B. Horto do Esposo - Universidade Aberta
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expressa<strong>do</strong> o desejo de que as prostitutas fossem ajudadas a salvar-se e, em 1277, Gregório<br />
IX ter aprova<strong>do</strong> a Ordem de Stª Maria Madalena, ao que se seguiu a criação de muitas<br />
casas que visavam a reabilitação de prostitutas. 158 Com efeito, encontramos em algumas<br />
narrativas medievais, os exempla 159 , a temática <strong>do</strong> arrependimento 160 de prostitutas que,<br />
após graves penitências pelos seus peca<strong>do</strong>s, morreram reconciliadas com Deus, por<br />
exemplo, «Vida de Tarsis», 161 ou tornaram-se santas, em «Vida de Santa Pelágia» 162 ,<br />
tornan<strong>do</strong>-se em exemplos 163 de resgate e de anulação das vidas passadas 164 .<br />
158 C.f., ibidem, pp.173-174.<br />
159 Cabe referir o estu<strong>do</strong> de Mario Pilosu no qual refere: «A popularidade maior ou menor de uma Vita pode<br />
depender da fama <strong>do</strong> redactor, verdadeiro ou presumível, ou, no caso <strong>do</strong> Ocidente, <strong>do</strong> tradutor para o latim,<br />
mas, por vezes, deve-se acima de tu<strong>do</strong> à presença, no relato, de uma personagem de certo relevo na<br />
hagiografia ou na vida religiosa da época – um santo, um eremita, um bispo – que, por sua vez, faz realçar a<br />
mulher que conseguiu converter ou que encontrou no local da sua penitência. Apenas Maria Egipcíaca,<br />
Pelágia e Taís (e em menor grau Teo<strong>do</strong>ra) saíram <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> obscuro para chegar aos lábios <strong>do</strong>s prega<strong>do</strong>res<br />
ou às penas <strong>do</strong>s compila<strong>do</strong>res de lendas pias ou de colectâneas de exempla.», Mário Pilosu, A Mulher, a<br />
Luxúria e a Igreja na Idade Média, Lisboa, Editorial Estampa, 1995, p.142.<br />
160 Na perspectiva de Mario Pilosu: «O modelo recorrente é o de uma mulher solteira (à excepção de<br />
Teo<strong>do</strong>ra) que pratica a prostituição ou uma outra actividade reprovável (dançarina, mima) e que fez cair na<br />
perdição e na pobreza dezenas de homens devi<strong>do</strong> à sua beleza sedutora. A ocasião da conversão é<br />
proporcionada pelo encontro com um homem santo (no caso de Maria Madalena trata-se de Deus encarna<strong>do</strong>)<br />
que toca, com as suas palavras e com a sua atitude, o coração da peca<strong>do</strong>ra e, por vezes, por um acontecimento<br />
extraordinário que faz ascender ao nível consciente o remorso pela vida pecaminosa (caso de Maria<br />
Egipcíaca). A reclusão numa gruta ou numa cela é considerada o castigo justo para os peca<strong>do</strong>s cometi<strong>do</strong>s e<br />
também o meio mais apropria<strong>do</strong> para uma penitência verdadeiramente completa. […] A penitência tem, como<br />
sempre, uma relação directa com a vida passada: abstinência, jejum, vestes grosseiras (ou, por fim, a<br />
completa nudez de Maria Egipcíaca), afastamento <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> opõem-se claramente à luxúria, aos excessos nos<br />
alimentos e nos trajes e à excessiva promiscuidade nas relações da «outra» vida.», ibidem, pp.142-143.<br />
161 Tarsis morreu reconciliada com Deus: «a vida de Tarssis molher que / foy muyto peccatriz// […] E o velho<br />
/ lhe disse: — Se esto sabes porque fezeste perder tan/tas almas? Que nam tam soomente pella tu/a, mais<br />
pellas de muitos que fezeste perder, / […] — Nom te per<strong>do</strong>ou Deos pella tua / peendença, mais pello teu<br />
arrepeendimẽto.», A. M. Martins, «Vida de Tarsis», pp.16-17. Em La leyenda <strong>do</strong>rada, Santiago de la<br />
Vorágine apresenta «Santa Tais, meretriz» que reconhece os seus peca<strong>do</strong>s: «– Pongo a Dios por testigo de<br />
que lo que voy a decirte es cierto: tan pronto como me quedé sola, encerrada en esta celda, hice un recuento<br />
minucioso de to<strong>do</strong>s mis peca<strong>do</strong>s, formé con ellos una especie de far<strong>do</strong> que resultó inmensamente voluminoso<br />
y, desde entonces hasta ahora, así como no he deja<strong>do</strong> ni un solo instante de respirar, así tampoco he cesa<strong>do</strong> de<br />
llorar amargamente al ver la cantidad, enormidad y gravedad de las innumerables malas acciones que en mi<br />
pasada vida he cometi<strong>do</strong>.», S. de la Vorágine, La leyenda…, p.207. Apesar de Tais surgir nos exempla<br />
anteriormente referi<strong>do</strong>s como santa, Dante coloca a prostituta Tais no Inferno: «Depois disse o meu guia:<br />
«Avança um pouco mais o rosto, para que possas ver distintamente a face daquela mulher suja e desgrenhada<br />
que além se arranha com as unhas repletas de fezes e ora se agacha, ora de pé se põe. É Tais, a prostituta»,<br />
Dante, A Divina comédia, O Inferno, 4ª edição, Mem Martins, Publicações Europa-América-Livros de Bolso<br />
197, 2003, p.79.<br />
162 De facto, as penitências proporcionaram a Pelágia a sua salvação: «Esta / he a vida de hũa que foy molher<br />
publica e / este foy seu mo<strong>do</strong> de viver e de sua penitẽ/cia com o qual nos Deos faca viver e em o díía <strong>do</strong> /<br />
juizo misericordia aver», L. F. Duarte, «Vida de Santa Pelágia», p.29.<br />
163 Em La leyenda <strong>do</strong>rada, Santiago de la Vorágine apresenta exempla de mulheres que permaneceram fiéis a<br />
Cristo, renuncian<strong>do</strong> ao casamento, preferin<strong>do</strong> permanecer virgens e sofren<strong>do</strong> as torturas que lhes foram<br />
infligidas pelos homens que pretendiam consigo casar. Devi<strong>do</strong> à intervenção divina, muitas das torturas não<br />
ocorreram, mas estas mulheres terminaram as suas vidas assassinadas. Salientam-se as santas: Lucia<br />
(«Pascasio, desespera<strong>do</strong>, ordenó que embadurnaran el cuerpo de la <strong>do</strong>ncella com pez y resina, que<br />
acumularan montones de leña en su derre<strong>do</strong>r y que prendieran fuego a la enorme hoguera para que la joven<br />
pereciera abrasada. Ardió la leña, consumióse toda ella, pero no se consumió ni ardió Lucía», p.35); Juliana<br />
(«y tanto la torturaron que le quebraron to<strong>do</strong>s los huesos hasta el extremo de que el tuétano de los mismos<br />
quedó esparci<strong>do</strong> por el suelo.», p.80); Doroteia («Fabricio, braman<strong>do</strong> de ira, mandó a los verdugos que a<br />
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