ARTISTAS UNIDOS - Companhia de Teatro de Almada
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protagonista da comédia com o seu nome, mas a presença é justificada pela história <strong>de</strong><br />
amor que ele condiciona e com que se confronta: e a acção conclui-se não com o fim, o<br />
arrependimento, o suicídio ou a prisão do Senhor To<strong>de</strong>ro, mas simplesmente e<br />
consequentemente com as bodas da sua sobrinha Zanetta.<br />
Esta necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma finalida<strong>de</strong> do amor com um sentido socialmente<br />
construtivo é tão forte que se encontra não apenas nas obras novas, como também nas<br />
obras do passado, que serão reapresentadas ao público burguês apenas se<br />
correspon<strong>de</strong>rem a esta nova sensibilida<strong>de</strong>, ou então se se transformarem em<br />
consequência disso. Entre os muitos exemplos possíveis na dramaturgia europeia do<br />
século XVIII, o mais sensacional e divertido é talvez aquele que diz respeito à tragédia<br />
<strong>de</strong> Shakespeare António e Cleópatra. Para a mentalida<strong>de</strong> positiva burguesa da primeira<br />
fase, nada po<strong>de</strong> ser mais estranho, irreconhecível e improdutivo como a história <strong>de</strong> uma<br />
paixão tórrida <strong>de</strong> um comandante romano e <strong>de</strong> uma rainha do Egipto; mas ao ser<br />
reescrita por um tal Henry Brooke em 1780 e – po<strong>de</strong>remos dizer – “reciclada” segundo<br />
o novo sentimento ético e civil, a história segue o único caminho possível, mostrandonos<br />
António e Cleópatra não tanto com amantes, mas como pais. O objecto do drama <strong>de</strong><br />
Brooke não é a satisfação da paixão amorosa dos dois, mas a conservação do seu núcleo<br />
familiar; António não está dividido entre o sentido do <strong>de</strong>ver e uma paixão incontrolável,<br />
mas entre o primeiro e a atmosfera familiar burguesa da sua cônjuge egípcia.<br />
Igualmente, Cleópatra não se serve do seu fascínio para <strong>de</strong>ter António mas recorre a<br />
duas crianças que nunca po<strong>de</strong>riam ter tido em Shakespeare a importância que aqui<br />
possuem: “Não queres dar um beijinho aos teus companheiros <strong>de</strong> jogos, meu António?<br />
(...) Vamos, meus meninos, aju<strong>de</strong>m-me a <strong>de</strong>ter aqui este esposo <strong>de</strong>sobediente”. E um<br />
dos filhos: “Nós ajudamos-te mamã. Põe-te <strong>de</strong>sse lado, Patty, eu fico <strong>de</strong>ste; e se ele<br />
tentar fugir penduramo-nos nele como dois contrapesos”. E António, ce<strong>de</strong>ndo: “Oh, se<br />
estivessem aqui pais, eles iriam compreen<strong>de</strong>r-me”.<br />
No momento histórico em que a nova classe burguesa entra em contacto e em<br />
conflito com a velha classe aristocrática, a história <strong>de</strong> amor e <strong>de</strong> casamento é muitas<br />
vezes a história <strong>de</strong> amor e <strong>de</strong> casamento entre um representante da burguesia e um<br />
representante da nobreza. O teatro burguês tratará naturalmente este tema através do seu<br />
próprio ponto <strong>de</strong> vista e com o rigoroso objectivo <strong>de</strong> que já falámos; mas o teatro<br />
aristocrático e o popular tinham em consi<strong>de</strong>ração esta relação e a maneira como ela é<br />
abordada mostra claramente o aperfeiçoamento da relação recíproca das duas classes e a<br />
passagem <strong>de</strong> um ponto <strong>de</strong> vista aristocrático para um ponto <strong>de</strong> vista burguês.<br />
O teatro aristocrático – e o teatro popular – têm em consi<strong>de</strong>ração muitos<br />
representantes da nova classe: trata-se, em geral, <strong>de</strong> um velho abastado a quem é<br />
prometido pelo pai ou por um tutor uma rapariga para esposa que, naturalmente, numa<br />
escolha <strong>de</strong>ste género, tem em maior consi<strong>de</strong>ração a carteira do que a formosura ou a<br />
ida<strong>de</strong>; o jogo, como é óbvio, não chega ao fim; a jovem casa com um belo cavaleiro que<br />
sempre amou e o mercador é normalmente ridicularizado, e às vezes espancado, por<br />
entre as risadas dos nobres e do povo, solidários e em harmonia contra a classe<br />
perturbadora. Exemplos <strong>de</strong>sta situação dramática abundam entre o século XVI e XVIII<br />
Rua <strong>de</strong> Campo <strong>de</strong> Ourique, 120 / 1250 – 062 Lisboa/ Tel: 21 391 67 50<br />
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