Baixe o Livro - poeminflamado
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Posfácio//176 a 177<br />
PARA ALÉM DO POEMINFLAMADO<br />
Falar de França é difícil, e tem que ser fácil. Difícil porque até com<br />
este livro é impossível dizer tudo – mesmo trazendo a compilação mais<br />
completa possível de seus poemas, além de depoimentos e outras informações<br />
sobre sua obra. Imagine então fazer isso em um posfácio.<br />
E tem que ser fácil porque para dizer dele é preciso falar e ouvir e<br />
ver – aproximar a escrita da voz e deixar rolar, alimentar o que a memória<br />
guarda com admiração e afeto, e observar o mundo a partir de<br />
seu ponto de vista – para então, compartilhar.<br />
Falar de França é antes de mais nada falar de um multiartista, de<br />
um guerreiro terno e autodidata cujo trabalho teve repercussão em<br />
diferentes meios e muitas vidas.<br />
É falar de sua poesia enquanto plena e fisicamente viva. De sua maneira<br />
de recitar, da originalidade de seu estilo de performance poética<br />
e da maneira com que enxergava e traduzia suas crenças em versos,<br />
divertindo(-se) e emancipando.<br />
E da ressurgência da poesia apresentada, nas últimas décadas. É falar da<br />
força da voz e do corpo no atual panorama cultural não só de Recife, mas de<br />
São Paulo, do Rio, de Salvador – e de Buenos Aires, de Nova Iorque, de Paris.<br />
Falar de uma potência ancestral desreprimida a partir do século passado,<br />
a Corpoesia praticada e presente em todas as sociedades humanas,<br />
em diferentes funções e materializações. Que por conta das novas tecnologias,<br />
e do esforço e prazer de muita gente, evoluiu a partir dos anos 50,<br />
utilizando suportes ancestrais como o blues, o repente, os sermões, as<br />
leituras. Com Allen Ginsberg, Last Poets, Chacal e a Nuvem Cigana; até a<br />
Slam Poetry, e a cena atual de Recife, com vários grupos de recitadores e<br />
artistas como Miró da Muribeca, Lara, Cida Pedrosa, Valmir Jordão, Fernando<br />
Chile, Malungo e tantos outros, parceiros de fé no ofício.<br />
Falar de França é falar da reconformação que a crença na performance<br />
poética faz com o sistema literário, com suas redes que agem<br />
de maneira alternativa e interligada à circulação mais convencional de<br />
livros. Aproveitando os grandes eventos para se lançar, por exemplo,<br />
mas tendo as suas próprias estruturas, espaços para recitação e circulação<br />
de poesia como foi o seu Eu, Poeta Errante.<br />
E da multidão de recitais que se multiplicam por todos os lugares.<br />
Dos Open Mics das maiores cidades americanas, aos torneios de poesia<br />
europeus. Do CEP 20000 ao Cooperifa e ao Quartas Literárias.<br />
É falar da força de suas publicações, artesanato editorial independente,<br />
nascidas do encontro com Sil, artista gráfica talentosíssima,<br />
amor que gerou a Mão-de-Veludo.<br />
E das várias editoras independentes na guerrilha cultural do dia a<br />
dia, filhas da caligrafia e do manuscrito, do xérox e depois afilhadas do<br />
computador. Nascidas de milhares de ações apenas entre amigos, de<br />
tantos ambientes culturais espalhados pelo Ocidente. Criando e publicando<br />
através do básico obras rudimentares e primorosas.<br />
E é ainda falar do TAO – o Teatro dos Amadores de Olinda, grupo<br />
por ele fundado, e falar da montagem do A Cor da Exclusão. Do<br />
dramaturgo formado em Cênicas na UFPE, com grau colado após seu<br />
falecimento, em homenagem e reconhecimento à conclusão do aprendizado<br />
na Universidade e nos palcos de rua.<br />
Mas falar de França, além do multiartista, é principalmente dizer<br />
da sua negritude combativa e impassível. Do mundo de hoje,<br />
onde ainda se vê que a escravidão não acabou, que seus efeitos<br />
continuam – e da luta cada vez maior e mais ativa por real igualdade<br />
espalhada pelo Planeta. É falar por isso da Capoeira, do Candomblé,<br />
dos Afoxés. De seus anos de estudo e luta, de sua pesquisa<br />
sobre Solano Trindade.<br />
É falar de sua ética de desapego tranquilo e consciente perante a<br />
vida. E de tanta gente que de tantas maneiras diferentes vive sem seguir<br />
os padrões que a sociedade de consumo procura lhes obrigar.<br />
E falar, finalmente, de sua presença viva na memória de tantos admiradores.<br />
Gente que se entusiasmou por poesia e por viver poesia<br />
corporalmente através dele, e que continua seu legado de tantas formas,<br />
criando e cultivando as artes que ele escolheu e misturou.<br />
Centelha de luz plantada em peitos e cabeças, brotando e gerando<br />
a partir das sementes que o mestre continua oferecendo...<br />
...e que agora germina esse livro, o site e as apresentações de<br />
Poeminflamado.<br />
Na esperança, na fé e na certeza que sua multicolorida ArteVida<br />
continua. Continua falando, ensinando, divertindo, conscientizando. E<br />
continuará, multiplicada em mais e mais mentes e corações.<br />
Axé, França!<br />
André Telles do Rosário, amigo e admirador.<br />
Mestre em Letras - Teoria Literária, pela universidade Federal de Pernambuco<br />
176<br />
Poeminflamado<br />
Posfácio<br />
177