br />

Diante de todo o exposto, não podemos afastar a aplicabilidade da função social<br />

da empresa pelos motivos até então dispostos, seja pela previsão constitucional, pelo o<br />

disposto nos artigos 421 e 966 do Código Civil, ou ainda, pelo entendimento firmado<br />

pela I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal<br />

Temos ainda, dois pontos a serem levantados, que são de suma importância,<br />

bem como, sofreram nítidos reflexos do princípio da socialidade. O primeiro como não<br />

poderia faltar, esta correlacionada a Família e já em um segundo momento, trataremos<br />

do Direito das Sucessões.<br />

Parece-nos que a função social da família – assim como na função da<br />

propriedade – é o ramo do Direto Civil que a função social pode ser observada com<br />

mais facilidade.<br />

Tal justificativa tem como fundamento, que assim como o ocorrido no direito de<br />

propriedade, a família tem sofrido significativas transformações nos últimos séculos.<br />

Neste sentido, podemos apregoar a disposição do Guilherme Calmon Nogueira<br />

Gama que inicialmente cita o Caio Mario da Silva Pereira e que complementa295 :<br />

““As transformações operadas neste século teriam sido maiores e mais avançadas de<br />

que em dois milênios de civilização romano-cristã. 296 ” Tal afirmação, precedida de<br />

advertência do autor sobre sua possível ousadia, bem demonstrada as transformações<br />

por que o Direito de família passou no século passado. A família não está dissociada dos<br />

fatores exógenos que a cercam, recepcionando acontecimentos e fenômenos que, num<br />

primeiro momento não se relacionariam ao contexto familiar. Sabe-se, na atualidade, que<br />

294<br />

Art. 966. – “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada<br />

para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.”<br />

295<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 64 –<br />

65.<br />

296<br />

Caio Mário da Silva Pereira, Direito Civil: alguns aspectos da sua evolução, p.169.<br />

101


um enfoque exclusivamente jurídico sobre temas de Direito de Família certamente<br />

representa visão estreita e falha sobre as famílias no Direito, devido à importância do<br />

contexto social, cultural, moral, religioso e econômico na âmbito das relações familiares.”<br />

Ainda correlacionando o Direito de Família ao Direito de Propriedade, podemos<br />

encontrar facialmente a aplicabilidade da função social da família em diversas<br />

passagens legislativas, como a do artigo 5°, inciso I, apregoada na Carta Magna, ou<br />

ainda, na legislação infraconstitucional como o artigo 1.511 do Código Civil.<br />

Insta salientar ainda, que a dignidade da pessoa humana prevista clara e<br />

insofismavelmente na Carta Magna têm aplicação no Direito de Família, tal<br />

apontamento tem estrutura-se na proteção prevista na dignidade da pessoa humana,<br />

não deve ser aplicada somente para um único individuo e sim – como é sabido – ao ser<br />

humano como ente social. 297<br />

O grande diferencial, devidamente apontado pelo Flávio Tartuce, é de que a<br />

entidade familiar é a estrutura basilar das sociedades contemporâneas, desta forma,<br />

estamos de frente de uns dos direitos resguardados de terceira geração.<br />

Corroborando esta idéia, Flávio Tartuce ao fazer menção do Miguel Reale<br />

acrescenta 298 :<br />

“Isso justifica o cuidado do legislador no momento de regular os institutos de Direito de<br />

Família, sendo certo que as suas normas são, regra geral, de ordem pública.”<br />

Assim, como se faz sabido, a maioria das alterações basilares – para não<br />

pontuar quase todas as alterações – do novo Código Civil, referentes ao Direito de<br />

Família, tem como marco principal a Constituição de 1988, a qual – conforme já<br />

pontuado – apregoa a igualdade absoluta entre os pares com vinculo familiar.<br />

297 Ibid., p. 127. “Lembre-se, que em tempo, de que a dignidade da pessoa humana não deve ser vista<br />

apenas sob o prisma da proteção co individuo, sob pena de se resultar num individualismo extremo. O ser<br />

humano, enquanto ser social, deve ser visto em seu aspecto individual, mas também em seu aspecto<br />

social, sendo a família o primeiro e privilegiado núcleo de integridade social.”<br />

298 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002. p. 63.<br />

102


Referido vínculo, observa todos os entes familiares, ou seja, dos cônjuges, dos<br />

filhos e dos parentes, não havendo diferenças de direitos e deveres entre os cônjuges,<br />

ou ainda, entre filhos havidos ou não da relação de casamento proibindo, desta forma,<br />

quaisquer alcunha discriminatória relativa à filiação 299 .<br />

Por fim, temos a função social do Direito das Sucessões, esta, que também tem<br />

suas repercussões tanto aos particulares como para o Estado.<br />

Desta forma, inicialmente entendemos que a limitação mais relevante é a<br />

prevista no artigo 5°, inciso XXX, da Carta Magna 300 .<br />

Tal limitação assegura claramente, o direito da proteção à herança, em relação<br />

do Estado. Temos ainda, as limitações no âmbito das relações privadas. Sendo que um<br />

dos melhores exemplos desta salvaguarda é o Luto familiar previsto no parágrafo único,<br />

artigo 12 do Código Civil 301 .<br />

Outra limitação muito interessante, – assim como a do exemplo anterior – que<br />

também foi pontuada por Flavio Tartuce 302 é a do caput, do artigo 1.848 do Código<br />

Civil 303 . Tal disposição, observa claramente a função social do testamento.<br />

Assim, o testador ao cravar as cláusulas limitativas de inalienabilidade,<br />

impenhorabilidade, e de incomunicabilidade sobre os seus bens da legítima deve<br />

obrigatoriamente apresentar uma justa causa. Tal feito, tem como fundamento lógico<br />

uma análise do ato de “última vontade” do testado no meio social que o cerca.<br />

299<br />

Miguel Reale, As Entidades Familiares, Disponível em: , Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

300<br />

Art. 5°, Inc. XXX - “é garantido o direito de herança;”<br />

301<br />

Art. 12. – “Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar<br />

perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Parágrafo único. Em se tratando de<br />

morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer<br />

parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.”<br />

302<br />

Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002. p.64.<br />

303<br />

Art. 1.848. – “Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer<br />

cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de incomunicabilidade, sobre os bens da legítima.”<br />

103


Em decorrência de todo o apresentado, assim como, colocando – em parte –<br />

termo final à temática dos princípios fundamentais do Código Civil de 2002, não<br />

podemos deixar de aplicar estes novéis institutos. Tal justificativa tem como<br />

fundamento, que a aplicabilidade destes, objetivam trazer a ética para as relações<br />

jurídicas, bem como, afastar o rigor do positivismo excessivo resultando em um Direito<br />

Civil mais equilibrado, justo e confiante.<br />

3.3 A Função Social do Direito de Propriedade<br />

3.3.1 O histórico e evolução da Função Social do Direito de Propriedade<br />

Conforme já apresentado nos tópicos anteriores, o debate em torno da<br />

propriedade sempre foi objeto de diversos estudos, todavia tais debates vêem se<br />

intensivando neste último século, em decorrência do desprendimento individualismo<br />

apregoado pelo liberalismo econômico anterior as Revoluções Burguesas 304 .<br />

Como é sabido, a sociedade com o decorrer do lapso temporal altera seus usos<br />

e costumes, bem como, sempre que necessário para o mantenimento de uma<br />

determinada ordem social, o Direito deve ser revitalizado no sentido de atender o<br />

clamor emanado por estes.<br />

304 Neste mesmo sentido, o professor Guilherme Calmon Nogueira da Gama: “Neste inicio de século,<br />

renova-se o debate referente a posse e à propriedade no contexto dos ordenamentos jurídicos,<br />

especialmente quando relembramos os institutos no movimento de codificação verificado a partir do<br />

século XVIII e que teve o Código Civil de 1916 como o exemplo brasileiro. Fundado em valores do<br />

liberalismo econômico e do exacerbado individualismo, a propriedade foi alcançada à condição de direito<br />

subjetivo paradigmático, absoluto, funcionalizando basicamente ao atendimento dos interesses<br />

individuais e egoísticos do homem-proprietário. No ideário de segurança e igualdade (formal), o sistema<br />

jurídico individualista se baseou na noção de propriedade como direito subjetivo por excelência em clara<br />

prevalência sobre outras situações jurídicas subjetivas como, por exemplo, aquelas relacionadas ao<br />

locatário, ao promissário comprador (possuidores não proprietários) e a coletividade (no que tange ao<br />

meio ambiente).” Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas,<br />

2007. p. 39 – 40.<br />

104


Desta forma, assim como não poderia de deixar de ser, o direito de propriedade<br />

com o decorrer do lapso temporal também sofreu várias intervenções sociais que e em<br />

contrapartida foram regulamentadas pelas inovações do Direito de Propriedade.<br />

Insta salientar, que não pontuaremos de forma sistemática a evolução histórica<br />

do direito de propriedade, bem como, todas as alterações pertinentes ocorridas no<br />

direito alienígena, porem não podemos enfrentar a presente temática sem resgatar<br />

alguns elementos históricos e conceituais que serão fundamentais para concluirmos e<br />

conceituar a idéia da função social da propriedade.<br />

Assim, no Direito Romano os elementos conceituais da propriedade que se<br />

consagrou foi a máxima dominium est ius utendi, fruendi e abutendi utilizadas até hoje.<br />

Desta forma, em Roma a propriedade é esculpida como um direito absoluto e<br />

perpétuo, não havendo a possibilidade do exercício alienígena a vontade do<br />

proprietário. 305<br />

No ocidente, este conceito persistiu durante muitos séculos, sendo afetado<br />

somente com a invasão dos Bárbaros e o mantenimento da propriedade pelos nobres.<br />

O termo final deste período, somente se deu entre os séculos XV e XVI.<br />

Momento este, que introduz uma nova forma de relação sócio-política denominada de<br />

vassalagem. Tal sistema, submete o servo proprietário das terras ao senhor feudal o<br />

qual, aquele além estar vinculado, deve ainda, tributos e prestações pessoais, o<br />

sistema político feudalismo 306 .<br />

Tal momento sócio político coloca a propriedade imobiliária, como uma garantia<br />

individual dos direitos naturais e imprescritíveis do homem apregoada no Bill of Rights<br />

305<br />

Celso Marini, Visão histórica do direito de propriedade imóvel, Disponível<br />

em:,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

105


da Virgínia de 1776 307 , onde a propriedade era tratada como instituto de direito privado,<br />

estranho à organização política do Estado.<br />

307 Virginia Bill of Rights, June 12, 1776, “A <strong>DE</strong>CLARATION OF RIGHTS made by the representatives of<br />

the good people of Virginia, assembled in full and free Convention; which rights do pertain to them, and<br />

their posterity, as the basis and foundation of government; 1. That all men are by nature equally free and<br />

independent, and have certain inherent rights, of which, when they enter into a state of society, they<br />

cannot, by any compact, deprive or divest their posterity; namely, the enjoyment of life and liberty, with the<br />

means of acquiring and possessing property, and pursuing and obtaining happiness and safety; 2. That all<br />

power is vested in, and consequently derived from, the people; that magistrates are their trustees and<br />

servants, and at all times amenable to them; 3. That government is, or ought to be, instituted for the<br />

common benefit, protection, and security, of the people, nation, or community; of all the various modes<br />

and forms of government that is best, which is capable of producing the greatest degree of happiness and<br />

safety, and is most effectually secured against the danger of maladministration; and that whenever any<br />

government shall be found inadequate or contrary to these purposes, a majority of the community hath an<br />

indubitable, unalienable, and indefeasible right, to reform, alter, or abolish it, in such manner as shall be<br />

judged most conducive to the publick weal; 4. That no man, or set of men, are entitled to exclusive or<br />

separate emoluments or privileges from the community, but in consideration of publick services; which, not<br />

being descendible, neither ought the offices of magistrate, legislator, or judge, to be hereditary; 5. That the<br />

legislative and executive powers of the state should be separate and distinct from the judicative; and that<br />

the members of the two first may be restrained from oppression, by feeling and participating the burthens<br />

of the people, they should, at fixed periods, be reduced to a private station, return into that body from<br />

which they were originally taken, and the vacancies be supplied by frequent, certain, and regular elections,<br />

in which all, or any part of the former members, to be again eligible, or ineligible, as the laws shall direct;<br />

6. That elections of members to serve as representatives of the people, in assembly, ought to be free; and<br />

that all men, having sufficient evidence of permanent common interest with, and attachment to, the<br />

community, have the right of suffrage, and cannot be taxed or deprived of their property for publick uses<br />

without their own consent, or that of their representatives so elected, nor bound by any law to which they<br />

have not, in like manner, assented, for the publick good; 7. That all power of suspending laws, or the<br />

execution of laws, by any authority without consent of the representatives of the people, is injurious to their<br />

rights, and ought not to be exercised; 8. That in all capital or criminal prosecutions a man hath a right to<br />

demand the cause and nature of his accusation, to be confronted with the accusers and witnesses, to call<br />

for evidence in his favour, and to a speedy trial by an impartial jury of his vicinage, without whose<br />

unanimous consent he cannot be found guilty, nor can he be compelled to give evidence against himself;<br />

that no man be deprived of his liberty except by the law of the land, or the judgment of his peers; 9. That<br />

excessive bail ought not to be required, nor excessive fines imposed, nor cruel and unusual punishments<br />

inflicted; 10. That general warrants, whereby any officer or messenger may be commanded to search<br />

suspected places without evidence of a fact committed, or to seize any person or persons not named, or<br />

whose offence is not particularly described and supported by evidence, are grievous and oppressive, and<br />

ought not to be granted; 11. That in controversies respecting property, and in suits between man and man,<br />

the ancient trial by jury is preferable to any other, and ought to be held sacred; 12. That the freedom of the<br />

press is one of the great bulwarks of liberty, and can never be restrained but by despotick governments.<br />

13. That a well regulated militia, composed of the body of the people, trained to arms, is the proper,<br />

natural, and safe defence of a free state; that standing armies, in time of peace, should be avoided, as<br />

dangerous to liberty; and that, in all cases, the military should be under strict subordination to, and<br />

governed by, the civil power; 14. That the people have a right to uniform government; and therefore, that<br />

no government separate from, or ndependent of, the government of Virginia, ought to be erected or<br />

established within the limits thereof; 15. That no free government, or the blessing of liberty, can be<br />

preserved to any people but by a firm adherence to justice, moderation, temperance, frugality, and virtue,<br />

and by frequent recurrence to fundamental principles; and 16. That religion, or the duty which we owe to<br />

our CREATOR, and the manner of discharging it, can be directed only by reason and conviction, not by<br />

force or violence; and therefore all men are equally entitled to the free exercise of religion, according to the<br />

dictates of conscience; and that it is the mutual duty of all to practice Christian forbearance, love, and<br />

charity, towards each other.” Declaration of Rights, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

106


Como já afirmado anteriormente, a referida alteração, teve seu embasamento<br />

fundamental em limitar a intenção do poder do Estado, que antes era condicionado aos<br />

domínios da monarquia, ou seja, o liberalismo econômico, onde o “eu” era muito mais<br />

importante do que “nós” 308 , que entendemos correta para aquele momento histórico.<br />

Neste mesmo sentido, temos várias disposições legais no direito alienígena que<br />

emplacaram esta ideologia, dentre eles, temos apregoar os seguintes:<br />

Código Civil Italiano 309 :<br />

Art. 832, Contenuto del diritto: “Il proprietario ha diritto di godere e disporre delle cose in<br />

modo pieno ed esclusivo, entro i limiti e con l'osservanza degli obblighi stabiliti<br />

dall'ordinamento giuridico.”<br />

Código Civil Espanhol 310 :<br />

Artículo 348: “La propiedad es el derecho de gozar y disponer de una cosa, sin más<br />

limitaciones que las establecidas en las leyes. El propietario tiene acción contra el<br />

tenedor y el poseedor de la cosa para reivindicarla.”<br />

Código Civil Português 311 :<br />

Artigo 1305º, Conteúdo do direito de propriedade: “O proprietário goza de modo pleno e<br />

exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro<br />

dos limites da lei e com observância das restrições por ela impostas.”<br />

308<br />

Flávio Tartuce, Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo<br />

a Nova Codificação, Disponível em: , Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

309<br />

The Cardozo Electronic Law Bulletin, Il Codice Civile Italiano, Disponível em: < http://www.jus.<br />

unitn.it/cardozo/Obiter_Dictum/codciv/Lib3.htm>, Acesso em: 04/06/2009.<br />

310<br />

Normacivil, Código Civil: Libro II: Título II, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

311<br />

Código Civil Português, Disponível em: < http://www.portolegal.com/CodigoCivil.html>. Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

107


Finalmente, porém não menos importante o Código Civil Francês 312 :<br />

Article 544, Créé par Loi 1804-01-27 promulguée le 6 février 1804: “La propriété est le<br />

droit de jouir et disposer des choses de la manière la plus absolue, pourvu qu'on n'en<br />

fasse pas un usage prohibé par les lois ou par les règlements.”<br />

Desta forma, o direito romano e o antigo status do liberalismo econômico, ambos<br />

definiam a propriedade como o direito de usar (ius utendi) e de dispor da coisa (ius<br />

abutendi), da maneira mais absoluta, desde que não se faça delas um uso proibido<br />

pelas leis e pelos regulamentos internos.<br />

Porém – a evolução história demonstra que – o referido sistema não logrou com<br />

êxito, desembocando na Revolução Francesa que procurou dispor de uma nova forma<br />

para a propriedade, buscando assim dar um caráter democrático à propriedade, todavia<br />

direcionado aos interesses da burguesia.<br />

Em decorrência disto, podemos afirmar que a propriedade somente passa a ter<br />

um sentido econômico em função de seu valor ou uso, somente no século XIX com o<br />

constitucionalismo dos institutos privados, tema este, já apresentado no capítulo<br />

anterior.<br />

Em continuidade a apregoado até então, insta salientar, que a primeira aparição<br />

do Estado Social de Direito como conhecemos na atualidade, foi na Constituição<br />

Mexicana de 1917 313 , esta, elevou claramente os direitos individuais, públicos e<br />

trabalhistas ao patamar dos direitos fundamentais em seus artigos 5º e 123, bem como,<br />

foi a primeira a restringir o caráter absoluto do direito de propriedade quanto a<br />

inobservância do interesse da população em seu artigo 27.<br />

312 Legifrance, Le service public dele diffusion du droit, Disponível em: , Acesso em: 0306/2009.<br />

313 I Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 45.<br />

108


A novel disposição Mexicana, também foi pautada na Constituição de Weimar de<br />

1919, e assim com Carta Capital, além de ter outros fins, objetivou restringir o direito de<br />

propriedade no mundo capitalista Europeu.<br />

Neste mesmo sentido pontua o Guilherme Calmon Nogueira da Gama e cita<br />

Ernst Benda 314 :<br />

“Em 1919, com a Constituição de Weimar, chegou a vez da Europa capitalista<br />

estabelecer uma restrição à propriedade privada. Criou-se a idéia da obrigação do<br />

proprietário, que ficou conhecida como função social da propriedade. Como acentua<br />

Ernst Benda, “o principio do estado social justifica e exige a proteção ao socialmente<br />

mais fraco também no campo econômico...” E, mais adiante, cuidando do tema à luz da<br />

Constituição alemã, o autor observa: A lei Fundamental defende a propriedade,<br />

declarando-a ao mesmo tempo, como vinculada a obrigações sociais; seu uso não deve<br />

servir apenas ao individuo, porem também a coletividade. Disso resulta o direito do<br />

legislador, porem sua tarefa, de promover o equilíbrio entre os interesse da coletividade e<br />

os do proprietário.”<br />

Desta forma, lídimo se faz notar o marcante artigo 153, da Constituição de<br />

Weimar, que dispunha claramente a função social da propriedade:<br />

“A propriedade obriga o uso e exercício devem ao mesmo tempo representar uma função<br />

social”<br />

Desta monta, a Constituição de Weimar, propõe uma nova interpretação ao<br />

pensamento individualistico-romano do direito de propriedade, vislumbrando a figura de<br />

um Estado Social de Direito, sem abater o direito absoluto da propriedade.<br />

Buscando por fim, “uma propriedade” tendo como ponto de vista deveres e<br />

obrigações dirigidas a um entendimento sócio econômico.<br />

314 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. 45 - 46.<br />

109


Em decorrência disto, podemos afirmar que as Constituições de Weimar de 1919<br />

e Mexicana de 1917 foram às precursoras da concepção do Estado Social de Direito 315 .<br />

No direito pátrio, a função social da propriedade, não foi vislumbrada nas<br />

Constituições de 1824 e de 1891, o que entendemos compreensível, pois estas – como<br />

óbvio se demonstra – apresentavam o caráter individualista de propriedade concebido<br />

pelo seu período histórico, assegurando o direito de propriedade nos moldes do direito<br />

individualistico-romano 316 .<br />

Podemos notar que na Carta Magna de 1934, por meio do artigo 113, n. 17 317 ,<br />

garantia que os direitos inerentes ao poder de propriedade, não poderiam ser exercidos<br />

contra o interesse social ou coletivo, bem como, a partir deste termo inicial, podemos<br />

notar que tal direito passa a ser observado de forma mais impositiva nas próximas<br />

Cartas Políticas.<br />

Nesta mesma esteira, a Constituição de 1937 318 manteve o princípio da função<br />

social da propriedade com a idéia focada no interesse publico, e em seguida, temos o<br />

texto Constitucional histórico mais importante segundo ao nosso ver.<br />

Estamos assim, diante da Carta Magna de 1946 posterior a Segunda Grande<br />

Guerra Mundial, bem como, a primeira Constituição nacional a transcrever efetivamente<br />

a definição de função social da propriedade condicionando.<br />

315 Neste sentido: “O Estado da Democracia Social, cujas linhas-mestras já haviam sido traçadas pela<br />

Constituição Mexicana de 1917, adquiriu na Alemanha de 1919 uma estrutura mais elaborada , que veio<br />

a ser retomada em vários países após o trágico interregno nazi-facista e a Segunda Guerra Mundial”<br />

Fabio Konder Comparato, A afirmação histórica dos Direitos Humanos, p. 189.<br />

316 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil, p. 46.<br />

317 Art. 113, 17 – “É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse<br />

social ou coletivo, na forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública<br />

far-se-á nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como guerra<br />

ou comoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o<br />

bem público o exija, ressalvado o direito à indenização ulterior.”<br />

318 Art. 122 – “A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no País o direito à<br />

liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (...) 14 - O direito de<br />

propriedade, salvo a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia.<br />

O seu conteúdo e os seus limites serão os definidos nas leis que lhe regularem o exercício;”<br />

110


Podemos notar que pela primeira vez o texto constitucional promove o<br />

intervencionismo político econômico, objetivando a justa distribuição da propriedade<br />

encontra-se prevista em seus artigos 141, § 16 319 e art. 147 320 .<br />

Observando a importância da Constituição de 1946, Gustavo Tepedino pontua<br />

que 321 :<br />

“... foi a norma constitucional de 1946 que expressou, pela primeira vez, a preocupação<br />

com a função social da propriedade, na esteira de copiosa legislação intervencionista que<br />

caracterizou os princípios passos do Estado assistência e da socialização do direito civil.”<br />

Continuando a evolução histórica, temos a Emenda Constitucional de 1969 que<br />

manteve, em parte, o conteúdo da Constituinte de 1967 em seu artigo 160, inciso III 322 .<br />

Desta forma, como podemos notar, somente na Emenda Constitucional de 1969,<br />

a expressão “função social da propriedade” foi utilizada como princípio de<br />

fundamentação da ordem econômica e social, porém ainda, não levada ao patamar a<br />

categoria de garantia fundamental do cidadão 323 .<br />

Por fim, a Constituinte de 1988 acolheu o direito à propriedade em seu artigo 5º,<br />

no Título reservado aos Direitos e Garantias Fundamentais, apregoado em conjunto do<br />

mesmo plano do direito à vida, à liberdade, igualdade.<br />

319 Art. 141 – “A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a<br />

inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos<br />

termos seguintes: § 16 - É garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por<br />

necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em<br />

dinheiro. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, as autoridades competentes<br />

poderão usar da propriedade particular, se assim o exigir o bem público, ficando, todavia, assegurado o<br />

direito a indenização ulterior.”<br />

320 Art 147 – “O uso da propriedade será condicionado ao bem-estar social. A lei poderá, com<br />

observância do disposto no art. 141, § 16, promover a justa distribuição da propriedade, com igual<br />

oportunidade para todos.”<br />

321 Temas de Direito Civil, p. 306.<br />

322 Art. 160. – “A ordem econômica e social tem por fim realizar o desenvolvimento nacional e a justiça<br />

social, com base nos seguintes princípios: III - função social da propriedade;”<br />

323 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil, p. 47.<br />

111


Desta monta, o direito de propriedade, bem como, a sua função social fora<br />

elevada ao patamar da categoria de garantia fundamental do cidadão. Analisaremos os<br />

pontos relevantes da função social da propriedade a luz da Carta Magna nos próximos<br />

itens do presente capítulo.<br />

3.3.2 Noção da função social da propriedade<br />

Ao analisar o estudo do conceito da função social da propriedade 324 , temos<br />

alguns implicadores para realização de tal tarefa. A presente justificativa, tem como<br />

fundamento a semântica das palavras função e social, ambas, apresentam vários<br />

sentidos nos ramo da ciência do direito, assim como, o próprio ordenamento, somente<br />

elencou o presente princípio, sem apontar os seu elementos característicos 325 .<br />

Partindo de uma idéia geral, entendemos que seria redundante indagar ou não a<br />

existência da função social dos institutos privados – ou até mesmo do direito –, pois a<br />

própria natureza subjetiva dos mesmos deveriam ser direcionadas ao um bem-estar<br />

social. Contudo, o individualismo – fato social dos últimos séculos – estilhaçou a idéia<br />

do coletivo em detrimento ao individual que se fez necessária a retomada de tal<br />

princípio devidamente positivado. 326<br />

Objetivando esmiuçar o presente estudo, Cristiano Chaves de Farias e Nelson<br />

Rosenvald 327 observam:<br />

“Estrutura e função são os dois elementos que compõem o direito subjetivo. A estrutura<br />

do modele jurídico é captada quando perguntamos “como é?”; já a função se segue a<br />

pergunta “para que serve?”. isto é, a gênese reside na estrutura, mas a orientação e a<br />

teleologia do instituto são capitadas pela sua função.”<br />

324<br />

A palavra função vem do latim functio, functionis, que quer dizer trabalho, exercício cumprimento,<br />

execução e liga-se ao verbo latino fungi, que significa cumprir, executar, desempenhar uma função.<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil, p. 48.<br />

325<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil, p. 48.<br />

326<br />

FARIAS, Cristiano Chaves: Nelson Rosenvald Direitos Reais, p. 197<br />

327<br />

Direitos Reais, p. 197.<br />

112


Assim, vários doutrinadores, entendem que a função social tem caráter de norma<br />

constitucional programática, devendo o legislador instrumentalizar tal principio<br />

fundamental.<br />

Dentre eles doutrinadores, Arruda Alvim 328 , entende que:<br />

“(...) a função social deve ser efetivada por lei (“reserva de lei”), por isso, ainda, constituise<br />

num critério para o legislador ao disciplinar o direito de propriedade, critério esse que<br />

encontra limites na própria garantia constitucional o direito de propriedade.”<br />

Já para Flavio Tartuce e José Fernando Simão 329 :<br />

“O código Civil de 2002 (arts. 1.228 a 1.232), a exemplo do seu antecessor (arts. 524 a<br />

529 do CC/1916), traz disposições gerais relativas à propriedade, que merecem ser<br />

estudadas. Algumas dessas disposições representam, na lei civil, claras restrições ao<br />

direito de propriedade, sendo a mais notória a aclamada função social.”<br />

Em decorrência disto, foram criadas várias legislações infraconstitucionais para a<br />

implementação do referido princípio fundamental. Insta salientar, que dentre muitas<br />

outras Leis, podemos citar como mais relevantes a Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra) e a<br />

Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), também não conceituaram o referido princípio 330 .<br />

Assim, prefacialmente, a doutrina mais respeitada busca o significado da função<br />

social nos fundadores: São Tomas de Aquino, Augusto Comte e Leon Duguit. Porém, a<br />

Ciência Jurídica inicialmente, ligava a idéia da função social ao atendimento de um<br />

interesse público, assim como fez nas Constituições 1934 e 1937.<br />

328<br />

O Livro de Direito das Coisas, p. 289.<br />

329<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 120.<br />

330<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil, p. 48.<br />

113


Não Obstante, como já apresentado anteriormente, a divisão entre o direito<br />

público e privado apregoado por algumas “escolas do saber”, não pode ser mais<br />

suportada, e neste sentido pontua Guilherme Calmon Nogueira da Gama 331 :<br />

“A evolução da Ciência Jurídica, entretanto, fez com que essa divisão entre direito<br />

público e direito privado ficasse ultrapassada, não mais devendo ser feita. Ademais, a<br />

introdução da função social em um ordenamento jurídico que reconhece e garante a<br />

propriedade privada implica a superação dessa contraposição entre o publico e privado.<br />

A propriedade passou a ter um sentido social, e não mais apenas individual, estando<br />

destinada à satisfação de exigências de cunho social”<br />

Acrescenta ainda o Guilherme Calmon Nogueira da Gama, ao citar José Diniz de<br />

Moraes 332 :<br />

“função é a satisfação de uma necessidade (...) por meio de um poder jurídico atribuído a<br />

uma pessoa, física ou jurídica, publica ou provada. Haveria, assim, certos interesses que<br />

são protegidos de forma especial, impondo obrigações e deveres jurídicos aos<br />

particulares, de modo que a sociedade é favorecida ou protegida, sem se tornar uma<br />

função exclusivamente pública, nem uma função individual pura esimples. Seria o<br />

interesse social, satisfeito pela função social que incide sobre direitos.”<br />

Outra definição anterior a Constituição promulgada em 1988, era que a função<br />

social era algo externo do direito de propriedade, ou seja, era um limitador ao direito de<br />

propriedade. Todavia, após a Aprovação da Carta Magna de 1988 tal entendimento não<br />

seria o mais adequado.<br />

Tal justificativa tem como fundamento a própria disposição constitucional, bem<br />

como, nesta linha Guilherme Calmon Nogueira da Gama 333 :<br />

331 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 49.<br />

332 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007 p. 49.<br />

333 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007, p. 51.<br />

114


“Hoje com base nos artigos 5º, XXIII, 170, III, 189, §§ 2º e 4º, 184 e 186, da Constituição<br />

federal deve-se reconhecer que a função social integra a propriedade; a função social da<br />

propriedade, e não algo exterior ao direito de propriedade será esvaziado.”<br />

Há inúmeras outras definições e expressões para a função social, todavia<br />

entendemos que a função social da propriedade, compreende-se em uma garantia<br />

constitucional fundamental, que por meio de legislações infraconstitucionais, busca uma<br />

propriedade mais justa, vinculada ao seu cunho social, buscando equilibrar as<br />

diferenças sociais apresentadas pelo momento pós-industrial.<br />

3.4 Instrumentos da função social da propriedade<br />

Como é sabido, os instrumentos e requisítos de cumprimento da função social da<br />

propriedade são numerosos. Em decorrência disto, teremos que observar tais aspectos<br />

por blocos em três blocos, ou seja, prefacialmente apontaremos os destaques oriundos<br />

da importância assumida no texto constitucional vigente; em um segundo momento, os<br />

principais dispositivos apresentados pelo novo Código Civil de 2002; e finalmente, um<br />

breve arrazoado das demais legislações infraconstitucionais tendo em vista, que estas,<br />

fogem do escopo do presente trabalho.<br />

III.IV.I Instrumentos e requisítos Constitucionais<br />

Prefacialmente, entendemos que não há outra forma de iniciarmos o referido<br />

ponto temático de forma assertiva, sem ponderar que a propriedade está devidamente<br />

assentada como um dos direitos e garantias fundamentais, direitos e deveres<br />

individuais e coletivos, contemplado lidimamente no caput do art. 5º da Constituição<br />

Federal de 1988 334 .<br />

334 Artigo 5º - “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos<br />

brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à<br />

igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”<br />

115


Não obstante a clara disposição do caput do referido artigo, ainda mesmo, no art.<br />

5º, o inciso XXII 335 , nos deparamos mais uma vez com a garantia constitucional do<br />

direito de propriedade. Porém no inciso posterior, ou seja, o XXIII 336 determina a sua<br />

correspondente função social.<br />

Todavia, temos como claro que a função social da propriedade é mais do que<br />

uma garantia Constitucional, esta, segundo o nosso ver, é um dos objetivos<br />

fundamentais do Estado Democrático Brasileiro.<br />

Vejamos a Carta Republicana em seu artigo 3° e incisos, arrola os objetivos<br />

fundamentais do Estado Democrático Brasileiro 337 que seguem: a) construir uma<br />

sociedade livre, justa e solidária; b) garantir o desenvolvimento nacional; c) erradicar a<br />

pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e d)<br />

promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e<br />

quaisquer outras formas de discriminação.<br />

Destas disposição Constitucional, entendemos que a função social da<br />

propriedade vai de encontro ao princípio da solidariedade, previsto no inciso um, que<br />

objetiva “construir uma sociedade livre, justa e solidária.” 338<br />

O objetivo de construir uma sociedade livre, justa e solidária, assim como os<br />

outros demais objetivos, tem como finalidade viabilizar a democracia, a economia, o<br />

social e a cultura; buscando ainda, assegurar e efetividade do princípio fundamental da<br />

dignidade da pessoa humana.<br />

Assim o Estado Brasileiro, seja pelo poder executivo, legislativo ou ainda pelo<br />

judiciário, deve implementar políticas, com o objetivo de erradicar patologias<br />

ocasionadas pela sociedade e promover, a aplicação de uma sociedade inspirada no<br />

335<br />

Artigo 5º, XXII – “é garantido o direito de propriedade;”<br />

336<br />

Artigo 5º, XXIII – “a propriedade atenderá a sua função social;”<br />

337<br />

Leo Van Holthe, Direito Constitucional, p. 61.<br />

338<br />

Art. 3º - “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma<br />

sociedade livre, justa e solidária;”<br />

116


Estado Democrático, ou seja, prover dentre outros institutos, a função social da<br />

propriedade.<br />

Conforme já apontado anteriormente, apesar da idéia da função social da<br />

propriedade estar devidamente transladada na Constituição Federal, esta, não foi<br />

conceituada, bem como, sua regulamentação e aplicabilidade está distribuída na Magna<br />

Carta.<br />

Neste sentido, Guilherme Calmon Nogueira da Gama 339 trancreve:<br />

“A Constituição Federal de 1988 expressou, em seu art. 5º, XXIII, a idéia de que a<br />

propriedade deve atender a sua função social. Sua regulamentação, entretanto,<br />

encontra-se espalhada em outros dispositivos da Magna Carta. Como foi visto, não há<br />

qualquer dispositivo constitucional fornecendo o conceito da função social da<br />

propriedade.”<br />

Em decorrência disto, pontuaremos os aspectos Constitucionais mais relevantes<br />

a luz da função social da propriedade quanto segue.<br />

O artigo 170 340 , assim como em Constituições anteriores, dispõe em seu caput a<br />

ordem econômica, estruturada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,<br />

objetivando assegurar a todos a existência digna, nos termos da justiça social, em<br />

especial no inciso III, a função social da propriedade.<br />

Neste sentido, o catedrático Ministro Eros Grau 341 , pontua que:<br />

“a propriedade-função social, que importa à ordem econômica é a propriedade dos bens<br />

de produção.”<br />

339 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 55.<br />

340 Art. 170. – “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem<br />

por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os<br />

seguintes princípios: II - propriedade privada; III - função social da propriedade;”<br />

341 Eros Roberto Grau, A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica), p. 249.<br />

117


Por seu turno, o artigo 23 do texto constitucional em seu inciso III 342 , ainda<br />

objetivando proteger a função social da propriedade, delega como competência comum<br />

à União, aos Estados, ao Distrito Federal e dos Municípios a proteção dos documentos,<br />

obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens<br />

naturais notáveis e os sítios arqueológicos.<br />

Já o artigo 21 caput, bem como, seu respectivo inciso XX 343 , ambos estabelecem<br />

a competência da União sobre diretrizes para o desenvolvimento urbano, incluindo<br />

habitação, saneamento básico e transportes urbanos.<br />

Corroborando a idéia de competência, no âmbito Municipal, temos duas<br />

disposições Constitucionais relevantes que devem ser arroladas.<br />

A primeira, esta consignada no artigo 30 da Carta Magna, em seu caput e inciso<br />

VIII 344 que delega aos Municípios a competência de promover, no que couber, o<br />

adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do<br />

parcelamento e da ocupação do solo urbano.<br />

Já o inciso IX 345 delega aos Municípios, a competência para promover a<br />

proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação<br />

fiscalizadora Federal e Estadual.<br />

Por fim, bem como, não obstante todos os dispositivos supracitados, ventilamos<br />

que o princípio da função social da propriedade, tem sua forma mais definida nos<br />

artigos 182 e 186 da Constituição Federal, em relação às propriedades urbanas e<br />

rurais.<br />

342 Art. 23. – “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: III -<br />

proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as<br />

paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;”<br />

343 Art. 21. – “Compete à União: XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive<br />

habitação, saneamento básico e transportes urbanos;”<br />

344 Art. 30. – “Compete aos Municípios: VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial,<br />

mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;”<br />

345 Art. 30. - Compete aos Municípios: IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local,<br />

observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.”<br />

118


Corroborando esta mesma idéia, Guilherme Calmon Nogueira da Gama 346<br />

pondera:<br />

“Nos arts. 182 e 186, (...), o legislador constituinte estabeleceu os requisitos para<br />

cumprimento da função social da propriedade urbana e rural”<br />

Desta forma, o legiferante constituinte ao observar e regulamentar a função<br />

social da propriedade urbana o fez em seu artigo 182, in verbis:<br />

“Artigo 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público<br />

municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno<br />

desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus<br />

habitantes. § 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para<br />

cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de<br />

desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função<br />

social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no<br />

plano diretor. § 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e<br />

justa indenização em dinheiro. § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei<br />

específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do<br />

proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu<br />

adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:I - parcelamento ou edificação<br />

compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no<br />

tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de<br />

emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez<br />

anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização<br />

e os juros legais.”<br />

O referido dispositivo, traz consigo, uma gama enorme de efeitos ao mundo<br />

jurídico e social, em decorrência disto, devemos observar cada ponto relevante deste<br />

separadamente.<br />

346 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 55.<br />

119


Assim, o caput do artigo 182, tem dois aspectos relevantes a serem levantados.<br />

O primeiro deles, determina a existência de uma política de desenvolvimento urbano de<br />

competência da Municipalidade.<br />

Em um segundo momento, nos deparamos, com natureza jurídica deste instituto,<br />

este, que busca o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade a garantia do<br />

bem-estar dos habitantes das cidades.<br />

Para concluir esta idéia, o parágrafo segundo do referido artigo, determina que a<br />

propriedade urbana somente atinge sua função social, caso ocorra o atendimento das<br />

exigências fundados no plano diretor.<br />

Neste sentido, Guilherme Calmon Nogueira da Gama 347 afirma:<br />

“O art. 182, da Constituição Federal, dispõe. Assim, que a propriedade urbana cumpre<br />

sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenamento da cidade<br />

expressas no plano diretor.”<br />

Por fim, o parágrafo quarto, é suma importância, pois este, traça as sanções para<br />

o caso de não observância do regramento disposto no presente artigo.<br />

Insta salientar, que tais sanções devem ser impostas de acordo com o texto<br />

constitucional ou seja, preliminarmente e sucessivamente da seguinte forma:<br />

I) Parcelamento ou edificação compulsórios;<br />

II) Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no<br />

tempo; e<br />

III) Desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de<br />

emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de<br />

347 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 55.<br />

120


esgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas,<br />

assegurados o valor real da indenização e os juros legais.<br />

Neste mesmo sentido, Guilherme Calmon Nogueira da Gama:<br />

“Essas sanções serão aplicadas progressivamente, sendo a desapropriação medida<br />

última ratio, quando o direito de propriedade será esvaziado.”<br />

Superada a questão da propriedade urbana, temos ainda, o cumprimento da<br />

função social da propriedade rural prevista no artigo 186, in verbis:<br />

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,<br />

simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos<br />

seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos<br />

recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das<br />

disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bemestar<br />

dos proprietários e dos trabalhadores.<br />

Assim como foi feito com o dispositivo anterior, para o presente caso, também se<br />

faz necessária algumas ponderações referentes ao artigo 186 da Carta Magna.<br />

Nestes sentido, afirma-se, que a propriedade rural para atender sua função<br />

social, não basta somente ter a vontade do proprietário para sua realização,<br />

necessitando ainda, de elementos externos para sua realização.<br />

Tais elementos se encontram arrolados nos incisos do artigo 186, ou seja,<br />

deverá o proprietário ainda dar um aproveitamento racional e adequado; utilizar<br />

adequadamente os recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;<br />

observar as disposições que regulam as relações de trabalho; e explorar a propriedade<br />

de forma que favoreça o bem-estar dos próprios e dos trabalhadores. 348<br />

348 Nesta esteira o professor Gustavo Tepedino com sua costumeira assertiva aloca o tema: “A<br />

produtividade, para impedir a desapropriação, deve ser associada à realização de sua função social. O<br />

conceito de produtividade vem definido pela Constituição de maneira essencial solidarista, vinculado aos<br />

pressupostos para a tutela da propriedade. Dito diversamente, a propriedade, para ser imune à<br />

121


Outro item importante que deve ser observado da Magna Carta, são os<br />

parágrafos e o caput do artigo 184 349 . Tal dispositivo legal, tem como objetivo aplicar a<br />

sanção estatal pela não observância da propriedade rural.<br />

legal.<br />

Não há muitas considerações a serem tecidas referentes ao presente dispositivo<br />

Todavia, há severas críticas quanto da aplicabilidade do referido dispositivo no<br />

sentido da remuneração insuficiente nas desapropriações, bem como, na demora em<br />

reaver tais valores. Tal crítica, também recai cumulativamente ao inciso III, parágrafo<br />

quarto do artigo 182 da Carta Magna.<br />

Neste mesmo sentido o Guilherme Calmon Nogueira da Gama acresce:<br />

“Uma crítica que deve ser feita aos artigos 182, § 4, III, e 184, da Constituição Federal,<br />

que prevêem a desapropriação utilizada nos casos de descumprimento na função social,<br />

é que eles alimentam dois enormes defeitos e injustiças: Remunera a mal usada<br />

propriedade, isto é, premia o descumprimento da lei, porque considera causador do dano<br />

e obrigado indenizar não o violador da norma, mas ao Poder Público que resolve por fim<br />

desapropriação, não basta ser produtiva no sentido econômico do termo, mas deve também realizar sua<br />

função social. Utilizada para fins especulativos, mesmo se produtora de alguma riqueza, não poderá a<br />

sua função social se não respeitar as situações jurídicas existenciais e sociais nas quais se insere. Em<br />

conseqüência, não será merecedora de tutela jurídica, devendo ser desapropriada, pelo Estado, por se<br />

apresentar como um obstáculo ao alcance dos fundamentos e objetivos – constitucionalmente<br />

estabelecidos – da República.” Temas de direito civil, p. 331.<br />

349 Art. 184. – “Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel<br />

rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da<br />

dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir<br />

do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.<br />

§ 1º - As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.<br />

§ 2º - O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a<br />

União a propor a ação de desapropriação.<br />

§ 3º - Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o<br />

processo judicial de desapropriação.<br />

§ 4º - O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o montante<br />

de recursos para atender ao programa de reforma agrária no exercício.<br />

§ 5º - São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis<br />

desapropriados para fins de reforma agrária.”<br />

122


a violação; e deixa a iniciativa de coibir o mau uso ao Poder Público, garantindo a<br />

integridade do direito ao violador da lei.”<br />

Assim, em decorrência do ora apresentado, entendemos que a Carta Magna de<br />

1988, não permite que o proprietário utilize a sua propriedade – seja ela rural ou urbana<br />

– conforme à sua vontade unilateral. Caso isso ocorra, tal propriedade deverá ser objeto<br />

das sanções previstas em lei, mas certamente não desfazendo de sua garantia<br />

indenizatória.<br />

3.4.2 Instrumentos do novo Código Civil<br />

Inicialmente, não há como negar a presença da função social em vários institutos<br />

de Direito Civil conforme já apontado.<br />

Dentre eles podemos arrolar – somente de forma exemplificativa – o inciso III do<br />

art. 1.275 350 do novo Código Civil a perda da propriedade pelo abandono de seu<br />

proprietário, o § 2º do art. 1.276 351 que trata da arrecadação dos imóveis abandonados<br />

e o § 1º prevê a arrecadação dos imóveis rurais, após três anos de desinteresse pelo<br />

proprietário. Podendo citar ainda, os artigos 187, 421, 2.035 e muitos outros artigos<br />

implicitamente.<br />

Ao tratar da função social da propriedade, devemos fazer uma análise<br />

sistemática do artigo 1.228, da Lei 10.406 de 10.01.2002, bem como, compreendê-lo<br />

corretamente dentro do atual contesto apresentado.<br />

350<br />

Art. 1.275. – “Além das causas consideradas neste Código, perde-se a propriedade: III - por<br />

abandono.”<br />

351<br />

Art. 1.276. – “O imóvel urbano que o proprietário abandonar, com a intenção de não mais o conservar<br />

em seu patrimônio, e que se não encontrar na posse de outrem, poderá ser arrecadado, como bem vago,<br />

e passar, três anos depois, à propriedade do Município ou à do Distrito Federal, se se achar nas<br />

respectivas circunscrições. § 1o O imóvel situado na zona rural, abandonado nas mesmas circunstâncias,<br />

poderá ser arrecadado, como bem vago, e passar, três anos depois, à propriedade da União, onde quer<br />

que ele se localize.§ 2o Presumir-se-á de modo absoluto a intenção a que se refere este artigo, quando,<br />

cessados os atos de posse, deixar o proprietário de satisfazer os ônus fiscais.”<br />

123


Assim, a redação do art. 1.228 352 do Código Civil vigente determina que “o<br />

proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do<br />

poder de quem injustamente a possua ou detenha”.<br />

Referida disposição, inovou muito pouco ao comparar este, com o artigo 524, do<br />

Código Civil de 1916. Cuja disposição legal determinava que “a lei assegura ao<br />

proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los de quem quer<br />

que injustamente os possua.”<br />

Modificação esta, que não compreendemos como mais assertiva. Tal justificativa<br />

tem como fundamento que o emprego da palavra “faculdade” e traz consigo uma<br />

problemática.<br />

Para o dicionário digital Priberam, a palavra “faculdade” significa 353 :<br />

“ força física ou moral que torna a pessoa capaz de atuar e de produzir certos efeitos;<br />

propriedade; qualidade; permissão; aptidão; facilidade; destreza; capacidade; direito,<br />

potência moral ou psicológica; e autorização de fazer alguma coisa.”<br />

Neste contexto, a referida palavra tem como característica, uma capacidade<br />

outorgada à um sujeito. Sendo assim, pode usar ou não esta prerrogativa. Todavia, esta<br />

não é a interpretação não é a mais adequada para o atual momento jurídico-civilista.<br />

Não obstante nosso entendimento, Guilherme Calmon Nogueira da Gama 354<br />

pontua:<br />

“Neste sentido, o art. 1228, do Código Civil de 2002, ao tratar dos poderes do<br />

proprietário, substituiu a noção de que “a lei assegura ao proprietário”, contida no art.<br />

524, do Código Civil revogado, de conteúdo jusnaturalista, em que a norma se limita a<br />

352<br />

Art. 1.228. – “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do<br />

poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”<br />

353<br />

Priberam Informática, Língua portuguesa on-line, Disponível em: . Acesso em: 10/06/2008.<br />

354<br />

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 57.<br />

124


econhecer o poder a ela preexistente, pela idéia de que “o proprietário tem a faculdade”,<br />

mais técnica e condizente com a idéia de limitação de poderes do proprietário.”<br />

O direito de propriedade, encontra-se devidamente resguardado pelo princípio da<br />

socialidade em várias disposições. Este princípio, atinge seu ápice no § 1°, do artigo<br />

1228.<br />

Flavio Tartuce e José Fernando Simão 355 quando tratam da importância do § 1.º<br />

do art. 1.228 dispõem:<br />

“A norma civil codificada passa a consagrar expressamente, a função social, em um<br />

sentido de finalidade, como principio orientador da propriedade; além de representar a<br />

principal limitação a esse direito, como reconhecem doutrina e jurisprudência, no caso da<br />

última pelos inúmeros casos julgados já transcritos.”<br />

Referido dispositivo legal, estabelece as diretrizes gerais da função social da<br />

propriedade em atendimento aos dispositivos constitucionais previstos nos artigos 5º,<br />

XXIII e 170, III, da Constituição Federal.<br />

Dispõe a referida legis:<br />

“Art. 1.228, § 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas<br />

finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade<br />

com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio<br />

ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das<br />

águas”. (Nossos grifos)<br />

Ao analisar o dispositivo, podemos entender facilmente que o direito de<br />

propriedade contemporâneo destaca-se do idealismo “romano napoleônico” de<br />

propriedade, passando a atender uma função social, levando em consideração a sua<br />

destinação.<br />

355<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 120.<br />

125


Neste mesmo sentido acrescenta o grande vanguardista Cristiano Chaves de<br />

Farias 356 :<br />

“... este dispositivo reproduz a mensagem da Constituição Federal na ordem privada e<br />

enceta um rol exemplificativo de aferições de função social e, de forma técnica, procura<br />

respaldar as leis especiais que cuidam de interesses difusos e coletivos. Há um interesse<br />

elevado na especificação do conteúdo de tal norma, pois ao contrario de seu antecessor<br />

hermenêutico, o Código Civil de 2002 pretende ter um sistema relativamente aberto,<br />

compromissado com as transformações econômicas e sociais do Pais.”<br />

Em decorrência disto, podemos afirmar que diferentemente do Código Civil de<br />

1916 357 , a propriedade é exercida de forma limitada, com o intuito final, da observância<br />

das questões relacionadas às atividades econômicas e sociais que recaírem sobre este<br />

imóvel.<br />

Neste mesmo sentido, o Guilherme Calmon Nogueira da Gama 358 pontua:<br />

“... ainda, § 1 o do referido artigo, do texto codificado, ao vincular o exercício do direito de<br />

propriedade às suas finalidades econômicas e sociais, visa perseguir a tutela<br />

constitucional da função social, dando um conteúdo jurídico ao aspecto funcional das<br />

situações proprietárias”<br />

Outro ponto relevante observado não somente por Flavio Tartuce e José<br />

Fernando 359 , mas também como o Lucas Abreu Barroso 360 referente ao dispositivo em<br />

tela, relaciona-se com a importantíssima questão do meio ambiente natural.<br />

Neste sentido discorre Flavio Tartuce e José Fernando Simão 361 :<br />

356<br />

Direitos Reais, p. 207.<br />

357<br />

Art. 524 – “A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los<br />

do poder de quem quer que injustamente os possua.”<br />

358<br />

Ibid., p. 57.<br />

359<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 121.<br />

360<br />

BARROSO, Lucas Abreu. Novas fronteiras....In: <strong>DE</strong>LGA<strong>DO</strong>, Mário Luiz; ALVES Jones Figueiredo.<br />

(Coord.). Questões Controvertidas do Novo Código Civil. v. 5:São Paulo: Método, 2006. p. 365.<br />

126


“ é forçoso compreender que tanto o atendimento da função quanto o da função sócio<br />

ambiental da propriedade devem ser uma preocupação de todos os aplicadores e<br />

estudiosos do Direito que almejam a construção de uma sociedade livre justa e solidária<br />

... Para que esse objetivo seja alcançado, os interesses egoísticos devem ser reduzidos<br />

em prol do interesse de todos”<br />

Desta monta, podemos verificar que o novel dispositivo privado de 2002<br />

transcende de forma nunca vista antes, pois além de ser verificada a implementação da<br />

função social do direito de propriedade, verificamos ainda a questão da função<br />

362 363<br />

socioambiental deste.<br />

361<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 122.<br />

362<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 120 e 102.<br />

363<br />

Este é o mesmo entendimento do Supremo Tribunal Federal que se posicionou nos seguintes termos:<br />

E M E N T A: MEIO AMBIENTE - <strong>DIREITO</strong> À PRESERVAÇÃO <strong>DE</strong> SUA INTEGRIDA<strong>DE</strong> (CF, ART. 225) -<br />

PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU CARÁTER <strong>DE</strong> METAINDIVIDUALIDA<strong>DE</strong> - <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong><br />

TERCEIRA GERAÇÃO (OU <strong>DE</strong> NOVÍSSIMA DIMENSÃO) QUE CONSAGRA O POSTULA<strong>DO</strong> DA<br />

SOLIDARIEDA<strong>DE</strong> - NECESSIDA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> IMPEDIR QUE A TRANSGRESSÃO A ESSE <strong>DIREITO</strong> FAÇA<br />

IRROMPER, NO SEIO DA COLETIVIDA<strong>DE</strong>, CONFLITOS INTERGENERACIONAIS - ESPAÇOS<br />

TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGI<strong>DO</strong>S (CF, ART. 225, § 1º, III) - ALTERAÇÃO E<br />

SUPRESSÃO <strong>DO</strong> REGIME JURÍDICO A ELES PERTINENTE - MEDIDAS SUJEITAS AO PRINCÍPIO<br />

CONSTITUCIONAL DA RESERVA <strong>DE</strong> LEI - SUPRESSÃO <strong>DE</strong> VEGETAÇÃO EM ÁREA <strong>DE</strong><br />

PRESERVAÇÃO PERMANENTE - POSSIBILIDA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, CUMPRIDAS<br />

AS EXIGÊNCIAS LEGAIS, AUTORIZAR, LICENCIAR OU PERMITIR OBRAS E/OU ATIVIDA<strong>DE</strong>S NOS<br />

ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGI<strong>DO</strong>S, <strong>DE</strong>S<strong>DE</strong> QUE RESPEITADA, QUANTO A ESTES, A<br />

INTEGRIDA<strong>DE</strong> <strong>DO</strong>S ATRIBUTOS JUSTIFICA<strong>DO</strong>RES <strong>DO</strong> REGIME <strong>DE</strong> PROTEÇÃO ESPECIAL -<br />

RELAÇÕES ENTRE ECONOMIA (CF, ART. 3º, II, C/C O ART. 170, VI) E ECOLOGIA (CF, ART. 225) -<br />

COLISÃO <strong>DE</strong> <strong>DIREITO</strong>S FUNDAMENTAIS - CRITÉRIOS <strong>DE</strong> SUPERAÇÃO <strong>DE</strong>SSE ESTA<strong>DO</strong> <strong>DE</strong><br />

TENSÃO ENTRE VALORES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES - OS <strong>DIREITO</strong>S BÁSICOS DA<br />

PESSOA HUMANA E AS SUCESSIVAS GERAÇÕES (FASES OU DIMENSÕES) <strong>DE</strong> <strong>DIREITO</strong>S (RTJ<br />

164/158, 160-161) - A QUESTÃO DA PRECEDÊNCIA <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> À PRESERVAÇÃO <strong>DO</strong> MEIO<br />

AMBIENTE: UMA LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL EXPLÍCITA À ATIVIDA<strong>DE</strong> ECONÔMICA (CF, ART.<br />

170, VI) - <strong>DE</strong>CISÃO NÃO REFERENDADA - CONSEQÜENTE IN<strong>DE</strong>FERIMENTO <strong>DO</strong> PEDI<strong>DO</strong> <strong>DE</strong><br />

MEDIDA CAUTELAR. A PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDA<strong>DE</strong> <strong>DO</strong> MEIO AMBIENTE: EXPRESSÃO<br />

CONSTITUCIONAL <strong>DE</strong> UM <strong>DIREITO</strong> FUNDAMENTAL QUE ASSISTE À GENERALIDA<strong>DE</strong> DAS<br />

PESSOAS. - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico<br />

direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ<br />

158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar,<br />

em benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter<br />

transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável, representa a<br />

garantia de que não se instaurarão, no seio da coletividade, os graves conflitos intergeneracionais<br />

marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse bem<br />

essencial de uso comum das pessoas em geral. Doutrina. A ATIVIDA<strong>DE</strong> ECONÔMICA NÃO PO<strong>DE</strong> SER<br />

EXERCIDA EM <strong>DE</strong>SARMONIA COM OS PRINCÍPIOS <strong>DE</strong>STINA<strong>DO</strong>S A TORNAR EFETIVA A<br />

PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. - A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por<br />

interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda<br />

127


Desta monta, a preocupação do legislador infraconstitucional no tocante da<br />

matéria ambiental vai ao encontro ao caput do art. 225 364 da Magna Carta, que<br />

estabelece as regras aplicadas Constitucionalmente para as questões relacionadas ao<br />

Meio Ambiente, bem como, busca garantir a todos o meio ambiente ecologicamente<br />

equilibrado, a qualidade de vida sadia e impor ao Poder Público e à coletividade o dever<br />

de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.<br />

Aspecto interessante a ser observado ainda, é a redação do, § 2º, do artigo 1228.<br />

Tal dispositivo, visa proibir os atos que não trazem ao proprietário qualquer<br />

comodidade, utilidade ou vantagem e sejam motivados pela intenção de prejudicar<br />

outrem.<br />

Insta salientar, que este dispositivo, vai ao encontro do abuso do direito previsto<br />

no Código Civil de 2002, e sendo assim, sendo necessárias algumas ponderações<br />

quanto a esta temática.<br />

mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege,<br />

está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF,<br />

art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio<br />

ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os<br />

instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do<br />

meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que<br />

provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem-estar da<br />

população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu<br />

aspecto físico ou natural. A QUESTÃO <strong>DO</strong> <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO NACIONAL (CF, ART. 3º, II) E A<br />

NECESSIDA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDA<strong>DE</strong> <strong>DO</strong> MEIO AMBIENTE (CF, ART. 225): O<br />

PRINCÍPIO <strong>DO</strong> <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO FATOR <strong>DE</strong> OBTENÇÃO <strong>DO</strong> JUSTO<br />

EQUILÍBRIO ENTRE AS EXIGÊNCIAS DA ECONOMIA E AS DA ECOLOGIA. - O princípio do<br />

desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra<br />

suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator<br />

de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no<br />

entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais<br />

relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo<br />

essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente,<br />

que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes<br />

e futuras gerações.. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA <strong>DE</strong> INCONSTITUCIONALIDA<strong>DE</strong>. ADI-<br />

MC 3540 / DF - DISTRITO FE<strong>DE</strong>RAL<br />

364 Art. 225. – “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do<br />

povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de<br />

defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”<br />

128


Para o Rodrigo Mazzei 365 :<br />

“Contudo, apesar do campo para comentários e críticas envolvendo as figuras jurídicas<br />

ser muito grande, desafiando estudos próprios para tal mister, há no Código Civil de 2002<br />

um ponto comum que une a propriedade e o abuso do direito em contradição inesperada”<br />

Em decorrência disto, faremos um comparativo entre o artigo 1228, § 2° e o novo<br />

artigo 187 para vislumbra melhor a distinção.<br />

Corroborando esta idéia, preliminarmente discorreremos o artigo referente ao<br />

abuso de direito, e posteriormente a inovação no direito de propriedade.<br />

“Art. 187 Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede<br />

manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa- fé ou<br />

pelos bons costumes.”<br />

“Art. 1.228 O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de<br />

reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.<br />

(....)<br />

§ 2º - São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou<br />

utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.”<br />

Na vigência do Código Civil de 1916, a previsão do abuso de direito era<br />

extremamente restrita 366 e dispunha in verbis:<br />

“Art. 160. Não constituem atos ilícitos:<br />

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido”<br />

365 Introdução Crítica ao Código Civil, p.346.<br />

366 Neste sentido, o Ministro César Peloso dispõe: “O Código Civil de 1916 continha tímido dispositivo a<br />

respeito do abuso de direito, consubstanciado no inc. I do art. 160, que se limitava a expor não<br />

constituem atos ilícitos “ os praticados em legitima defesa ou no exercício regular de um direito<br />

reconhecido.” Código Civil comentado, p. 110.<br />

129


Em decorrência da referida disposição legal, foram formadas duas correntes<br />

teóricas que tratam da referida temática no tocante da vontade do agente, ou seja, a<br />

teoria objetivista e subjetivista.<br />

Tais teorias sobre o abuso do direito, foram emplastradas sob o preceito de uma<br />

interpretação contra sensu. Pois não havia na vigência do Código Civil 1916 a definição<br />

clara do instituto abuso do direito. 367<br />

Desta forma para a teoria subjetivista, o abuso de um direito configura-se quando<br />

um sujeito causar dano a outrem, exigindo-se ainda, para configuração deste o ânimo<br />

de prejudicar outrem. Para os objetivistas, há abuso de direito sempre que o exercício<br />

volta-se à satisfação de interesses ilegítimos, ou em desconformidade com sua<br />

destinação econômica ou social. 368<br />

Com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, tais teorias, não são mais<br />

necessárias para analisarmos o instituto do abuso de direito isoladamente. Tal<br />

justificativa tem como fundamento a clara redação do artigo 187 do Código Civil.<br />

Ao correlacionar o artigo 187 e o § 2º, do artigo 1.228 do Código Civil, temos<br />

uma clara incompatibilidade quanto à intenção do sujeito.<br />

Neste diapasão, Rodrigo Mazzei acrescenta 369 :<br />

367 Conforme festejado desembargador Sylvio Capanema conforme palestra ministrada no curso de pósgraduação<br />

realizada em 19 de maio de 2008, na Faculdade Autônoma de Direito – FADISP, função social<br />

dos contratos e boa fé.<br />

368 Neste sentido, o Decágono Ministro César Peloso dispõe: “Parte da doutrina entendia que o preceito<br />

consagrava a figura citada, por uma interpretação contra sensu. Duas tradicionais correntes – a subjetiva<br />

e a objetiva – procuram justificar e dar os contornos da teoria do abuso de direito. (...) Para os<br />

subjetivistas, consiste a figura no uso de um direito com o fim de causar dano a outrem, exigindo-se o<br />

ânimo de prejudicar, ou, em tendência mais tênue, ao menos o exercício culposo do abuso do direito. (...)<br />

Para os objetivistas, há abuso de direito sempre que o exercício volta-se à satisfação de interesses<br />

ilegítimos, ou em desconformidade com sua destinação econômica ou social. Código Civil Comentado,<br />

doutrina e jurisprudência.” Código Civil comentado, p. 1048.<br />

369 Introdução Crítica ao Código Civil, p. 346.<br />

130


“... dois critérios absolutamente diferentes (objetivo no art. 187 e subjetivo no art. 1.228, §<br />

2º), a contradição criada no ponto de contato entre o abuso do direito e a propriedade<br />

merece ser solucionada...”<br />

Sobre a aplicabilidade do referido dispositivo o Ministro César Peloso dispõe<br />

que 370 :<br />

“O preceito em exame inclina-se de modo claro pela corrente subjetiva, exigindo, para<br />

configuração do abuso do direito, consistente em uma conduta que não traga proveito,<br />

vantagem ou utilidade ao proprietário; o segundo requisito é subjetivo, consistente no<br />

ânimo do proprietário de com tal conduta prejudicar outrem.<br />

A regra em exame, contudo, deve ser examinada sistematicamente com a figura do<br />

abuso do direito prevista na parte geral (...) que positivou o principio como cláusula geral,<br />

de modo amplo e operativo.<br />

Não resta duvida de se aplica ao instituto da propriedade tanto a teoria subjetiva como a<br />

objetiva do art. 187, muito mais operativa ao conceber o instituto como violação ao<br />

espírito do direito ou seu fim social”<br />

Corroborando esta idéia da aplicabilidade da teoria objetiva ao artigo 1.228, §2º,<br />

já encontramos morada no Enunciado 49 da Primeira Jornada promovida pelo Centro<br />

de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal realizado sob a coordenação do<br />

Ministro Ruy Rosado que dispõe:<br />

“Art. 1.228, § 2º - Enunciado 49: A regra do art. 1.228, § 2º, do novo Código Civil<br />

interpreta-se restritivamente, em harmonia com o princípio da função social da<br />

propriedade e com o disposto no art. 187.”<br />

Rodrigo Mazzei vai além e propõe 371 :<br />

“A melhor solução para a problema é a reforma legislativa, com a retirada do disposto no<br />

§ 2º, do art. 1.288 do Código Civil, pois se eliminará a norma conflituosa, sendo o art. 187<br />

370 Código Civil comentado, p. 1048 – 1049.<br />

371 Introdução Crítica ao Código Civil, p. 346.<br />

131


do mesmo diploma suficiente para regular o abuso do direito, em qualquer relação ou<br />

figura privada, abrangendo os atos decorrentes do exercício dos poderes inerentes à<br />

propriedade”<br />

Apesar dos elementos serem extremamente distintos, os artigos em questão<br />

devem ser examinadas sistematicamente com a figura do abuso do direito prevista<br />

como cláusula geral, cabendo então, a análise das circunstâncias em cada caso, pelo<br />

magistrado verificando a efetividade da função social e econômica da propriedade.<br />

Da melhor idéia usada na ontognoselogia jurídica de Miguel Reale, se funde no<br />

direito das coisas e no direito pessoal no mesmo plano. 372<br />

Em continuidade ao estudo do presente artigo, temos ainda § 3º, onde um<br />

determinado o proprietário poderá perder sua propriedade em casos de desapropriação<br />

por necessidade, utilidade pública ou interesse social, bem como, no caso de<br />

requisição, em caso de perigo público iminente.<br />

Dispõe in verbis:<br />

“Artigo 1.228, § 3º - O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de<br />

desapropriação, por necessidade utilidade pública ou interesse social, bem como, no<br />

caso de requisição, em caso de perigo público iminente.”<br />

Segundo nosso ver, não cabem maiores apontamentos sobre o referido instituto,<br />

pois é uma forma da perda da propriedade previstas Constitucionalmente, Há três leis<br />

especiais que regulamentam este instituto, a Lei 8.629/93 (Desapropriação para fins de<br />

reforma agrária), a Lei 4.132/62 (Desapropriação para fins de interesse público) e o<br />

Decreto Lei 3.365/41 (Desapropriação para fins de utilidade pública).<br />

372<br />

Flávio Tartuce, Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de<br />

2002, p. 67.<br />

132


Por fim, temos os parágrafos §§ 4º e 5º do artigo 1.228, tais dispositivos prevêem<br />

uma nova forma de modalidade de expropriação privada, com regras e ponderações<br />

especificas.<br />

Entendemos que estes, privilegiam a função social da posse e por isso,<br />

trataremos destes no próximo item do presente capítulo.<br />

Encerrando o estudo dos Instrumentos do novo Código Civil o art. 2.035, e<br />

parágrafo único 373 que se observa a eficácia temporal da aplicabilidade da função social<br />

dos Contratos e da Propriedade.<br />

Desta forma, o legislador infraconstitucional, novo Código Civil define de forma<br />

clara os limites temporais de negócios nos seguintes termos:<br />

I) Os negócios jurídicos firmados até de 11.01.2003, ou seja, da entrada<br />

em vigor do Código Civil 2002 são regidos por leis do tempo de sua<br />

celebração;<br />

II) Caso os efeitos dos negócios jurídicos firmados até de 11.01.2003<br />

“adentrarem” vigência do Código Civil de 2002, aos preceitos destes se<br />

subordinará;<br />

III) Todavia caso o negócio previu exceção, podem os efeitos não ser<br />

atingidos pelo Novo Código Civil.<br />

373 Art. 2.035. - A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor<br />

deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos,<br />

produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido<br />

prevista pelas partes determinada forma de execução. Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá<br />

se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a<br />

função social da propriedade e dos contratos.<br />

133


3.4.3 Instrumentos Infraconstitucionais<br />

Prefacialmente, antes de esboçar alguns dos instrumentos mais importantes da<br />

função social da propriedade, se faz necessário, ressaltar que estes, não são os objetos<br />

de estudo do presente trabalho monográfico, todavia, tais instrumentos são de suma<br />

importância para o presente trabalho e assim, entendemos como mais prudente,<br />

objetivando a excelência do presente trabalho, pontuar-los, mesmo que de forma<br />

superficial.<br />

Sendo assim, os instrumentos infraconstitucionais da função social da<br />

propriedade são os instrumentos basilares e norteadores para a devida aplicação do<br />

direito de propriedade.<br />

Tais instrumentos, têm como natureza jurídica assegurar e restringir interesses e<br />

valores específicos dos proprietários e terceiros intervenientes daquele.<br />

Neste mesmo sentido verifica o Guilherme Calmon Nogueira da Gama 374 :<br />

“...A legislação infraconstitucional como, por exemplo as Leis nºs 4.504/64 (Estatuto da<br />

Terra) e 10.257/2001 (Estatuto da Cidade)” trouxesse os meios hábeis à concretização<br />

da função social da propriedade...”<br />

Desta monta, temos o § 1°, do artigo 2°, da Lei n° 4.504 de 30 de novembro de<br />

1964, dispõe in verbis:<br />

“Art. 2° É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra,<br />

condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei. § 1° A propriedade da<br />

terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente: a)<br />

favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim<br />

como de suas famílias; b) mantém níveis satisfatórios de produtividade; c) assegura a<br />

conservação dos recursos naturais; d) observa as disposições legais que regulam as<br />

justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem.”<br />

374 Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Função social no Direito Civil. São Paulo: Atlas, 2007. p. 48.<br />

134


Ao analisarmos o referido dispositivo, – este, que é muito similar ao artigo 186 da<br />

Magna Carta – podemos entender que a propriedade da terra, somente desempenha<br />

integralmente sua função social quando, cumulativamente favorecer o bem-estar dos<br />

proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias,<br />

quando mantém níveis satisfatórios de produtividade, assegurando ainda, a<br />

conservação dos recursos naturais e por fim, observar as disposições legais que<br />

regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem.<br />

Ainda no âmbito das propriedades rurais, temos o Decreto Federal nº 95.715/88,<br />

que regulamenta as desapropriações para efeitos de reforma agrária.<br />

Insta salientar, que referido dispositivo legal, relaciona a respeito da propriedade<br />

rural aos princípios da ordem econômica e social, na exploração da propriedade rural,<br />

ou seja, o atendimento da função social da propriedade rural.<br />

Já no âmbito da propriedade urbana, temos o Estatuto da Cidade, objeto da Lei<br />

nº 10.257/01, este que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal e<br />

estabelece diretrizes gerais da política urbana.<br />

O regramento da função social da propriedade urbana, está alocada no artigo 38<br />

da Lei nº 10.257/01, in verbis:<br />

“Artigo 39 A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências<br />

fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o<br />

atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social<br />

e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no<br />

art. 2 o desta Lei.”<br />

Deste dispositivo legal, podemos afirmar com exatidão que a propriedade urbana<br />

somente atende sua função social quando atender às exigências fundamentais de<br />

ordenação da cidade expressas no plano diretor, com o intuito de assegurar o<br />

atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça<br />

135


social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, bem como, respeitar as<br />

diretrizes previstas no artigo 2º da Lei n. 10.257/01.<br />

Conforme demonstraremos abaixo, tal dispositivo infraconstitucional, ao<br />

regulamentar os artigos já citados da Magna Carta, exterioriza lidimamente o avanço na<br />

interferência do Poder Público sobre a propriedade privada nos termos do artigo 2º da<br />

referida lei.<br />

Referido dispositivo é muito extenso e contém várias disposições passíveis de<br />

discussão, bem como, para esgotá-lo corretamente, demandaria muitas e extensas<br />

laudas, desta forma, pontuaremos os itens que entendemos mais relevantes ao<br />

presente estudo.<br />

Oportuno se torna dizer que o artigo 2º, em seu caput, determina que a política<br />

urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade<br />

e da propriedade urbana.<br />

Por seu turno, o inciso I, visa garantir o direito a cidades sustentáveis, entendido<br />

como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura<br />

urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes<br />

e futuras gerações;<br />

Corroborando com a idéia de limitações ao direito de propriedade, o inciso VI, do<br />

artigo 2º 375 dispõe sobre o controle do uso do solo objetivando evitar abusos<br />

decorrentes dos atos dos proprietários.<br />

375 Art. 2º - “A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da<br />

cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: VI – ordenação e controle do<br />

uso do solo, de forma a evitar: a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos; b) a proximidade de usos<br />

incompatíveis ou inconvenientes; c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou<br />

inadequados em relação à infra-estrutura urbana; d) a instalação de empreendimentos ou atividades que<br />

possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente; e)<br />

a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização; f) a<br />

deterioração das áreas urbanizadas; g) a poluição e a degradação ambiental.”<br />

136


Referidas disposições estabelecidas no Estatuto da Cidade, buscam a<br />

interferência da Sociedade e do Estado na efetiva utilização do bem pelo proprietário,<br />

bem como, e por fim, aplicar sanções nos casos de inobservância da utilização<br />

adequada do patrimônio imobiliário 376 .<br />

Temos ainda, diversas normas infraconstitucionais que visão o atendimento da<br />

função social da propriedade, dentre elas, nos deparamos costumeiramente com Lei nº<br />

6.766/79, de cunho urbanístico, impondo ao proprietário de grandes áreas<br />

determinadas diretrizes para o parcelamento do solo urbano.<br />

Outra lei de sua importância para a função sócio-ambiental da propriedade é a<br />

Lei nº 6.938/81 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, e cria sistemas<br />

de proteção ao meio ambiente.<br />

Ao estudarmos não somente os dispositivos infraconstitucionais ora apregoados,<br />

mas sim, ao observar todas as demais normas, que aqui não foram devidamente<br />

alocadas. Concluimos que estas devem ser entendidas de forma a complementar aos<br />

dispositivos previstos na Constituição Federal e Código Civil vigente, e assim aplicar a<br />

efetiva função social do direito de propriedade.<br />

3.5 Breve arrazoado sobre a função social da posse<br />

Superado o tema supracitado, como notório se faz entendemos que, não há no<br />

sistema jurídico brasileiro uma disposição legal expressa da função social da posse.<br />

376 Art. 7º - “Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art.<br />

5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5o do art. 5o desta Lei, o Município<br />

procederá à aplicação do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no<br />

tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.” § 1º - “O valor da<br />

alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a que se refere o caput do art. 5o desta<br />

Lei e não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de<br />

quinze por cento.”§ 2º - “Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em cinco<br />

anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação,<br />

garantida a prerrogativa prevista no art. 8º.” § 3º - “É vedada a concessão de isenções ou de anistia<br />

relativas à tributação progressiva de que trata este artigo.”<br />

137


Todavia conclui-se que esta decorre do próprio direito de propriedade, assegurando<br />

assim sua aplicabilidade.<br />

Nestes termos, o pioneiro Cristiano Chaves de Farias 377 transcreve:<br />

“... a ausência de regramento no direito privado em nada perturba filtragem constitucional<br />

sobre o importante modelo jurídico, pois o acesso à posse é um instrumento de redução<br />

de desigualdades sociais e a justiça distributiva.”<br />

Referente à função social da posse, que no mesmo entender de Flávio<br />

Tartuce 378 , compreende que esta é a mera exteriorização do direito de propriedade e<br />

assim emplacando automaticamente ao principio da socialidade.<br />

O Guilherme Calmon Nogueira da Gama, pontua como de praxe 379 :<br />

“Tradicionalmente só pode haver posse onde haja propriedade; se não houver<br />

propriedade, não poderá haver posse. A posse é a aparência de propriedade; o<br />

possuidor pratica atos inerentes ao de um proprietário, ainda que não o seja. (...) A<br />

função social da propriedade e a função social da posse, na verdade são os dois lados<br />

da de uma mesma moeda. A posse, como conteúdo do direito, é indispensável à<br />

propriedade para que esta cumpra sua função social e receba s proteção social. ”<br />

Não obstante deve-se constar, que apesar da posse e da propriedade serem<br />

correlatas entre si, elas devem ser tratadas e entendidas de forma distintas.<br />

Assim, devemos estudar ambos os institutos de forma autônoma. Tal justificativa<br />

tem como fundamento a possibilidade de distinguir a função social da posse sem tratar<br />

da propriedade.<br />

377 Direitos Reais, p.42.<br />

378 Introdução Crítica ao Código Civil, p. 366.<br />

379 Função social no Direito Civil. p. 64 – 65.<br />

138


Neste sentido, como leciona Flavio Tartuce é possível que um determinado<br />

sujeito possa ter a posse de um determinado bem – sendo assim somente mero<br />

detentor – e tirar algum proveito deste 380 .<br />

Ademais, temos artigos 1.238, parágrafo único 381 , e 1.242, parágrafo único 382 , do<br />

Código Civil de 2.002 que enfatizam a função social da posse pela diminuição dos<br />

prazos da usucapião, bem como, a previsão dos parágrafos 4º e 5º do artigo 1.228 que<br />

inova trazendo a Desapropriação Judicial por Posse-Trabalho 383 .<br />

Neste diapasão, Flávio Tartuce pontua:<br />

“Mesmo a posse recebe uma função social, já que o Código prevê a diminuição dos<br />

prazos de usucapião quando estiver configurada a “posse-trabalho”, situação fática em<br />

que o possuidor despendeu tempo e labor na ocupação de determinado imóvel. A nova<br />

codificação valoriza aquele que “planta e colhe”, o trabalho da pessoa natural, do cidadão<br />

comum. Tais regras podem ser captadas pela leitura dos arts. 1.238, parágrafo único, e<br />

1.242, parágrafo único, do Código Civil de 2.002.”<br />

Insta salientar, que o instituto do Usucapião não é objeto do presente trabalho<br />

monográfico, por este motivo não adentraremos ao estudo deste. Não obstante, se faz<br />

obrigatória a leitura do novel instituto da Desapropriação Judicial por Posse-Trabalho.<br />

380 “Na verdade , mesmo sendo exteriorização da propriedade, o que também comprova sua função<br />

social a posse com ela não se confunde. É cediço que determinada pessoa pode ter a posse sem ser<br />

proprietária do bem, já que ser proprietário é ter o domínio da coisa. A posse significa apenas ter a<br />

disposição do da coisa, utilizando-se dela e tirando-lhe os frutos com fins socioeconômicos” Introdução<br />

Crítica ao Código Civil, p. 366.:<br />

381 Art. 1.238. – “Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um<br />

imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que<br />

assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.<br />

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver<br />

estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.”<br />

382 Art. 1.242. – “Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente,<br />

com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.<br />

Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido,<br />

onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde<br />

que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse<br />

social e econômico.”<br />

383 Expressão defendida por Miguel Reale, Maria Helena Diniz e Flavio Tartuce, e por nós compartilhada.<br />

139


Assim, ao tratarmos dos parágrafos §§ 4º e 5º do artigo 1.228, devemos nos<br />

debruçar sobre este tema, de forma um pouco mais profunda, porém sem esgotar<br />

devidamente este, pois a gama de novas posições e questionamentos ainda sem<br />

respostas são muitas.<br />

Tal justificativa tem como fundamento, dois pontos básicos – diríamos até<br />

correlatos – o primeiro deriva de sua notória inovação, bem como, em um segundo<br />

momento sua aplicabilidade fática restaria por prejudicada.<br />

Dispõe a referida legis in verbis:<br />

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de<br />

reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. (...) § 4 O<br />

proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em<br />

extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável<br />

número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente,<br />

obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5 No<br />

caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário;<br />

pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos<br />

possuidores.<br />

O novel dispositivo, traz consigo uma gama relevante de requisitos para sua<br />

realização, desta forma, o proprietário poderá perder sua propriedade quando:<br />

I) Caso o imóvel reivindicado consistir em extensa área;<br />

II) Os possuidores adquirentes devem ter a posse ininterrupta e de boa-fé, por<br />

mais de cinco anos;<br />

III) Há a necessidade de considerável número de pessoas;<br />

140


IV) Tais pessoas, obrigatoriamente devem realizar, em conjunto ou<br />

separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e<br />

econômico relevante; e<br />

V) O juiz no caso de procedência da ação em favor dos possuidores fixará uma<br />

justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença<br />

como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores<br />

Não podemos negar que idéia de posse trabalho, apresentada neste instituto,<br />

apregoa de forma clara tem a aplicação na função social da posse, porém com vários<br />

problemas quanto da interpretação e aplicação deste instituto.<br />

Boa parte destes problemas, foram objetos de debates junto a todas as Jornadas<br />

de Direito Civil promovidas pelo Conselho da Justiça Federal e foram editados alguns<br />

Enunciados. 384<br />

384 I) Primeira Jornada de Direito Civil: 82 – Art. 1.228: É constitucional a modalidade aquisitiva de<br />

propriedade imóvel prevista nos §§ 4º e 5º do art. 1.228 do novo Código Civil. II) Terceira Jornada de<br />

Direito Civil: 240 – Art. 1.228: A justa indenização a que alude o parágrafo 5º do art. 1.228 não tem como<br />

critério valorativo, necessariamente, a avaliação técnica lastreada no mercado imobiliário, sendo<br />

indevidos os juros compensatórios; 241 – Art. 1.228: O registro da sentença em ação reivindicatória, que<br />

opera a transferência da propriedade para o nome dos possuidores, com fundamento no interesse social<br />

(art. 1.228, § 5o), é condicionada ao pagamento da respectiva indenização, cujo prazo será fixado pelo<br />

juiz; III) Quarta Jornada de Direito Civil: 304 – Art.1.228. São aplicáveis as disposições dos §§ 4º e 5º do<br />

art. 1.228 do Código Civil às ações reivindicatórias relativas a bens públicos dominicais, mantido,<br />

parcialmente, o Enunciado 83 da I Jornada de Direito Civil, no que concerne às demais classificações dos<br />

bens públicos; 306 – Art.1.228. A situação descrita no § 4 º e 5º do art. 1.228 do Código Civil enseja a<br />

improcedência do pedido reivindicatório. 307 – Art.1.228. Na desapropriação judicial (art. 1.228, § 4º),<br />

poderá o juiz determinar a intervenção dos órgãos públicos competentes para o licenciamento ambiental<br />

e urbanístico; 308 – Art.1.228. A justa indenização devida ao proprietário em caso de desapropriação<br />

judicial (art. 1.228, § 5°) somente deverá ser suportada pela Administração Pública no contexto das<br />

políticas públicas de reforma urbana ou agrária, em se tratando de possuidores de baixa renda e desde<br />

que tenha havido intervenção daquela nos termos da lei processual. Não sendo os possuidores de baixa<br />

renda, aplica-se a orientação do Enunciado 84 da I Jornada de Direito Civil; 309 – Art.1.228. O conceito<br />

de posse de boa-fé de que trata o art. 1.201 do Código Civil não se aplica ao instituto previsto no § 4º do<br />

art. 1.228; 310 - Art.1.228. Interpreta-se extensivamente a expressão “imóvel reivindicado” (art. 1.228, §<br />

4º), abrangendo pretensões tanto no juízo petitório quanto no possessório; 311 - Art.1.228. Caso não seja<br />

pago o preço fixado para a desapropriação judicial, e ultrapassado o prazo prescricional para se exigir o<br />

crédito correspondente, estará autorizada a expedição de mandado para registro da propriedade em favor<br />

dos possuidores; 312 – Art.1.239. Observado o teto constitucional, a fixação da área máxima para fins de<br />

usucapião especial rural levará em consideração o módulo rural e a atividade agrária regionalizada.<br />

141


De todos estes Enunciados – que são de grande valor para os estudiosos –<br />

podemos erradicar vários problemas apontados anteriormente pela Doutrina, sendo<br />

assim verifica-se que a aplicação deste, segundo o nosso ver, são de suma<br />

importância.<br />

Outro tema criticado trata-se da imprecisão do legislador segundo alguns<br />

requisitos como: O que é em extensa área?; Qual é o termo inicial para contagem dos<br />

cinco anos?; Qual é a quantidade exata para identificar número de pessoas?; Qual o<br />

valor exato para justa indenização devida ao proprietário?; dentre outras questões.<br />

Pontua sobre estas questões Flávio Tartuce 385 :<br />

“Observa-se que o instituto está relacionado a vários conceitos legais indeterminados, já<br />

que o dispositivo não menciona qual seria esta extensa área, qual o número de pessoas<br />

e, principalmente, quais seriam as obras tidas como de relevante caráter social. A fixação<br />

da justa indenização também dependerá do poder discricionário do juiz da causa.”<br />

Neste caso, entendemos que mais uma vez nos deparamos com um dos<br />

princípios norteadores do novo Código Civil, ou seja, estamos diante de uma cláusula<br />

geral, e ainda, entendemos, que todas estas questões devem ser superadas pela<br />

interpretação do Magistrado.<br />

Este que, – claramente na atualidade – deixou de ser um mero aplicador da lei e<br />

passa a ter a responsabilidade de interpretar e aplicar esta devidamente, nos termos<br />

dos princípios gerais conforme seu entendimento.<br />

Da aplicabilidade do referido instituto, ventila Cristiano Chaves de Farias ao Citar<br />

Teori Albino Zavascki 386 :<br />

“Concordamos com a teoria de Teori Albino Zavascki quando admite que o instituto<br />

desafiará a angustia da doutrina e dos juízes, pois “fundado em diversos conceitos<br />

385<br />

A Função Social da Posse e da Propriedade e o Direito Civil Constitucional, p. 7.<br />

386<br />

Direitos Reais, p.44.<br />

142


abertos, haverá de ser sua finalidade social bem compreendida para que possa ser<br />

adaptado às variedades circunstancias de cada caso concreto””<br />

Acrescenta Flavio Tartuce 387 :<br />

Acreditamos que esta desapropriação judicial está fadada ao insucesso, pois não<br />

visualizamos hipótese em que os ocupantes pagarão indenização ao proprietário. Mesmo<br />

assim, não vemos qualquer inconstitucionalidade na inovação, sendo certo que tal artigo<br />

está fundamentado, principalmente, na solidariedade social.<br />

Entendemos como preocupantes os aspectos levantados pelos mais respeitados<br />

e vanguardistas professores da atualidade, ou seja, para não haver distorções da<br />

aplicabilidade deste instituto, devemos maturar a idéia de finalidade social da<br />

propriedade, bem como, verificar – de forma a otimizá-los e corrigi-los quando<br />

necessário – os demais impasses para atender a solidariedade social.<br />

Por fim, não obstante o sistema jurídico brasileiro não ter uma disposição legal<br />

expressa da função social da posse, entendemos que sua aplicabilidade está<br />

devidamente assegurada, bem como, apesar desta ser uma mera exteriorização do<br />

direito de propriedade, deve ser tratada e colocada de forma distinta, pois é um<br />

instrumento efetivo da socialidade, prevista do Código Civil, e da solidariedade, prevista<br />

na Carta Magna.<br />

387 A Função Social da Posse e da Propriedade e o Direito Civil Constitucional, p. 7.<br />

143


CAPÍTULO 4 – A <strong>FUNÇÃO</strong> <strong>SOCIAL</strong> <strong>DO</strong> <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong><br />

4.1 Teoria Geral dos Direitos Reais: Principais pontos de correlação com o Direito<br />

de Superfície<br />

Ë de suma importância para o presente estudo, observar de forma preambular a<br />

Teoria Geral dos Direitos Reais e a Superfície, dentro dos direitos reais adequando o<br />

presente instituto aos contornos atuais do Direito Civil.<br />

Desta forma, dispõem Flávio Tartuce e José Fernando Simão 388 quando ao<br />

conceito de diretos reais:<br />

144<br />

“A partir das lições dos doutrinadores clássicos e contemporâneos, podemos<br />

conceituar os Direitos Reais como sendo as relações jurídicas estabelecidas<br />

entre pessoas e coisas determinadas ou determináveis, tendo como fundamento<br />

principal o conceito de propriedade seja ela pela plena ou restrita”<br />

Já para Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald o conceito de direitos<br />

reais visa regular 389 :<br />

“o poder do homem sobre certos bens suscetíveis de valor e os modos de sua<br />

utilização econômica. Certamente, ao longo de nossa abordagem, saltará claro<br />

que tal poder de atuação sobre bens encontrará seus contornos modernamente<br />

definidos pelo principio da função social”<br />

Poderíamos ainda, arrolar vários conceitos para os direitos reais, porém a idéia<br />

nuclear do presente estudo é este exposto, ou seja, relações jurídicas observadas entre<br />

388<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 24<br />

389<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 1.


sujeitos e bens determinados ou determináveis, tendo como fundamento principal o<br />

conceito de propriedade tendo o enfoque principal o cunho subjetivo relacionado a<br />

função social 390 .<br />

É fundamental observar a dicotomia das teorias justificadoras apregoadas por<br />

Orlando Gomes em sua obra. 391<br />

A primeira delas está relacionada à teoria personalista, que basicamente<br />

estabelece o critério pelo qual os direitos reais são relações jurídicas balizadas entre as<br />

pessoas, porem intermediadas por coisas.<br />

Assim, dispõe Orlando Gomes 392 “a diferença está no sujeito passivo. Enquanto<br />

no direito pessoal, esse sujeito passivo – o devedor – é pessoa certa e determinada, no<br />

direito real seria indeterminada, havendo neste caso uma obrigação passiva universal, a<br />

de respeitar o direito – obrigação que se concretiza toda vez que alguém o viola”.<br />

Por outro lado, existe ainda, a teoria realista ou clássica que dispõe claramente<br />

do exercício de uma pessoa sobre uma coisa, tendo esta eficácia contra todos, ou ainda<br />

também denominada de erga omnes. Desta forma, se distingui de forma nítida e clara<br />

da teoria anterior.<br />

Entre as teorias ora apregoadas, nos veredamos a mais próxima, ou seja, a<br />

teoria realista ou clássica que determina o exercício das faculdades de usar, gozar e<br />

dispor tendo como objéto a coisa em detrimento a um relacionamento negativo<br />

universal e de exclusão 393 .<br />

390<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 24<br />

391<br />

GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. Ed. Ver., atual. E aum. de acordo com o Código Civil de 2002.<br />

Atualizador Luiz Edson Fachin. Coord. Edvaldo Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p 10 à 17.<br />

392<br />

GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. Ed. Ver., atual. E aum. de acordo com o Código Civil de 2002.<br />

Atualizador Luiz Edson Fachin. Coord. Edvaldo Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p 12 à 17.<br />

393<br />

Neste sentido: TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed.<br />

São Paulo: Método, 2008. p. 24 e CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais.<br />

4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 15<br />

145


Não obstante observamos e nos posicionarmos na direção da teoria realista ou<br />

clássica, assim como o fez Flávio Tartuce e José Fernando Simão não, poderíamos<br />

deixar de citar uma nova tendência no Direito Privado denominada de contratualiazação<br />

do Direito Civil. 394<br />

Segundo esta nova tendência – ainda sujeita de confirmação – tem-se como<br />

característica fundamental que todos os instrumentos negociais de Direito Civil, ou seja,<br />

os contratos, teriam um dirigismo negocial ou contratual da intervenção legal ou<br />

estatal 395 .<br />

Neste sentido dispõe Flávio Tartuce e José Fernando Simão 396 :<br />

“é preciso apontar que há forte tendência de contratualização do Direito Privado, ou seja,<br />

o contrato vem ganhando campos que antes não eram de sua abrangência. Por isso,<br />

ouse-se afirmar que todos os institutos negociais de Direito Civil seriam contratos, pela<br />

forte influencia exercida pelo principio da autonomia provada... De qualquer forma, ainda<br />

é cedo para confirmar essa tendência de contratualiazação, principalmente no Brasil, o<br />

que colocaria em xeque toda a divisão metodológica que aqui se propõe”<br />

Todavia, entendemos que tal proposta é ousada e de certa forma ultrajante ao<br />

direito posto. Pois conforme já apontado anteriormente, a referida disposição<br />

desmantelaria toda a base metodológica e conceitual do Direito Civil apregoada até<br />

então por vários juristas a décadas. 397<br />

Superado estes pontos fundamentais, devemos observar quais são as<br />

características ou também denominados, princípios dos direitos reais tão bem<br />

apregoadas por vários dos doutrinadores mais respeitados da atualidade 398 :<br />

394<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 25<br />

395<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 25<br />

396<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 25<br />

397<br />

Sobre este tema: PENTEA<strong>DO</strong>, Luciano de Camargo. Efeitos contratuais perante terceiros. São Paulo:<br />

Quartier Latin, 2007.<br />

398<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 20. CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de<br />

Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 3.<br />

146


a) O princípio do absolutismo ou ainda conhecido como oponibilidade erga omnes,<br />

ou seja, contra todos os membros da coletividade;<br />

b) Existência de um direito de seqüela, uma vez que os direitos reais aderem ou<br />

colam na coisa;<br />

c) Previsão de um direito de preferência a favor do titular de um direito real como é<br />

comum nos casos de direito real de garantia sobre coisa alheia (penhor e<br />

hipoteca);<br />

d) Possibilidade de abandono dos direitos reais, isto é de renúncia a tais direitos;<br />

e) Viabilidade de incorporação da coisa por meio da posse, de um domínio fático;<br />

f) Previsão da usucapião como um dos meios de sua aquisição. Vale dizer que a<br />

usucapião não atinge somente a propriedade, mas também outros direitos reais,<br />

caso das servidões (artigo 1379 do CC);<br />

g) Suposta obediência a um rol taxativo (numerus clausus) de institutos previstos<br />

em lei, o que consagra o princípio da tipicidade dos direitos reais;<br />

h) Regência pelo princípio da publicidade dos atos, o que se dá pela entrega da<br />

coisa ou pela tradição (no caso de bens móveis) e pelo registro (no caso de bens<br />

imóveis);<br />

i) Observância do princípio do absolutismo.<br />

Insta salientar, que todos estes tópicos arrolados são a base do sustentáculo dos<br />

direitos reais. Todavia devemos observar que o tais princípios ou características dos<br />

147


direitos reais não são absolutos, bem como com as novas tendências do Direito Civil,<br />

devem ser interpretados de uma forma sistêmica observando os novos paradigmas. 399<br />

O primeiro deles está relacionado ao princípio do absolutismo, também<br />

conhecido por oponibilidade erga omnes, que tem como fundamentação seu efeitos<br />

contra todos.<br />

Não obstante, devemos verificar outro princípio fundamental para os bens<br />

imóveis, denominado de principio da publicidade. Sem este, não há que se falar – a<br />

principio 400 – do direito de seqüela 401 oriundo do principio do absolutismo.<br />

Já para os Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald o conceito de direitos<br />

reais visa regular 402 :<br />

148<br />

“Como conseqüência do principio do absolutismo, surge o principio da<br />

publicidade, por excelência para bens imóveis. Os direitos reais só se podem<br />

exercer contra todos, se forem ostentados publicamente. Assim, pelo registro do<br />

título aquisitivo (art. 1227 do CC) é acautelada a segurança nas transações<br />

imobiliárias e também resguardada a boa-fé do adquirente do direito real e de<br />

terceiros que com ele se relacionem.”<br />

Conforme entendimento dos doutrinadores mais modernos, não há como<br />

sustentar que absolutismo engendrado no Código Civil de 1916 que apregoava o<br />

individualismo e o afastamento da intervenção do Estado nas relações privadas. 403<br />

399<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 26<br />

400<br />

Quando utilizamos a ponderação “a principio”, nos fundamentamos, na idéia de que não somente o<br />

proprietário resguardado da publicidade é detentor dos direitos inerentes a propriedade, restando ainda,<br />

por exemplo o possuidor, o locatário, o comodatário e etc.<br />

401<br />

Neste sentido: “Ação reivindicatória. Direitos reais. Propriedade. Possuidor sem Justo titulo. Os direitos<br />

reais conferem ao seu titular a possibilidade de segui a coisa sobre a qual recaem, onde quer que ela vá.<br />

A propriedade é o mais amplo dos direitos reais. Plena in re potesta e, por expressa disposição legal, é<br />

assegurado ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de quem quer que injustamente os possua.<br />

Possuidores sem justo título não podem permanecer no bem reivindicado, sob pena de enriquecimento<br />

ilícito, vedado no recurso improvido” (TJ/BA AC. 4ª Câm. Cív., ApCív. 67632 – comarca de Feira de<br />

Santana, rel. Dês. João Pinheiro de Souza)<br />

402<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 5.


Desta forma, ponderar que o absolutismo não deve ser mitigado em razão de<br />

outros princípios fundamentais, apregoados na Carta Política de 1988 seria uma<br />

heresia jurídica.<br />

Neste contexto, há disposições na doutrina moderna que, tal absolutismo não<br />

pode ser tido como um poder absoluto de seus titulares. Importante observar que assim<br />

como qualquer outro direito tido como fundamental o ordenamento o submete ao<br />

principio de valores, tendo em vista o atual status do Estado Democrático de Direito,<br />

marcado pela eticidade 404 e pela pluralidade, não cabendo assim espaço para<br />

dogmas 405 .<br />

Outro aspecto relevante que deve ser ponderado na mesma esteira, esta<br />

relacionado ao Enunciado n.º 274 aprovado na IV Jornada de Direito Civil dispondo que:<br />

“Os Direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil,<br />

são expressões da clausula geral de tutela humana, contida no artigo 1.º, III, da<br />

Constituição (principio da dignidade pessoa humana). Em caso de colisão entre eles,<br />

como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica de ponderação.” 406<br />

Se apregoamos a possibilidade de verificação e aplicação do princípio da<br />

dignidade da pessoa humana, os princípios, ou características dos direitos reais, como<br />

403<br />

Flávio Tartuce,Tendências do Novo Direito Civil: Uma Codificação para o 3° Milênio. Compreendendo<br />

a Nova Codificação, Disponível em: , Acesso em:<br />

10/06/2008.<br />

404<br />

Miguel Reale, Visão Geral do Novo Código Civil, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

405<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 3.<br />

406<br />

“O Conselho da Justiça Federal, por meio do seu Centro de Estudos Judiciários, dentre os muitos<br />

serviços que presta ao aperfeiçoamento da Justiça Federal, decidiu promover as Jornadas de Direito Civil<br />

e incluí-las na sua programação bienal. O objetivo é reunir em Brasília magistrados, professores,<br />

representantes das diversas carreiras jurídicas e estudiosos do Direito Civil para o debate, em mesa<br />

redonda, de temas sugeridos pelo novo Código Civil e aprovar enunciados que representem o<br />

pensamento da maioria dos integrantes de cada uma das diversas comissões (Parte Geral, Direito das<br />

Obrigações, Direito das Coisas, Direito de Empresa, Direito de Família e Direito das Sucessões)”. Ruy<br />

Rosado de Aguiar Junior, Apresentação: Jornadas de Direito Civil, Disponível em:<br />

, Acesso em: 13/03/2009.<br />

149


poderíamos deixar de aplicar outros princípios como a função social da propriedade, 407<br />

408 e outros como o respeito ao meio ambiente sustentável? 409 .<br />

Outro ponto que tem sido trazido às mesas de debates á a temática relacionada<br />

ao rol taxativo, numerus clausus relativos aos direitos reais previstos no atual artigo<br />

1.225 do Código Civil em vigor que dispõe:<br />

“Art. 1.225. São direitos reais:<br />

I - a propriedade;<br />

II - a superfície;<br />

III - as servidões;<br />

IV - o usufruto;<br />

V - o uso;<br />

VI - a habitação;<br />

VII - o direito do promitente comprador do imóvel;<br />

VIII - o penhor;<br />

IX - a hipoteca;<br />

X - a anticrese;<br />

XI – a concessão de uso especial para fins de mordia;<br />

XII – a concessão de direito real de uso.”<br />

Importante frisar, que a doutrina majoritária 410 entende que o rol supracitado é<br />

uma relação taxativa, ou seja, numerus clausus de institutos previstos em lei, o que<br />

consagra o princípio da tipicidade dos direitos reais.<br />

407<br />

Constituição Federal, “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,<br />

garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à<br />

liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXIII - a propriedade<br />

atenderá a sua função social”;<br />

408<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 26<br />

409<br />

Constituição Federal,Art. 225. – “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem<br />

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à<br />

coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 3º - As<br />

condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou<br />

jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente.”<br />

410<br />

Neste sentido: DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São<br />

Paulo: Saraiva, 2004. v. 4; PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. 4. ed. Rio de<br />

Janeiro: Forense, 1981. v. IV. p. 244.; GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. Ed. Ver., atual. E aum. de<br />

acordo com o Código Civil de 2002. Atualizador Luiz Edson Fachin. Coord. Edvaldo Brito. Rio de Janeiro:<br />

Forense, 2004. p 10 à 17.TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das<br />

150


Desta forma, nos termos dos ensinamentos do Arruda Alvim, somente os tipos<br />

previstos e consagrados no texto positivado poderão ser intitulados de direitos reais,<br />

bem como os demais institutos que não observam tal requisito formal, terá somente os<br />

seus efeitos em âmbito obrigacional. 411<br />

Defendendo esta posição, José Guilherme de Braga Teixeira pondera 412 :<br />

“Cumpre insistir, quanto à caracterização de um direito real, que há duas correntes<br />

distintas disputando a posição vencedora: uma proclama serem direitos reais todos<br />

aqueles institutos que apresentam as características principais desses direitos; outra q<br />

que entende não bastar a uma direito tais características para ser um direito real, caráter<br />

que sé adquirirá quando, ademais dessas características, o legislador conferir-lhe a<br />

dignidade de direito real. Essa última posição tem o elenco dos direitos reais de um<br />

ordenamento como constituído um rol taxativo, por isso denominado de sistema do<br />

numerus clausus de tais direitos, ao passo que a primeira posição recebe a denominação<br />

de sistema do numerus apertus dos direitos reais. Apesar de insignes opiniões em<br />

sentido contrario, parece-nos que sempre predominou, no Pais, o sistema de<br />

constituírem os direitos reais em número taxativo.”<br />

Porém, no atual momento jurídico há algumas ponderações apregoadas por<br />

vários doutrinadores vanguardistas – mesmo que forma tímida – investigando a<br />

possibilidade deste rol previsto no artigo 1.225 do Código Civil não ser taxativo numerus<br />

clausus, mas sim exemplificativo numerus apertus.<br />

Existindo assim a possibilidade de haver outros direitos reais, criados por novas<br />

leis emergentes 413 . A fundamentação para a aplicabilidade desta teoria é justamente a<br />

servidões. Arts. 1.277 a 1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários<br />

ao Código Civil Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256. BARBOSA, Diana Coelho. O<br />

Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 63 a 65.<br />

411<br />

ALVIM, Arruda. Confronto entre a situação de direito real e direito obrigacional, In Revista de Direito<br />

Privado, São Paulo: RT, n.01 jan./mar.2000<br />

412<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256.<br />

413<br />

Neste sentido: GONDINHO, André Pinto da Rocha Osório. Direitos Reais e autonomia da vontade. Rio<br />

de janeiro: Renovar, 2001. e NEVES, Gustavo Kloh Muller. O Principio da tipicidade dos direitos reais ou<br />

151


ecente introdução da Lei 11.481 de 31 de maio de 2007 que acrescentou os últimos<br />

dois incisos do artigo 1.225, ou seja, a concessão de uso especial para fins de mordia e<br />

a concessão de direito real de uso.<br />

Neste sentido, apregoam Flávio Tartuce e José Fernando Simão 414 :<br />

“percebe-se que a recente Lei 11.481, de 31 de maio de 2007, introduziu duas novas<br />

categorias de direitos reais sobre coisa alheia... A recente alteração legislativa acaba por<br />

confirmar o entendimento de que a relação constante do art. 1.225 do CC e aberta, pela<br />

possibilidade de surgimento de novos direitos reais, por lei emergentes.”<br />

Não obstante o referido apontamento, o saudoso Theotonio Negrão discorre de<br />

forma brilhante outros direitos reais, não apregoados no referido artigo quanto segue 415 :<br />

“a) compromisso de compra e venda, a cessão e a promessa de cessão de compromisso<br />

de venda e compra (Decreto–lei n. 50, de 10.12.37, art.22, com as modificações trazidas<br />

pela Lei n. 649 de 11.03.49, posteriormente pela lei n. 6.014, de 27.12.73, e Lei 6.766 de<br />

19.12.79, art 25; Lei n. 4.380, de 21.08.64, art. 69; Lei n. 4.591, de 16.12.64, art. 32, § 2º,<br />

c/c art. 35, § 4º); b) a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares e do espaço<br />

aéreo sobre eles (Decreto-lei n. 271, de 28.02.67, arts. 7º e 8º); c) a locação de prédio,<br />

com clausula de vigência no caso de alienação (Lei n. 6.015 (Lei de registros públicos),<br />

de 31.12.73, art. 167, I, n. 3; Código Civil, art. 1.187; lei 8.245, de 18.10.91, art 8º); d) a<br />

propriedade fiduciária de imóvel (art. 33da Lei 9.514, de 20.11.97); e) a propriedade<br />

fiduciária de coisa móvel (Decreto-lei n. 911, de 1.10.69, art. 1, redação do art. 66, §1º da<br />

Lei n. 4.728); ou imóvel (Lei n. 9.514, de 20.11.97, art. 23); f) a cessão fiduciária de<br />

direito creditórios decorrentes de contratos de alienação de imóveis; a caução de direitos<br />

creditórios decorrentes de contratos de venda ou promessa de venda de imóveis (art. 17,<br />

§ 1º da Lei n. 9.514, de 20.97); g) a caução, a cessão parcial ou cessão fiduciária, tanto<br />

de direitos decorrentes de contratos de alienação de unidades habitacionais vinculadas<br />

ao Sistema Financeiro da Habitação (Lei n. 4.864, de 29.11.65, arts. 22 e 23), quanto de<br />

empréstimos destinados ao financiamento da construção ou da venda das unidades<br />

a regra do numerus clausus. In: MORAES, Maria Celina Bodim de (Cood.). Princípios do direito civil<br />

contemporâneo. Rio de Janeiro, 2006.<br />

414<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 27.<br />

415<br />

NEGRÃO. Theotonio, Código Civil e legislação civil em vigor. 18 ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999. pg.<br />

168.<br />

152


imobiliárias (Decreto-lei n. 70, de 21.11.66, art. 43); h) o uso da derivação de águas<br />

(Decreto 24.643( Código das Águas), de 10.07.34, art. 50”<br />

Iremos além ao apontar que há outros direitos reais vigentes no ordenamento<br />

jurídico brasileiro que não encontram-se alocados no referido artigo.<br />

Dentre estes podemos citar três institutos previstos no Estatuto das Cidades 416 ,<br />

sendo eles, a concessão de direito real de uso, concessão de uso especial para fins de<br />

moradia e o próprio direito de superfície.<br />

Podemos citar ainda, outro direito real constante no ordenamento jurídico, que<br />

não conta no rol do artigo 1.225, denominado de alienação fiduciária em garantia, que<br />

não obstante poderia ser enquadrada no inciso I do referido artigo, todavia não consta<br />

literalmente neste. 417<br />

Em ambas ocorrências, é possível portanto, afirmar que há um abrandamento<br />

do principio da taxatividade apregoada pela doutrina majoritária, porem há ainda uma<br />

corrente – mais ousada – que se embasa no principio da autonomia privada para<br />

justificar a possibilidade, ainda que em escala pequena, incluir novos modelos jurídicos<br />

de direitos reais com base nos espaços consentidos por lei 418 .<br />

Seguindo esta idéia, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 419<br />

assinalam:<br />

416 o<br />

Lei 10.257 de 1º de julho de 2001, Art. 4 Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros<br />

instrumentos: g) concessão de direito real de uso; h) concessão de uso especial para fins de moradia; l)<br />

direito de superfície.<br />

417<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 28.<br />

418<br />

Neste sentido: TEPEDINO, Gustavo. A Multipropriedade Imobiliária, São Paulo, Saraiva, 1993;<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de<br />

Janeiro: Lúmen Júris, 2007.<br />

419<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 12 e 13.<br />

153


“a rigidez na elaboração de tipos não é absoluta. Nada impede que o principio na<br />

autonomia provada possa, no âmbito do conteúdo de cada direito, ainda que em pequena<br />

escala, intervir para a afirmação de diferentes modelos jurídicos, com base nos espaços<br />

consentidos em lei. Desde que não exista lesão a normas de ordem pública , os privados<br />

podem atuar dentro dos tipos legais, utilizando a sua vontade criadora para inovar no<br />

território concedido pelo sistema jurídico, modificando o conteúdo dos direitos reais<br />

afirmados pela norma. Como exemplo podemos citar a multipropriedade – tanto<br />

resultante da fusão da propriedade individual e coletiva nas convenções de condomínio,<br />

como aquela tratada na propriedade de shoppings center, de flat ou time sharing.”<br />

Não obstante nos espelharmos aos ensinamentos de ambos doutrinadores,<br />

entendemos – mesmo que de forma momentânea – que tal posicionamento não seria o<br />

mais assertivo.<br />

Tal justificativa tem como fundamento, que o exemplo ora arrolado pelos<br />

doutrinadores traz consigo o condicionamento de natureza obrigacional a respeito da<br />

utilização exclusiva pelos condôminos, no decorrer do ano, da totalidade das unidades<br />

autônomas, tornando reais direitos em obrigacionais sem a devida previsão<br />

legislativa. 420<br />

420 Este é o mesmo entendimento da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo<br />

que em processo Processo CG n° 549/2007 (315/2007-E) decidiu nos seguintes termos: “Registro de<br />

Imóveis – Multipropriedade (time sharing) – Enquadramento entre os direitos reais – Inviabilidade –<br />

Entendimento firmado pela Corregedoria Geral da Justiça – Constituição do empreendimento como<br />

condomínio especial disciplinado pela Lei n. 4.591/1964, com instituição de condomínio tradicional, regido<br />

pelo Código Civil, sobre as diversas unidades autônomas – Possibilidade – Inadmissibilidade, porém, da<br />

inserção, na convenção de condomínio levada a registro e nas matrículas das unidades autônomas, de<br />

quaisquer disposições tendentes a vincular o direito real de propriedade ao direito pessoal de regramento<br />

acerca do uso periódico anual das unidades, tornando reais direitos obrigacionais. Registro de Imóveis –<br />

Multipropriedade (time sharing) – Recusa acertada de averbação de alteração de convenção condominial<br />

que traz disposições de natureza obrigacional a respeito da utilização exclusiva pelos condôminos, no<br />

decorrer do ano, da totalidade das unidades autônomas – Determinação, ainda, da anotação, no livro em<br />

que registrada a convenção de condomínio, da ineficácia real da disciplina obrigacional constante do<br />

título – Recurso não provido nessa parte. Registro de Imóveis – Multipropriedade (time sharing) –<br />

Condomínio tradicional sobre as unidades autônomas, com inserção nas matrículas correspondentes de<br />

elementos de ordem obrigacional, tendentes a tornar reais direitos pessoais – Inadmissibilidade –<br />

Retificação das matrículas determinada a fim de ser excluído do fólio real todo e qualquer dado de<br />

natureza pessoal e obrigacional – Desnecessidade, porém, do bloqueio das matrículas, diante da<br />

retificação determinada – Recurso parcialmente provido”<br />

154


Desta forma entendemos como mais assertiva, a teoria que abranda<br />

possibilidade de existir outros direitos reais, criados por novas leis emergentes o que<br />

englobaria até o próprio direito de propriedade previsto no Estatuto das Cidades,<br />

instituto este que nos aprofundaremos em um dado momento oportuno do presente<br />

trabalho.<br />

4.2 Teoria Geral do Direto de Superfície<br />

4.2.1 Conceito<br />

Conforme já ventilado, podemos verificar que a Superfície é um instrumento<br />

válido para o atendimento da função social, todavia importante se faz analisar a teoria<br />

geral deste importantíssimo instituto.<br />

Desta feita, não poderíamos iniciar de outra forma a não ser pelo seu conceito,<br />

para depois analisarmos suas peculiaridades específicas.<br />

Inicialmente, conforme pontua a doutrina, os conceitos atribuídos ao direito de<br />

superfície são os mais variados, conforme o ordenamento jurídico originário 421 , todavia<br />

conforme poderemos notar, esta definição, no direito pátrio também tem suas correntes,<br />

tendo em vista sua recente reintrodução.<br />

Clóvis Beviláqua pontua que: ``superfície como direito real é o direito de propriedade<br />

aplicado somente às coisas que se encontram na superfície do solo, ou, mais particularmente, às<br />

plantações ou construções em terreno alheio 422 ``.<br />

Nesta esteira, para José Guilherme de Braga Teixeira 423 o conceito de Superfície<br />

é: “Trata-se, com efeito, do direito real de construir ou de plantar, assim como manter a<br />

421 Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 76.; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo:<br />

Revista dos Tribunais, 1993. p. 55<br />

422 BEVILAQUA. Covis. Direito das Coisas, Rio de Janeiro, Ed. Freitas Bastos, 1951. p.220.<br />

155


construção e a plantação, por tempo determinado, em imóvel de propriedade de<br />

outrem”<br />

Referido posicionamento, é o mesmo apregoado no direito lusitano, que<br />

conceitua o direito de superfície a faculdade de construir ou manter, perpétua ou<br />

temporariamente, uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter<br />

plantações. 424<br />

Neste mesmo sentido, Maria Helena Diniz 425 apregoa “Direito real de fruição<br />

sobre coisa alheia pelo qual o proprietário concede, por tempo determinado, gratuita ou<br />

onerosamente, a outrem o direito de construir, ou plantar em seu terreno, mediante<br />

escritura publica devidamente assentado no Registro Imobiliário.”<br />

Para Flavio Tartuce e José Fernando Simão 426 é:<br />

“uma concessão feita pelo proprietário (fundieiro ou fundeiro) para quem (superficiário)<br />

realize construção ou plantação de um terreno, mediante escritura pública registrada em<br />

Cartório de Registro de Imóvel....sendo que o superficiário é titular de um direito real<br />

dotado de valor econômico, o que permite a alienação a terceiros (da própria superfície),<br />

ou, ainda, que, sobre a superfície, sejam criados outros direitos reais, caso do usufruto,<br />

da habitação e da hipoteca.”<br />

Já para Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 427 :<br />

“O direito de superfície consiste na faculdade que o proprietário possui de conceder um<br />

terceiro, tido como superficiário, a propriedade das construções e plantações que este<br />

efetue sobre ou sob o solo alheio (solo, subsolo ou espaço aéreo de terreno), por tempo<br />

determinado ou sem prazo, desde que promova a escritura publica no registro imobiliário.<br />

423 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256.<br />

424 Código Civil Português. Artigo 1528.º (Princípio geral) O direito de superfície pode ser constituído por<br />

contrato, testamento ou usucapião, e pode resultar da alienação de obra ou árvores já existentes,<br />

separadamente da propriedade do solo.<br />

425 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico: Q - Z, v. 4. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 566 – 567.<br />

426 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 330.<br />

427 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 396.<br />

156


Ainda, para o Carlos Roberto Gonçalves 428 :<br />

“Trata-se, em suma, de uma limitação espontânea ao direito de propriedade... na qual o<br />

titular do direito real mais amplo concede à outra parte contratante, doravante<br />

denominado superficiário, o direito real de construir ou plantar em seu terreno”<br />

Em continuidade, para Luiz Guilherme Loureiro 429 :<br />

“a superfície é um direito real, fixado por tempo determinado ou indeterminado, que<br />

confere ao superficiário a propriedade da construção ou plantação, ainda que em caráter<br />

resolúvel, gratuito ou mediante o pagamento de uma pensão periódica, e que pode ser<br />

transmitido por ato ``entre vivos`` ou causa mortis. O proprietário da construção ou<br />

plantação é o superficiário e o proprietário do terreno é o fundeiro.”<br />

Neste mesmo sentido, Ricardo Pereira Lira 430 :<br />

“é o direito real autônomo, temporário ou perpétuo, de fazer e manter construção ou<br />

plantação sobre ou sob terreno alheio; é a propriedade – separada do solo – dessa<br />

construção ou plantação, bem como é a propriedade decorrente da aquisição feita ao<br />

dono do solo de construção ou plantação nele já existente.”<br />

Por fim, para José Guilherme Braga Teixeira 431 :<br />

“O direito real de superfície instituído pelo novo Código Civil é um direito real limitado;<br />

imobiliário, autônomo, temporário e transmissível, que confere ao seu titular, chamado<br />

superficiário, o uso e gozo de terreno de propriedade de outrem, para nele construir ou<br />

plantar e manter a construção ou plantação durante o tempo pelo qual tiver sido ajustada<br />

sua concessão”<br />

428<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 411.<br />

429<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 273.<br />

430<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 15.<br />

431<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 262.<br />

157


Verificando a análise sistemática da disposição legal, bem como de todos os<br />

apontamento até aqui empenhados, podemos afirmar que o superficiário é otitular de<br />

um direito real, nele pode construir ou plantar e manter a construção ou plantação, com<br />

o respectivo valor econômico – tendo em vista que este pode ser comercializado ou<br />

ainda gravado de ônus real – em caráter acessório e temporal.<br />

4.2.2 Natureza Jurídica<br />

Em decorrência da análise da teoria geral dos direitos reais e do conceito<br />

do direito de superfície, não poderíamos deixar de iniciar a explanação da natureza<br />

jurídica 432 do presente instituto sem questionamos se o direito de Superfície é um direito<br />

real ou uma propriedade resolúvel?<br />

De inicio, podemos anteceder, que verificada a inserção do direito de superfície<br />

no rol do artigo 1.225 do Código Civil, bem como desde que, devidamente averbado o<br />

seu registro junto ao Cartório de Registro de Imóveis de sua respectiva comarca, a<br />

superfície opera com os efeitos erga omnes, ao inverso da locação e do comodato, que<br />

são somente meros possuidores de direitos inter partis, ou seja, de cunho<br />

obrigacional. 433<br />

Neste sentido, Carlos Alberto Dabus Maluf, ao atualizar a obra de Washington de<br />

Barros Monteiro pontua: 434 “Não se confunde esse novo instituto com os direitos de<br />

arrendamento, locação ou parceria, pois estes são direitos obrigacionais, e a superfície<br />

432<br />

Conforme Rima Gorayb: “Determinar a natureza jurídica significa dizer qual o lugar que um certo<br />

direito ocupa na ordem jurídica vigente.” GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier<br />

Latin, 2007. p. 123.<br />

433<br />

Neste sentido: CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de<br />

Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 399.; RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, v. 3: Direito das Coisas. 27ª ed.<br />

São Paulo: Saraiva, 2002, v. 3. p. 265. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª<br />

ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 390 e 391.<br />

434<br />

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253.<br />

158


é um direito real” 435 . Porém há na doutrina ainda, a análise do referido instituto<br />

propondo a exposição e confrontação do direito de superfície com os demais direitos<br />

reais, verificando quais se assimilam com aquele. 436<br />

Em um segundo momento, devido a não disposição legal quanto a natureza do<br />

jurídica do instituto, devemos observar na doutrina se o direito de Superfície é um<br />

direito real ou uma propriedade resolúvel.<br />

Inicialmente, o Plácido e Silva 437 escreve:<br />

“Dêsse modo, construída ou objetiva pelas edificações, ou pelas plantações, a superfície<br />

resulta num supersolo, isto é, do que vem acima do solo, em oposição ao subsolo,<br />

representado pelo que esta abaixo do solo. Em principio, a superfície pertence ao<br />

proprietário do solo, consoante a mesma regra que o faz proprietário do subsolo.<br />

Instituído como um direito real, porem, que se destaca do direito de propriedade sobre o<br />

solo, pode o direito de superfície ser atribuído a quem não seja proprietário do terreno. O<br />

direito de superfície, o direito de utilizar a propriedade de outrem para nela manter<br />

construções, obras ou plantações de que é proprietário o superficiário, faz assim,<br />

estabelecer sobre a propriedade um encargo que se converte num domínio útil, bem<br />

distinto do domínio do solo.”<br />

Para Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald: 438<br />

“A resposta é: ambos. O direito de superfície é um direito real sobre coisa alheia (lote ou<br />

gleba), pois sua formação resulta de uma de uma concessão do titular da propriedade<br />

para fins de futura edificação (sobre ou sob solo) ou plantação, que, quando concretizada<br />

pelo superficiário (concessionário), converterá o direito inerente incorpóreo em um bem<br />

materialmente autônomo da propriedade do solo do concedente” (nossos grifos)<br />

435 Neste mesmo sentido: RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004.<br />

p. 862.; BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba:<br />

Juruá, 2006. p. 83.<br />

436 José Guilherme Braga Teixeira expõe e confronta o direito de superfície em sua obra como o<br />

arrendamento; a enfiteuse; o usufruto; e a servidão. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos<br />

Tribunais, 1993. p. 61<br />

437 SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico: A - C, v. I: 3 ed. Forense: São Paulo, 1973. p. 1501.<br />

438 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 399.<br />

159


Em um segundo momento, firmando a idéia da possibilidade de cisão total do<br />

direito de propriedade, ou seja, na verificação de ser possível gravar de ônus reais,<br />

transferir e etc., o direito de superfície Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald<br />

concluem: 439<br />

“Esses argumentos evidenciam que não pode ser a superfície considerada apenas como<br />

um direito real em coisa alheia, em paralelismo com modelos jurídicos como servidão,<br />

usufruto e enfiteuse. Em sentido contrario, a caracterização da superfície como<br />

verdadeira propriedade resolúvel propicia a dinamização e o enriquecimento do modelo<br />

jurídico, concedendo-lhe eficácia como relevante função social do direito subjetivo de<br />

propriedade.” (nossos grifos)<br />

Em contra posição, Maria Helena Diniz 440 apregoa:<br />

“É um direito de propriedade sobre plantações separado do domínio do solo, por ser um<br />

direito real de construir ou plantar em terreno de outrem. É um direito real de construir ou<br />

plantar em terreno de outrem. É um direito real de fruição sobre coisa alheia, visto que<br />

não atinge a propriedade do dono do solo, por afastar a acessão, consagrada no art.<br />

1.253 do Código Civil.” (nossos grifos)<br />

Nesta mesma esteira, pontua a Diana Coelho Barbosa: 441<br />

“Consoante já se pode depreender, nem primeiro momento, da leitura dos dispositivos, o<br />

texto do estatuto limita o direito de superfície à denominada concessão ad aedificandum<br />

ou ad plantantum, sem qualquer alusão à possibilidade de se adquirir a propriedade<br />

separada de construções ou plantações, sejam elas preexistentes ou resultantes de<br />

exercício da concessão” (nossos grifos)<br />

Defendendo esta posição, José Guilherme de Braga Teixeira pondera 442 :<br />

439 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 402.<br />

440 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 457.<br />

441 BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 92.<br />

442 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 262.<br />

160


“É um direito real, por isso que adere à coisa, vinculando-se diretamente ao titular, a<br />

quem provê de ação real contra todos, conferindo-lhe os atributos da seqüela e<br />

oponibilidade... Porem não vai alem de um direito real imobiliário limitado, não se<br />

alcançado jamais, a uma propriedade superficiária, ainda que fosse resoluvelemente,<br />

portanto o legislador pátrio não livrou o instituto de sua integral subserviência ao princípio<br />

aquisitivo da acessão”<br />

Já em contra partida, para o Carlos Roberto Gonçalves 443<br />

“Surge, em conseqüência da superfície, uma propriedade resolúvel. (art. 1.359). No Caso<br />

de efetuar o superficiário um negócio jurídico que tenha por objeto o direito de superfície,<br />

ou no de sucessão mortis causa, o adquirente recebe-o subordinado à condição<br />

resolutiva.” (nossos grifos)<br />

Neste mesmo sentido, Luiz Guilherme Loureiro pondera que 444 :<br />

“Trata-se, portanto, de uma derrogação convencional do princípio de acessão segundo o<br />

qual o proprietário do solo se torna também dono de tudo aquilo que for construído ou<br />

plantado em seu terreno. Por outra parte, o superficiário goza do solo alheio, tanto que o<br />

utiliza para construir ou plantar ou manter o resultado de sua atividade... Assim, o<br />

proprietário do solo não será, necessariamente, o proprietário da construção, podendo<br />

existir uma separação entre a propriedade do imóvel e a propriedade da edificação.”<br />

Demonstrando a possibilidade de todas estas vertentes serem possíveis, Ricardo<br />

Pereira Lira pondera que: 445<br />

“A estrutura da relação superficiária é plástica. Tem a propriedade de partir de uma<br />

relação simples, evoluindo para uma relação complexa. Poderá em modalidade possível,<br />

443<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 415. Neste mesmo sentido: PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio<br />

de Janeiro: Forense, 2004. p. 244.<br />

444<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 276.<br />

445<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.32.<br />

161


nascer complexa. Procuraremos lançar algumas luzes sobre essas afirmações. Existem<br />

mecanicamente três momentos possíveis na relação superficiária: (a) o direito real de<br />

construir ou plantar em solo alheio; (b) a propriedade separada superficiária, efeito da<br />

concreção do direito real de construir ou plantar em solo alheio; (c) a propriedade<br />

separada da superfície, efeito da alienação que o dominus soli separadamente faz a<br />

outrem de construção já existente.”<br />

Em continuidade, a estes temos, Marise Pessoa Cavalcanti pondera 446 :<br />

“..., a superfície tem matrizes próprias e traços distintivos evidentes de institutos, como o<br />

usufruto, a enfiteuse, o arrendamento a servidão etc. (...) Assim, pode-se dizer que a<br />

natureza jurídica da superfície é de direito real imobiliário, limitado e autônomo ...”<br />

Corroborando este mesmo entender, Paulo Roberto Benasse aponta:<br />

“A propriedade superficiária, construção ou plantação, é propriedade limitada, destacada<br />

de propriedade do solo; que se puder ser removida sem perecimento ela se torna bem<br />

móvel; e não atinge o dominus soli, este continua existindo e pertence ao proprietário do<br />

solo ela é um ius superficiei, sui generis, e resolúvel, suspendendo apenas os efeitos da<br />

acessão, previstos na máxima superficiies solo cedit. Se perpetua, a revogaria, mas a<br />

perpetuidade não foi contemplada em nosso ordenamento jurídico, mas tão-somente o<br />

prazo indeterminado.”<br />

Nestes mesmos termos, não poderíamos deixar de citar a fundamental posição<br />

da Rima Gorayb que 447 :<br />

A classificação ou delimitação da natureza jurídica do direito de superfície é<br />

problemática, porque ser trata de relação complexa ainda in fieri. (...) Assim cremos que<br />

podemos afirmar que o direito de superfície sofreu desde o fim do feudalismo até agora,<br />

e sobre tudo a partir de seu renascimento, em fins do século XIX, um evolução<br />

semelhante à ocorrida no Direito Romano. (...) Assim, podemos concluir que, mesmo<br />

quando tratado nominalmente como direito real limitado tradicional, o direito de<br />

446 CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 12 – 14.<br />

447 GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 123.<br />

162


superfície, por cauda de suas características, acaba por receber um tratamento particular<br />

como se continuasse um direito imobiliário especial. (...) Esta é a solução mais<br />

comumente adotada: o direito de superfície é um direito real limitado sui generis, levando<br />

assim em conta as características próprias do reito de superfície que não deixarem<br />

confundir-se com qualquer outro direito real já existente.<br />

Por fim entendemos como mais assertivo, após a verificação de toda a doutrina<br />

ora apregoada, bem como sob a égide do sistema jurídico pátrio positivado, que a<br />

natureza jurídica do direito é superfície é inegavelmente um direito real imobiliário<br />

limitado sui generis, porem com seus contornos específicos diferenciados de qualquer<br />

outro direito real.<br />

4.2.3 O Afastamento do princípio superfícies solo cedit (a superfície acompanha o<br />

solo)<br />

Outro ponto interessantíssimo, relaciona-se ao afastamento de um princípio<br />

basilar dos direitos reais, ou seja, a superfícies solo cedit (a superfície acompanha o<br />

solo). A justificativa para esta afirmação, encontra-se nítida no próprio instituto, pois<br />

enquanto o superficiário for proprietário das construções ou plantações realizadas, o<br />

fundeiro continuará tendo a propriedade do terreno.<br />

Assim, conforme parte da doutrina defende o conceito romano de atribuição<br />

qualificada do solo 448 ficaria prejudica e o acessório não seguirá o principal por exceção<br />

legal, bem como haveria uma nítida divisão das faculdades da propriedade já de haverá<br />

disparidades quanto ao domínio do acessório (construções e plantações) como do<br />

principal (terreno). 449<br />

Neste sentido pontuam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 450 :<br />

448 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 3.<br />

449 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 330.<br />

450 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

163


“Em principio, as construções e plantações são acessões continuas, caracterizadas por<br />

uma união exógena de coisas, por forca da qual tudo o que se planta ou constrói-se em<br />

solo alheio é de propriedade definitiva do dono do solo. Trata-se do antigo principio<br />

superfícies solo cedit. Esse principio, alinhavado no art. 1255 do Código Civil, cederá no<br />

direito de superfície, pois haverá a suspensão temporária dos efeitos da acessão, à<br />

medida que o a propriedade da construção ou plantação efetiva em solo alheio será<br />

daquele que a realizou permanecendo a propriedade do solo com o seu proprietário. De<br />

uma certa forma seguimos a lição enraizada na cultura germânica, pela qual se valoriza<br />

“o trabalho de quem constrói ou planta em detrimento do proprietário do solo.” (nossos<br />

grifos)<br />

A constatação da existência de tal colocação encontra-se exteriorizada no<br />

Enunciado n.º 249, aprovado na III Jornada de Direito Civil CJF/STJ que dispõe: “A<br />

propriedade superficiária pode ser autonomamente objeto de direitos reais de gozo e<br />

garantia, cujo prazo não exceda a duração da concessão da superfície, não se lhe<br />

aplicando o art. 1.474.”<br />

Para sacramentar esta idéia no Enunciado n.º 321, aprovado na IV Jornada de<br />

Direito Civil CJF/STJ dispõe:<br />

“Art. 1.369: Os direitos e obrigações vinculados ao terreno e, bem assim, aqueles<br />

vinculados à construção ou à plantação formam patrimônios distintos e autônomos,<br />

respondendo cada um de seus titulares exclusivamente por suas próprias dívidas e<br />

obrigações, ressalvadas as fiscais decorrentes do imóvel.”<br />

Assim, vale dizer, que parte da doutrina defende o afastamento do princípio<br />

superfícies solo cedit (a superfície acompanha o solo), criando assim, um fenômeno de<br />

superposição de duas propriedades distintas, pois enquanto o superficiário for<br />

proprietário das construções ou plantações realizadas, o fundeiro continuará tendo a<br />

propriedade do terreno. 451<br />

451 Neste sentido: LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de<br />

planificação urbana. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 299.; CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano;<br />

ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

164


Todavia, esta não é a disposição legal vigente, pois o direito de superfície não<br />

cria uma propriedade resolúvel conforme aponta parte da doutrina 452 , bem como<br />

conforme já pontuado anteriormente, a natureza jurídica do direito em tela é<br />

inegavelmente um direito real imobiliário limitado o que afasta tal possibilidade.<br />

4.3 O Código Civil de 2002 e o Estatuto da Cidade.<br />

Superado alguns pontos relevantes, adentraremos em um dos temas mais<br />

controversos do presente estudo, observando assim, as diferenças e as similaridades<br />

existentes entre os dois institutos vigentes – O Código Civil de 2002 e o Estatuto da<br />

Cidade – que tratam do objeto do presente estudo. 453<br />

4.3.1 O Código Civil de 2002<br />

Conforme podemos verificar, a Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002<br />

regulamentou o direito de superfície em seus artigos 1.369 a 1.377, basicamente em<br />

seis tópicos sendo eles respectivamente: objeto, condições; obrigação tributária;<br />

transferência e preferência; extinção; e constituição por pessoa de direito público.<br />

Sendo assim, conforme o proprietário de um terminado imóvel pode conceder a<br />

outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado,<br />

mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.<br />

(Art. 1.369), verifica-se ainda, que o direito de superfície não autoriza obra no subsolo,<br />

salvo se for inerente ao objeto da concessão. (Art. 1.369, parágrafo único) e que<br />

concessão da superfície será gratuita ou onerosa; se onerosa, estipularão as partes se<br />

o pagamento será feito de uma só vez, ou parceladamente. (Art. 1.370)<br />

452 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 331.<br />

453 Objetivando esmiuçar a difícil e árdua tarefa que nos segue, elaboramos quadro comparativo de<br />

ambos os institutos jurídicos que consta no presente trabalho como ANEXO 1.<br />

165


Ainda neste contexto a responsabilidade tributária sobre imóvel o recairá sobre<br />

superficiário (Art. 1.371), bem como é possível transferir o direito de superfície a<br />

terceiros, por morte do superficiário, aos seus herdeiros. (Art. 1.372).<br />

Desta transferência, insta salientar que não poderá ser avençado entre as<br />

apartes, a nenhum título, qualquer pagamento pela transferência. (Art. 1.369, parágrafo<br />

único) e que em caso de alienação do imóvel ou do direito de superfície, o superficiário<br />

ou o proprietário tem direito de preferência, em igualdade de condições (Art. 1.373).<br />

Em continuidade, a extinção do direito de superfície se resolve antes de seu<br />

termino quando o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para que foi<br />

concedida. (Art. 1.374).<br />

Sendo extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena<br />

sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, salvo se<br />

as partes não houverem pactuado de forma diferente (Art. 1.375). Todavia, no caso de<br />

extinção do direito de superfície em conseqüência de desapropriação, a indenização<br />

cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada<br />

um (Art. 1.376).<br />

Por fim, o direito de superfície, quando constituído por pessoa jurídica de direito<br />

público interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente disciplinado em<br />

lei especial (Art. 1.377).<br />

4.3.2 O Estatuto da Cidade.<br />

A Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, conhecida como Estatuto da Cidade,<br />

conforme já ponderado anteriormente, regulamenta os artigos 182 e 183 da<br />

Constituição Federal, e estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras<br />

providências de forma muito semelhante ao Código Civil.<br />

166


Importante observar que, no Capítulo II, dos instrumentos da política urbana,<br />

mais especificadamente na seção VII, em seus artigos 21 a 24 regulamenta e positiva o<br />

direito de superfície urbana. 454<br />

Sendo assim, nos termos da referida legislação, o proprietário urbano poderá<br />

conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, seja por tempo determinado<br />

ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis (Art. 21).<br />

O objeto da superfície, abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço<br />

aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, observada a<br />

legislação urbanística (Art. 21, § 1º), bem como a concessão do direito de superfície<br />

poderá ser gratuita ou onerosa (Art. 21, § 2º).<br />

No tocante das obrigações tributárias, o superficiário responderá integralmente<br />

pelos encargos e tributos que incidirem sobre a propriedade superficiária, arcando,<br />

ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e<br />

tributos sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo disposição em<br />

contrário do contrato respectivo. (Art. 21, § 3º).<br />

Referente a transmissibilidade do direito de superfície, há duas disposições na<br />

referida legislação. Sendo assim, este pode ser transferido a terceiros, obedecidos os<br />

termos do contrato respectivo (Art. 21, § 4º) e por morte do superficiário, os seus<br />

herdeiros (Art. 21, § 5º).<br />

Assim como também é previsto no Código Civil, em caso de alienação do<br />

terreno, ou do direito de superfície, o superficiário e o proprietário, respectivamente,<br />

terão direito de preferência, em igualdade de condições à oferta de terceiros (Art. 22).<br />

454<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 71.<br />

167


Conforme referida legislação extingue-se o direito de superfície, por três motivos.<br />

O primeiro deles, pelo advento do termo; por conseguinte pelo descumprimento das<br />

obrigações contratuais assumidas pelo superficiário (Art. 22) e por fim, antes do termo<br />

final do contrato, se o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para a<br />

qual for concedida (Art. 24, § 1º).<br />

Quando da extinção do direito de superfície, o proprietário recuperará o pleno<br />

domínio do terreno, bem como das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel,<br />

independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário<br />

no respectivo contrato (Art. 24), bem como a referida extinção deverá ser averbada no<br />

Cartório de Registro de Imóveis (Art. 24, § 2º).<br />

4.3.3 Divergências legislativas entre o Estatuto da Cidade e o Código Civil de 2002<br />

Assim como fez Marcus Vinicius dos Santos Andrade 455 , trataremos neste<br />

momento de todas as divergências legislativas entre os referidos institutos, porém<br />

realizaremos tal tarefa de forma sintática para esmiuçar as possíveis antinomias em um<br />

momento oportuno.<br />

Desta forma, nos termos do analisado das referidas disposições legais,<br />

verificamos oito diferenças a serem elencadas desde o inicio da concessão até o seu<br />

término. A primeira delas é que a Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 se restringe a<br />

imóveis urbanos, quanto ao Código Civil aplica-se aos imóveis rurais.<br />

Há ainda, a divergência temporal quanto do prazo da concessão da superfície,<br />

pois conforme artigo 21 do Estatuto da Cidade, o proprietário urbano poderá conceder a<br />

terceiros o direito de superfície do seu terreno, seja por tempo determinado ou<br />

indeterminado, já o artigo 1.369 do Código Civil dispõe que o proprietário de um<br />

455<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 83 e 84.<br />

168


terminado imóvel pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu<br />

terreno, por tempo determinado.<br />

Em continuidade, conforme o artigo 21 do Estatuto da Cidade o seu objeto é o<br />

próprio direito de superfície, enquanto o Código Civil determina que o objeto da<br />

superfície relaciona-se com o direito de construir e plantar. Ainda, referente ao objeto da<br />

superfície, enquanto o Código Civil não possibilita as obras no subsolo, salvo se for<br />

inerente ao objeto da concessão, o Estatuto da Cidade autoriza a utilização do solo,<br />

subsolo e do espaço aéreo, na forma estabelecida pelas partes, bem como pela<br />

legislação urbanista.<br />

Referente à contra prestação da concessão superficiária, enquanto o Estatuto da<br />

Cidade dispõe somente que esta poderá ser onerosa ou gratuita, o Código Civil<br />

apregoa que se onerosa, estipularão as partes se o pagamento será feito de uma só<br />

vez, ou parceladamente. (Art. 1.370).<br />

No tocante das obrigações tributárias, conforme disposição do Código Civil, a<br />

responsabilidade tributária sobre imóvel o recairá sobre superficiário (Art. 1.371). Tal<br />

disposição se repete inicialmente no Estatuto da Cidade, porem este, deverá arcar,<br />

ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e<br />

tributos sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo acordo em<br />

contrário (Art. 21, § 3º).<br />

Referente à transferência do direito de superfície, não obstante tal previsão estar<br />

prevista em ambas as legislações, o Código Civil em seu parágrafo único do artigo<br />

1.369 dispõe que não poderão as apartes avençar, a nenhum título, qualquer<br />

pagamento pela transferência.<br />

Por fim, enquanto o Estatuto da Cidade prevê três formas de extinção do direito<br />

de superfície, por três motivos, sendo eles: O primeiro deles, pelo advento do termo; por<br />

conseguinte pelo descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo<br />

169


superficiário (Art. 22); e antes do termo final do contrato, se o superficiário der ao<br />

terreno destinação diversa daquela para a qual for concedida (Art. 24, § 1º). O Código<br />

Civil não contempla como causa extintiva o descumprimento contratual. 456<br />

4.3.4 Revogação do Estatuto da Cidade pelo Código Civil de 2002<br />

Existindo um conflito de normas – conforme já apontado – temos um problema<br />

relacionado ao Direito Intertemporal e de conflitos de normas. Assim, no caso em tela<br />

há dois diplomas infraconstitucionais que regulam a mesma disciplina jurídica, sendo<br />

eles os artigos 1.367 a 1.377 do Código Civil de 2002 e o Estatuto da Cidade em seus<br />

artigos 21 a 24.<br />

A Lei de Introdução ao Código Civil, Decreto-lei 4.657, de 04/09/1942, é clara<br />

regulamentando que a lei posterior revoga a anterior, em três hipóteses, sendo elas:<br />

Quando expressamente o declare; Quando a lei anterior for incompatível com a nova<br />

norma regulamentadora; e por fim quando regule a nova lei regule inteiramente a<br />

matéria de que tratava a lei anterior. 457<br />

Verificaremos a seguir, a seguinte questão posta não se resolverá tão somente<br />

com a referida regulamentação ora apregoada. Pois, em um primeiro momento<br />

conforme parte de doutrina, não há a revogação expressa no Código Civil de 2002 em<br />

detrimento do Estatuto da Cidade, bem como em um segundo momento não haveria a<br />

incompatibilidade dos institutos e a nova lei não regula inteiramente a matéria de que<br />

tratava o Estatuto da Cidade. 458<br />

456<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 84.<br />

457<br />

Lei de Introdução ao Código Civil, Decreto-lei 4.657, de 04/09/1942Art. 2o Não se destinando à<br />

vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1o A lei posterior revoga a<br />

anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule<br />

inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.<br />

458<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 81.<br />

170


Sendo assim como não poderia deixar de ser, a questão posta é: O Código Civil<br />

de 2002 – lei posterior, revogou ou não – a Lei anterior – Estatuto da Cidade? Para<br />

resolver o presente questionamento, será necessário fazer a análise doutrinaria deste<br />

conflito normativo para tão somente e posteriormente verificarmos uma proposta de<br />

solução.<br />

Observada a dúvida devidamente colocada, devemos estudar as duas grandes<br />

correntes que se dividem. A primeira delas se posiciona no sentido da revogação do<br />

Estatuto da Cidade pelo Código Civil de 2002, já em contra partida a outra corrente pelo<br />

mantenimento dos dois dispositivos concomitantemente.<br />

Filados a primeira corrente, ou seja, a corrente que se posiciona no sentido da<br />

revogação do Estatuto da Cidade pelo Código Civil de 2002 temos Pablo Stolze<br />

Gagliano 459 , Joel Dias Figueira Junior 460 , Carlos Roberto Gonçalves 461 , Washington de<br />

Barros Monteiro 462 e Luiz Guilherme Loureiro 463 .<br />

Neste mesmo sentido, pontua de forma contundente José Guilherme de Braga<br />

Teixeira 464 :<br />

“ousamos divergir da opinião que eu quando houver conflito entre as regras do (novo)<br />

Código Civil e do estatuto da Cidade para a superfície urbana, prevalecerão as desta em<br />

razão do princípio da especialidade..a superfície urbana, criada pela Lei n. 10.257/2001,<br />

não é um direito real, ao rezes do que ocorre com a superfície do Código Civil cujo o<br />

caráter real é conferido pelo art. 1.255,II... Não aceitamos, outrossim, nenhum argumento<br />

que vise atribuir caráter de direito real superfície criada pela lei n. 10.257/2001, mediante<br />

459 Código Civil comentado. Coord. Álvaro Villaça de Azevedo. São Paulo: Atlas, 2004. v. XII: Direito das<br />

Coisas. p. 25.<br />

460 Novo Código Civil comentado. 5. ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1.124.<br />

461 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 410.<br />

462 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253 e 254.<br />

463 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 274.<br />

464 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 266 e 267.<br />

171


uma aplicação a ela, retroativa ou não do inciso II do artigo 1.225 do novo Código Civil,<br />

motivo pelo qual nos parece que a melhor solução será o legislador ab-rogar os arts. 21 a<br />

24 e seus parágrafos”<br />

Em contra partida como já foi dito, temos a corrente que se posiciona no sentido<br />

do mantenimento dos dois dispositivos concomitantemente, posição esta, defendida<br />

pelo Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 465 e Rima Gorayb 466 .<br />

Neste sentido, Maria Helena Diniz 467 se posiciona nos seguintes termos:<br />

“Como nos explica Miguel Reale, lei estende tal concessão de uso às relações entre<br />

particulares, por isso o Código Civil não pôde deixar de contemplar essa espécie, pois<br />

consoante justa ponderação de José Carlos Moreira Alves, a migração desse modelo<br />

jurídico, que passou da esfera do direito administrativo para a do direito privado, veio<br />

estabelecer um novo enforque, a antigo instituto da superfície, regendo a exploração da<br />

terra por quem não tem o domínio legal sobre ela.”<br />

Conforme estes, as normas previstas no Estatuto da Cidade são instrumentos de<br />

política de desenvolvimento urbano, assim, não sujeita, a revogação pelo Código Civil<br />

de 2002, bem como, neste entendimento foi aprovado o Enunciado n.º 93 aprovado na I<br />

Jornada de Direito Civil dispondo que:<br />

“Art. 1.369: As normas previstas no Código Civil sobre direito de superfície não revogam<br />

as relativas a direito de superfície constantes do Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/2001)<br />

por ser instrumento de política de desenvolvimento urbano.”<br />

Ainda neste sentido, temos uma solução pratica proposta pelos Nelson Nery<br />

Junior e Rosa Maria de Andrade Nery 468 endossada por Flavio Tartuce e José Fernando<br />

465 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 399.<br />

466 “... Enquanto o estatuto se aplica só às cidades (art. 21) o Código Civil tem aplicação tanto na cidade<br />

cquanto nas áreas rurais.” GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 88<br />

e 89.<br />

467 Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 4. p. 455.<br />

468 Código Civil comentado. 3. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 657.<br />

172


Simão 469 que apregoam a não revogação dos artigos 21 a 24 do Estatuto da Cidade e<br />

acrescentam:<br />

“Enquanto o direito de superfície referente aos imóveis urbanos é regido Estatuto da<br />

Cidade, o referente aos imóveis rurais é regido pelo Código Civil. Em se tratando de<br />

superfície urbana, caso haja conflitos de normas, prevalece o Estatuto da Cidade sobre o<br />

Código Civil, por ser lei especial”<br />

Este é o mesmo entendimento de José Carlos Moreira Alves 470 :<br />

“... apesar de complexa esta nova disposição do Código Civil, pois há grandes debates<br />

no tocante deste tema, entendo que não ocorreu a revogação do Estatuto da Cidade pelo<br />

Código Civil, devendo ser aplicado para os imóveis urbanos o Estatuto da Cidade, e para<br />

os imóveis rurais o Código Civil”<br />

Em continuidade deste mesmo pensar, com uma pequena modificação afirma<br />

Frederico Henrique Viegas de Lima 471 que:<br />

“ Pode recair, segundo o Estatuto da Cidade, sobre o solo urbano planificado, assim<br />

como pelo Código Civil de 2002 sobre o solo urbano não planificado ou solo rural”<br />

A interpretação dada por Silvio de Salvo Venosa é a de que 472 :<br />

“Se levarmos em conta... que o Estatuto da Cidade institui um microssistema, tal como o<br />

Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Inquilinato, portanto sob essa óptica, o<br />

Estatuto vigorará sobranceiro, em principio, sobre as demais leis, ainda que posteriores.<br />

Silvio de Salvo Venosa complementa ainda, em outro artigo publicado que 473 :<br />

469 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 332.<br />

470 Conforme palestra ministrada no curso de mestrado realizada em 26 de junho de 2009, na Faculdade<br />

Autônoma de Direito – FADISP.<br />

471 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 377.<br />

472 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 393.<br />

473 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Superfície: Origem histórica. Conceito. Particularidades.<br />

Disponível em . Acesso em: 10/06/2009.<br />

173


“O Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), já mencionado, atravessou legislativamente<br />

o atual Código Civil em várias matérias, disciplinando também o direito de superfície, nos<br />

arts. 21 a 23. Essa situação obriga o intérprete definir a aplicabilidade de ambos os<br />

diplomas legais que abordam o mesmo instituto jurídico. O Estatuto entrou em vigor<br />

antes do Código Civil. É de se perguntar se o Código, posterior, derrogou essa matéria<br />

do Estatuto. Esse estatuto constitui, sem dúvida um microssistema jurídico e, como tal,<br />

deve harmonizar-se com os Códigos. Assim, deve ser buscado o nicho social próprio<br />

sobre o qual se debruça o Estatuto da Cidade, como se faz, por exemplo, com o<br />

decantado Código de defesa do consumidor, certamente o mais importante<br />

microssistema atual de nosso ordenamento. Ademais, o Estatuto da Cidade é Lei<br />

Complementar Constitucional. Desse modo, tudo é no sentido que esse estatuto vigora<br />

sobranceiro no seu alcance específico, qual seja o planejamento urbano. A matéria,<br />

contudo, é polêmica e longe está de uma unanimidade. O desleixado legislador poderia<br />

ter facilmente evitado esse entrave, estabelecendo uma diretriz legal única para esse<br />

instituto e para o usucapião, que é outra matéria trata nessa lei de alcance urbano. De<br />

qualquer forma, como sua própria autodenominação, o Estatuto da Cidade dirige-se<br />

exclusivamente aos imóveis urbanos. O recente Código se aplicará sem rebuços aos<br />

imóveis rurais.<br />

Neste mesmo entender Erik F. Gramstrup apregoa 474 :“... o Código Civil regeria a<br />

superfície instituída por particular, em solo urbano ou rural e o Estatuto da Cidade, a<br />

superfície instituída por pessoa jurídica de direito publico.”<br />

Por fim, Marcus Vinicius dos Santos Andrade pontua de forma assertiva segundo<br />

nosso ver que 475 :<br />

“Inegavelmente, os arts. 1.369 a 1.377 do Código Civil cuidam da mesma temática<br />

disciplinada no Estatuto da Cidade. Em em primeiro momento, seria permitido concluir<br />

que esta última lei deixou de vigorar a partir de Código Civil, norma revogadora implícita,<br />

ainda que repetindo, praticamente, o conteúdo dos artigos. Porem, na contrapartida,<br />

alguns tópicos devem ser suscitados. A lei 10.257/01 é especial, formando um sistema<br />

próprio de regramento da política urbana, estruturada nos arts. 182 e 183, da<br />

474<br />

GRAMSTRUP, Erik F. Questões intrigantes Sobre o direito real de superfície. In: ALVES, Jones<br />

Fiqueiredo; Delgado, Mario Luiz. (Coords.). Novo Código Civil: questões controvertidas: Direito das<br />

Coisas, São Paulo; Método, 2008. p. 256 – 257.<br />

475<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 81 e 82.<br />

174


Constituição da Republica, normas as quais tem por finalidade regulamentar. (...) O<br />

enfoque é político-administrativo, de direito público, com suporte e dimensões<br />

institucionais, por se destinar à execução da política urbana administrativa com plena<br />

atuação da Municipalidade. Trata da implementação desse propósito na âmbito das<br />

urbes, compreendendo a terra, amoradia, o saneamento ambiental, a infra-estrutura, o<br />

transporte os serviços públicos, o trabalho e o lazer. O viés do Código Civil, porém,<br />

mostra ser, preponderantemente, de direito privado, sem abstrair o interesse social. O<br />

direito de superfície vem disciplinado com mais um mecanismo, a disposição das<br />

pessoas físicas e das empresas, à realização flexível de negócios jurídicos que permitam<br />

melhor utilização da propriedade, abrangendo as urbanas e rurais, tanto que o estende<br />

às plantações. As ponderações feitas conduzem, em principio ao convencimento de que<br />

as duas leis, em suas diversas perspectivas, coexistem, com aplicação subsidiária do<br />

Código Civil em relação ao estatuto da Cidade. São sistemas diversos, que se<br />

interpenetram num grande numero de casos, sem se excluírem”<br />

Observando todos os apontamentos divergentes quando da presente temática,<br />

pontua Luiz Guilherme Loureiro 476 a seguinte disposição:<br />

“De qualquer forma, para evitar dúvida e confusão nas interpretações dos dispositivos e<br />

diferença de tratamento entre imóveis urbanos e rurais, seria conveniente uniformizar a<br />

redação utilizada nos artigos supracitados”.<br />

Entendemos como mais assertiva, a interpretação fundamentada no<br />

microssistema, ou seja, aplicando o diálogo destas duas fontes 477 , e sendo assim,<br />

entendemos que em principio, aplicamos o Código Civil quando tratamos de relações<br />

privadas e aplicaremos subsidiariamente o Estatuto da Cidade, quando tratarmos de<br />

política de desenvolvimento urbano.<br />

476<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004.p. 280.<br />

477<br />

Sobre este tema, indicamos a doutrina da Professora Claudia Lima Marques: Claudia Lima Marques;<br />

Antônio Herman V. Benjamin; Bruno Miragem, Código de Defesa ao Consumidor. 2ª ed., São Paulo:<br />

Revista dos Tribunais, 2006.<br />

175


4.4 Da Constituição e da transferência do direito de propriedade<br />

Superado estes pontos fundamentais para o estudo da teoria geral do direito de<br />

superfície, adentraremos em mais um ponto que gera muita divergência doutrinaria<br />

relacionado a constituição e transferência do direito de superfície.<br />

Ponto este, polemico na doutrinária em decorrência de lacunas deixadas pela<br />

legislação vigente, porem sem grandes disparidades legislativas no tocante do Código<br />

Civil de 2002 e do Estatuto da Cidade.<br />

4.4.1 Das modalidades do direito de superfície<br />

Conforme verificado na doutrina 478 , há cinco tipos de modalidades de concessão<br />

do direito de superfície, sendo elas respectivamente: Simples; Social; Para<br />

reconstrução; Para construção, ad aedficandum; e Por cisão.<br />

Trataremos de cada uma delas resumidamente nesta mesma ordem exposta,<br />

sendo assim, a superfície simples que tem como característica fundamental ser<br />

desprovida de qualquer motivação especial, como nos casos da superfície Social ou<br />

Para reconstrução.<br />

Referente a esta modalidade de superfície, Paulo Roberto Benasse 479 pondera:<br />

“É aquela embasada na legislação existente: espacial, de cada local, em certo tempo,<br />

sem atribuir-lhe condições novas não vedadas legalmente.”<br />

Já em segundo momento, temos o direito de superfície social, que tem como<br />

cunho fundamental solucionar o problema de escassez de moradias, bem como o<br />

478<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 94 – 96.<br />

479<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 95.<br />

176


direito de superfície para reconstrução. Importante verificar que em ambos os casos há<br />

subsídios – seja financeiro ou não – em benefício do superficiário. 480<br />

Em continuidade, temos ainda, para construção, ad aedficandum que tem como<br />

base fundamental o direito Italiano, ou seja visa a constituição do direito de superfície<br />

como propriedade autônoma do solo. E por fim, a superfície por cisão, que tem como<br />

característica elementar a modalidade anterior, porem trataremos desta quando<br />

tratarmos do objeto da superfície.<br />

Conforme observamos, todas as modalidades ora apregoadas, ou seja, o direito<br />

de superfície Simples; Social; Para reconstrução; Para construção, ad aedficandum; e<br />

Por cisão. Podemos verificar que somente o primeiro deles encontra-se em vigor em<br />

nosso ordenamento jurídico pátrio, não cabendo as partes, a não ser por lei federal<br />

inserir nem nosso ordenamento as demais modalidades aqui apregoadas.<br />

4.4.2 Modos de constituição da concessão do direito de superfície<br />

Quando tratamos da constituição do direito de superfície, não há que se cogitar<br />

em posição contraria, pois este somente se constitui como direito real imobiliário<br />

quando do acordo de vontade das partes, ou seja, da devida celebração do contrato<br />

solene ou instrumento hábil, ou ainda por disposição de ultima vontade e por fim, levado<br />

para averbação junto ao Cartório de Registro de Imóveis. 481<br />

Entretanto, antes de verificarmos as principais críticas referentes ao presente<br />

instituto, pouco se verifica na doutrina, como se instrumentalizara o direito se superfície.<br />

480<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 95 - 96.<br />

481<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 101.<br />

177


4.4.2.1 Modo derivado de concessão do direito de superfície<br />

Conforme Lei de Registros Públicos nos temos da alteração realizada pelo<br />

Estatuto da Cidade, o Registro de Imóveis, além da matrícula, realizará o registro da<br />

constituição do direito de superfície de imóvel urbano. 482<br />

Em decorrência disto podemos afirmar, que quando da constituição do direito de<br />

superfície a mesma se realizará junto ao Cartório de Registro de Imóveis por meio de<br />

registro, diferente do que ocorrerá na extinção de deverá ser pela via da averbação. 483<br />

484<br />

Em continuidade, Luiz Guilherme Loureiro dispõe: ``... o direito de superfície nasce com<br />

a união de dois elementos: o acordo de vontades, consubstanciado no título (no caso, a escritura<br />

pública) e o registro, vale dizer, título e modo 485 ``.<br />

Importante observar que para o presente caso, ou seja, pela constituição da<br />

concessão pela vontade das partes, a lei dispensa a inserção de cláusulas que repitam<br />

as disposições já previstas na legislação em vigor, porém ficam as partes livres para<br />

482<br />

Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. (Renumerado do art. 168 com nova<br />

redação pela Lei nº 6.216, de 1975). I - o registro: (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975). 39) da<br />

constituição do direito de superfície de imóvel urbano; (Incluído pela Lei nº 10.257, de 2001)<br />

483<br />

Sobre a diferenciação da averbação e do registro perante aos Cartórios Imobiliários vale arrolar o voto<br />

de Venício Antonio de Paula Salles qu em parte de seu voto discorre: “Uma primeira questão que foi<br />

muito bem apresentada em quase todas as manifestações (particularmente na fala do Oficial do 7° SRI),<br />

diz respeito à natureza do ATO <strong>DE</strong> REGISTRO que marca a sucessão patrimonial determinados pela<br />

INCORPORAÇÃO, FUSÃO e CISÃO de sociedades. A todos incomoda o fato de que o ato registral em<br />

tais hipóteses deva ser formalizado por AVERBAÇÃO, que é ato de índole acessória, que se presta, no<br />

mais das vezes, a agregar, informar ou corrigir dados, detalhes ou informações do fólio, ostentando<br />

natureza complementar, não se afeiçoando às hipóteses de transferência patrimonial direta. Os<br />

pareceristas Dr. Helio Lobo e Dr. Narciso Orlandi, bem sintetizaram este pensar, ao anotarem que o ato é<br />

de averbação, apenas por que a LEI assim o estabelece. Não há uma razão intrínseca, não há o respeito<br />

à natureza ou forma do NEGÓCIO JURÍDICO. O ato é objeto de AVERBAÇÃO porque assim se<br />

pronunciou a LEI.” <strong>DE</strong>CISÃO 1ª VRPSP DATA: 7/10/2005 FONTE: 000.04.049033-5. LOCALIDA<strong>DE</strong>:<br />

SÃO PAULO Relator: Venício Antonio de Paula Salles Legislação: Arts. 167 e § 13, do art. 213 da Lei nº<br />

6.015/73; art. 234 da Lei das Sociedades Anônimas; art. 165, § 2º, inciso I da Carta Constitucional e Lei<br />

nº 10.931/2004. SOCIEDA<strong>DE</strong> EMPRESÁRIA – INCORPORAÇÃO – FUSÃO – CISÃO. AVERBAÇÃO.<br />

<strong>DO</strong>CUMENTOS – EXIGIBILIDA<strong>DE</strong>. ITBI. CND – INSS – RECEITA FE<strong>DE</strong>RAL – DISPENSA<br />

EMOLUMENTOS – PADRONIZAÇÃO. ESPECIALIDA<strong>DE</strong>. EMENTA<br />

484<br />

Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. (Renumerado do art. 168 com nova<br />

redação pela Lei nº 6.216, de 1975). II - a averbação: (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975). 20) da<br />

extinção do direito de superfície do imóvel urbano. (Incluído pela Lei nº 10.257, de 2001)<br />

485<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004, p.277.<br />

178


estabelecerem o que entenderem como mais pertinente, ressalvada as cláusulas que<br />

forem contra legem, ou seja, fica vedado cláusulas no instrumento de concessão que<br />

contrariem as leis em vigor. 486<br />

Corroborando esta mesma idéia Ricardo Pereira Lira 487 “Para o direito moderno,<br />

pode dizer-se que o direito de superfície se constitui mediante contrato, devidamente<br />

registrado no registro de imóveis, e por disposição de ultima vontade”<br />

Esmiuçando e elucidando estes requisítos ponta Luiz Guilherme Loureiro 488 :<br />

``Os direitos reais sobre bens imóveis – aí incluído o direito de superfície – são<br />

constituídos, transmitidos ou onerados, nos atos ``entre vivos``, pelo inscrição do título no<br />

Registro de Imóveis. Há, portanto, duas fases na constituição ou aquisição do direito de<br />

superfície: a estipulação do direito real no contrato e o registro deste título, que serve de<br />

suporte ao direito real respectivo, no Ofício de Registro de Imóveis.(...) O direito brasileiro<br />

segue, assim, tal como ocorre com o direito alemão, o princípio da inscrição. Segundo<br />

esse princípio, a constituição, transmissão e extinção dos direitos reais sobre imóveis,<br />

por ato inter vivos, só se operam com a inscrição no Registro de Imóveis``.<br />

Em decorrência do disposto no referido artigo, há disposição na doutrina, de<br />

forma assertiva segundo o nosso ver, criticando o referido dispositivo no sentido de<br />

reformá-lo há para fazer contar outras formas de constituição da superfície.<br />

Neste diapasão, José Guilherme de Braga Teixeira dispõe que 489 :<br />

“devemos criticar a referencia que o art. 1.369...De fato, melhor teria sido que o legislador<br />

tivesse imitido tal referencia... Com efeito, melhor teria sido o legislador pátrio deixar de<br />

aludir ao desnecessário e referir o imprescindível, no que a primeira parte do artigo 1.528<br />

486<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 103 - 104.<br />

487<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.65.<br />

488<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p.277.<br />

489<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 274 e 275.<br />

179


do Código Civil Português lhe Daca a diretriz: O Direito de Superfície pode ser constituído<br />

por contrato, testamento ou usucapião... ”<br />

Referido apontamento é assertivo conforme já pontuamos anteriormente. Tal<br />

justificativa tem como fundamento, nos termos do discorrido no presente trabalho, pois<br />

referida disposição, colocaria termo final em alguns debates enfrentados pela doutrina,<br />

como por exemplo, a possibilidade de ser possível ou não usucapir o direito de<br />

superfície.<br />

Assim, quando tratamos do contrato solene, inicialmente estamos diante de uma<br />

escritura pública nos termos dos artigos 1.396 do CC 490 e do artigo 21 do Estatuto da<br />

Cidade 491 .<br />

Porem ao confrontá-los com a regra geral do artigo 108 do Código Civil 492 , que<br />

dispõe ser essencial para a validade dos negócios jurídicos a escritura publica que<br />

visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre<br />

imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País,<br />

verificamos a seguinte divergência doutrinária.<br />

A primeira delas que defende a possibilidade de constituição de direito de<br />

superfície por instrumento particular sobre imóveis de valor inferior a trinta vezes o<br />

maior salário mínimo vigente no País e outra pela impossibilidade desta forma 493 .<br />

Quanto da impossibilidade de constituição por instrumento particular – a doutrina<br />

majoritária – se posiciona no sentido de que em ambos os institutos, ou seja, os artigos<br />

490<br />

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno,<br />

por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de<br />

Imóveis.<br />

491<br />

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis.<br />

492<br />

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios<br />

jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis<br />

de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.<br />

493<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 398.<br />

180


1.396 do CC e o artigo 21 do Estatuto da Cidade, em nenhum momento fazem<br />

referencia ao valor do imóvel, sendo assim, quando da constituição ou da extinção do<br />

direito de superfície será sempre necessário a outorga de escritura pública. 494<br />

Quanto ao instrumento hábil para constituição, é verificado a possibilidade de<br />

constituição da concessão de outras formas, como por exemplo, cartas de sentenças<br />

extraídas de processos de inventário, partilha e etc. 495<br />

Esclarece ainda Carlos Roberto Gonçalves 496 :<br />

“A escritura pública equipara-se a carta de sentença que for extraída de acordo<br />

homologado judicialmente que estipule a constituição de direito de superfície. Pode este<br />

ser adquirido também por ato de ultima vontade, cujo titulo é o testamento...Embora a<br />

superfície seja direito diverso da propriedade, o registro deverá ser feito, em qualquer<br />

hipótese, na própria matricula do imóvel, não sendo o caso de matricula autônoma, uma<br />

vez que os direitos são exercidos sobre um só imóvel.”<br />

Por fim, Paulo Roberto Benasse 497 pondera:<br />

“É admissível no embasamento do instituto do direito superficiário, e no Brasil, segundo o<br />

novo Código Civil, no seu art. 1.372: O direito de superfície pode ser transferir-se a<br />

terceiros, e por morte do superficiário, aos seus herdeiros. Assim, esse direito real,<br />

constituído através de escritura públicas pode ser objeto de testamento , respeitados os<br />

limites a eles atribuídos, no que concerne ao direito de disposição de ultima vontade.”<br />

494<br />

Neste sentido: LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito<br />

Registral.São Paulo: Editora Método, 2004. p. 277.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à<br />

luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 134<br />

495<br />

Neste sentido dispõe o artigo 169 da Lei nº 6.015, de dezembro de 1973: Todos os atos enumerados<br />

no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no Cartório da situação do imóvel<br />

496<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.<br />

497<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.<br />

181


4.4.2.2 Modo originário de aquisição do direito de superfície (usucapião) 498<br />

Enfrentaremos mais um tema de disparidades doutrinárias, onde a questão gira<br />

em torno da possibilidade ou não da aquisição do direito de superfície pelo o usucapião.<br />

Segundo Ricardo Pereira Lira 499 , não é possível a aquisição do direito de<br />

superfície pela aquisição por usucapião, pois seria difícil imaginar a posse circunscrita<br />

somente sobre as plantações e construções, bem como ser a superfície um direito real<br />

aprazado e em contra partida a usucapião por prazo ilimitado; o que geraria uma<br />

desconformidade entre os institutos.<br />

Neste sentido esclarece o Silvio de Salvo Venosa 500 “Nosso Código também não<br />

se refere à possibilidade de aquisição do direito de superfície por usucapião, que<br />

poderia dar margem a infindáveis confusões, pois a disposição nesse sentido é criticada<br />

no direito português.”<br />

Ao reverso, a doutrina atual, vem tomando outra direção quanto a presente<br />

temática entendendo a viabilidade de tal aquisição. Desta monta, o entendimento<br />

majoritário, se fundamenta na existência e possibilidade de um possuidor ter somente<br />

animus domini inerente a superfície e não a propriedade do solo. 501<br />

498 Referente a presente temática, Marcus Vinicius das Santos Andrade pontua que: “Diz-se originário,<br />

porque ocorre independentemente de convergência de vontades expressas, através de contrato, para<br />

transferência da coisa. À aquisição pelo usucapiente corresponde a perda da propriedade pelo antigo<br />

proprietário, de todo irrelevante o registro imobiliário em seu nome.” ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos<br />

Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009.<br />

499 Conforme o professor: “a doutrina dá noticia da possibilidade da constituição do direito de superfície<br />

por usucapião. Não conseguimos vislumbrar como possa o direito de superfície constituit-se pela via do<br />

usucapião. No tocante da propriedade separada superficiária, no plano dogmático, não haveria<br />

dificuldade algula. Essas dificuldades suergem quando se desce do abstrato para o concreto. Quando se<br />

chega à realidade da vida. Como imaginar, por exemplo, uma posse circunscrita à construção, sem<br />

necessariamente considerá-la abrangente do solo sobre o qual ela esra edificada?” LIRA, Ricardo<br />

Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito da Procuradoria<br />

Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.38.<br />

500 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 393.<br />

501 Neste sentido: ALVES, Jones Figueiredo; <strong>DE</strong>LGA<strong>DO</strong>, Mario Luiz. Código Civil anotado. São Paulo:<br />

Método, 2005. p.697. MONTEIRO <strong>DE</strong> BARROS, Flávio Augusto. Manual de Direito Civil. São Paulo:<br />

Método, 2005. v. 3: Direito das Coisas e responsabilidade civil. p. 118. RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das<br />

Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 863. BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À<br />

Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 46.; AZEVE<strong>DO</strong>, Adriano Barcelos de. O direito<br />

182


Inicialmente, apregoa Marise Pessoa Cavalcanti: 502<br />

Quando à aquisição por usucapião, há na doutrina referencia a esta possibilidade,<br />

embora rara. Recai a mesma, principalmente, sobre o usucapião ordinário, em razão de<br />

concessão anterior a non domino. Neste caso o concessionário adquire a superfície caso<br />

conserve a posse pelo tempo necessário, na qualidade de superficiário, desde que não<br />

lhe falte boa-fé.<br />

Esclarecem Flavio Tartuce e José Fernando Simão: 503<br />

“na doutrina contemporânea, essa é a posição que prevalece, ao admitir aquisição de<br />

direito de superfície por usucapião nas modalidades ordinária e extraordinária. Nota-se<br />

que na usucapião da superfície em nada altera a propriedade do solo, que pertence com<br />

o fundieiro.”<br />

Neste mesmo sentido, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald<br />

pontuam 504 :<br />

“Em tese não há óbice legal para a criação da superfície por intermédio da usucapião. Apesar de,<br />

na prática, ser árdua a distinção do animus daquele que possui com intenção de proprietário,<br />

daquele que exerce a posse a titulo de superficiário – fato sempre faria prevalecer à primeira<br />

situação, posto mais vantajosa ao usucapiente – há casos em que é nítida a distinção. Basta<br />

cogitar daquele que recebe concessão de superfície non domino, possuído o imóvel por anos, sem<br />

saber que o concedente não era o verdadeiro proprietário.”<br />

Complementando a idéia anterior, apregoa Luiz Guilherme Loureiro 505 :<br />

real de superfície e o seu reingresso no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em<br />

. Acesso em: 10/06/2008.; CAVALCANTI, Marise<br />

Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da propriedade. Rio de<br />

Janeiro: Renovar. 2000. p. 15 – 17.<br />

502<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 16 e 17.<br />

503<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 337.<br />

504<br />

Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 404.<br />

505<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 279.<br />

183


“Cumpre ressaltar, ainda, que alguém seja possuidor de boa-fé e justo título. Embora<br />

tenha dotado as cautelas legais para a aquisição do direito de superfície (v.g., mediante<br />

contrato por instrumento público), pode ocorrer que o título fosse eivado de nulidade,<br />

desconhecida do adquirente (v.g., aquisição a non domino). Nada impede que o<br />

possuidor de boa-fé venha, verificada a prescrição aquisitiva, a usucapir a superfície.”<br />

Importante observar, que as ponderações da primeira corrente, que entende não<br />

ser possível a aquisição do direito de superfície pela aquisição por usucapião, sob a<br />

fundamentação de que aquela é um direito real aprazado, em contra partida, o<br />

usucapião tem prazo ilimitado, o que geraria uma desconformidade entre os institutos<br />

tem a sua razão de existir.<br />

Contudo ao admitirmos a aquisição de direito de superfície por usucapião,<br />

devemos ter em mente, que esta, nada altera a propriedade do solo, que permanece<br />

com o proprietário, e findado o prazo e verificada a obrigação propter rem o imóvel<br />

retorna a posse do proprietário.<br />

Outra grande fonte de verificação da viabilidade do usucapião é o direito<br />

comparado, este fornece alguns exemplos em que o direito de superfície pode ser<br />

adquirido por usucapião. Nesta esteira temos o Código Civil alemão (BGB) dispõe que a<br />

sua possibilidade quando a superfície tenha sido estipulada por 30 anos, bem como o<br />

titular do direito haja possuído o imóvel por esse tempo (art. 900); Outro exemplo, o<br />

Código Civil de Macao dispõe em seu artigo 1.421 que o direito de superfície pode ser<br />

constituído por contrato, testamento ou usucapião 506 .<br />

Por fim, não poderíamos deixar de apregoar a importante contribuição de José<br />

Carlos Moreira Alves quanto ao seu estudo da posse e seus efeitos quanto o uso<br />

usucapião. Assim, conforme ensinamentos do célebre doutrinador 507 :<br />

506<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 279.<br />

507<br />

MOREIRA ALVES, José Carlos. Posse. vol. II, 1º tomo (Estudo Dogmático), Ed. Forense, 1999; 2ª ed.,<br />

3ª tir., 1999. p. 237.<br />

184


“A graduação da posse é, em rigor, uma organização da posse da coisa, em que o<br />

possuidor com animus domini conserva a posse (como posse direta) sem ter a coisa.em<br />

seu poder, porque tem como intermediário dessa posse o possuidor direto. (...) Nessa<br />

graduação, há a derivação de ius possessionis, a partir da posse que admite a mais<br />

ampla utilização possível da coisa, e que se desdobra em outras em que essa utilização<br />

é mais restrita, sem que se leve em consideração, por via de regra, a correspondência de<br />

tal utilização com o conteúdo a ela correspondente de um direit, o que implica dizer que,<br />

nesse tipo de organização, toda a posse é posse de coisa.”<br />

Referida passagem verifica a possibilidade da graduação da posse na forma<br />

vertical, ou seja, a possibilidade da posse direta e indireta, ou seja, a possibilidade do<br />

exercício da posse de somente um dos direito inerentes a propriedade.<br />

Complementa ainda o grande jurista brasileiro quanto da possibilidade de<br />

aquisição dos direitos reais limitados 508 : “Não há posse do direito e sim posse sobre o<br />

objeto do direito, exercício este, que possibilita o usucapião de direito obrigacionais ou<br />

reais inerentes a propriedade como servidão, usufruto e superfície”<br />

Diante de todas as manifestações doutrinárias ora apregoadas, não obstante, na<br />

prática, ser árdua a distinção do animus daquele que possui com intenção de<br />

proprietário, daquele que exerce a posse a título de superficiário, não é possível refutar<br />

a existência de um possuidor ter somente animus domini inerente a superfície, sendo<br />

assim, possível admitir o usucapião do direito de superfície.<br />

4.5 Elementos subjetivos: as partes do direito de superfície<br />

A relação jurídica superficiária é formada por duas partes, a primeira delas o<br />

proprietário do solo como concedente, e por outro lado o superficiário. 509 Tratando de<br />

um contrato, sempre devemos verificar quem poderá constituir o direito de superfície.<br />

508<br />

José Carlos Moreira Alves Conforme em palestra ministrada no curso de mestrado realizada em 26 de<br />

junho de 2009, na Faculdade Autônoma de Direito – FADISP.<br />

509<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 75.<br />

185


Inicialmente não há como negar que apenas o proprietário possa constituir a concessão<br />

de superfície 510 .<br />

Neste diapasão o contrato de superfície segundo o Ricardo Pereira Lira tem os<br />

seguintes contornos 511 :<br />

tema.<br />

“Quem outorga o direito de construir ou plantar, ou aliena separadamente a construção<br />

ou plantação, é concedente, proprietário do solo (dominus soli); outro sujeito da relação<br />

jurídica é o concessionário, superficiário, proprietário da construção ou plantação (se a<br />

relação houver chegado a esse estágio, ou tiver nele iniciado); o direito de superfície<br />

abrangerá tanto o direito de construir e plantar, como a propriedade superficiária<br />

(separada do solo), nascida da concessão ou advinda da cisão de construção ou<br />

plantação já existente; superfície ou bens superficiários serão o bem ou complexo de<br />

bens objeto da propriedade superficiária (ressalvado o sentido vernacular já posto)<br />

negócio superficiário será aquele, unilateral ou bilateral, constitutivo de um direito de<br />

superfície.”<br />

Assim, verificaremos a seguir algumas disposições importantes quanto a este<br />

A primeira delas, -- que corriqueiramente tem sido objeto de argüição, tanto em<br />

bancas de conclusões de cursos, como em salas de aula – relaciona-se com os efeitos<br />

jurídicos teriam o compromisso de direito de superfície, ou ainda, o direito de superfície<br />

não levado a registro. 512<br />

Não obstante a importante ponderação entendemos como mais assertivo, que<br />

tais situações são protegidas juridicamente, porém sem o respectivo direito real<br />

resguardado.<br />

510<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.65.<br />

511<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 17.<br />

512<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 132<br />

186


Tal justificativa tem como fundamento, que em ambos os casos somente<br />

estaríamos na seara dos direitos obrigacionais e não dos direitos reais contidos no<br />

artigo 1.225 do Código Civil. 513<br />

Em um segundo momento, outro ponto relaciona-se com a concessão do direito<br />

de superfície quando se tratar de condomínio. Neste caso entendemos, que devido a<br />

amplitude deste instituto, os condôminos somente poderam constituir direito de<br />

superfície quando houver o senso comum de todos estes 514 .<br />

Outra questão que vem surgindo na doutrina 515 sob objeto de verificação, referese<br />

à transferência da superfície de ascendente para descendente.<br />

O presente apontamento tem como fundamento a venda e compra de bens<br />

imóveis de ascendente para descendente nos termos do artigo 496 do Código Civil 516 ,<br />

sendo exigida a anuência do cônjuge e dos demais descendentes, bem como o direito<br />

real de superfície seria muito próximo da propriedade.<br />

Assim, segundo o Luiz Guilherme Loureiro 517 , “parece-nos que na alienação da<br />

propriedade superficiária de ascendente para descendente, também se faz necessária a<br />

anuência do cônjuge e dos demais descendentes”.<br />

Não obstante o respeitável posicionamento do grande doutrinador entendemos<br />

não ser necessário tal requisíto, sob dois fundamentos: O primeiro deles, que a lei não<br />

o exigiu; e em um segundo momento, que este contrato deve observar os limites de sua<br />

513<br />

Conforme já apontado anteriormente entendemos como mais assertiva, a teoria que abranda<br />

possibilidade de existir outros direitos reais não previstos no rol do artigo 1.225 do Código Civil, porem<br />

referido abrandamento, somente pode ser criado por novas leis emergentes o que não condiz com tais<br />

situações referenciadas.<br />

514<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.65.<br />

515<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 282.<br />

516<br />

Art. 496. É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o<br />

cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.<br />

517<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 282.<br />

187


função social, e no caso de inobservância, ou seja, em prejuízo as partes ou terceiros,<br />

deve ser revisto ou até mesmo rescindido.<br />

Finalmente partiremos para a analise do artigo 1.377 do Código Civil 518 que<br />

estabelece a constituição da superfície por pessoa jurídica de direito público interno,<br />

regendo-se inicialmente pelo Código Civil, no que não for diversamente disciplinado em<br />

lei especial.<br />

Assim, para Carlos Roberto Gonçalves 519 as legislações em vigor que trata da<br />

concessão de terras públicas e respectivo direito de uso são as seguintes: Lei n.<br />

4.504/64; Lei n. 9.636/98; 4.937/66; 8.629/93; e Decreto Lei n. 271/67, bem como dada<br />

a complexidade dos referidos dispositivos.<br />

Referente a presente temática, optamos em não analisarmos tal fato, que de<br />

veras, tem sua importância, pois lançamos mão do critério por corte metodológico.<br />

Neste contexto a ponderação de José Guilherme de Braga Teixeira no sentido de<br />

que: “trata-se, porem, de uma disposição oportuna, visando a prevenir controvérsias<br />

que provavelmente hão de advir a propósito do seu conteúdo.” 520<br />

4.6.1 Objeto do direito de superfície:<br />

Inicialmente, não poderíamos deixar de citar a ponderação do José Guilherme de<br />

Braga Teixeira, pois no sentido de que: “O objeto do novo instituto é bem claro:<br />

constituir ou plantar em terreno de outrem, ou seja, do proprietário concedente”. 521<br />

518<br />

Art. 1.377. O direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de direito público interno, rege-se por<br />

este Código, no que não for diversamente disciplinado em lei especial.<br />

519<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 414.<br />

520<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 290.<br />

188


Esclarece Ricardo Pereira Lima 522 :<br />

“O objeto do direito de superfície pode ser relativo a construção ou referente a plantação.<br />

Neste último caso a doutrina denomina vegetal, rústica ou agrícola. No primeiro caso<br />

poder-se-ia chamar de edilícia. Por construção é de entender-se toda obra<br />

consubstanciada um todo independente: edilício, ponte dique; muro, monumento, fonte<br />

etc... Nada impede seja o direito de superfície referente a uma pluralidade de<br />

construções.”<br />

Neste sentido, a perfeita colocação de Caio Mario da Silva Pereira que dispõe 523 :<br />

“O objeto da superfície pode ser o direito de efetuar uma construção ou plantação (ius<br />

ad aedficandum vel implantandum), ou na alienação de construção ou plantação já<br />

existente, separadamente da propriedade do solo que pertence com o alienante”<br />

O objeto do direito de superfície, conforme verificamos, divergem do Código Civil<br />

para o Estatuto da Cidade. Pois em quanto este, refere-se as acessões e<br />

benfeitorias 524 , aquele realiza-se, quando da plantações e construções 525 .<br />

Nos termos do observado, Flavio Tartuce e José Fernando Simão 526 entendem:<br />

“Seguindo noções da Teoria Geral do Direito Civil, as diferenças são claras. Se os<br />

acréscimos decorrem da natureza, não se trata de benfeitorias, mas sim de acessões<br />

naturais. Da mesma forma, tratando-se de obras novas (e não acréscimos), estaremos<br />

diante de acessões artificiais (v.g., semente lançada ao solo e edifício construído)”<br />

521<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 270.<br />

522<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.69.<br />

523<br />

PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.<br />

p. 244.<br />

524<br />

Art. 24. Extinto o direito de superfície, o proprietário recuperará o pleno domínio do terreno, bem como<br />

das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel, independentemente de indenização, se as partes não<br />

houverem estipulado o contrário no respectivo contrato.<br />

525<br />

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno,<br />

por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de<br />

Imóveis.<br />

526<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 340.<br />

189


Não obstante a louvável e correta à distinção entre os referidos institutos,<br />

entendemos 527 que tal distinção – quanto aos seus efeitos –, do termo final da<br />

concessão da superfície serão os mesmos, ou seja, o proprietário irá sempre adquirir<br />

todos os acessórios ao fim da concessão.<br />

4.6.1.1 Acessibilidade ao objeto da superfície:<br />

Outro ponto relevante quanto ao objeto da superfície é o apregoado por Carlos<br />

Roberto Gonçalves 528 no tocante da necessidade de acessibilidade ao objeto da<br />

superfície:<br />

“Tendo por objeto a construção de uma obra, o direito de superfície pode abranger uma<br />

parte do solo não necessária à sua implantação, desde que tenha ela a utilidade para o<br />

uso da obra, como prescreve o ert. 1525 do Código Civil Português”<br />

No mesmo sentido, complementando Luiz Guilherme Loureiro 529 aduz:<br />

“O recente Código Civil de Macau, por exemplo determina que a constituição do direito<br />

de superfície importa na constituição das servidões necessárias ao uso e fruição da obra.<br />

Se no título não forem designados o local e as demais condições de exercício das<br />

servidões, serão eles fixados, na falta de acordo, por decisão judicial. regra é válida<br />

também para o direito brasileiro, uma vez que deve o contratante agir de boa-fé. Assim,<br />

ao alienar a superfície de seu imóvel, deve o proprietário permitir e contribuir para que o<br />

objetivo do contrato (v.g., construção ou cultura) seja alcançado, ainda que venha a<br />

sofrer restrições de alguns de seus direitos dominicais ou venha a ser obrigado a tolerar<br />

que o superficiário se utilize do imóvel para que possa explorar a constrição ou a cultura.”<br />

527<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 340.<br />

528<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 409.<br />

529<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 280 e 281.<br />

190


Desta forma, no caso de ser necessária a implantação de uma servidão, para<br />

que o superficiário tenha acesso às benfeitorias, esta será possível nos termos da<br />

legislação comparada, bem como desde que prevista no contrato de concessão.<br />

4.6.1.2 A Superfície por cisão:<br />

A superfície por cisão encontra-se relacionada com uma das formas de<br />

instituição da superfície denominada pela maior parte da doutrina de superfície por<br />

cisão 530 .<br />

Tal forma de instituição tem como objeto um prédio já erigido 531 , ou seja,<br />

existente que se objetiva a constituição da superfície para que o superficiário o<br />

conserve, reforme ou ainda amplie. 532<br />

Inicialmente, como não poderíamos deixar de fazê-lo constar, conforme os<br />

ensinamentos de Silvio de Salvo Venosa, a denominação apregoada a(s) benfeitoria(s)<br />

acrescida(s) ao solo da propriedade é implante. 533<br />

Porém, os objetos dos debates sobre este tema giram entorno da Lei não admitir<br />

expressamente tal forma de escrituração. Assim, para Carlos Roberto Gonçalves, os<br />

imóveis que já possuírem construções ou plantações não poderão ser objeto de direito<br />

de superfície. 534 Posto este, somente o terreno que se presta à esta finalidade, salvo se<br />

estabelecido contratualmente a demolição da construção existente para a reconstrução<br />

de uma outra nova obra.<br />

530<br />

Referida forma de constituição -- conforme já verificamos nos capítulos anteriores – era aceita tanto na<br />

sua forma originaria existente em Roma, ou ainda na Alemanha onde o referido direito evoluiu e se<br />

transformou em uma das suas formas mais modernas.<br />

531<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 94 e 95.<br />

532<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 330.<br />

533<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 393.<br />

534<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 413.<br />

191


Todavia, não obstante o respeitável e notório saber jurídico do citado, conforme<br />

demonstraremos a seguir, não há como sustentar a impossibilidade da não utilização<br />

535<br />

desta forma de constituição por três motivações.<br />

A primeira delas, encontra-se no próprio Estatuto das Cidades não se restringiu<br />

tão somente ao direito de “construir e plantar” conforme disposto no artigo 1.369 do<br />

Código Civil de 2002, sendo possível assim admitir a aplicação deste instituto. 536<br />

Não obstante a devida previsão normativa desta modalidade não estar prevista<br />

no Código Civil de 2002, como já é sabido, o Projeto Lei 276/2007 contempla esta<br />

forma de constituição exatamente sob a justificativa de se amoldar aos critérios já<br />

estabelecidos no Estatuto da Cidade nos seguintes termos 537 :<br />

Projeto Lei 276/2007 Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de<br />

construir ou de plantar em seu terreno ou o direito de executar benfeitorias em sua<br />

edificação, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no<br />

cartório de Registro de Imóveis. (NR) Justificativa n.º 83. Art. 1.369: A presente proposta<br />

pretende expandir a utilização do direito de superfície e harmonizar a sua<br />

regulamentação. (nossos grifos)<br />

A segunda delas encontra-se devidamente embasada no Enunciado n.º 250,<br />

aprovado na III Jornada de Direito Civil CJF/STJ, que dispõe de forma clara e lidima:<br />

“Admite-se a constituição do direito de superfície por cisão”, ou seja, incontestadamente<br />

aprovada a referida forma de constituição.<br />

Neste mesmo sentido pontua Luiz Guilherme Loureiro 538 :<br />

535<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 131.<br />

536<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 330.<br />

537<br />

BRASIL. Projeto Lei nº 276/2007. Altera o Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro<br />

de 2002. Autoria Léo Alcântra PSDB/CE. Projetos de Lei e Outras Proposições: Consulta Tramitação de<br />

Proposição. Disponível em: .<br />

Acesso em: 26 março 2009.<br />

538<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 276.<br />

192


`` Com efeito, é possível a instituição de direito de superfície de obra ou plantação já<br />

existente, o que não se confunde com o usufruto. Neste, o usufrutuário pode apenas<br />

administrar, usar e gozar o bem, mas não pode consumi-lo ou alterar sua composição ou<br />

destinação econômica. Na superfície, embora o superficiário deva dar à coisa a<br />

destinação prevista no contrato (vale dizer, construção ou plantação), ele se torna<br />

proprietário da construção ou plantação... Assim, nada impede que ele destrua a<br />

construção para reconstruir, amplie ou reforme a obra, mude de uma cultura de algodão<br />

para uma cultura de soja e assim por diante, salvo se houver expressa proibição no<br />

contrato. Já no usufruto, a proibição da alteração da destinação econômica da coisa<br />

usufruída é elemento do próprio tipo.”<br />

Neste contexto entendem Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 539 :<br />

“Parece-nos que neste ponto o legislador agiu de forma tímida, pois a possibilidade de<br />

concessão de “superfície por cisão” seria excelente modo de revitalização de edificações<br />

mal conservadas, abandonadas pelo tempo, ou de conclusão de obras de edificação que<br />

foram paralisadas por desídia ou carência econômica dos proprietários“<br />

Um exemplo prático, pontuado por nós, são os imóveis históricos – como os das<br />

cidades de Olinda, Salvador e São Luis -- tombados -- tanto em suas importantíssimas<br />

fachadas como em seus interiores – pelos respectivos órgãos públicos 540 que<br />

necessitam de benfeitorias, sejam elas de conservação ou de reforma.<br />

4.6.1.3 Da superfície em segundo grau ou sobreelevação<br />

Conforme se verifica na doutrina, a superfície em segundo grau ou<br />

sobreelevação, é um instituto que merece ser esmiuçado. Tal justificativa tem como<br />

539 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

540 Podemos citar como exemplo em âmbito nacional o IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e<br />

Artístico Nacional. Órgão federal responsável pelo tombamento, em âmbito do Estado de São Paulo o<br />

CON<strong>DE</strong>PHAAT - Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do<br />

Estado de São Paulo. Órgão responsável pelo tombamento no Estado de São Paulo e por fim, o<br />

CONPRESP - Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da<br />

Cidade de São Paulo.<br />

193


fundamento a grande densidade populacional e os poucos lugares passíveis de<br />

construção ainda existentes. 541<br />

Sendo assim, verifica-se ainda, quem defenda a possibilidade de constituição da<br />

denominada sobreelevação da superfície, ou seja, a instituição de uma outra superfície<br />

sobre uma já existente. 542<br />

Tal corrente doutrinária, tem como base em um primeiro momento, que não há<br />

disposição legal que trata da desta matéria, bem como e posteriormente, embasam-se<br />

na tese do rol do artigo 1.225 do Código Civil seria somente exemplificativo, o que<br />

resultaria na possibilidade da instituição de qualquer e novel direito real – seja qual for –<br />

que no presente caso seria a superfície em segundo grau. 543<br />

Entrementes, como se pôde verificar anteriormente, entendemos forçoso mitigar<br />

completamente o rol taxativo do referido dispositivo legal, sob a única e exclusiva<br />

fundamentação, o princípio da autonomia privada para justificar esta possibilidade,<br />

ainda que em escala pequena, incluir novos modelos jurídicos de direitos reais com<br />

base nos espaços consentidos por lei 544 .<br />

Ainda na esteira do presente debate, Cristiano Chaves de Farias e Nelson<br />

Rosenvald ponderam 545 :<br />

“Apesar da impossibilidade jurídica da instituição do modelo da sobreelevação, em<br />

localidades mais carentes, pode-se ver o chamado “direito de laje” – popular “puxainho” –<br />

uma situação analógica ao que se pretende na sobreelevação. É lamentável que não<br />

541<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 83.<br />

542<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 305 – 306.<br />

543<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 333.<br />

544<br />

Neste sentido: TEPEDINO, Gustavo. A Multipropriedade Imobiliária, São Paulo, Saraiva, 1993;<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de<br />

Janeiro: Lúmen Júris, 2007.<br />

545<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 405.<br />

194


haja previsão normativa desta interessante figura, pois permitia o acréscimo de função<br />

social da posse em várias favelas e aglomerados populares pela via de sua regularização<br />

através do registro imobiliário.<br />

Entendemos legítima a posição que o presente instituto, sendo que este, pode<br />

ser uma ferramenta importante para a regularização de algumas situações inadequadas<br />

perante o atual sistema legal e registrário – dentre elas a Lei de Registros Públicos (Lei<br />

n. 6.015/73) – vigente.<br />

Todavia entendemos como assertiva, a teoria que abranda possibilidade de<br />

existir outros direitos reais, criados por novas leis emergentes o que não encontra<br />

guarida no presente caso, 546 bem como uma alternativa para resolução desta situação<br />

seria a reforma legislativa para acrescer esta importantíssima forma de constituição de<br />

direito de superfície.<br />

4.6.1.4 Da ocupação do subsolo e do espaço aéreo<br />

Conforme disposição prevista no Código Civil, propriedade do solo se verifica em<br />

todo o espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu<br />

exercício 547 , bem como a propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais<br />

recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e<br />

outros bens referidos por leis especiais 548 não submetidos a transformação industrial,<br />

obedecido o disposto em lei especial. 549<br />

546 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 274.<br />

547 Art. 1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e<br />

profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam<br />

realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em<br />

impedi-las.<br />

548 Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os<br />

potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.<br />

549 Art. 1.230. Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de<br />

emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação industrial, obedecido o<br />

disposto em lei especial.<br />

195


Analisando o referido dispositivo legal, não se admite o direito de superfície do<br />

subsolo e do espaço aéreo, ressalvado se for o objeto inerente da própria concessão,<br />

ou ainda se constar expressa autorização no instrumento ou contrato que o instituiu nos<br />

termos do definido no Artigo 1.369, parágrafo único do Código Civil de 2002 550 .<br />

Importante observar que no direito português inicialmente existiu a vedação da<br />

construção de obra no subsolo, salvo se fosse inerente à obra superficiária. Referido<br />

dispositivo teve sua previsão legal no art. 1.525, p.2., do CCPor. 551 Em decorrência<br />

disto, o posicionamento doutrinário, neste sentido, ou seja, em prol de não dever o<br />

instituto autorizar obra no subsolo, se ela não for inerente à obra superficiária. 552 Foi<br />

fortemente criticado pela doutrina e posteriormente derrogado pelo Dec. – lei 257 de<br />

1991. 553<br />

Entrementes, conforme pode se verificar o direito de superfície previsto no artigo<br />

21, § 1.º, da Lei 10.247/2001 554 , autoriza ao superficiário o direito de utilizar o solo, o<br />

subsolo ou o espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato<br />

555 556<br />

respectivo, porem devendo ser observada a legislação urbanística.<br />

550 Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno,<br />

por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de<br />

Imóveis. Parágrafo único. O direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao<br />

objeto da concessão.<br />

551 BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 181<br />

552 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 273.<br />

553 LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral. São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p.274.<br />

554 Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis. § 1º O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo<br />

relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, atendida a legislação urbanística.<br />

555 Um exemplo prático é “ no âmbito do direito privado, a aquisição por condomínios da superfície do<br />

terreno visinho, com o fim de impedir qualquer edificação no imóvel contíguo acima de limitas que<br />

inviabilizem o sossego, privacidade e, mesmo o campo visual dos superficiários.” CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS,<br />

Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 402.<br />

556 Neste sentido: VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas,<br />

2003.p. 395.<br />

196


Neste sentido aponta Frederico Henrique Viegas de Lima 557 : “A concessão<br />

superficiária poderá abranger o direito de utilização do solo, do subsolo ou do espaço<br />

aéreo que esta acima do terreno, de acordo com o ajuste efetuado entre o concedente<br />

e o superficiário no momento da contratação do direito.”<br />

Em suma, há de se perceber perfeitamente que há uma suposta divergência<br />

referente aos diplomas em tela, todavia entendemos que os referidos dispositivos<br />

normativos possuem o mesmo objetivo, ou seja, busca-se restringir a utilização do solo,<br />

bem como proteger o proprietário, caso haja minério de propriedade da União artigo 20,<br />

inciso IX, da Magna Carta de 1998 558 , pertencendo assim os valores a serem pagos<br />

pela exploração ao proprietário.<br />

Neste diapasão, pontuam Flavio Tartuce e José Fernando Simão 559 :<br />

“Pois bem, entendemos que as normas, apesar das relações aparentemente<br />

antagônicas, possuem idêntico alcance. O superficiário não pode explorar o subsolo, e,<br />

caso haja minério de propriedade da União (art. 20, inc. IX, da CF/1988), os valores<br />

pagos pela exploração não pertencerão ao superficiário, mas ao dono que mantém a<br />

propriedade e o direito de exploração do subsolo.”<br />

Não obstante o já disposto, objetivando por termo final na presente discussão, o<br />

Projeto Lei 276/2007 propõe a alteração do Código Civil para contemplar os seguintes<br />

termos 560 :<br />

“Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em<br />

seu terreno ou o direito de executar benfeitorias em sua edificação, por tempo<br />

determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no cartório de Registro<br />

de Imóveis. Parágrafo único. O direito de superfície abrange o direito de utilizar o imóvel<br />

557<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 216.<br />

558<br />

Art. 20. São bens da União: ... IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo Constituição Federal.<br />

559<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 333.<br />

560<br />

BRASIL. Projeto Lei nº 276/2007. Altera o Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro<br />

de 2002. Autoria Léo Alcântra PSDB/CE. Projetos de Lei e Outras Proposições: Consulta Tramitação de<br />

Proposição. Disponível em: .<br />

Acesso em: 26 março 2009.<br />

197


pronto ou em fase de construção, o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo ao<br />

mesmo, na forma estabelecida no contrato, atendida a legislação urbanística”. (NR)<br />

Justificativa n.º 83. Art. 1.369: A presente proposta pretende expandir a utilização do<br />

direito de superfície e harmonizar a sua regulamentação. A restrição do parágrafo único<br />

do art. 1.369 limita o Instituto da Superfície ao nível do solo, excluindo o subsolo e o<br />

espaço aéreo que são da essência do instituto da superfície. (nossos grifos)<br />

Diante do exposto, o que visa ambos dispositivos, inicialmente é a proteção do<br />

patrimônio público da União, bem como o proprietário do imóvel quando do recebimento<br />

da exploração extrativista, observando ainda, a devida exploração do subsolo e do<br />

espaço aéreo nos termos do pactuado e por fim o Projeto Lei 276/2007 a harmonia<br />

entre os institutos, assim como expandir o uso do subsolo e do espaço aéreo que são<br />

primordiais para a perfeita aplicação do instituto.<br />

4.6.1.5 Da impossibilidade de constituição do direito de superfície<br />

Por fim, quando tratamos do objeto de constituição do direito real de superfície,<br />

podemos verificar que a doutrina se posiciona no sentido da impossibilidade de<br />

constituição em imóveis com gravame e/ou ônus reais.<br />

Neste sentido o Luiz Guilherme Loureiro dispõe que 561 :<br />

“ Como ato de gravame somente o proprietário com plena capacidade de disposição de<br />

sobre o imóvel pode constituir superfície. Assim, não é possível, ao nosso ver, a<br />

instituição do direito em imóvel gravado com clausula de inalienabilidade e<br />

incomunicabilidade ou ainda sobre o bem de família. Também não pode faze-lô apenas<br />

um dos condôminos, já que detêm apenas uma fração ideal, isto é, não localizável no<br />

espaço.”<br />

561<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 277.<br />

198


Entendemos como assertiva tal disposição, pois para a constituição do direito de<br />

superfície, além do proprietário do imóvel necessariamente encontrar-se apto para<br />

realização de tal feito, deve ainda, o objeto da concessão, estar desimpedido ônus ou<br />

gravames. 562<br />

4.7 Da impossibilidade de pagamento do laudêmio<br />

Em continuidade, verificamos a impossibilidade de pagamento do laudêmio ou<br />

qualquer outro similar quando da constituição ou transferência por ato oneroso do<br />

direito de superfície 563 . Assim, dispõe o artigo 1.372 nos seguintes termos:<br />

“Art. 1.372. O direito de superfície pode transferir-se a terceiros e, por morte do<br />

superficiário, aos seus herdeiros. Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo<br />

concedente, a nenhum título, qualquer pagamento pela transferência.” (Nossos Griffos)<br />

Corroborando com o apontamento do referido dispositivo, podemos afirmar –<br />

como já dito anteriormente – que o superficiário é titular de um direito real, com o<br />

respectivo valor econômico – tendo em vista que este pode ser comercializado ou ainda<br />

gravado de ônus real – em caráter acessório e temporal.<br />

Entrementos, não há que se falar em aplicação ou pagamento de laudêmio,<br />

referida disposição legal prevista no artigo supracitado é louvável tendo em vista o<br />

instituto do laudêmio sempre sofreu severas critícas por boa parte da doutrina nacional<br />

por diversos motivos relevantes. 564<br />

Neste entendimento, entendem Flavio Tartuce e José Fernando Simão 565 :<br />

562<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 309.<br />

563<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 83.<br />

564<br />

Neste sentido: TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts.<br />

1.277 a 1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil<br />

Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 269.<br />

565<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 282.<br />

199


“Conforme já explicado quando do estudo da enfiteuse, o laudêmio sempre sofreu sérias<br />

críticas da doutrina por representar fonte fácil de enriquecimento para o senhorio, que<br />

lucra com o trabalho alheio. Se houver tal previsão em instrumento negocial, esta será<br />

nula por ofender normas de ordem pública. Para tal conclusão serve como fundamento a<br />

vedação do enriquecimento sem causa, constante dos arts. 884 a 886 do CC. Caso o<br />

superficiário pague tal quantia ao proprietário, poderá reavê-la posteriormente, cabendo a<br />

ação de repetição de indébito (actio in rem verso)”<br />

Tal posicionamento segundo nosso ver é assertivo, bem como a forma proposta<br />

de resolução desta imposição pactuada, ou seja, se houver a presente condição<br />

negocial de imposição de laudêmio, esta será nula não somente por ofender uma<br />

ordem pública, – conforme pontuam os referidos doutrinadores – mas também, pela não<br />

observância da função social dos contratos prevista no artigo 421 do Código Civil 566 ,<br />

como ainda, pela função social da propriedade prevista no § 1 º , artigo 1.228 567 , do<br />

mesmo diploma.<br />

Neste raciocínio, entendemos como correta a previsão que determina o dever de<br />

reaver o valor pago indevidamente pelo superficiário ao proprietário do imóvel, por meio<br />

da ação de repetição de indébito prevista devidamente nos artigos 884 a 886 do Código<br />

Civil 568 .<br />

Dispositivo este, que aponta a obrigação de restituir o valor devidamente<br />

auferido, no caso de sem justa causa enriquecer do esforço e trabalho alheio.<br />

566 Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.<br />

567 Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do<br />

poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 1o O direito de propriedade deve ser<br />

exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam<br />

preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o<br />

equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.<br />

568 Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o<br />

indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento<br />

tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais<br />

subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido. Art. 885. A restituição é<br />

devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta<br />

deixou de existir.Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros<br />

meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.<br />

200


4.8 Da duração do direito de superfície<br />

Outro conflito aparente, – além de outros que iremos arrolar – esta<br />

correlacionado ao prazo limite máximo pactuada pelo fundieiro ou fundeiro e o<br />

superficiário referente à superfície.<br />

Tal apontamento tem como fundamento o dispositivo legal expresso no artigo<br />

1.369 do Código Civil de 2002 569 , o direito de superfície tem tempo determinado, já em<br />

contra partida dispõe o artigo 21 do Estatuto da Cidade 570 tem tempo determinado ou<br />

indeterminado. 571<br />

Utilizando o mesmo critério de resolução já apresentado para o direito<br />

intertemporal, ou seja, a interpretação fundamentada em microssistemas, ou seja,<br />

entendemos que aplicando Código Civil quando tratamos de relações privadas e<br />

aplicaremos subsidiariamente o Estatuto da Cidade, quando tratarmos de política de<br />

desenvolvimento urbano.<br />

Ao observarmos que em ambos institutos – seja o Estatuto da Cidade ou o<br />

Código Civil de 2002 de forma mais latente, pois este último, utiliza-se somente do<br />

prazo determinado – objetivam de certar forma, evitar a perpetuidade do instituto que<br />

afasta a idéia imutabilidade e absolutismo de qualquer instituto vigente. 572<br />

569<br />

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno,<br />

por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de<br />

Imóveis.<br />

570<br />

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis.<br />

571<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 140.<br />

572<br />

Conforme ponderação da Marise Pessoa Cavalcanti: “Nota-se que a superfície perpetua traz o<br />

inconveniente de retirar do instituto sua principal vantagem, a maleabilidade, a possibilidade de<br />

adequação às realidades e necessidades sociais de casa época. CAVALCANTI, Marise Pessoa.<br />

Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da propriedade. Rio de Janeiro:<br />

Renovar. 2000.<br />

201


Neste diapasão Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 573 : “Essa<br />

abertura do Estatuto da Cidade não prejudica a essência do modelo, pois o que se<br />

proíbe é a perpetuidade do direito real, que acarretaria a própria interrupção dos efeitos<br />

da acessão, e não a mera suspensão.”<br />

Complementam Flavio Tartuce e José Fernando Simão 574 :<br />

“o que pretende evitar o Código Civil de 2002 é a perpetuidade da superfície,<br />

característica presente na enfiteuse e que não se justifica nos dias de hoje, pois valores<br />

os contemporâneos e pós-modernistas rechaçam a idéia de algo perpétuo ou imutável.<br />

Desse modo, ainda que a instituição de superfície de superfície urbana possa ocorrer por<br />

prazo indeterminado, não poderá esta ser perpétua, por contrariar a própria sistemática<br />

do instituto.”<br />

Outro ponto latente, que não pode deixar de ser ventilado é: determinar qual<br />

seria o prazo máximo ou limite para a instituição da superfície? Seria 10 anos, 50 anos<br />

ou 100 anos?<br />

Uma das respostas para à presente problemática, que inicialmente tem sido<br />

assinalada pela doutrina, seria uma alternativa analógica com base no inciso III, do<br />

artigo 1.410 575 do Código Civil que estabelece o prazo máximo de 30 (trinta) anos. 576<br />

Não obstante a primeira corrente, há ainda quem sustente, que a superfície não<br />

poderá ter um prazo superior a 50 (cinqüenta) anos com base na legislação e<br />

experiência alienígena.<br />

Neste sentido, apregoa José Guilherme de Braga Teixeira 577 :<br />

573 Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 402.<br />

574 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 333.<br />

575 Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis:... III -<br />

pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo<br />

decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer.<br />

576 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 333.<br />

202


“A experiência haurida com o direito real de superfície na Espanha, desde a admissão desse<br />

instituto em 1956, ano de criação da Ley Del Suelo, levou as novas leis de solo a elevar para os atais<br />

noventa e nove anos o prazo de duração do direito de superfície constituídos entre particulares, qual era<br />

originariamente de cinqüenta anos, conforme estabelecido pelo Reglamento de la ley hipotecaria (Já<br />

modificado pelo decreto de 17 de março de 1959), no art. 16, C. Sem embargo, continuamos opinando<br />

que, entre nós, esse instituto novo, o direito real de superfície, tenha prazo de duração não excedente a<br />

cinqüenta anos.”<br />

Porém, com devida vênia, entendemos que esta alternativa não seria a mais<br />

adequada pelos seguintes fundamentos.<br />

O primeiro ponto, encontra-se relacionado à própria disposição legal – e<br />

proposital – de ambos institutos que deixam uma “janela em aberto”, para a aplicação<br />

do caso pratico, ou seja, o Legislador disponibilizou um instrumento, pelo qual as<br />

próprias partes possam em comum acordo instituir a superfície pelo prazo que<br />

entenderem mais adequados de acordo com suas necessidades.<br />

Corroborando esta idéia, Luiz Guilherme Loureiro esclarece que:<br />

``O Código Civil português, ao contrário, prevê uma prazo de caducidade de dez anos.<br />

Nada impede, entretanto, que as partes convencionem um prazo máximo para que seja<br />

erguida a construção ou realizada a plantação, sob pena de revogação do contrato de<br />

concessão do direito real de superfície 578 ``.<br />

Sem assim, com base no que determina o Código Civil, não obstante estarmos<br />

diante de uma norma de ordem pública, o Legislador disponibilizou um instrumento,<br />

pelo qual as próprias partes possam em comum acordo instituir a superfície pelo prazo<br />

que entenderem mais adequados de acordo com suas necessidades.<br />

577<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 273.<br />

578<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 273.<br />

203


4.9 O Cânon superficiário ou solarium<br />

Conforme já apontado anteriormente, superficiário é titular de um direito real,<br />

com o respectivo valor econômico – tendo em vista que este pode ser comercializado<br />

ou ainda gravado de ônus real – em caráter acessório e temporal. Assim, a superfície<br />

pode ser estabelecida de forma gratuita ou onerosa. 579<br />

Referida disposição legal, de veras, é inovadora e pertinente, pois referido<br />

instituto regulamenta uma questão não tratada de forma específica nas legislações<br />

estrangeiras. 580<br />

Deste modo, conforme estabelece tanto o artigo 1.370 581 do Código Civil e o<br />

artigo 21, § 2. º, da Lei 10.247/2001 582 – e neste ponto não há divergência normativa –<br />

que a concessão da superfície poderá ser onerosa ou gratuita, bem como as partes<br />

poderão ainda, pactuar a forma dos pagamentos do cânon superficiário ou solarium,<br />

sendo estes, anuais, semestrais, bimestrais ou etc. 583<br />

Retomando a idéia originária do presente instituto, dispõe José Guilherme Braga<br />

Teixeira: “Convém frisar que, mesmo na antiga Roma, o direito de superfície costumava<br />

ser remunerado por uma contraprestação consistente num cânon denominado solarium.<br />

579<br />

CORREA, Osíris Leite. Direito de Superficie. Disponível em . Acesso em: 10/06/2008.<br />

580<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 277. BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do<br />

Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá, 2006. p. 98.<br />

581<br />

Art. 1.370. A concessão da superfície será gratuita ou onerosa; se onerosa, estipularão as partes se o<br />

pagamento será feito de uma só vez, ou parceladamente.<br />

582<br />

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis. ... § 2o A concessão do direito de superfície poderá ser gratuita ou onerosa.<br />

583<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 105.<br />

204


Entretanto, podia ser a superfície concebida sem nenhuma retribuição, posto que não<br />

era o solarium essencial ao instituto.” 584<br />

Neste mesmo sentido, porem verificando sua aplicabilidade nos dias modernos,<br />

Frederico Henrique Viegas de Lima pontua 585 :<br />

“A concessão do direito de superfície pelo teor do §2º do artido 21 poderá ser gratuita ou<br />

onerosa. No caso de concessão onerosa, as partes contratantes estipularão se o<br />

pagamento do cânon superficiário será realizado de uma única vez ou será datisfeito de<br />

forma parcial. Desta forma pode-se estipular, no tempo da constituição do direito de<br />

superfície, se o pagamento será realizado no momento de iniciar a concessão, ou será<br />

realizado durante toda a concessão do direito.”<br />

Todavia existem duas importantes observações a serem tecidas sobre este<br />

ponto. A primeira delas relaciona-se a obrigação pelo pagamento do cânon superficiário<br />

ou solarium – quando avençado – entre as partes é uma obrigação propter rem, pois<br />

esta é oriunda do próprio do próprio direito real de superfície. 586<br />

Em um segundo momento, como conseqüentemente, ainda que a superfície seja<br />

transferida por ato inter vivos ou causa mortis 587 , pela natureza da obrigação, o novo<br />

proprietário será responsável pelo pagamento devido de seu antecessor 588 .<br />

Por fim, importante frisar, que a doutrina predominante entende que caso haja<br />

ausência de previsão, a superfície entende-se como onerosa, 589 não obstante<br />

584<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 277.<br />

585<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 216 e 217.<br />

586<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.72.<br />

587<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 383. dispõe: “Alias nada impede que o direito real seja concebido pela via do negocio<br />

jurídico unilateral do testamento. Assim, é possível que A faça um testamento deixando a propriedade do<br />

bem a seus herdeiros B e C, efetuando legado de direito de superfície em prol de um amigo D.<br />

Fundamental para a gênese do direito de superfície será o registro do formal de partilha.”<br />

588<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 334.<br />

205


espeitoso posicionamento, entendemos que tal premissa, seria equivocada, pois nos<br />

questionamos inicialmente: como presumir que superfície é onerosa, sem constar o<br />

valor a ser pago, bem como a forma de pagamento do cânon superficiário ou solarium?<br />

Em decorrência disto, não vislumbramos a possibilidade presumir a onerosidade sem as<br />

devidas condições – como valor avençado e forma de pagamento – expressas.<br />

Ainda neste sentido, nos termos dos ensinamentos de Cristiano Chaves de Faria<br />

e Nelson Rosenvald, verificamos que o proprietário pode perceber que não<br />

compensaria cobrar os valores do superficiário, tendo em vista o grande vulto das<br />

benfeitorias realizadas em seu imóvel, pois o núcleo da superfície é o tempo de sua<br />

vigência e não onerosidade ou gratuidade. 590<br />

Diante do exposto acima, temos como entendimento, que uma das premissas<br />

fundamentais do direito de superfície neste aspecto, é composta por uma ambivalência<br />

de elementos.<br />

Por fim concluímos que em um primeiro momento, podemos afirmar que o núcleo<br />

da superfície é o tempo de sua vigência tendo em vista realização – ou não – de<br />

benfeitorias acrescidas no imóvel, já em um segundo momento o cânon superficiário ou<br />

solarium como uma complementação da primeira premissa fundamental.<br />

4.10 Dos encargos e contribuições<br />

Não poderíamos iniciar o presente tópico, sem apregoar o discorrido por José<br />

Guilherme de Braga Teixeira 591 :<br />

589<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2002. v. 5: Direitos reais.p. 395.<br />

590<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 403.<br />

591<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 279.<br />

206


“O codificador brasileiro introduziu regra faltante em todas as legislações estrangeiras,<br />

exceto a francesa, prevista no artigo 4 da Lei n.º 64-1.247, que determina expressamente<br />

tal obrigação, de modo expresso. Agiu muito bem o legislativo em disciplinar questão que<br />

poderia vir a trazer varias querelas entre o concessionário (superficiário) e o concedente<br />

(senhor do solo).”<br />

Entretanto existe outro ponto de divergência na legislação vigente, que encontrase<br />

pautada na obrigação do pagamento dos encargos e contribuições, porem<br />

inicialmente devemos diferenciar encargos e tributos, bem como estabelecer as<br />

diretrizes gerais deste instituto.<br />

Neste diapasão, pontuam Flavio Tartuce e José Fernando Simão 592 :<br />

“O superficiário tem o dever de pagar os encargos e tributos que incidirem sobre o imóvel<br />

(art. 1.371 do CC). Os tributos têm natureza fiscal sendo pertinente exemplificar com o<br />

ITR (para áreas rurais) e o IPTU (para áreas urbanas). Como encargo, pode ser citado o<br />

dever de pagar a taxa condominial, se o imóvel dado em superfície se localizar em um<br />

condomínio edilício”<br />

No tocante dos tributos, assim como os Cristiano Chaves de Farias e Nelson<br />

Rosenvald, entendemos que não há inconstitucionalidade na regra com violação com o<br />

inciso III, do artigo 146, da Magna Carta que resguarda a Lei Complementar<br />

regulamentar as relações entre contribuinte e tributo. Ao inverso, o Código Civil<br />

estabeleceu um novo responsável patrimonial solidário no pólo passivo nos da relação<br />

tributária. Medida esta, possível, por lei ordinária nos termos do artigo 128 do Código<br />

Tributário Nacional. 593<br />

Em continuidade, podemos entender que nos termos do artigo 1.371 594 do<br />

Código Civil de 2002, o superficiário tem o dever de pagar os encargos e tributos<br />

inerentes ao imóvel. 595<br />

592<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 333.<br />

593<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 405.<br />

594<br />

Art. 1.371. O superficiário responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre o imóvel.<br />

207


Todavia, havendo mais uma disparidade legal na legislação em vigor, o artigo 21,<br />

§ 3º, do Estatuto da Cidade 596 , dispõe em sentido complementar, que não obstante esta<br />

obrigação seja inicialmente do superficiário, deverá o proprietário do imóvel, arcar,<br />

ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e<br />

tributos sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo disposição em<br />

contrário do contrato respectivo.<br />

Neste sentido Frederico Henrique Viegas de Lima 597 :<br />

“Conforme o estabelecido no §3º artigo 23, ao superficiário corresponderá pagamento de<br />

todas as cargas tributárias que incidam direta ou indiretamente sobre a propriedade<br />

superficiária, enquanto dure o direito de superfície. Trata-se de uma forma supletiva, que<br />

pode ser afastada pela vontade das partes no momento da contratação da superfície.<br />

Inquestionavelmente, há uma repartição de cargas tributárias, uma vez que há divisão de<br />

domínio. Algumas corresponderão ao proprietário do solo, outras ao superficiário. Isto,<br />

alias, é muito comum na constituição de direito real de usufruto, quando ao usufrutuário<br />

correponde uma carga tributária bem superior àquela correspondente ao nu-proprietário”<br />

Mais uma disparidade observada, que poderíamos utilizar o mesmo critério de<br />

resolução já apresentado, ou seja, aplicando inicialmente o dialogo das fontes entre<br />

estes dois instituto, porem com a seguinte propositura inicial: Aplicando Código Civil<br />

quando tratamos de relações privadas e aplicaremos subsidiariamente o Estatuto da<br />

Cidade, quando tratarmos de política de desenvolvimento urbano já resolveremos o<br />

problema de confronto normativo.<br />

595<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 151.<br />

596<br />

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis.... § 3º O superficiário responderá integralmente pelos encargos e tributos que incidirem sobre a<br />

propriedade superficiária, arcando, ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os<br />

encargos e tributos sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo disposição em<br />

contrário do contrato respectivo.<br />

597<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005<br />

208


Não obstante, podemos resolver a presente proposição com elementos mais<br />

materiais ou factíveis do que este apresentado. Assim, encontrados na doutrina, dois<br />

apontamentos importantíssimos de nos direciona para a aplicação do dispositivo<br />

elencado no Estatuto da Cidade.<br />

O primeiro deles, encontra-se devidamente embasado no Enunciado n.º 94,<br />

aprovado na I Jornada de Direito Civil CJF/STJ, que dispõe clara e lidimamente: 94 –<br />

Art. 1.371: “As partes têm plena liberdade para deliberar, no contrato respectivo, sobre<br />

o rateio dos encargos e tributos que incidirão sobre a área objeto da concessão do<br />

direito de superfície”.<br />

Assim, podemos entender, que estamos diante de um negócio jurídico contratual,<br />

onde as partes podem avençar a melhor alternativa, ou, a melhor forma de contratar<br />

pontuando assertivamente a responsabilidade sob o pagamento de encargos e tributos.<br />

Ainda neste sentido, ou seja, observando a liberdade de contratar, bem como a<br />

disparidade legislativa, como já é sabido, o Projeto Lei 276/2007 contempla a mesma<br />

disposição legislativa já estabelecidos no Estatuto da Cidade, nos seguintes termos 598 :<br />

Projeto Lei 276/2007 “Art. 1.371. O superficiário responderá integralmente pelos<br />

encargos e tributos que incidirem sobre a propriedade superficiária, arcando, ainda,<br />

proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e tributos sobre<br />

a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo disposição em contrário do<br />

contrato respectivo”. (NR) Justificativa n.º 84. Por esses motivos, afigura-se necessário<br />

modificar-se a redação dos dois dispositivos, complementando-a, nos termos da proposta<br />

formulada. (nossos grifos)<br />

Em suma, entendemos como assertiva a alteração legislativa, bem como o<br />

enunciado aprovado. Pois ambos apontamentos, objetivam se amoldar ao critério já<br />

existente no Estatuto da Cidade que visa assegurar a liberdade de contratar e com o<br />

598 BRASIL. Projeto Lei nº 276/2007. Altera o Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro<br />

de 2002. Autoria Léo Alcântra PSDB/CE. Projetos de Lei e Outras Proposições: Consulta Tramitação de<br />

Proposição. Disponível em: .<br />

Acesso em: 26 março 2009.<br />

209


intuito atender de forma mais assertiva, tanto a função social desta concessão, como a<br />

função social da propriedade.<br />

4.11 Do direito de preferência<br />

Com relação ao tema que alude a presente preposição, incisiva no particular, as<br />

disposições legislativas – que entendemos como corretas – no sentido de que em caso<br />

de alienação do imóvel ou do direito de superfície é garantido o direito de preferência. 599<br />

Tal direito, encontra-se devidamente cravado, em ambos diplomas positivamos,<br />

tão largamente debatidos até este ponto, seja no Código Civil pelo artigo 1.373 600 , ou<br />

pelo o artigo 22 Estatuto da Cidade 601 .<br />

Neste sentido, Arruda Alvim: 602<br />

“Estabelece o art. 1.373 uma preferência recíproca, isto é, se se alienar a propriedade ----<br />

- que se poderia designar como uma realidade com alguma analogia à da "nua<br />

propriedade", ou seja, sem o direito real de superfície, daquela destacado ----- o<br />

superficiário terá preferência para adquirir essa "nua propriedade", integrando e<br />

“consolidando”, digamos assim, o seu direito real relativo a este imóvel, passando a ser<br />

deste proprietário; e reciprocamente, como foi dito, se alienar o direito real de superfície,<br />

estabelece o Código Civil uma preferência para o proprietário, no sentido de voltar-lhe às<br />

mãos o que é representado por aquele direito real que se havia desmembrado de sua<br />

propriedade.”<br />

Assim, ocorrendo a transferência do terreno, ou ainda do direito de superfície,<br />

tanto o superficiário como o proprietário, terão direito de preferência, em igualdade de<br />

599<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 108i.<br />

600<br />

Art. 1.373. Em caso de alienação do imóvel ou do direito de superfície, o superficiário ou o proprietário<br />

tem direito de preferência, em igualdade de condições.<br />

601<br />

Art. 22. Em caso de alienação do terreno, ou do direito de superfície, o superficiário e o proprietário,<br />

respectivamente, terão direito de preferência, em igualdade de condições à oferta de terceiros.<br />

602<br />

ALVIM, Arruda. O Livro do Direito das Coisas. Rio de Janeiro: Editora Forense, obra não publicada.<br />

210


condições à oferta de terceiros, perfeito, pois conforme colocamos anteriormente<br />

advogamos pelo direito de preferência neste instituto. 603<br />

Ao reverso, deveria o legislador ordinário assim como o fez o patrício 604 ,<br />

estabelecer as regras para a efetivação de um direito tão importante como este para o<br />

presente instituto. 605<br />

Ante a ausência de supedâneo devemos buscar a solução para a presente<br />

questionamento em outros direitos de preferência, como a prelação ou preferência<br />

dispostos na atual legislação civil vigente.<br />

603<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 218.<br />

604<br />

Código Civil Português. Artigo 1535.º (Direito de preferência) É aplicável ao direito de preferência o<br />

disposto nos artigos 416.º a 418.º e 1410.º. Artigo 416.º (Conhecimento do preferente) 1. Querendo<br />

vender a coisa que é objecto do pacto, o obrigado deve comunicar ao titular do direito o projecto de venda<br />

e as cláusulas do respectivo contrato. 2. Recebida a comunicação, deve o titular exercer o seu direito<br />

dentro do prazo de oito dias, sob pena de caducidade, salvo se estiver vinculado a prazo mais curto ou o<br />

obrigado lhe assinar prazo mais longo. Artigo 417.º (Venda da coisa juntamente com outras) 1. Se o<br />

obrigado quiser vender a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o direito ser<br />

exercido em relação àquela pelo preço que proporcionalmente lhe for atribuído, sendo lícito, porém, ao<br />

obrigado exigir que a preferência abranja todas as restantes, se estas não forem separáveis sem prejuízo<br />

apreciável. 2. O disposto no número anterior é aplicável ao caso de o direito de preferência ter eficácia<br />

real e a coisa ter sido vendida a terceiro juntamente com outra ou outras. Artigo 418.º (Prestação<br />

acessória) 1. Se o obrigado receber de terceiro a promessa de uma prestação acessória que o titular do<br />

direito de preferência não possa satisfazer, será essa prestação compensada em dinheiro; não sendo<br />

avaliável em dinheiro, é excluída a preferência, salvo se for lícito presumir que, mesmo sem a prestação<br />

estipulada, a venda não deixaria de ser efectuada, ou que a prestação foi convencionada para afastar a<br />

preferência. 2. Se a prestação acessória tiver sido convencionada para afastar a preferência, o preferente<br />

não é obrigado a satisfazê-la, mesmo que ela seja avaliável em dinheiro.<br />

605<br />

No direito de superfície há também direito de preempção ou preferência, tanto no caso de alienação<br />

do imóvel como de cessão do direito de superfície (art. 1.373 do Código Civil; art. 22 do Estatuto da<br />

Cidade). Essa preferência atende tendência natural de extinção de direito real sobre coisa alheia,<br />

tornando a propriedade plena. No primeiro caso terá preferência o superficiário e, no segundo, o<br />

proprietário, em igualdade de condições com terceiros. A finalidade desse direito de preempção é<br />

consolidar a propriedade em um único titular, quando possível. O Código não disciplina no capítulo<br />

específico a forma pela qual deve operar a preferência. O proprietário ou o superficiário deve tomar<br />

conhecimento da proposta respectiva para poder exercer sua preempção tanto por tanto. A preempção<br />

ou preferência é regulada no atual Código nos arts. 513 e seguintes. O art. 517 se refere ao prazo de 60<br />

dias para os imóveis, para o exercício da prelação, após a notificação. Quando não for concedido esse<br />

direito de preferência, responderá aquele que deixou de concedê-la por perdas e danos, respondendo<br />

também, solidariamente o adquirente, se tiver agido de má-fé (art. 518). Não existe possibilidade de o<br />

preterido nessa preempção depositar o preço e haver para si a coisa, como autoriza expressamente, por<br />

exemplo, a Lei do Inquilinato. Não há dispositivo na lei que autorize que o direito de preferência na<br />

superfície tenha natureza de direito com efeito real. A situação fica, portanto, no âmbito dos direitos<br />

obrigacionais. VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica. Conceito.<br />

Particularidades. Disponível em . Acesso em:<br />

10/06/2009.<br />

211


Assim como o fez Flavio Tartuce e José Fernando Simão, destacaremos três<br />

tipos 606 .<br />

A) O Direito de preferência previsto no artigo 504 do Código Civil 607 relacionado a<br />

preferência do em favor do condomínio que possibilita a adjudicação da coisa<br />

pelo condômino preterido;<br />

B) O Direito de preferência previsto nos artigos 513 e 518 do Código Civil 608 que<br />

dispõe sobre o direito de preferência avençado em contrato de compra e venda<br />

de bens móveis ou imóveis, prevendo o direito de pleitear perdas e danos<br />

quando não observado este; e<br />

C) O direito de preferência previsto nos artigos 27 a 34 da Lei 8.245/1991 609 que<br />

dispõe ao locatário de imóvel urbano pleitear o direito de adjudicar o bem ou<br />

ainda, requerer perdas e danos no caso de inobservância deste direito.<br />

606 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 335.<br />

607 Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro<br />

consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá,<br />

depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta<br />

dias, sob pena de decadência.<br />

608 Art. 513. A preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a<br />

coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na<br />

compra, tanto por tanto.Parágrafo único. O prazo para exercer o direito de preferência não poderá<br />

exceder a cento e oitenta dias, se a coisa for móvel, ou a dois anos, se imóvel.Art. 514. O vendedor pode<br />

também exercer o seu direito de prelação, intimando o comprador, quando lhe constar que este vai<br />

vender a coisa. Art. 515. Aquele que exerce a preferência está, sob pena de a perder, obrigado a pagar,<br />

em condições iguais, o preço encontrado, ou o ajustado.Art. 516. Inexistindo prazo estipulado, o direito de<br />

preempção caducará, se a coisa for móvel, não se exercendo nos três dias, e, se for imóvel, não se<br />

exercendo nos sessenta dias subseqüentes à data em que o comprador tiver notificado o vendedor. Art.<br />

517. Quando o direito de preempção for estipulado a favor de dois ou mais indivíduos em comum, só<br />

pode ser exercido em relação à coisa no seu todo. Se alguma das pessoas, a quem ele toque, perder ou<br />

não exercer o seu direito, poderão as demais utilizá-lo na forma sobredita.Art. 518. Responderá por<br />

perdas e danos o comprador, se alienar a coisa sem ter dado ao vendedor ciência do preço e das<br />

vantagens que por ela lhe oferecem. Responderá solidariamente o adquirente, se tiver procedido de máfé.Art.<br />

519. Se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social,<br />

não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou serviços públicos, caberá<br />

ao expropriado direito de preferência, pelo preço atual da coisa.Art. 520. O direito de preferência não se<br />

pode ceder nem passa aos herdeiros.<br />

609 Art. 27. No caso de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de direitos ou dação<br />

em pagamento, o locatário tem preferência para adquirir o imóvel locado, em igualdade de condições com<br />

terceiros, devendo o locador dar - lhe conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial<br />

212


Posta as três hipóteses de direito de preferência, devemos verificar com base na<br />

doutrina, qual seria a alternativa ou a solução mais adequada para o presente instituto.<br />

Em decorrência disto, iniciaremos pela primeira corrente que vislumbra a<br />

possibilidade de se cumular, no caso da inobservância do direito de preferência tanto a<br />

obrigação de pagar perdas e danos como pleitear a adjudicação do bem com depósito<br />

em juízo. 610 Importante observar, que esta corrente, se aproxima com a Lei 8.245/1991<br />

o que comunga com as duas opções do lesado. 611<br />

Já a segunda corrente, entende que deve-se aplicar analogicamente, a cláusula<br />

de preferência de compromisso de venda e compra dos artigos 513 a 520 do Código<br />

Civil. Desta monta, o artigo 518 do referido diploma determina que responderá por<br />

perdas e danos o vendedor de um bem móvel ou imóvel, ao alienar a coisa sem ter<br />

dado ciência ao beneficiário do direito de preferência do preço e das vantagens que for<br />

ou outro meio de ciência inequívoca. Parágrafo único. A comunicação deverá conter todas as condições<br />

do negócio e, em especial, o preço, a forma de pagamento, a existência de ônus reais, bem como o local<br />

e horário em que pode ser examinada a documentação pertinente. Art. 28. O direito de preferência do<br />

locatário caducará se não manifestada, de maneira inequívoca, sua aceitação integral à proposta, no<br />

prazo de trinta dias. Art. 29. Ocorrendo aceitação da proposta, pelo locatário, a posterior desistência do<br />

negócio pelo locador acarreta, a este, responsabilidade pelos prejuízos ocasionados, inclusive lucros<br />

cessantes. Art. 30. Estando o imóvel sublocado em sua totalidade, caberá a preferência ao sublocatário<br />

e, em seguida, ao locatário. Se forem vários os sublocatários, a preferência caberá a todos, em comum,<br />

ou a qualquer deles, se um só for o interessado. Parágrafo único. Havendo pluralidade de pretendentes,<br />

caberá a preferência ao locatário mais antigo, e, se da mesma data, ao mais idoso. Art. 31. Em se<br />

tratando de alienação de mais de uma unidade imobiliária, o direito de preferência incidirá sobre a<br />

totalidade dos bens objeto da alienação. Art. 32. O direito de preferência não alcança os casos de perda<br />

da propriedade ou venda por decisão judicial, permuta, doação, integralização de capital, cisão, fusão e<br />

incorporação. Parágrafo único. Nos contratos firmados a partir de 1o de outubro de 2001, o direito de<br />

preferência de que trata este artigo não alcançará também os casos de constituição da propriedade<br />

fiduciária e de perda da propriedade ou venda por quaisquer formas de realização de garantia, inclusive<br />

mediante leilão extrajudicial, devendo essa condição constar expressamente em cláusula contratual<br />

específica, destacando-se das demais por sua apresentação gráfica. (Incluído pela Lei nº 10.931, de<br />

2004) Art. 33. O locatário preterido no seu direito de preferência poderá reclamar do alienante as perdas<br />

e danos ou, depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o imóvel<br />

locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato no cartório de imóveis, desde<br />

que o contrato de locação esteja averbado pelo menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do<br />

imóvel. Parágrafo único. A averbação far-se-á à vista de qualquer das vias do contrato de locação desde<br />

que subscrito também por duas testemunhas. Art. 34. Havendo condomínio no imóvel, a preferência do<br />

condômino terá prioridade sobre a do locatário. Lei 8.245/1991<br />

610<br />

Neste sentido: DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São<br />

Paulo: Saraiva, 2004. v. 4. p. 455.<br />

611<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 337.<br />

213


oferecido a terceiro, bem como será responsável solidariamente o adquirente, se tiver<br />

procedido de má-fé.<br />

Referido posicionamento doutrinário, tem como fundamento, o descumprimento<br />

do direito de preferência, repousa tão somente sobre a matéria de direitos<br />

obrigacionais, impondo somente ao infrator de tal direito somente o dever de pagar<br />

perdas e danos. 612<br />

Já a terceira corrente, 613 ao reverso da teoria anterior, entende que o<br />

descumprimento do direito de preferência, repousa tão somente sobre a matéria de<br />

direitos obrigacionais, entende-se que não justifica tanto a aplicação o artigo 518 do<br />

Código Civil, como o artigo 33 da Lei 8.245/1991.<br />

Assim, entende a referida corrente, que o direito de preferência oriundo da<br />

superfície não se debruça somente no âmbito de natureza obrigacional, sendo que deve<br />

ser observado a natureza de direito real, assim como, o direito de preferência em favor<br />

do condomínio previsto no artigo 504 do Código Civil. 614<br />

Neste sentido pontuam Flavio Tartuce e José Fernando Simão: 615<br />

“Em nossa opinião, não se justifica a aplicação dos arts. 513 a 520do CC. Isso porque<br />

tais dispositivos trazem uma preferência de origem convencional, fixada pelas partes, que<br />

somente gera efeitos obrigacionais. Também não se justifica a aplicação, por analogia do<br />

art. 33 da Lei de Locação – Lei 8.245/1991 –, que é norma aplicada a um caso em que<br />

há um vínculo meramente obrigacional entre as partes, não de natureza real, como<br />

ocorre na superfície”<br />

612<br />

Neste sentido: GAGLIANO, Pablo Stolze.Código Civil comentado. Coord. Álvaro Villaça de Azevedo.<br />

São Paulo: Atlas, 2004. v. XII: Direito das Coisas. p. 42; VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 7. ed. São<br />

Paulo: Atlas, 2007. v. 5: Direitos reais.p. 396; ALVES, Jones Figueiredo; <strong>DE</strong>LGA<strong>DO</strong>, Mario Luiz. Código<br />

Civil anotado. São Paulo: Método, 2005. p.697.<br />

613<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 404.<br />

614<br />

Neste sentido: RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 865.<br />

615<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 337.<br />

214


Neste mesmo sentido, bem como complementando a idéia anterior, Cristiano<br />

Chaves de Farias e Nelson Rosenvald aduz: 616<br />

“De qualquer modo, à semelhança dos modelos jurídicos em enfoque, atrai a adoção extensiva da<br />

regra do art. 504 do Código Civil. Não parece, efetivamente ser possível alegar ofensa ao principio<br />

da legalidade, pois a ausência da regra especifica para o direito de superfície não afasta a<br />

principiologia dos direitos reais, cuja oponibilidade erga omnes permite que seu titular possa buscar<br />

a coisa onde quer que ela se encontre.”<br />

Desta monta, nos parece mais correto – porém incompleto – aplicar a última<br />

alternativa proposta, ou seja, o direito de preferência previsto no artigo 504 do Código<br />

Civil, que dispõe ao locatário de imóvel urbano a possibilidade pleitear o direito de<br />

adjudicar o bem, pois este, aproxima-se mais ao instituto do direito de superfície quanto<br />

matéria de direitos reais, bem como o prazo de decadência para a referia ação ser de<br />

180 dias, a contar do registro do título aquisitivo do imóvel nos termos do referido<br />

dispositivo legal.<br />

Contudo, há uma quarta corrente – que completa o posicionamento anterior –,<br />

encabeçada por Flavio Tartuce e Fernando José Fernando Simão no sentido de<br />

aplicarmos sucessivamente e inicialmente a Lei de Locação – Lei 8.245/1991 quando<br />

tratamos dos procedimentos iniciais da parte, que quer transferir seu direito de<br />

propriedade ou superfície, bem como em um segundo momento o artigo 504 do Código<br />

Civil quando da inobservância do direito de superfície. 617<br />

Resta induvidoso conforme observado, a divergência doutrinária referente ao<br />

caso em tela é notória, porem entendemos como mais assertivo o posicionamento em<br />

aplicarmos a quarta corrente.<br />

Sendo assim, no primeiro momento, o proprietário ou o superficiário tem<br />

preferência para adquirir o imóvel objeto da transferência, em igualdade de<br />

616<br />

Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 404.<br />

617<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 337.<br />

215


equiparidade a terceiros, devendo o transmitente dar-lhe ciência do negócio mediante<br />

notificação judicial, extrajudicial ou outro meio inequívoco.<br />

Referida comunicação deverá ainda, conter todas as condições do negócio e, em<br />

especial, o preço, a forma de pagamento, a existência de ônus reais, bem como o local<br />

e horário em que pode ser examinada a documentação pertinente.<br />

Por fim, direito de preferência do locatário caducará se não manifestada<br />

inequivocadamente no prazo de trinta dias acarretará na sua aceitação à proposta.<br />

Da inobservância do referido direito, o proprietário ou superficiário, a quem não<br />

se deu conhecimento da transferência, poderá, após o deposito do preço, haver para si<br />

o bem à terceiros, no prazo decadencial de cento e oitenta dias.<br />

4.12 Extinção da Superfície<br />

Analisaremos no presente momento as formas de extinção do direito de<br />

superfície, direito este, que ao seu termino final, em regra, consolida todos os direitos<br />

inerentes a propriedade ao fundieiro ou fundeiro decorrente por força de lei ou do<br />

próprio contrato. 618<br />

Todavia, antes de adentrarmos às formas de extinção do direito de superfície,<br />

entendemos como pertinente, pontuar uma coincidência formal entre todas as formas<br />

de extinção.<br />

O primeiro ponto interessante relaciona-se com as formas de extinção do direito<br />

de superfície previstas tanto no Código Civil, como no Estado da Cidade, não elencam<br />

618<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 159.<br />

216


um rol taxativo das formas de extinção assim como o fez o Código Civil Português 619 .<br />

Tal providência, foi assertiva segundo nosso entender, pois não há engessamento do<br />

instituto quando da sua extinção.<br />

Conforme ensinamentos de Silvio Rodrigues: 620<br />

“Extinta a concessão, originariamente, pelo transcurso do prazo, passará ao contratante<br />

a propriedade plena do imóvel independentemente de indenização. O art. 1.375, que<br />

consagra a regra, afirma, ainda, que isso ocorre se as partes não houverem estipulado o<br />

contrario, o que indica que a regra não é de ordem pública, ficando, portanto, ao inteiro<br />

artibro das partes ajustar o que lhes aprouver a respeito.”<br />

Não obstante ser assertiva a referida disposição legal, esta traz consigo, um<br />

pequeno infortúnio. Sendo assim, quando verificada a extinção do direito de superfície a<br />

doutrina diverge nas distintas formas de classificações e denominações para os<br />

mesmos eventos extintivos. 621 Em decorrência disto elencaremos as formas de extinção<br />

mais relevantes para o direito de superfície tendo em vista, seus respectivos efeitos em<br />

conseqüência de sua extinção. 622<br />

Em continuidade, ao conceituar o término da superfície não seria tecnicamente<br />

correto utilizarmos as terminologias de reversão ou resgate das benfeitorias acrescidas<br />

ao imóvel do proprietário, salvo no caso de superfície constituída por cisão. Tal<br />

619 1410.º CAPÍTULO IV Extinção do direito de superfície Artigo 1536.º (Casos de extinção) 1. O direito de<br />

superfície extingue-se: a) Se o superficiário não concluir a obra ou não fizer a plantação dentro do prazo<br />

fixado ou, na falta de fixação, dentro do prazo de dez anos; b) Se, destruída a obra ou as árvores, o<br />

superficiário não reconstruir a obra ou não renovar a plantação, dentro dos mesmos prazos a contar da<br />

destruição; c) Pelo decurso do prazo, sendo constituído por certo tempo; d) Pela reunião na mesma<br />

pessoa do direito de superfície e do direito de propriedade; e) Pelo desaparecimento ou inutilização do<br />

solo; f) Pela expropriação por utilidade pública. 2. No título constitutivo pode também estipular-se a<br />

extinção do direito de superfície em conseqüência da destruição da obra ou das árvores, ou da<br />

verificação de qualquer condição resolutiva. 3. À extinção do direito de superfície, nos casos previstos<br />

nas alíneas a) e b) do n.º 1, são aplicáveis as regras da prescrição.<br />

620 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, v. 3: Direito das Coisas. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 3. p.<br />

265.<br />

621 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 85.<br />

622 VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica. Conceito. Particularidades.<br />

Disponível em . Acesso em: 10/06/2009.<br />

217


justificativa tem como fundamento que a propriedade das construções nunca<br />

pertenceram ao proprietário do solo ingressando a propriedade deste a primeira vez. 623<br />

Nestes termos, dispõe o § 2.º, 24, do Estatuto da Cidade: “A extinção do direito<br />

de superfície será averbada no cartório de registro de imóveis.” Tal coincidência<br />

determina a necessidade do registro da averbação da extinção da superfície. 624<br />

Assim, podemos entender, que tanto da constituição quanto da extinção do<br />

direito de superfície, Há a necessidade da formalidade de escriturarão pública, bem<br />

como posteriormente ser registrada em Cartório de Registro de Imóvel.<br />

Não obstante parte da doutrina entender que deve ser observado, o artigo 108 625<br />

do Código Civil que dispõe a necessidade de escritura pública para os negócios<br />

jurídicos que envolvem direitos reais.<br />

Por fim, outro apontamento importante, relaciona-se com as garantias reais<br />

constituídas eventualmente pelo superficiário. Importante observar, que assim como<br />

ocorre na legislação estrangeira, ou seja, no direito português, no italiano, no espanhol,<br />

que dispõe respectivamente nos artigos 1539, I do Código Civil Português; 954,<br />

primeira parte do, Código Civil italiano e art 289, 4 da Ley Del régimen Del suelo,<br />

quando da extinção do direito real de superfície, todos os demais gravames que neles<br />

conterem serão, também extintos. 626<br />

623<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 406.<br />

624<br />

Art. 167 - No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos. (Renumerado do art. 168 com nova<br />

redação pela Lei nº 6.216, de 1975). II - a averbação: (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975). 20) da<br />

extinção do direito de superfície do imóvel urbano. (Incluído pela Lei nº 10.257, de 2001)<br />

625<br />

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios<br />

jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis<br />

de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.<br />

626<br />

Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 112.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e<br />

do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 160.<br />

218


4.12.1 Extinção pelo inadimplemento das obrigações assumidas pelas partes<br />

Assim como já afirmado anteriormente, o direito de superfície tem como base<br />

elementar um negócio jurídico, onde haverá obrigações signalagmáticas 627 entre as<br />

partes contratantes e assim, respeitando, todos as suas diretrizes gerais – do direito<br />

obrigacional e dos contratos – como as específicas do próprio instituto. 628<br />

Neste sentido esclarecem Flavio Tartuce e José Fernando Simão: 629<br />

“Terá o superficiário, obrigações assumidas para com o fundeiro. O descumprimento<br />

dessas obrigações gera a possibilidade de resolução culposa do direito de superfície (art.<br />

392, 402 e 404 do Código Civil). Em havendo culpa do superficiário, as perdas e danos<br />

são cabíveis.”<br />

Temos como assertivas as ponderações alocadas pelos os respeitáveis<br />

professores no sentido de se verificar a culpa do contratante nos casos de<br />

inadimplemento contratual, salvo com suas exceções previstas em lei, cabendo ainda,<br />

perdas e dados ao lesado desta relação nos termos dos artigos supracitados. 630<br />

Ainda nestes sentido, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald,<br />

acrescentam: 631<br />

627 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 143.<br />

628 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p.305.<br />

629 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 338.<br />

630 Art. 392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a quem o contrato<br />

aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das<br />

partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei. Art. 402. Salvo as exceções expressamente<br />

previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o<br />

que razoavelmente deixou de lucrar. Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em<br />

dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos,<br />

abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.<br />

631 CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 407.<br />

219


“preconizamos ainda a possibilidade alternativa do proprietário buscar a tutela específica<br />

das obrigações de fazer e não fazer (art. 461 do CPC), como forma de constranger o<br />

superficiário a não desviar das finalidades contratuais. Trata-se de uma opção mais<br />

interessante do que o exercício do direito potestativo resolutório, como sugere o art. 475<br />

do Código Civil.”<br />

Porém acreditamos, que devemos vislumbrar ainda, outros dispositivos já<br />

citados, como o da execução dos contratos, onde estes, devem ser pautados pelos<br />

princípios da probidade e da boa-fé previstos no artigo 422 632 do Código Civil, como<br />

ainda, a aplicação da função social do contrato prevista no artigo 421 633 do mesmo<br />

diploma legal.<br />

Não há disposição no direito brasileiro, todavia podemos verificar a função social<br />

do contrato e da propriedade.<br />

`` Alguns direitos estabelecem, ainda, que o direito de superfície pode ser extinto quando<br />

o superficiário não concluir a obra dentro do prazo fixado no contrato, ou, na falta de<br />

fixação, dentro do prazo previsto em lei (Código Civil de Macau estabelece o prazo de<br />

sete anos – art. 1.427, 1, a). O Código Civil não contempla disposição semelhante,<br />

embora possibilite a extinção da superfície pelo descumprimento das obrigações<br />

contratuais assumidas. Seria recomendável para garantir a função social da propriedade<br />

e a utilização econômica do imóvel estabelecer dispositivo igual ao Código de Macau,<br />

porém nada impede, no entanto, que as partes estabeleçam, no contrato, prazo para<br />

conclusão da obra ou plantação, sob pena de extinção do direito real 634 ``.<br />

Superado este primeiro momento, ao analisar o Código Civil de 2002,<br />

diferentemente do que se verifica no Estatuto da Cidade, não está previsto a extinção<br />

do contrato de concessão pelo descumprimento das obrigações assumidas pelo<br />

superficiário e, mais pontualmente pelo não pagamento do preço do cânon<br />

632<br />

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.<br />

633<br />

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua<br />

execução, os princípios de probidade e boa-fé.<br />

634<br />

Loureiro, Luiz Guilherme. Direitos Reais, p.284.<br />

220


superficiário. 635 Porém, nos termos do disposto específicos que tratam desta matéria,<br />

como o dos artigos 23, inciso II e 24, § 1.º, do Estatuto da Cidade dispõem:<br />

“Art. 23. Extingue-se o direito de superfície:<br />

I – pelo advento do termo;<br />

II – pelo descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo superficiário.<br />

.....<br />

Art. 24. Extinto o direito de superfície, o proprietário recuperará o pleno domínio do<br />

terreno, bem como das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel,<br />

independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário no<br />

respectivo contrato.<br />

§ 1o Antes do termo final do contrato, extinguir-se-á o direito de superfície se o<br />

superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para a qual for concedida.”<br />

(nossos grifos)<br />

Ao analisar os referidos dispositivos, podemos afirmar com clareza que o tanto o<br />

descumprimento das obrigações contratuais assumidas 636 637 , bem como o desvio de<br />

finalidade da superfície são causas de descumprimentos dos deveres assumidos<br />

cabendo sua extinção. 638<br />

Neste sentido, exemplificam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 639 :<br />

635<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 161.<br />

636<br />

Importante observar, que há posicionamento um único posicionamento divergente, quanto ao<br />

descumprimento das obrigações contratuais assumidas que dispõe esta: “Na falta de pagamento, é<br />

inviável a resolução. Pode-se, no entanto, executar as prestações pendentes. Ingressa-se com o<br />

competente processo de execução, efetuando-se a constrição, por meio de penhora, para garantir a<br />

satisfação do credito, na construções e plantações erigidas no terreno. São as mesmas após decorrido o<br />

prazo de embargos, ou julgados estes improcedentes, e depois da devida avaliação, levadas a hasta<br />

pública, para apurar-se o montante necessário ao pagamento das obrigações devidas.” RIZZAR<strong>DO</strong>,<br />

Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 864.<br />

637<br />

Referente a este descumprimento o acrescenta ainda Paulo Roberto Benasse que o não uso da<br />

concessão superficiária também é uma das formas de extinção: “Neste caso será aplicado o principio<br />

geral do não cumprimeto das condições pactuadas, havendo resolução do contrato nos moldes previsto<br />

no novo Código Civil: art. 1.374”. BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil<br />

brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 118.<br />

638<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 338.;<br />

639<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 407.<br />

221


“O inadimplemento e a conseqüente resolução contratual também poderão traduzir-se<br />

pela falta de pagamento do solarium ou pelo descumprimento de outras cláusulas<br />

contratuais, tais como recusa ao pagamento de tributos e danos causados ao imóvel.”<br />

Ainda neste sentido, quando verificada a ocorrência de inadimplemento do cânon<br />

superficiário, 640 devemos avaliar se no contrato é dado ao superficiário o direito de<br />

purgar a mora e esta discussão se verifica até o momento em que esta poderá ser<br />

purgada. 641<br />

Entrementes, ao analisar o Código Civil, nos deparamos somente com o artigo<br />

1.374 que dispõe: “Antes do termo final, resolver-se-á a concessão se o superficiário<br />

der ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida.” Observando assim,<br />

amais uma possível antinomia entre os dois dispositivos legais.<br />

Neste diapasão Marcus Vinicius dos Santos Andrade apregoa 642 :<br />

“A finalidade a ser imprimida na propriedade superficiária, obrigatoriamente, não precisa<br />

constar da convenção ou do contrato de alienação. Porem , caso prevista e<br />

desobedecida pelo superficiário, tem força extintiva. Estaria justificada, por vincular-se o<br />

negócio jurídico à realização de determinada construção ou plantação ou, ainda, à<br />

manutenção do que já foi feito e está constituído e plantado, observado a alteração.”<br />

Tal afirmação, teria como fundamento, que tanto o Código Civil como o Estatuto<br />

da Cidade, prevêem o desvio de finalidade como causas de descomprimidos dos<br />

deveres assumidos, porem o Código Civil, não teria concebido o descumprimento das<br />

obrigações contratuais assumidas pelo superficiário.<br />

Neste sentido pontua Paulo Roberto Benasse 643 :<br />

640<br />

Diferentemente do direito pátrio, o inadimplemento do cânon não é caso de extinção e sim de<br />

aplicação de penalidade, nestes termos dispõe o Artigo 1531.º (Pagamento das prestações anuais) 1. Ao<br />

pagamento das prestações anuais é aplicável o disposto nos artigos 1505.º e 1506.º, com as necessárias<br />

adaptações. 2. Havendo mora no cumprimento, o proprietário do solo tem o direito de exigir o triplo das<br />

prestações em dívida.<br />

641<br />

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.p. 396.<br />

642<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 161.<br />

222


“Se o inadimplemento contratual se referir ao desvio de finalidade a que se destina a<br />

concessão, como prevê o art. 1.374 do novo Código Civil, este é motivo de rescisão<br />

contratual. Então, a clausula que especificar o destino, deverá de forma mais ampla<br />

possível tipificá-lo, para que não se alegue o desvio de finalidade nos casos em que uma<br />

dessas finalidades seja principal, em entanto que a outra subsidiária...”<br />

Entendemos que esta afirmação é descabida, pois não obstante o Código Civil<br />

não prever tal situação em sua parte especial – direito de superfície – referida<br />

ocorrência encontra-se devidamente resguardada em outros institutos – de direitos das<br />

obrigações e/ou contratos – aqui já citados.<br />

Não obstante o resguardo já previsto, o legislador no Projeto Lei 276/2007<br />

contempla a adequação destes dois institutos, nos seguintes termos 644 :<br />

Projeto Lei 276/2007 “Art. 1.374. Antes do termo final, resolver-se-á a concessão se o<br />

superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida bem como<br />

se descumprir qualquer outra obrigação assumida no contrato”.(NR) Justificativa n.º 84.<br />

Art. 1374: .... alteração proposta ao artigo 1374 , para compatibilização desse dispositivo<br />

com o art. 23, inciso II do atual Estatuto da Cidade, que ao dispor sobre a extinção do<br />

direito de superfície, apresenta-se mais completo, explicitando outras hipóteses de<br />

descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo superficiário, tais como o<br />

não pagamento da concessão; não uso do imóvel; danos ao imóvel; não pagamento dos<br />

tributos etc. Por esses motivos, afigura-se necessário modificar-se a redação dos dois<br />

dispositivos, complementando-a, nos termos da proposta formulada. (nossos grifos)<br />

Por fim e ainda neste sentido, dispõe Luiz Guilherme Loureiro 645 :<br />

643<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 108.<br />

644<br />

BRASIL. Projeto Lei nº 276/2007. Altera o Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro<br />

de 2002. Autoria Léo Alcântra PSDB/CE. Projetos de Lei e Outras Proposições: Consulta Tramitação de<br />

Proposição. Disponível em: .<br />

Acesso em: 26 março 2009.<br />

645<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 283.<br />

223


“For proposital e implicar em destinação diversa daquela para qual foi concedido o direito<br />

de superfície, será este extinto...Uma vez extinta a superfície, seja pelo decurso do prazo<br />

contratual, seja pela destinação diversa, o proprietário volta a ter o domínio pleno sobre o<br />

bem imóvel, inclusive sobre os acessórios realizados pelo superficiário (construção ou<br />

plantação), independentemente de indenização, salvo convenção contrária das partes.<br />

Desta forma, quando da ocorrência de burla a legislação vigente quanto ao<br />

pactuado e da verificação do dano causado à outra parte, ou ainda, quando da<br />

inobservância de princípios basilares tanto do direito obrigacional como real deve-se<br />

observar todas as causas e efeitos para a aplicação das respectivas imposições<br />

sancionatórias se for o caso.<br />

4.12.2 Extinção pelo termo final<br />

Nos termos do inciso I, artigo 23 do Estatuto da Cidade 646 , extingue-se o direito<br />

de superfície pelo advento do termo final estipulados pelas partes. Findo estes prazo, a<br />

extinção deste direito é automática e a posse que inicialmente era justa passa a ser<br />

injusta. 647<br />

Ao fazer referência ao Código Civil, Paulo Roberto Benasse 648 pontua:<br />

“Aqui ocorrerá a resolução, pelo termo final do contrato, prevista nos arts. 1.369 e 1.374,<br />

bem como pelo complemento da condição, ou seja, atendida sua finalidade e cumpridas<br />

as obrigações contratuais.”<br />

646<br />

Art. 23. Extingue-se o direito de superfície: I – pelo advento do termo;<br />

647<br />

Neste sentido; VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas,<br />

2003.p. 397.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função<br />

social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 19.; LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O<br />

direito de superfície como instrumento de planificação urbana. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 218.<br />

648<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 108.<br />

224


Nesta esteira pontuam Flavio Tartuce e José Fernando Simão: 649 “Ao fim do<br />

prazo estipulado pelas partes, a extinção da superfície é automática e a posse do<br />

superficiário que era justa passa a ser precária (injusta). O proprietário ou fundieiro<br />

poderá, em casos tais, valer-se da ação de reintegração de posse após o termo final.”<br />

Ainda neste mesmo sentido, complementa Marcus Vinicius dos Santos<br />

Andrade 650 :<br />

Vencido o termo, mas permanecendo inalterada a situação de fato, por inércia ou<br />

desinteresse das partes, ocorre a prorrogação, que passa a ser por prazo indeterminado.<br />

Em suma, não se operado, pela desconsideração do termo, resolução da propriedade, o<br />

direito real permanece, inclusive porque válido o registro imobiliário.<br />

Sendo assim, podemos concluir que com o fim estipulado pela a extinção da<br />

superfície é automática e a posse do superficiário que era justa passa a ser precária,<br />

bem como permanecendo inalterada a situação de fato, por inércia ou desinteresse das<br />

partes, ocorre a prorrogação do direito de superfície.<br />

4.12.3 Extinção pela consolidação<br />

Nesta modalidade de extinção, também denominada de confusão 651 , o fundieiro<br />

adquire a propriedade da superfície e o fundieiro adquire a propriedade do solo. Na<br />

presente modalidade de extinção, não há grandes ponderações a serem tecidas, porem<br />

importante observar, que neste caso ser observado o direito de preferência, prelação ou<br />

preempção já apresentada anteriormente. 652<br />

649 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 339.<br />

650 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 160.<br />

651 BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 118.<br />

652 CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 19.<br />

225


4.12.4 Extinção pelo distrato<br />

Pelo o pacto firmado entre as partes, poderá ocorrer à extinção do direito de superfície<br />

e assim, para a presente a resilição 653 bilateral será necessário alguns requisitos de<br />

formalidade. 654<br />

Neste sentido, Flavio Tartuce e José Fernando Simão apregoam 655 :<br />

“Constitui da resilição bilateral, direito potestativo à extinção que é reconhecido às partes<br />

da superfície. Aplica-se o regime contratual do art. 472 do CC, pelo qual o distrato faz-se<br />

pela mesma forma do contrato. Desse modo, deve-se frisar que como a lei exige que o<br />

direito de superfície cujo o valor ultrapasse trinta salários mínimos seja constituído por<br />

meio de escritura pública (artigo 108 do CC), essa extinção também deve ocorrer por<br />

escritura pública”<br />

Segundo nosso olhar, perfeita – de certa forma – a anotação do presente caso,<br />

porém não seriam somente estes os requisítos de formalidade, resta o registro da<br />

referida escritura ou instrumento particular junto ao Cartório de Registro de Imóveis.<br />

Por fim, porém não menos importante, é possível as partes no transcurso da<br />

concessão modificar as diretrizes desta. Neste sentido, Carlos Alberto Dabus Maluf, ao<br />

atualizar a obra de Washington de Barros Monteiro pontua: 656<br />

“Na hipótese de o superficiário desejar modificar no curso do contrato, a destinação da<br />

utilização do terreno, poderá fazê-lo, desde que assim ajuste em comum acordo com o<br />

proprietário concedente, por termo aditivo, em escritura pública, a ser também registrada<br />

653 Neste sentido Paulo Roberto Benasse dispõe que: “ Ocorrerá o distrato por mera liberalidade das<br />

partes, declarando extinta a superfície, que deverá ocorrer por escritura publica, ou seja, da mesma forma<br />

que fora contratada”. BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro.<br />

Campinas: Bookseller, 2002. p. 119.<br />

654 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 164.<br />

655 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 339.<br />

656 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253.<br />

226


no Cartório de Registro de Imóveis, alterando a clausula especifica precedente. O que a<br />

lei não permite é a alteração unilateral”<br />

Por fim, verificamos que não somente nos casos de distrato é possível rever<br />

cláusulas contratuais, mas também para realizar devidos acertos não verificados<br />

anteriormente quando termo inicial da concessão. Tal previsão atende o princípio<br />

fundamental do direito civil denominado de mantenimento dos contratos.<br />

4.12.5 Extinção por denúncia de uma das partes<br />

Superada as formas anteriores, adentraremos agora em uma das formas mais<br />

polemicas de extinção do direito de superfície. Assim, nos termos do previsto do<br />

Estatuto da Cidade, a superfície pode ser instituída pelo prazo indeterminado 657 , e em<br />

decorrência lógica destes direito, qualquer um destes envolvidos poderá denunciá-lo a<br />

qualquer tempo. 658<br />

Neste sentido, apregoam Flavio Tartuce e José Fernando Simão: 659660<br />

“Melhor tecnicamente, trata-se de hipótese de resilição unilateral decorrente de qualquer<br />

negócio jurídico por prazo indeterminado, aplicando-se o art. 473, caput do CC, que é<br />

próprio dos contratos. A denuncia se dará necessariamente por notificação ou<br />

interpelação, judicial ou extrajudicial, pois o caso é de mora ex persona (art. 397,<br />

parágrafo único, do CC).”<br />

657<br />

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis.<br />

658<br />

Neste sentido: CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de<br />

Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 402.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código<br />

Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 164.<br />

659<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 338.<br />

660<br />

Neste sentido: VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 3ª ed. São Paulo: Atlas,<br />

2003.p. 394.<br />

227


Entendemos que esta questão, deve ser analisada de forma minuciosa, bem<br />

como no caso prático, pois quando esta denuncia unilateral, poderemos ter abusos e<br />

irregularidades por parte do denunciante.<br />

A presente justificativa se embasa nos ensinamentos de Flavio Tartuce e José<br />

Fernando Simão que verifica a presente, da seguinte forma: 661<br />

“a questão da denuncia deve ser analisada de acordo com os princípios da função social<br />

da propriedade e da posse. imagine-se que haja a concessão para a construção de um<br />

imóvel residencial e não se fixe o prazo de duração da superfície. Se logo após o termino<br />

da construção o proprietário denunciar o contrato, certamente estará a função social da<br />

propriedade e da posse, podendo o juiz suspender os efeitos da resilição unilateral.”<br />

Quando os autores aludem que denúncia deve ser analisada de acordo com os<br />

princípios da função social da propriedade e da posse, entendemos como assertiva em<br />

parte tal ensinamento, pois não há elisão somente destes princípios, havendo ainda, a<br />

inobservância do principio da função social dos contratos previsto no artigo 421 662 , bem<br />

como da boa-fé objetiva do artigo 422 663 do Código Civil.<br />

Assim, se possível e aceitável a eventual denúncia unilateral, devemos verificar<br />

se as partes estão observando os princípios de probidade e boa-fé na execução deste<br />

contrato.<br />

E no caso de inobservância de tais preceitos, poderíamos lançar mão do<br />

parágrafo único do artigo 475 do Código Civil 664 que determina que a denúncia<br />

unilateral somente poderá produzir efeitos quando da sua compatibilidade dos<br />

661<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 339.<br />

662<br />

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.<br />

663<br />

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua<br />

execução, os princípios de probidade e boa-fé.<br />

664<br />

Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera<br />

mediante denúncia notificada à outra parte.Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma<br />

das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só<br />

produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos.<br />

228


investimentos realizados pelo denunciado, observando assim o princípio da<br />

conservação dos contratos. 665<br />

4.12.6 Extinção pela desapropriação<br />

Enfrentaremos no presente momento, mais um ponto tortuoso quanto sua<br />

aplicabilidade, porém de aparente resolução. Desta forma, prefacialmente cabe<br />

ressaltar que o artigo 1.376 do Código Civil, dispõe que:<br />

“Art. 1.376. No caso de extinção do direito de superfície em conseqüência de<br />

desapropriação, a indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor<br />

correspondente ao direito real de cada um.”<br />

Neste raciocínio, podemos afirmar que o valor da indenização deve ser<br />

correspondente tanto para o proprietário e ao superficiário de acordo com o coeficiente<br />

inerente ao seu direito real.<br />

Neste mesmo sentido, pondera Silvio de Salvo Venosa 666 :<br />

“Ocorrendo desapropriação do imóvel concedido, a indenização cabe ao proprietário e ao<br />

superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um (art. 1.376). Haverá,<br />

portanto, uma avaliação bipartida. Se as obras e benfeitorias pertencerem integralmente<br />

ao superficiário, a ele caberá, portanto, o seu respectivo valor.”<br />

Segundo nosso entendimento, adequada e pertinente a presente disposição,<br />

pois quando da desapropriação tanto o proprietário como o superficiário serão<br />

devidamente indenizados. Porem o presente problema, não se resolve tão<br />

simplesmente tendo em vista dois pontos elementares. O primeiro deles referente a<br />

665 Neste sentido: TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed.<br />

São Paulo: Método, 2008. p. 339; CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais.<br />

4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 406.<br />

666 VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica. Conceito. Particularidades.<br />

Disponível em . Acesso em: 10/06/2009.<br />

229


extensão da desapropriação e o segundo ponto o lapso temporal do direito de<br />

superfície. 667<br />

Referente a extensão da desapropriação, podemos verificar que esta não<br />

extingue obrigatoriamente a superfície, tendo em vista que o ato expropriatório – com<br />

fundamentação na própria função social –, poderá atingir somente as edificações ou<br />

plantações, permanecendo o domínio com o proprietário ou vice-versa. Na ocorrência<br />

de tal situação, a indenização somente atingirá a modo exclusivo ao titular o objeto<br />

expropriado. 668<br />

Em continuidade, segundo ponto mais tortuoso relaciona-se com o lapso<br />

temporal do direito de superfície conforme apontado anteriormente.<br />

Neste mesmo sentido, pondera Luiz Guilherme Loureiro 669 :<br />

“Em caso de desapropriação, extingue-se também o direito de superfície e a indenização<br />

deverá ser repartida entre o superficiário e o proprietário de acordo com o valor<br />

correspondente ao direito de cada um. O Código Civil não esclarece como será calculado<br />

o valor de cada titular de direito real. Cremos que não se afigura justo o mero cálculo do<br />

valor da construção ou da plantação e o valor do restante do prédio, mas deve ser<br />

ponderado também o tempo que falta para a extinção da superfície.<br />

A presente ponderação, tem como fundamento o do termo final da concessão,<br />

onde o proprietário encontra-se muito próximo de receber a propriedade das<br />

benfeitorias agregadas ao seu imóvel.<br />

667<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 408.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da<br />

função social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 19.<br />

668<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 162.<br />

669<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 283.<br />

230


Neste caso, se interpretamos literalmente o presente dispositivo, no direito<br />

efetivamente tem a indenização, todavia esta, não seria equânime quanto ao seu direito<br />

de propriedade. 670<br />

Neste sentido, apregoam Flavio Tartuce e José Fernando Simão: 671<br />

“Se o prazo do direito de superfície estiver perto de seu fim, deverá a indenização ser<br />

repensada em caso de desapropriação. Isso porque o proprietário estará muito próximo<br />

de receber a propriedade dessas benfeitorias com o fim do direito de superfície. A<br />

conclusão é pelo retorno à regra pela qual o acessório segue o principal (acessorium<br />

sequitur principale) ... Ora, pela própria essência do direito de superfície, lucra o<br />

proprietário com a aquisição de construções e plantações ao fim do prazo contratado”<br />

Não obstante a doutrina mais respeitada já ter se posicionado quanto a presente<br />

casuística, Enunciado n.º 322, aprovado na VI Jornada de Direito Civil CJF/STJ, que<br />

dispõe clara e lidimamente:<br />

322 – Art. 1.376. O momento da desapropriação e as condições da concessão<br />

superficiária serão considerados para fins da divisão do montante indenizatório (art.<br />

1.376), constituindo-se litisconsórcio passivo necessário simples entre proprietário e<br />

superficiário.<br />

Outra forma de assegurar a estabilidade equânime no valor da desapropriação<br />

apontada pela doutrina, 672 é a da previsão contratual, ou seja, as partes devem acordar<br />

que quando mais próximo o término da concessão, menor será o valor rateado em favor<br />

do superficiário.<br />

Assim, conforme já afirmado, tanto pela doutrina, como consolidado o<br />

entendimento pele entendimento do CJF/STJ, podemos afirmar que o valor da<br />

670<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 367.<br />

671<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 340.<br />

672<br />

Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 408.<br />

231


indenização deve ser correspondente tanto para o proprietário e ao superficiário de<br />

acordo com o coeficiente inerente ao seu direito real.<br />

Quando do termo final da concessão, onde o proprietário encontra-se muito<br />

próximo de receber a propriedade das benfeitorias agregadas ao seu imóvel devemos<br />

interpretar a legislação em vigor de forma mais equânime quanto ao direito do<br />

proprietário.<br />

4.13 Da função social do direito de superfície<br />

Conforme já verificamos, direito de superfície é um direito real imobiliário de<br />

natureza complexa, diferente de qualquer outro direito real, tendo em vista suas<br />

peculiares particularidade, e em especial, sua nítida transmissibilidade.<br />

Não podemos negar ainda, que este instituto, soluciona inúmeros situações não<br />

emplacadas pelo Código Civil de 1916, onde ficavam as partes limitadas a outros<br />

institutos como o arrendamento, à locação ou até utilizar praticas informais, com<br />

resultados via de regra insolúveis, que acabam, quando muito, em perdas e danos. 673<br />

Para Caio Mario da Silva Pereira 674 : “O “direito de superfície” é um destes<br />

institutos que os sistemas jurídicos modernos retiram das cinzas do passado, quando<br />

não encontram fórmulas novas para disciplinar relações jurídicas impostas pelas<br />

necessidades econômicas ou sociais.”<br />

Não obstante, como bem anota Maria Helena Diniz 675 :<br />

673<br />

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 252.<br />

674<br />

PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.<br />

p. 243.<br />

675<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 461.<br />

232


Na era romana decorria o direito da superfície da necessidade pratica de permitir<br />

construção em terra alheia, principalmente pública. Roberto Cesar Pereira Lira salienta<br />

que não se está ressuscitando uma instituição uma supérflua, porque o direito à<br />

superfície ajusta-se às exigências sociais, principalmente na política de racionalização do<br />

uso do solo urbano e de mantença do homem na zona rural.<br />

Por fim, porém não menos importante Ricardo Pereira Lira dispõe que 676 :<br />

“de que a sustentação da volta do direito de superfície ao direito positivo brasileiro não<br />

significa respingar, no entulho das instituições defuntas, concepção perempta e<br />

fossilizada. Não é ripristinar o antigo pelo gosto da vetustez gerado sementeira de litígios.<br />

O que acontece é que o direito de superfície plasticamente se foi moldando às exigências<br />

sociais, ganhando, em nosso tempo, a fisionomia de um direito real autônomo, rico na<br />

sua estrutura, valioso nas suas aplicações”<br />

Sendo assim é possível solucionar em parte, o problema da falta de habitação e<br />

o do não-aproveitamento devido do solo urbano e rural, atendendo o princípio da função<br />

social da propriedade 677 .<br />

Quanto a este problema da exploração da propriedade a Rima Goryb, pontua<br />

que 678 :<br />

“A propriedade é estudada e debatida como direito individual e como direito socialcoletivo<br />

ou do estado; focam-se os problemas decorrentes da acentuada urbanização<br />

brasileira, especialmente os habitacionais e, ainda, apesar de toda extensão de nosso<br />

território, os problemas fundiários que se agravam, quer pela injustiça da distribuição<br />

desigual de terras, que pelo acesso quase impossível daqueles que não pertencem a<br />

engrenagem do poder econômico. Todos problemas de nossos dias, constituindo-se em<br />

desafio à imaginação criadora dos cientistas”<br />

Neste mesmo entendimento, Maria Helena Diniz apregoa 679 :<br />

676<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 89.<br />

677<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 457.<br />

678<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 18.<br />

679<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 457.<br />

233


“A superfície foi contemplada em lugar da enfiteuse, substituindo-a vantajosamente, por<br />

sua grande utilidade economia e social, por não ter o inconveniente da perpetuidade e<br />

por diminuir a crise habitacional, por incentivar a agricultura, por possibilitar uma reforma<br />

agrária e por fazer com que a terra, no meio urbano, inclusive, possa ser fonte de<br />

trabalho e produção.”<br />

Sendo assim, o superficiário, ou seja, o titular da concessão superficiária, é titular<br />

de um direito real de fruição ou gozo da coisa alheia, que nele, pode construir ou plantar<br />

e manter a construção ou plantação, com o respectivo valor econômico – tendo em<br />

vista que este, pode ser comercializado ou ainda gravado de ônus real – em caráter<br />

acessório e temporal.<br />

Tal hipótese, conforme se verifica, ao ser esculpido no ordenamento jurídico<br />

pátrio, reflete de forma inegável no atendimento da função social da propriedade 680 ,<br />

previsto tanto na Constituição Federal promulgada em 1988 como no Código Civil 681 .<br />

Neste pensar Marcus Vinicius dos Santos Andrade 682 aponta:<br />

“Compete-lhe o interesse em adequar a propriedade ao conjunto social, usando-a,<br />

organizando-a e ordenando-a de forma útil a comunidade. O sentimento do social, na<br />

propriedade, mais se identifica quanto aos meios de produção empresarial, na cidade e<br />

no campo, como diretriz básica da atividade econômica. A função social qualifica e<br />

justifica a propriedade, publica e privada.”<br />

680<br />

O atual momento Constitucional altera o conceito de propriedade, neste entender Marcus Vinicius dos<br />

Santos Andrade discorre que:“A expressa opção da Constituição em atribuir-lhe a função social, alterou o<br />

conceito básico do instituto. Além do uso, gozo, disposição, fruição e defesa erga omnes, a propriedade<br />

deve ostentar e ser praticada para um fim social.(...) Não basta o “ter”, mas cumpre que se acresça o<br />

“fazer”, preocupado com as carências gerais” ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do<br />

Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 200.<br />

681<br />

Sobre a função social da propriedade no Código Civil de 2002 Marcus Vinicius dos Santos Andrade<br />

dispõe:“O direito privado não se afasta da linha constitucional. O art. 1.228, do Código Civil de 2002,<br />

após, no “caput”, firmar os poderes e atributos da propriedade, nos parágrafos seguintes os relativiza<br />

vinculando o exercício às finalidades econômicas e sociais” ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos.<br />

Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 198.<br />

682<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 198.<br />

234


Corroborando esta idéia apregoam Maria Cecília Ladeira de Almeida e<br />

Washington Carlos de Almeida 683 :<br />

“A reformulação do individualismo contido no bojo da doutrina liberal e consagrada no<br />

Code Napoleon, em 1804 e, por sua vez no Código Civil Brasileiro de 1916, teve o<br />

condão de modificar os poderes do domínio, cuja expressão mais ampla é, sem dúvida,<br />

o reconhecimento da função social da propriedade, reconhecendo agora as idéias de<br />

Leon Duguit, da Rerum Novarum e da própria doutrina tomista, que já no século XIII,<br />

pregava a dupla natureza da propriedade, como direito natural primário, onde cada<br />

indivíduo tem direito ao acesso a propriedade e como direito natural secundário ( ou<br />

relativo) onde todos os indivíduos tem o mesmo direito de acesso.”<br />

Mais especificadamente Carlos Roberto Gonçalves 684 esclarece que: “Verifica-se,<br />

destarte, que a reintegração em nosso ordenamento dessa modalidade de direito real,<br />

com nova roupagem, atende a razões de ordem sociológica, cujas origens encontra-se<br />

na Constituição Federal, que define a existência dos fins sociais da propriedade.”<br />

Neste mesmo sentido, ponderam Cristiano Chaves de Farias e Nelson<br />

Rosenvald 685 :<br />

“Ao contrario dos que possam pensar ser a superfície uma forma de aniquilação do<br />

direito de propriedade, em razão da inserção de uma titularidade dentro de outra,<br />

configura-se ela como importante mecanismo destinado não somente a ordenar a<br />

propriedade urbana e incrementar a sua função econômica pela diversificação nas<br />

formas de utilização, como também a auxiliar ao atendimento às funções sociais das<br />

cidades” principalmente pela possibilidade de redução de déficit habitacional, trazendo<br />

em seu bojo regras de direito Civil e Urbanístico”<br />

683<br />

ALMEIDA, Maria Cecília Ladeira de Almeida e ALMEIDA, Washington Carlos de Almeida. <strong>DIREITO</strong><br />

<strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>. Disponível em .<br />

Acesso em: 10/06/2009.<br />

684<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 415. Neste mesmo sentido: PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio<br />

de Janeiro: Forense, 2004. p. 411.<br />

685<br />

CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 398.<br />

235


Sendo assim, podemos afirmar, que o referido instituto é benéfico ao proprietário<br />

e à coletividade, pois atende nitidamente ao principio constitucional da função social da<br />

propriedade, sendo também verificado, que em decorrência destes benefícios, é<br />

utilizada vastamente pela legislação estrangeira como: Portugal; Suíça; Alemanha;<br />

Itália; Espanha; etc... 686<br />

Corroborando esta mesma idéia, Diana Coelho Barbosa 687 :<br />

“... sem duvida, ao relevante papel que esse instituto desempenha, nos países em que se<br />

encontra positivado, na implementação de uma nova concepção da propriedade<br />

imobiliária, que surge atrelada a uma função social, preconizado um aproveitamento mais<br />

efetivo e uma distribuição mais equânime das terras.”<br />

Sendo que na maioria das vezes, a não regulamentação legislativa deste<br />

instituto, restringe as pessoas de intensificar referida prática tão importante, tornando<br />

ainda mais a propriedade social e economicamente aproveitável. 688<br />

Da real utilidade da superfície, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald 689<br />

descrevem que:<br />

“Uma das maiores utilidades do direito se superfície é a sua grande densidade economia.<br />

Uma pessoa poderá construir ou plantar em solo alheio sem a necessidade de adquirir o<br />

terreno e despender grandes somas de capital, propiciando a concessão de função social<br />

à propriedade. Por um lado, o superficiário adquire as acessões e explora todas as<br />

possibilidades financeiras que lhe concede; por outro, evita-se a antieconomicidade da<br />

propriedade. O proprietário do terreno mantém a titularidade, percebe uma renda pela<br />

concessão da superfície.”<br />

686 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 457.<br />

687 BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 14.<br />

688 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253.<br />

689 CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen<br />

Júris, 2007. p. 398.<br />

236


Desta forma, podemos afirmar que a superfície permite uma melhor utilização do<br />

bem imóvel, pois trata-se de um direito real de fruição ou gozo da coisa alheia 690 . Esse<br />

instituto dinamiza a propriedade evitando interferência do Estado, transformando uma<br />

propriedade não aproveitada, em frutífera, principalmente se o proprietário não tiver<br />

meios para explorá-la. 691<br />

José Guilherme Braga Teixeira 692 dispõe que a: “A superfície pode, outrossim,<br />

ter aplicações outras, tais como a construção de fabricas, armazéns, hospitais, teatros,<br />

museus, policlínicas, sanatórios, conjuntos poli esportivos, hotéis, etc.”<br />

Acresce ainda o autor que 693 :<br />

“A superfície, nas formas com que é disciplinada pelas legislações da Europa, dita<br />

ocidental, pôde e pode atender a existência sociais novas, colaborando para diminuir a<br />

falta de moradias e para operar uma reformulação agrária. Os diversos países adotaram<br />

o instituto conforme as peculiaridades locais e o vêm moldando às novas situações<br />

exigidas pelo progresso”<br />

Uma das formas de viabilidade deste direito real são as formalizações de<br />

acordos com particulares ou empresas, concedendo-lhes o uso da superfície de sua<br />

terra, para que nela haja plantação ou a construção de prédios 694 ; sendo assim,<br />

690 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253.<br />

691 Não obstante todas as ponderações aqui elencadas, Paulo Roberto Benasse diverge deste entender<br />

pelos seguintes motivos: “Temos entendimento divergente, pois o direito superficiário, como instituto<br />

internacional, tem condão altamente social, na atualidade, onde resolvia os problemas de moradia nas<br />

grandes cidades, pela construção de residências em terras publicas destinadas a este fim. Por outro lado,<br />

permitiria a latifundiários urbanos ou rurais, o exercício do direito superficiário como “senhor da terra”, tão<br />

criticados na Idade Média, criando os “servos da terra” tão criticados na idade média, criando os “servos<br />

da terra”; obtendo financiamentos para serem assumidos pelos terceiros interessados em construir em<br />

suas terras, escavizando-os, pela cobrança do preço da terra partilhada, que poderia atingir cifra de dês<br />

vezes mais cara, como solarium ,e obtendo grande lucro””. BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de<br />

Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 122.<br />

692 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. 91.<br />

693 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. 102.<br />

694 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 461.<br />

237


conforme se verifica o presente instituto atende as disposições constitucionais quanto a<br />

presente temática.<br />

Neste diapasão Marcus Vinicius dos Santos Andrade apregoa que 695 :<br />

“Nesta linha, o art. 182, § 2º, da Constituição Federal, realça que a propriedade urbana<br />

cumpre sua função social, quando atende as exigências de ordenação das cidades<br />

previstas no plano diretor, o que vem reiterado no art. 39, da Lei 10.257/01. O plano<br />

diretor estabelece, no art. 11, que a propriedade urbana cumpre sua função social ao<br />

satisfazer as necessidades dos cidadãos, no tocante à qualidade de vida, à justiça social,<br />

ao acesso universal aos direitos sociais e ao desenvolvimento econômico, bem como à<br />

compatibilidade do uso da propriedade (a) com infra-estrutura, equipamentos e serviços<br />

públicos disponíveis, (b) com a preservação da qualidade do ambiente urbano e rural e<br />

(c) com a segurança. Bem estar e saúde de seus vizinhos”<br />

Sendo assim, de acordo com o presente escopo ora apresentado, o direito de<br />

superfície, pode influir positivamente no desenvolvimento do país, pois ajuda diminuir a<br />

enorme crise habitacional que encontra-se engendrado, quer, em perímetro urbano, ou<br />

ainda colaborando de modo profícuo para uma efetiva reformulação agrária. 696<br />

Neste entender Ricardo Pereira Lira esclarece 697 :<br />

“o direito de superfície é categoricamente jurídica relevante do ponto de vista jurídico<br />

social, a ser reintroduzida em nosso direito positivo, como indispensável instrumento a<br />

ser adotado na implantação de uma política racional de utilização do solo urbano e de<br />

uma reforma agrária efetivamente estrutural”<br />

Sendo assim, a função social da propriedade rural encontra-se prevista –<br />

conforme já ponderado anteriormente –, no artigo 182, § 2º, da Constituição Federal,<br />

695<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 198.<br />

696<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 269.<br />

697<br />

LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 93.<br />

238


que define claramente que esta propriedade somente atenderá sua função quando<br />

simultaneamente segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, atender o<br />

aproveitamento racional e adequado; a utilização adequada dos recursos naturais<br />

disponíveis e preservação do meio ambiente; a observância das disposições que<br />

regulam as relações de trabalho; e sua exploração favoreça o bem-estar dos<br />

proprietários e dos trabalhadores.<br />

Referida norma se reproduz no artigo 9º, da Lei 8.629/93 que regulamenta o<br />

artigo 182, § 2º, da Constituição Federal, bem como seu descumprimento autoriza a<br />

União desapropriar o imóvel por interesse social, para fins de reforma agrária nos<br />

termos da legislação vigente. 698<br />

Entretanto, não somente nestes dispositivos ora apresentados que verificamos o<br />

relatado. Sendo que podemos constatar ainda em vários trabalhos acadêmicos<br />

publicados – conforme já apresentado anteriormente – que o direito de superfície terá<br />

uma efetiva utilização pela sociedade.<br />

Neste contexto, Osíris Leite Correa discorre 699 :<br />

“Saber se tal instituto terá grande utilização é tarefa que exige tempo. É preciso que os<br />

operadores do direito acostumem-se a usar tal novo instituto, assimilem suas vantagens,<br />

assim eliminando as normais incertezas que a novidade sempre traz. Só assim o direito<br />

de superfície deixará de ser um punhado de regras hipotéticas, inseridas na codificação<br />

civil, para ganhar o corpo na realidade fática. O tempo dirá...”<br />

Não obstante tal ponderação, destarte, inegável se torna dizer, que positivação<br />

do direito de superfície em nosso ordenamento, com a nova roupagem, atende a razões<br />

698<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 199.<br />

699<br />

CORREA, Osíris Leite. Direito de Superficie. Disponível em . Acesso em: 10/06/2008.<br />

239


de ordem sociológica, cujas origens encontra-se na Constituição Federal, que define<br />

lidimamente a existência dos fins sociais da propriedade. 700<br />

Discorre Rodrigo Reis Mazzei 701 :<br />

“...o direito de superfície, uma das novidades em Direito das Coisas da Codificação de<br />

2002, que outrora foi tachado de ultrapassado e sem aplicação, foi recodificado, a partir<br />

da análise de que poderá ser uma ferramenta, útil, com aplicação bem elástica. A<br />

constatação não se deu apenas pelo legislador responsável pelo Código Civil, mas<br />

também por aquele que participou do processo legislativo da Lei. 10.257/2001 (Estatuto<br />

da Cidade), eis que ambos receberam a mesma iluminação constitucinal acerca da<br />

função social da propriedade”<br />

Neste mesmo contexto, Luis Guilherme Loureiro 702 dispõe que “... a superfície<br />

constitui uma inovação importante e pode constituir para a melhor utilização econômica<br />

e social dos imóveis urbanos e rurais...”, bem como, Ricardo Pereira Lira anota que:<br />

“Sem sobra de dúvida, avançou-se, notavelmente, com o instituto do direito de<br />

superfície nos planos jurídico, social, político e econômico.” 703<br />

Analisando a presente temática mais especificadamente verificando as funções<br />

que determinados institutos buscam na sociedade, Marise Pessoa Cavalcante pondera<br />

que:<br />

Nota-se que essa visão pode ser ampliada. Tudo que existe, criado por Deus, possui<br />

uma missão que é a realidade indivisível, espiritual, não perceptível aos olhos, porem<br />

intrínseca ao homem ou a coisa. Assim, a missão da terra é alimentar, do Direito é<br />

manter a harmonia entre os homens na vida de relação, e assim por diante. Para cumprir<br />

700<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 411.<br />

701<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 154.<br />

702<br />

LOUREIRO, Luiz Guilherme. Direitos Reais à luz do Código Civil e do Direito Registral.São Paulo:<br />

Editora Método, 2004. p. 272.<br />

703<br />

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253.<br />

240


esta missão, tem-se no pleno material a função realidade perceptível e a forma, realidade<br />

visível. Desta forma cada um desempenha suas funções estereotipadas através, do<br />

agricultor, do advogado do juiz sempre para cumprir uma missão espiritual. Assim, o que<br />

deve mover o agricultor é o sentimento de semear a terra é alimentar o povo. A<br />

retribuição financeira é mera conseqüência desse trabalho. Da mesma forma, o<br />

legislador, o administrador deve ter como principio ordenador o bem-estar social, a<br />

paz. 704<br />

Sendo assim, bem como, por fim, poderíamos questionar qual seria a função o<br />

social do direito de superfície e como ela se opera na sociedade? A uma das respostas<br />

resumidamente apresentadas, porem mais assertiva, segundo nosso entendimento é a<br />

do Ricardo Pereira Lira 705 que baliza a presente temática nos seguintes termos:<br />

“... o direito de superfície invade o bastião da propriedade, embute a propriedade dentro<br />

da propriedade: a manipulação ágil, inteligente, desse instrumento com o estado se<br />

valendo dos recursos do direito privado, operando como um verdadeiro “banco central”<br />

em uma “câmara de compensação” de direitos de construir (separados do direito de<br />

propriedade) – formulação que nesse passo seria inadequado e fantasioso expor e<br />

desenvolver --, tudo isso pode significar, em termos de campo e cidade, uma<br />

reformulação estrutural do DIRETO <strong>DE</strong> TER, afim de conduzí-lo a uma forma equânime<br />

de TER PARA USAR, <strong>DE</strong> MANEIRA <strong>SOCIAL</strong> E SOLIDÁRIA.”<br />

704 CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. 86 e 87.<br />

705 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 92.<br />

241


CONCLUSÃO<br />

Conforme verificamos o presente trabalho este tem em sua essência a finalidade<br />

de trazer à baila, diversos temas contraditórios e polêmicos entre si. Neste sentido<br />

enfrentamos diversos embates e indagações em relação ao estudo ora abordado, seja<br />

pela aplicação normativa, doutrinária ou jurisprudencial.<br />

Em decorrência disto, não se pretendeu por termo final no estudo em tela, bem<br />

como esgotar-lo, uma vez ser a matéria abrangente e o fato de trazer consigo vários<br />

outros elementos que esbarram diretamente ou indiretamente com este importante<br />

instituto denominado direito de superfície.<br />

Tal justificativa tem como fundamento que todo trabalho acadêmico, quando da<br />

verificação de um tema ou instituto não é possível fazê-lo sem se confrontar em<br />

determinadas adesões ou pontos de vista por parte dos pesquisadores. Sendo assim,<br />

no decorrer deste, se fez necessário, pontuar muitas assertivas referentes ao tema<br />

delimitado, ponderações estas acostadas em estudos, já conhecidos de diversos<br />

doutrinadores, bem como extraindo-se todos os itens importantes.<br />

Porém, sempre que considerado oportuno, não nos furtamos da<br />

responsabilidade de emitir nosso entendimento sobre cada questão. Para que o<br />

presente trabalho possa contribuir de algum modo para uma ampla reavaliação do<br />

tema, verificando as inconsistências e omissões existentes atualmente.<br />

Superado todos os pontos apresentados no presente trabalho, não poderíamos<br />

iniciar o presente momento conclusivo, sem fazer constar, que a etimologia da palavra<br />

Superfície é diferente do direito de superfície.<br />

242


Neste entender Rima Gorayb 706 pontua ser possível diferenciar a superfície de<br />

duas formas. A primeira delas como simples termo que é, ou seja, simplesmente<br />

superfície, este caso pode ser esta interpretada no mesmo sentido da linguagem usual<br />

já apresentada. Todavia em um segundo momento, temos ainda, a superfície como<br />

instituto jurídico, que neste caso, emprega-se o termo direito de superfície.<br />

Neste diapasão, conforme foi verificado entendemos como assertiva tal<br />

diferenciação do referido instituto, ou seja, o direito de superfície, vai muito alem do<br />

simples conceito comum ou do termo geral.<br />

Em um segundo momento, analisando a origem do instituto, e observamos que<br />

este tem inegavelmente seu primeiro momento no direito Romano 707 , onde o<br />

proprietário da terra era titular de um direito de propriedade praticamente absoluto,<br />

praticamente sem restrições ao seu uso e gozo, bem como se beneficiava<br />

exclusivamente por tudo que fosse acrescido ao solo. 708<br />

Sendo assim, em Roma, o proprietário de um imóvel, quando acrescida qualquer<br />

benfeitoria no imóvel – seja na terra ou no seu espaço aéreo –, este seria encampado à<br />

propriedade como conseqüência lógica do direito de propriedade.<br />

Porém, em decorrência desta rigidez, tornou-se inconveniente o direito de<br />

propriedade com este escopo na medida da expansão do território romano o<br />

desenvolvimento das obras públicas. 709<br />

706 GORAYB, Rima. O Direito de Superfície São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 20.<br />

707 Há na doutrina ainda, divergências do momento histórico da criação do direito de superfície, porem<br />

todas as teorias se adéquam no sentido de afirmar que este instituto foi criado no direito romano.<br />

708 Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 20.; GORAYB,<br />

Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 24 e 25.; BENASSE, Paulo Roberto. O<br />

Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 16.<br />

709 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 20. CAVALCANTI, Marise Pessoa.<br />

Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da propriedade. Rio de Janeiro:<br />

Renovar. 2000. p. 8.<br />

243


Verificamos ainda, que o direito de superfície originariamente é um instrumento<br />

de direito público-administrativo, que com o tempo, se confunde com o direito privado,<br />

pois inicialmente foi utilizado para a expansão do território romano e posteriormente<br />

arrematava suas terras a particulares, que se obrigavam ao pagamento de uma contra<br />

prestação. 710<br />

Assim, somente no período de Justiniano, o referido instituto se criou das<br />

mesmas diretrizes delineadoras do direito real, ou seja, um direito de uso e gozo sobre<br />

imóvel alheio, transmissível, bem como provido de uma ação própria e demais ações a<br />

eles pertinentes (ações confessatórias e negatórias) 711 .<br />

Neste diapasão pode-se concluir que em decorrência das novas conjecturas<br />

sociais romanas do direito de propriedade, ou seja, pelo rigor dos princípios reguladores<br />

do direito de propriedade, a necessidade de melhoramento quanto o aproveitamento<br />

das terras conquistadas 712 , a adequação habitacional e a valorização do resultado<br />

laborativo de quem trabalha nas terras se fez necessária a criação do instituto do direito<br />

de propriedade. 713<br />

Entrementes no direito medieval, a interferência no presente instituto foi oriunda<br />

do povo germânico. Estes tinham, como elemento basilar social a peregrinação, e<br />

710 Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 17.; BENASSE,<br />

Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 22.<br />

711 Neste sento; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts.<br />

1.277 a 1.389. In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil<br />

Brasileiro. v. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 256 e 257; RIZZAR<strong>DO</strong>, Arnaldo. Direito das Coisas. 1ª<br />

ed. Rio de janeiro: Forense, 2004. p. 861.; LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio<br />

de uma teoria geral. Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p.<br />

23.; CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 9.; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de<br />

Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 19.: ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos.<br />

Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 36.<br />

712 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 21.<br />

713 LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral. Revista de direito<br />

da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 26.<br />

244


assim modificando alguns conceitos e critérios fundamentais referentes ao binômio<br />

construtor/produtor e proprietário do solo. 714<br />

Neste sentido pontua com exatidão Diana Coelho Barbosa: 715 “O princípio do<br />

trabalho, contraposto ao princípio da acessão, caracterizaria o reconhecimento da<br />

propriedade superficiária não só na era medieval mas também nos codificações<br />

modernas.”<br />

Em decorrência desta evolução histórica o direito de superfície se amoldou ao<br />

novo fato social transformando-se de um direito real para se tornar o instituto mais<br />

equânime ao apresentado inicialmente. 716<br />

Não obstante, o avanço do instituto referido instituto ter ocorrido, este, em<br />

decorrência dos mesmos acontecimentos históricos já apresentado aqui, sofreu uma<br />

grande perda, e tornou-se repúdioso perante a sociedade em decorrência dos abusos<br />

cometidos pelos proprietários do solo. 717<br />

Verificada, a nítida repudia da aplicação do instituto, tão vislumbrada pela<br />

sociedade naquele período, no o direito português isso não ocorrera. Pois Marquês de<br />

Pombal, verificando todos os excessos ocorridos em todos os territórios restringiu os<br />

714<br />

Neste sentido: LIRA, Ricardo Pereira. O Moderno direito de superfície: ensaio de uma teoria geral.<br />

Revista de direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro. n. 35, 1979. p. 27 e 28.;<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 149. CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função<br />

social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 9.; BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de<br />

Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 29.; TEIXEIRA, José Guilherme<br />

Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 22. ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus<br />

Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 37<br />

715<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 26.<br />

716<br />

CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da função social da<br />

propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000. p. 84.<br />

717<br />

Neste sentido; AZEVE<strong>DO</strong>, Adriano Barcelos de. O direito real de superfície e o seu reingresso no<br />

ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em .<br />

Acesso em: 10/06/2009. VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica.<br />

Conceito. Particularidades. Disponível em .<br />

Acesso em: 10/06/2009.; TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo:<br />

Revista dos Tribunais, 1993. p. 25.<br />

245


poderes dos senhores feudais, limitando assim, as exigências vantajosas e outros<br />

abusos cometidos por estes. 718<br />

Desta forma, não obstante o direito se superfície ter evoluído até então, este<br />

sofrera uma grande perda em função da sua indevida utilização por parte dos<br />

proprietários dos solos. Todavia desde que devidamente, aplicado o direito de<br />

superfície é um instituto adequado que atende vários preceitos de aplicabilidade que<br />

verificaremos a seguir.<br />

Superada esta evolução, ao analisarmos o direito de superfície no Direito Pátrio<br />

verificamos que este reflete à realidade de sua evolução, no sentido que este encontrou<br />

sucedâneo na divisão propriedade (dominium utile)” 719 , bem como incorporamos o<br />

Brasil enquanto colônia portuguesa, encontrava-se sobre a égide dos diplomas legais<br />

de Portugal 720 , até a entrada em vigor da Lei n. 1.237 de 24 de setembro de 1864<br />

(Teixeira de Freitas), que excluiu inicialmente o direito de superfície do direito nacional.<br />

Em continuidade, podemos anotar que foram conseguintes, três as<br />

oportunidades de implementação do presente instituto na legislação nacional.<br />

A primeira tentativa, foi a elaboração no Código Civil de 1916 que não obstante,<br />

a importância do instituto, este, foi descartado pelo legiferante nacional por não haver<br />

interesse ou utilidade do instituto. 721 A segunda tentativa, mais expressiva, com<br />

previsão expressa em seu projeto, porém rejeitada pelo legislativo, foi o projeto de<br />

Orlando Gomes e por fim, -- porem não a primeira legislação vigente –, a terceira e<br />

vitoriosa pretensão fora a segunda redação do Anteprojeto do Código Civil de 2002.<br />

718 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 257 e 258.<br />

719 PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.<br />

p. 243.<br />

720 TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 45.<br />

721 Neste sentido: CAVALCANTI, Marise Pessoa. Superfície compulsória: instrumento de efetivação da<br />

função social da propriedade. Rio de Janeiro: Renovar. 2000.p. 30.; BENASSE, Paulo Roberto. O Direito<br />

de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 16.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius<br />

dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 49.<br />

246


Superado o estudo da etimologia do direito de superfície, bem como da evolução<br />

história deste, se faz necessário verificar ainda, a legislação alienígena.<br />

A referida analise, tem como fundamento, que este instituto foi recentemente<br />

introduzido no sistema jurídico pátrio e sua prática pouco difundida até então. 722 Sendo<br />

assim, à analise da legislação alienígena se faz de suma importância e apoio<br />

interpretativo nos questões controvertidas no direito doméstico. 723<br />

Em continuidade, quando enfrentamos o presente estudo utilizamos como critério<br />

metodológico três bases elementares. A primeira delas dispõe que verificaremos tão<br />

somente, a legislação positiva no direito correlato. Pois a análise do direito alienígena é<br />

muito mais profunda e complexa.<br />

Em um segundo momento, não foi realizada no segundo capítulo, a comparação<br />

das legislações correlatas sob a luz do direito pátrio positivado e por fim o último corte<br />

metodológico necessário e pertinente para o presente estudo, refere-se aos direitos<br />

socialistas e aos direitos pertencentes ao Common Law que não forma analisados.<br />

No referido tópico verificamos ainda, que independentemente da origem<br />

legislativa, ou seja, em todos os países analisados, mesmo que indiretamente, pode ser<br />

observada a intenção do legiferante no atendimento da função social da propriedade.<br />

Corroborando esta mesma idéia, Diana Coelho Barbosa 724 : “... sem duvida, ao<br />

relevante papel que esse instituto desempenha, nos países em que se encontra<br />

positivado, na implementação de uma nova concepção da propriedade imobiliária, que<br />

722<br />

MAZZEI, Rodrigo Reis Mazzei. O direito de Superfície no Ordenamento Jurídico Brasileiro. 2007.<br />

paginas 404. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP, São<br />

Paulo, 2007. p. 42.<br />

723<br />

GORAYB, Rima. O Direito de Superfície. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 43.<br />

724<br />

BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed. Curitiba: Juruá,<br />

2006. p. 14.<br />

247


surge atrelada a uma função social, preconizado um aproveitamento mais efetivo e uma<br />

distribuição mais equânime das terras.”<br />

No tópico da “A constitucionalização de Direito Civil” 725 demonstramos sua devida<br />

importância em nosso ordenamento jurídico pátrio, uma vez ser profunda a sua<br />

influência no princípio da função social da propriedade e do direito de superfície.<br />

Quando tratamos deste tema, concluímos que sua origem histórica se deu por<br />

fatos históricos, políticos e sociológicos apregoados no presente trabalho, todavia foi no<br />

início do Século XIX, mais especificadamente, com as Constituições Mexicana (1917) e<br />

Alemã (1919) iniciou-se uma nova proposta legislativa intervencionista nas relações<br />

privadas, denominado de Constitucionalismo.<br />

Neste sentido explica Leo van Holthe que 726 :<br />

“inspirados nos princípios liberais, nos ideais de uma sociedade política fundada no<br />

contrato social (Locke e Rosseau), numa ordem jurídica inspirada na razão humana<br />

(Iluminismo) e nos postulados da liberdade e fraternidade, o movimento do<br />

constitucionalismo trouxe este novo formato de Constituição (um documento escrito e<br />

rígido, que estrutura o Estado e limita o seu poder através de princípio da separação dos<br />

poderes e da previsão de direitos fundamentais), fazendo surgir o chamado Estado<br />

Liberal, Estado de Direito ou Estado constitucional”.<br />

Desta monta, que se faz necessário entender um novo direito que deve ser<br />

aplicado nas relações privadas, ou seja, não podemos negar a existência da codificação<br />

Constitucional. Instituo este, que indiscutivelmente deve nortear das demais relações<br />

criando assim princípios e regras constitucionais norteadoras para as demais<br />

legislações infraconstitucionais 727 .<br />

725 Temas de Direito Civil, p. 383.<br />

726 Direito Constitucional, p. 3.<br />

727 Ibid., p.41. “Para chegar à plenitude desta concepção, é necessário mudar a forma de raciocinar do<br />

operador do direito. Não se pode, de forma alguma, relegar à Constituição o papel da Carta de Intenções,<br />

ou de mera folha de papel, na imagem já referida, divulgada por Ferdinand Lassale. O interprete não<br />

pode continuar a vislumbrar os princípios constitucionais como meros princípios políticos, como produto<br />

de uma demagogia não concretizável. Deve-se voltar, aqui, ao conceito de vontade de Constituição, de<br />

248


Podemos verificar ainda, que a presente codificação Constitucional apresentada<br />

também permeou o Código Civil, que teve como unidade basilar, disciplinar os<br />

particulares em suas relações, todavia, como notório se faz, emplacou nos mesmos<br />

moldes principiológicos implementados pela Constituição Federal de 1988.<br />

Em continuidade, verificamos ainda, os princípios norteadores que emplacaram a<br />

nova hermenêutica no âmbito Civil, enfatizando ainda os reflexos do principio da<br />

solidariedade social prevista na Carta Magna.<br />

Nesse sentido, completa o Flávio Tartuce 728 :<br />

“... a mesma onda de solidariedade social que se abateu sobre a Constituição também o<br />

fez sobre o Código Civil, fazendo com que os dois diplomas acabassem por interagir de<br />

uma forma totalmente nova, muito diferente da forma tradicional de convivência entre<br />

eles”<br />

Em decorrência disto, avistamos um novo diploma Civil, nunca desbravado<br />

antes. Um diploma, que interage com os princípios Constitucionais, pois aplica-se e<br />

observa-se referências apregoadas na Carta Maior como a dignidade da pessoa<br />

humana.<br />

Tal convergência, como já pontuado esta condicionada à própria evolução<br />

humana, no próprio ordenamento jurídico, onde se verifica alterações no Direito Privado<br />

e Direito Público.<br />

Nasceu então uma ideologia para o Direito Civil que merece destaque, e nos<br />

ensina Maria Celina Bodin de Moraes 729 neste sentido:<br />

força normativa da Constituição, reconhecendo-se o caráter auto-aplicável dos princípios constitucionais<br />

e a importância de realizá-los, de torná-los efetivos.”<br />

728<br />

Direito Civil e a Constituição, p.2, Disponível em: ,<br />

Acesso em: 10/06/2008.<br />

729<br />

A caminho de um Direito Civil Constitucional, p. 25.<br />

249


“... a separação do direito em público e privado, nos termos em que era posta pela<br />

doutrina tradicional, há de ser abandonada. A partição, que sobrevive desde os romanos,<br />

não mais traduz a realidade econômico-social, nem corresponde à lógica do sistema,<br />

tendo chegado o momento de empreender a sua reavaliação.”<br />

Com a referida anotação podemos extrair que os conceitos de relacionamento<br />

entre o direito público e privado antigos, estão ultrapassados uma vez que ambos, na<br />

sociedade contemporânea, não mais se compreendem em categorias distintas, mas sim<br />

que elas se interpenetram.<br />

De toda esta dilação, podemos afirmar legitimamente que não estamos criando<br />

uma nova codificação, ou ainda, dilatando de forma negligente os liames obrigacionais<br />

privados. Estamos sim, buscando uma aplicabilidade hermenêutica cujo paradigma é o<br />

patamar constitucional, este, que visa garantias individuais e coletivas necessárias para<br />

a manutenção do atual status quo que se encontra a sociedade moderna.<br />

Outro aspecto de grande relevância, no presente estudo, são os princípios<br />

fundamentais 730 do Código Civil de 2002. Referidos princípios conforme dispostos foram<br />

fecundados pelo festejado Miguel Reale sendo eles os princípios da eticidade,<br />

socialidade e operabilidade na Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.<br />

Destes referidos princípios, podemos concluir que estes são de imensurável<br />

valia, pois sem a observação destes, não poderíamos interpretar e verificar de forma<br />

correta o Direito Civil 731 , bem como, os seus resultados casuísticos para a sociedade<br />

tudo em consonância à função social da propriedade.<br />

Verificado os instrumentos e requisitos de cumprimento da função social da<br />

propriedade que podemos, que concluir que são numerosos. Analisamos ainda os<br />

destaques oriundos do texto constitucional vigente, em um segundo momento, os<br />

730 Miguel Reale, Visão Geral do Novo Código Civil, Disponível em:<br />

, Acesso em: 10/06/2008.<br />

731 Função Social dos Contratos, do Código de Defesa do Consumidor ao Código Civil de 2002, p. 54.<br />

250


principais dispositivos apresentados pelo novo Código Civil de 2002 e finalmente, um<br />

breve arrazoado das demais legislações infraconstitucionais tendo em vista.<br />

Dentre todos destes instrumentos para o cumprimento da função social da<br />

propriedade, elevamos ao cume à presente temática, ou seja, o direito de superfície que<br />

conforme concluímos este é um dos direitos reais imobiliários limitados sui generis,<br />

porém com seus contornos específicos diferenciados de qualquer outro direito real, que<br />

nele é possível construir ou plantar e manter a construção ou plantação, com o<br />

respectivo valor econômico – tendo em vista que este pode ser comercializado ou ainda<br />

gravado de ônus real – em caráter acessório e temporal.<br />

Ventilamos ainda, que parte da doutrina defende que há o afastamento do<br />

principio superfícies solo cedit (a superfície acompanha o solo), criando assim, um<br />

fenômeno de superposição de duas propriedades distintas, pois enquanto o<br />

superficiário for proprietário das construções ou plantações realizadas, o fundeiro<br />

continuará tendo a propriedade do terreno. 732<br />

Todavia, esta não é a disposição legal vigente, pois o direito de superfície não<br />

cria uma propriedade resolúvel conforme aponta parte da doutrina 733 , bem como<br />

conforme já pontuado anteriormente, a natureza jurídica do direito em tela é<br />

inegavelmente um direito real imobiliário limitado o que afasta tal possibilidade.<br />

Apregoamos ainda, um dos pontos mais combatidos na doutrina relacionada aos<br />

dois diplomas infraconstitucionais que regulam a mesma disciplina jurídica, sendo eles<br />

os artigos 1.367 a 1.377 do Código Civil de 2002 e o Estatuto da Cidade em seus<br />

artigos 21 a 24.<br />

Assim, no caso em tela, temos em vigor, um conflito de normas – conforme já<br />

apontado – relacionado ao Direito Intertemporal e de conflitos de normas. Que<br />

732 Neste sentido: LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de<br />

planificação urbana. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 299.; CHAVES <strong>DE</strong> FARIAS, Cristiano;<br />

ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 397.<br />

733 Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 331.<br />

251


entendemos como mais assertiva, a interpretação fundamentada no microssistema, ou<br />

seja, aplicando o diálogo destas duas fontes 734 , e sendo assim, entendemos que em<br />

princípio, aplicamos o Código Civil quando tratamos de relações privadas e aplicaremos<br />

subsidiariamente o Estatuto da Cidade, quando tratarmos da política de<br />

desenvolvimento urbano.<br />

Concluímos ainda, que nos termos do verificado na doutrina 735 , há cinco tipos de<br />

modalidades de concessão do direito de superfície, sendo elas respectivamente:<br />

Simples; Social; Para reconstrução; Para construção, ad aedficandum; e por cisão, bem<br />

como os modos de constituição e transferência podem ser derivadas ou originária.<br />

Ainda nesta esteira, quando tratamos da forma originária de concessão, diante<br />

de todas as manifestações doutrinárias ora apregoadas, não obstante, na prática, será<br />

árdua a distinção do animus daquele que possui com intenção de proprietário, daquele<br />

que exerce a posse a titulo de superficiário, não é possível refutar a existência de um<br />

possuidor ter somente animus domini inerente a superfície, sendo assim, possível<br />

admitir o usucapião do direito de superfície.<br />

Em continuidade, conforme verificamos, o objeto do direito de superfície, diverge<br />

do Código Civil para o Estatuto da cidade. Pois em quanto este, refere-se as acessões<br />

e benfeitorias 736 , aquele realiza-se, quando da plantações e construções 737 .<br />

Nos termos do observado, Flavio Tartuce e José Fernando Simão 738 pontuam:<br />

734<br />

Sobre este tema, indicamos a doutrina da Professora Claudia Lima Marques: Claudia Lima Marques;<br />

Antônio Herman V. Benjamin; Bruno Miragem, Código de Defesa ao Consumidor. 2ª ed., São Paulo:<br />

Revista dos Tribunais, 2006.<br />

735<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 94 – 96.<br />

736<br />

Art. 24. Extinto o direito de superfície, o proprietário recuperará o pleno domínio do terreno, bem como<br />

das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel, independentemente de indenização, se as partes não<br />

houverem estipulado o contrário no respectivo contrato.<br />

737<br />

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno,<br />

por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de<br />

Imóveis.<br />

738<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 340.<br />

252


“Seguindo noções da Teoria Geral do Direito Civil, as diferenças são claras. Se os<br />

acréscimos decorrem da natureza, não se trata de benfeitorias, mas sim de acessões<br />

naturais. Da mesma forma, tratando-se de obras novas (e não acréscimos), estaremos<br />

diante de acessões artificiais (v.g., semente lançada ao solo e edifício construído)”<br />

Porem, não obstante a louvável e correta à distinção entre os referidos institutos,<br />

entendemos 739 , que tal distinção – quanto aos seus efeitos –, do termo final da<br />

concessão da superfície serão os mesmos, ou seja, o proprietário ira sempre adquirir<br />

todos os acessórios ao fim da concessão.<br />

No que tange a necessidade de acessibilidade ao objeto da superfície caso seja<br />

necessária a implantação de uma servidão, para que o superficiário tenha acesso as<br />

benfeitorias concluímos que esta será possível nos termos da legislação comparada,<br />

bem como desde que prevista no contrato de concessão.<br />

Verificamos ainda a superfície por cisão, sendo que referida forma de instituição,<br />

tem como objeto um prédio já erigido 740 , ou seja, existente que se objetiva a<br />

constituição da superfície para que o superficiário o conserve, reforme ou ainda<br />

amplie. 741<br />

Nesta esteira concluímos que não há como sustentar a impossibilidade da não<br />

utilização 742 desta forma de constituição por pelas motivações fundamentadas, bem<br />

como sua utilização prática é fundamental para os imóveis históricos tombados que<br />

necessitam de benfeitorias, conservação ou de reforma.<br />

739<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 340.<br />

740<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 94 e 95.<br />

741<br />

Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo: Método, 2008. p. 330.<br />

742<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 131.<br />

253


Outro ponto relevante quanto ao objeto, se verifica com a constituição da<br />

denominada sobreelevação da superfície, ou seja, a instituição de uma outra superfície<br />

sobre a já existente. 743<br />

O presente instituto, pode ser uma ferramenta importante para a regularização<br />

de algumas situações inadequadas perante o atual sistema legal e registrário – dentre<br />

elas a Lei de Registros Públicos (Lei n. 6.015/73) – vigente. Porem, entendemos como<br />

mais assertiva, a teoria que abranda possibilidade de existir outros direitos reais,<br />

criados por novas leis emergentes o que não encontra guarida no presente caso, 744<br />

bem como uma alternativa para resolução desta situação seria a reforma legislativa<br />

para acrescer esta importantíssima forma de constituição de direito de superfície.<br />

Da ocupação do subsolo e do espaço aéreo, concluímos que não obstante haver<br />

distinção entre o Código Civil e o Estatuto da Cidade uma vez que ambos dispositivos,<br />

o que se objetiva inicialmente é a proteção do patrimônio público da União, bem como o<br />

proprietário do imóvel quando do recebimento da exploração extrativista, observamos<br />

ainda, que o Projeto Lei 276/2007 a harmoniza o conflito entre os institutos.<br />

Quatro outras particularidades importantíssimas do referido instituto também<br />

foram analisadas, sendo elas: a impossibilidade de pagamento do laudêmio, a duração<br />

do direito de superfície, o cânon superficiário ou solarium e por fim os encargos e<br />

contribuições.<br />

Analisando estas particularidades, concluímos respectivamente que a<br />

impossibilidade de pagamento do laudêmio ou qualquer outro similar quando da<br />

constituição ou transferência por ato oneroso do direito de superfície 745 é correta, bem<br />

743<br />

LIMA, Frederico Henrique Viegas de. O direito de superfície como instrumento de planificação urbana.<br />

Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 305 – 306.<br />

744<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. Da propriedade, da superfície e das servidões. Arts. 1.277 a 1.389.<br />

In: ARRUDA ALVIM, José Manuel de; ALVIM Thereza (orgs.) Comentários ao Código Civil Brasileiro. v.<br />

12. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 274.<br />

745<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 83.<br />

254


como a restituição do valor quando auferido, é devida sob pena de enriquecer sem justa<br />

causa do esforço e trabalho alheio.<br />

Quando da duração do direito de superfície concluímos que devemos aplicar<br />

Código Civil quando tratamos de relações privadas e aplicaremos subsidiariamente o<br />

Estatuto da Cidade, quando tratarmos de política de desenvolvimento urbano.<br />

Outro ponto latente, que não pode deixar de ser ventilado é determinar qual seria<br />

o prazo máximo ou limite para a instituição da superfície? Referente a presente<br />

indagação concluímos que com base no que determina o Código Civil, não obstante<br />

estarmos diante de uma norma de ordem pública, o Legislador disponibilizou um<br />

instrumento, pelo qual as próprias partes possam em comum acordo instituir a<br />

superfície pelo prazo que entenderem mais adequados de acordo com suas<br />

necessidades.<br />

No que tange o cânon superficiário ou solarium concluímos que em um primeiro<br />

momento, podemos afirmar que o núcleo da superfície é o tempo de sua vigência tendo<br />

em vista realização – ou não – de benfeitorias acrescidas no imóvel, já em um segundo<br />

momento o cânon superficiário ou solarium como uma complementação da primeira<br />

premissa fundamental.<br />

Referente a responsabilidade do pagamento dos encargos e contribuições, em<br />

suma, concluímos como assertivo a alteração legislativa, para amoldar-se aprovado<br />

pelo Conselho da Justiça federal. Pois ambos apontamentos, objetivam se amoldar ao<br />

critério já existente do Estatuto da Cidade que visa e assegura a liberdade de contratar<br />

e assim possivelmente atender de forma mais assertiva tanto a função social desta<br />

concessão como a função social da propriedade.<br />

Em continuidade, bem com relação ao direito de preferência, incisiva no<br />

particular, as disposições legislativas – que entendemos como corretas – no sentido de<br />

255


que em caso de alienação do imóvel ou do direito de superfície é garantido o referido<br />

direito. 746<br />

Porém, legislador ordinário assim como o fez o patrício 747 , estabeleceu as regras<br />

para a efetivação de um direito tão importante como este para o presente instituto. 748<br />

Sendo assim, não obstante haver outras correntes doutrinárias, concluímos como<br />

mais assertivo a teoria do direito de preferência encabeçada por Flavio Tartuce e<br />

Fernando José Fernando Simão no sentido de aplicarmos sucessivamente e<br />

inicialmente a Lei de Locação – Lei 8.245/1991 quando tratamos dos procedimentos<br />

746<br />

BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller,<br />

2002. p. 108i.<br />

747<br />

Código Civil Português. Artigo 1535.º (Direito de preferência) É aplicável ao direito de preferência o<br />

disposto nos artigos 416.º a 418.º e 1410.º. Artigo 416.º (Conhecimento do preferente) 1. Querendo<br />

vender a coisa que é objecto do pacto, o obrigado deve comunicar ao titular do direito o projecto de venda<br />

e as cláusulas do respectivo contrato. 2. Recebida a comunicação, deve o titular exercer o seu direito<br />

dentro do prazo de oito dias, sob pena de caducidade, salvo se estiver vinculado a prazo mais curto ou o<br />

obrigado lhe assinar prazo mais longo. Artigo 417.º (Venda da coisa juntamente com outras) 1. Se o<br />

obrigado quiser vender a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o direito ser<br />

exercido em relação àquela pelo preço que proporcionalmente lhe for atribuído, sendo lícito, porém, ao<br />

obrigado exigir que a preferência abranja todas as restantes, se estas não forem separáveis sem prejuízo<br />

apreciável. 2. O disposto no número anterior é aplicável ao caso de o direito de preferência ter eficácia<br />

real e a coisa ter sido vendida a terceiro juntamente com outra ou outras. Artigo 418.º (Prestação<br />

acessória) 1. Se o obrigado receber de terceiro a promessa de uma prestação acessória que o titular do<br />

direito de preferência não possa satisfazer, será essa prestação compensada em dinheiro; não sendo<br />

avaliável em dinheiro, é excluída a preferência, salvo se for lícito presumir que, mesmo sem a prestação<br />

estipulada, a venda não deixaria de ser efectuada, ou que a prestação foi convencionada para afastar a<br />

preferência. 2. Se a prestação acessória tiver sido convencionada para afastar a preferência, o preferente<br />

não é obrigado a satisfazê-la, mesmo que ela seja avaliável em dinheiro.<br />

748<br />

No direito de superfície há também direito de preempção ou preferência, tanto no caso de alienação<br />

do imóvel como de cessão do direito de superfície (art. 1.373 do Código Civil; art. 22 do Estatuto da<br />

Cidade). Essa preferência atende tendência natural de extinção de direito real sobre coisa alheia,<br />

tornando a propriedade plena. No primeiro caso terá preferência o superficiário e, no segundo, o<br />

proprietário, em igualdade de condições com terceiros. A finalidade desse direito de preempção é<br />

consolidar a propriedade em um único titular, quando possível. O Código não disciplina no capítulo<br />

específico a forma pela qual deve operar a preferência. O proprietário ou o superficiário deve tomar<br />

conhecimento da proposta respectiva para poder exercer sua preempção tanto por tanto. A preempção<br />

ou preferência é regulada no atual Código nos arts. 513 e seguintes. O art. 517 se refere ao prazo de 60<br />

dias para os imóveis, para o exercício da prelação, após a notificação. Quando não for concedido esse<br />

direito de preferência, responderá aquele que deixou de concedê-la por perdas e danos, respondendo<br />

também, solidariamente o adquirente, se tiver agido de má-fé (art. 518). Não existe possibilidade de o<br />

preterido nessa preempção depositar o preço e haver para si a coisa, como autoriza expressamente, por<br />

exemplo, a Lei do Inquilinato. Não há dispositivo na lei que autorize que o direito de preferência na<br />

superfície tenha natureza de direito com efeito real. A situação fica, portanto, no âmbito dos direitos<br />

obrigacionais. VENOSA, Silvio de Salvo. <strong>DIREITO</strong> <strong>DE</strong> <strong>SUPERFÍCIE</strong>: Origem histórica. Conceito.<br />

Particularidades. Disponível em . Acesso em:<br />

10/06/2009.<br />

256


iniciais da parte, que quer transferir seu direito de propriedade ou superfície, bem como<br />

em um segundo momento o artigo 504 do Código Civil quando da inobservância do<br />

direito de superfície. 749<br />

A extinção do direito de superfície, em regra se consolida em todos os direitos<br />

inerentes a propriedade ao fundieiro ou fundeiro decorrente por força de lei ou do<br />

próprio contrato 750 , bem como tanto no Código Civil, como no Estado da Cidade, não<br />

elencam um rol taxativo das formas de extinção assim como o fez o Código Civil<br />

Português 751 .<br />

Tal providência foi assertiva segundo nosso entender, pois não há<br />

engessamento do instituto quando da sua extinção. Todavia, não obstante ser assertiva<br />

a referida disposição legal, esta traz consigo ainda, um pequeno infortúnio. Pois,<br />

quando da verificação da extinção do direito de superfície há na doutrina diferentes<br />

classificações e denominações para os mesmos eventos extintivos. 752<br />

Não obstante elencamos como mais importantes as seguintes formas de<br />

extinção do direito de superfície: inadimplemento das obrigações assumidas pelas<br />

partes, pelo termo final, pela consolidação, pelo distrato, por denuncia de uma das<br />

partes e pela desapropriação.<br />

749<br />

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil, v. 4: Direitos das Coisas. 1ª ed. São Paulo:<br />

Método, 2008. p. 337.<br />

750<br />

ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 159.<br />

751<br />

1410.º CAPÍTULO IV Extinção do direito de superfície Artigo 1536.º (Casos de extinção) 1. O direito de<br />

superfície extingue-se: a) Se o superficiário não concluir a obra ou não fizer a plantação dentro do prazo<br />

fixado ou, na falta de fixação, dentro do prazo de dez anos; b) Se, destruída a obra ou as árvores, o<br />

superficiário não reconstruir a obra ou não renovar a plantação, dentro dos mesmos prazos a contar da<br />

destruição; c) Pelo decurso do prazo, sendo constituído por certo tempo; d) Pela reunião na mesma<br />

pessoa do direito de superfície e do direito de propriedade; e) Pelo desaparecimento ou inutilização do<br />

solo; f) Pela expropriação por utilidade pública. 2. No título constitutivo pode também estipular-se a<br />

extinção do direito de superfície em conseqüência da destruição da obra ou das árvores, ou da<br />

verificação de qualquer condição resolutiva. 3. À extinção do direito de superfície, nos casos previstos<br />

nas alíneas a) e b) do n.º 1, são aplicáveis as regras da prescrição.<br />

752<br />

TEIXEIRA, José Guilherme Braga. O Direito Real de Superfície. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

1993. p. 85.<br />

257


Outro apontamento importante, relaciona-se com as garantias reais constituídas<br />

eventualmente pelo superficiário. Importante observar, que assim como ocorre na<br />

legislação estrangeira, ou seja, no direito português, no italiano, no espanhol, que<br />

dispõe respectivamente nos artigos 1539, I do Código Civil Português; 954, primeira<br />

parte do, Código Civil italiano e art 289, 4 da Ley Del régimen Del suelo, quando da<br />

extinção do direito real de superfície, todos os demais gravames que neles conterem<br />

serão, também extintos. 753<br />

Concluímos conforme disposição majoritária da doutrina que este instituto,<br />

soluciona inúmeros situações não emplacadas pelo Código Civil de 1916, onde ficavam<br />

as partes limitadas a outros institutos como o arrendamento, à locação ou até utilizar<br />

praticas informais, com resultados via de regra insolúveis, que acabam, quando muito,<br />

em perdas e danos. 754<br />

Neste sentido Caio Mario da Silva Pereira 755 : “O “direito de superfície” é um<br />

destes institutos que os sistemas jurídicos modernos retiram das cinzas do passado,<br />

quando não encontram fórmulas novas para disciplinar relações jurídicas impostas<br />

pelas necessidades econômicas ou sociais.”<br />

Tanto é assim, que é possível solucionar em parte, o problema da falta de<br />

habitação e o do não-aproveitamento devido do solo urbano e rural, atendendo o<br />

princípio da função social da propriedade 756 .<br />

Neste pensar Marcus Vinicius dos Santos Andrade 757 aponta:<br />

753 Neste sentido: BARBOSA, Diana Coelho. O Direito de Superfície: À Luz do Estatuto da Cidade, 1ª ed.<br />

Curitiba: Juruá, 2006. p. 112.; ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e<br />

do Estatuto da Cidade. Curitiba: Juruá, 2009. p. 160.<br />

754 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 252.<br />

755 PEREIRA,Caio Mario de Silva. Direito Civil, v. 4: Direitos Reais. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.<br />

p. 243.<br />

756 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito das Coisas. 20 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2004. v. 4. p. 457.<br />

757 ANDRA<strong>DE</strong>, Marcus Vinícius dos Santos. Superfície à luz do Código Civil e do Estatuto da Cidade.<br />

Curitiba: Juruá, 2009. p. 198.<br />

258


“Compete-lhe o interesse em adequar a propriedade ao conjunto social, usando-a,<br />

organizando-a e ordenando-a de forma útil a comunidade. O sentimento do social, na<br />

propriedade, mais se identifica quanto aos meios de produção empresarial, na cidade e<br />

no campo, como diretriz básica da atividade econômica. A função social qualifica e<br />

justifica a propriedade, publica e privada.”<br />

Concluímos ainda, que a superfície permite uma melhor utilização do bem<br />

imóvel, pois trata-se de um direito real de fruição ou gozo da coisa alheia 758 . Esse<br />

instituto dinamiza a propriedade evitando interferência do Estado, transformando uma<br />

propriedade não aproveitada em frutífera, principalmente se o proprietário não tiver<br />

meios para explorá-la. 759<br />

Em vários trabalhos acadêmicos publicados, foi verificado e ponderado queo<br />

direito de superfície terá uma efetiva utilização pela sociedade.<br />

Observando esta assertiva, Osíris Leite Correa discorre 760 :<br />

“Saber se tal instituto terá grande utilização é tarefa que exige tempo. É preciso que os<br />

operadores do direito acostumem-se a usar tal novo instituto, assimilem suas vantagens,<br />

assim eliminando as normais incertezas que a novidade sempre traz. Só assim o direito<br />

de superfície deixará de ser um punhado de regras hipotéticas, inseridas na codificação<br />

civil, para ganhar o corpo na realidade fática. O tempo dirá...”<br />

758<br />

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 37ª ed., São Paulo:<br />

Saraiva, 2003, v. 3. p. 253.<br />

759<br />

Não obstante todas as ponderações aqui elencadas, Paulo Roberto Benasse diverge deste entender<br />

pelos seguintes motivos: “Temos entendimento divergente, pois o direito superficiário, como instituto<br />

internacional, tem condão altamente social, na atualidade, onde resolvia os problemas de moradia nas<br />

grandes cidades, pela construção de residências em terras publicas destinadas a este fim. Por outro lado,<br />

permitiria a latifundiários urbanos ou rurais, o exercício do direito superficiário como “senhor da terra”, tão<br />

criticados na Idade Média, criando os “servos da terra” tão criticados na idade média, criando os “servos<br />

da terra”; obtendo financiamentos para serem assumidos pelos terceiros interessados em construir em<br />

suas terras, escavizando-os, pela cobrança do preço da terra partilhada, que poderia atingir cifra de dês<br />

vezes mais cara, como solarium ,e obtendo grande lucro””. BENASSE, Paulo Roberto. O Direito de<br />

Superfície e o código civil brasileiro. Campinas: Bookseller, 2002. p. 122.<br />

760<br />

CORREA, Osíris Leite. Direito de Superficie. Disponível em . Acesso em: 10/06/2008.<br />

259


Não obstante tal ponderação, é inegável para nós que a positivação do direito de<br />

superfície em nosso ordenamento, com nova roupagem, atende a razões de ordem<br />

sociológica, cujas origens encontra-se na Constituição Federal, bem como define<br />

lidimamente a existência dos fins sociais da propriedade. 761<br />

Com base nestes atuais instrumentos jurídicos vigentes como tão amplamente<br />

demonstrado, o instituto do direito de superfície é capaz de atender de forma clara e<br />

lidima o principio constitucional da função social da propriedade e sendo assim<br />

concluímos que é possível atender um principio fundamental por meio da aplicação de<br />

um determinado instituto, o qual seja direito de superfície.<br />

761<br />

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil, v. 5: Direito das Coisas. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.<br />

p. 411.<br />

260


ANEXO 01<br />

Comparativo entre as Leis n. os 10.257/01 (Estatuto da Cidade) e 10.406/02 (Código Civil)<br />

Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem<br />

o direito de construir ou de plantar em seu terreno,<br />

por tempo determinado, mediante escritura pública<br />

devidamente registrada no Cartório de Registro de<br />

Imóveis.<br />

Parágrafo único. O direito de superfície não<br />

autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao<br />

objeto da concessão.<br />

Art. 1.370. A concessão da superfície será gratuita<br />

ou onerosa; se onerosa, estipularão as partes se o<br />

pagamento será feito de uma só vez, ou<br />

parceladamente.<br />

Art. 1.371. O superficiário responderá pelos<br />

encargos e tributos que incidirem sobre o imóvel.<br />

Art. 1.372. O direito de superfície pode transferir-se<br />

a terceiros e, por morte do superficiário, aos seus<br />

herdeiros.<br />

Parágrafo único. Não poderá ser estipulado pelo<br />

concedente, a nenhum título, qualquer pagamento<br />

pela transferência.<br />

Art. 1.373. Em caso de alienação do imóvel ou do<br />

direito de superfície, o superficiário ou o<br />

proprietário tem direito de preferência, em<br />

igualdade de condições.<br />

Art. 1.374. Antes do termo final, resolver-se-á a<br />

concessão se o superficiário der ao terreno<br />

destinação diversa daquela para que foi concedida.<br />

Art. 1.375. Extinta a concessão, o proprietário<br />

passará a ter a propriedade plena sobre o terreno,<br />

construção ou plantação, independentemente de<br />

indenização, se as partes não houverem estipulado<br />

o contrário.<br />

Art. 1.376. No caso de extinção do direito de<br />

261<br />

Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a<br />

outrem o direito de superfície do seu terreno, por<br />

tempo determinado ou indeterminado, mediante<br />

escritura pública registrada no cartório de registro de<br />

imóveis.<br />

§ 1o O direito de superfície abrange o direito de<br />

utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo<br />

ao terreno, na forma estabelecida no contrato<br />

respectivo, atendida a legislação urbanística.<br />

§ 2o A concessão do direito de superfície poderá ser<br />

gratuita ou onerosa.<br />

§ 3o O superficiário responderá integralmente pelos<br />

encargos e tributos que incidirem sobre a propriedade<br />

superficiária, arcando, ainda, proporcionalmente à<br />

sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e<br />

tributos sobre a área objeto da concessão do direito<br />

de superfície, salvo disposição em contrário do<br />

contrato respectivo.<br />

§ 4o O direito de superfície pode ser transferido a<br />

terceiros, obedecidos os termos do contrato<br />

respectivo.<br />

§ 5o Por morte do superficiário, os seus direitos<br />

transmitem-se a seus herdeiros.<br />

Art. 22. Em caso de alienação do terreno, ou do<br />

direito de superfície, o superficiário e o proprietário,<br />

respectivamente, terão direito de preferência, em<br />

igualdade de condições à oferta de terceiros.<br />

Art. 23. Extingue-se o direito de superfície:<br />

I – pelo advento do termo;<br />

II – pelo descumprimento das obrigações contratuais<br />

assumidas pelo superficiário.<br />

Art. 24. Extinto o direito de superfície, o proprietário<br />

recuperará o pleno domínio do terreno, bem como


superfície em conseqüência de desapropriação, a<br />

indenização cabe ao proprietário e ao superficiário,<br />

no valor correspondente ao direito real de cada<br />

um.<br />

Art. 1.377. O direito de superfície, constituído por<br />

pessoa jurídica de direito público interno, rege-se<br />

por este Código, no que não for diversamente<br />

disciplinado em lei especial.<br />

262<br />

das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel,<br />

independentemente de indenização, se as partes não<br />

houverem estipulado o contrário no respectivo<br />

contrato.<br />

§ 1o Antes do termo final do contrato, extinguir-se-á o<br />

direito de superfície se o superficiário der ao terreno<br />

destinação diversa daquela para a qual for concedida.<br />

§ 2o A extinção do direito de superfície será averbada<br />

no cartório de registro de imóveis.


ABREVIATURAS UTILIZADAS<br />

AC Apelação Civil<br />

ADI-MC Medida Cautelar na Ação Direita de Inconstitucionalidade<br />

Art. Artigo<br />

Arts. Artigos<br />

BGB Código Civil Alemão<br />

Câm. Câmara<br />

Cood. Coordenação<br />

CC Código Civil<br />

CC/1916 Código Civil de 1916<br />

CCPor Código Civil Portugues<br />

CPC Código de Processo Civil<br />

CF Constituição Federal 1988<br />

CJF/STJ Conselho Justiça Federal<br />

C/C Combinado<br />

DF Distrito federal<br />

Dês. Desembargador<br />

n.º Número<br />

NR Nova redação<br />

orgs Organizadores<br />

TJ/BA. Tribunal de Justiça da Baia<br />

In: Disponível em<br />

v. Volume<br />

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