19.04.2013 Views

ARTISTAS UNIDOS - Companhia de Teatro de Almada

ARTISTAS UNIDOS - Companhia de Teatro de Almada

ARTISTAS UNIDOS - Companhia de Teatro de Almada

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

velha cúmplice (II, 6), é tudo menos submissa: assim que ficam sós (II, 8), ele tenta<br />

<strong>de</strong>scarregar em cima <strong>de</strong>la o próprio “po<strong>de</strong>r” (“Esperai, já vos disse”), e ela volta-se para<br />

ele, aliás, revolta-se contra ele com toda a sua “altivez”: “Que preten<strong>de</strong>is <strong>de</strong> mim?”, e<br />

eclipsa-se <strong>de</strong>ixando-o aborrecido a <strong>de</strong>cifrar um brin<strong>de</strong>-enigma. Ripafratta está como que<br />

encan<strong>de</strong>ado por um lampião diabólico, por um Lúcifer <strong>de</strong> saia, que abate e assassina: se<br />

tivesse coragem para fugir naquele instante, salvar-se-ia (“Malditíssimas sejam todas as<br />

mulheres! On<strong>de</strong> haja mulheres, aí juro que não mais entrarei.”): mas o <strong>de</strong>miurgo<br />

Goldoni já <strong>de</strong>cidiu que o seu tormento apenas acabou <strong>de</strong> começar.<br />

Dotada daquele “gran<strong>de</strong> espírito”, que finalmente o não muito perspicaz<br />

Albafiorita lhe reconhece, a “patroa da estalagem” (<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Hortência e Dejanira<br />

fracassarem miseravelmente no cerco que fazem ao misantropo, em II, 12-13: ele, com<br />

o seu orgulhoso “Vivo só para mim”, maltrata-as “com o maior prazer <strong>de</strong>ste mundo.”)<br />

apresta-se a voltar à carga. O Cavaleiro toma “uma resolução <strong>de</strong> homem” (a conta, as<br />

malas, o espadim e o chapéu, e uma partida para o precipício, em II, 14-16): basta que<br />

Mirandolina apareça “tristemente” à porta “com um papel na mão”, enxugando “os<br />

olhos com o avental” (I, 17), e pronto, aquele “novo <strong>de</strong>sprazer”, que “nunca tinha<br />

experimentado”, readapta-o, a própria “força incógnita” que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início o oprimia.<br />

Ao princípio, ela “finge conter-se para não chorar”, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> que é melhor um<br />

<strong>de</strong>smaio silencioso. Sem dúvida, estamos diante <strong>de</strong> um estratagema teatral conhecido (é<br />

um lazzo habitual da apaixonada secundária na Commedia <strong>de</strong>ll’Arte): mas que aqui é<br />

preenchido com o realismo da mercadora, generosa, nos seus cálculos, para com o<br />

pouco generoso (e vil) cliente preferido (II, 17): o qual, daqui a pouco, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> a<br />

tornar “bendita” e pela primeira vez ter acreditado que ela é frágil (“Ai que esta <strong>de</strong><br />

certeza que me ama!”), é sujeito, pela sua escolha <strong>de</strong> um in<strong>de</strong>coroso volte-face, ao<br />

escárnio geral. (“Bravo! O senhor, que não podia ver mulheres” diz o Marquês, em II,<br />

19, em nome <strong>de</strong> todos). No proscénio, sozinha com o seu público, Maddalena já se po<strong>de</strong><br />

vangloriar da “vitória”, aliás, do “triunfo”, “para <strong>de</strong>sengano dos homens presunçosos”:<br />

mas, queremos sublinhar: o gen<strong>de</strong>r aqui pouco conta, aqui está em jogo o egoísmo <strong>de</strong><br />

uma pequena burguesa, que não vê a hora <strong>de</strong> cobrar ao enésimo nobre <strong>de</strong> trazer por casa<br />

que ousou provocá-la.<br />

Da provisória <strong>de</strong>spedida dos nobres (<strong>de</strong> Ripafratta, ao Albafiorita, ao<br />

Forlipopoli, que comem, bebem e <strong>de</strong> vez em quando galanteiam nos palcos <strong>de</strong><br />

Sant’Angelo, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> possuem invejosamente as chaves), advém todo o terceiro acto,<br />

que se abre com um dobre <strong>de</strong> sinos premonitório (“Pronto. Acabou-se o passatempo.”) e<br />

com certezas bem azedas: “E aquele caro senhor Cavaleiro que tão gran<strong>de</strong> inimigo era<br />

das mulheres? Se agora eu quisesse, era senhora <strong>de</strong> o obrigar a qualquer asneira!” (III, 1<br />

e 2). Ao constatar quão pateticamente ele segue os seus passos (a oferta <strong>de</strong> um<br />

frasquinho <strong>de</strong> ouro <strong>de</strong> doze moedas que chega tão tar<strong>de</strong> que lhe parece uma “afronta”),<br />

Mirandolina, sozinha, abandona-se ao sarcasmo: “Pronto! Cozido, recozido e assado!”<br />

(III, 3). Depois dá-se ao luxo <strong>de</strong> receber o Cavaleiro, obstinando-se em lhe mostrar as<br />

mais prosaicas e domésticas acções (passar a ferro, com raiva e no recusar “com<br />

<strong>de</strong>sprezo” a oferta, que <strong>de</strong>ita “para a cesta da roupa), enquanto mostra uma ternura<br />

Rua <strong>de</strong> Campo <strong>de</strong> Ourique, 120 / 1250 – 062 Lisboa/ Tel: 21 391 67 50<br />

22

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!