B. Horto do Esposo - Universidade Aberta
B. Horto do Esposo - Universidade Aberta
B. Horto do Esposo - Universidade Aberta
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Introdução<br />
A presente dissertação constitui uma proposta de resposta à seguinte pergunta de<br />
partida: se e de que mo<strong>do</strong> os contos coligi<strong>do</strong>s por José Leite de Vasconcellos, edita<strong>do</strong>s em<br />
Contos Populares e Lendas, apresentam peca<strong>do</strong>s de mulheres enuncia<strong>do</strong>s em exempla de<br />
<strong>Horto</strong> <strong>do</strong> <strong>Esposo</strong>, espelhan<strong>do</strong>, deste mo<strong>do</strong>, uma visão medieval que, a reflectir-se, ainda se<br />
poderá encontrar no universo onírico popular? Para responder a esta questão, sentimos<br />
necessidade de procurar indica<strong>do</strong>res sobre a sociedade medieval, pois quisemos verificar de<br />
que maneira os peca<strong>do</strong>s enuncia<strong>do</strong>s quer no <strong>Horto</strong> <strong>do</strong> <strong>Esposo</strong>, quer nos Contos Populares e<br />
Lendas poderiam reflectir uma cosmovisão principalmente religiosa e punitiva<br />
relativamente aos comportamentos das mulheres. Para colmatar esta necessidade,<br />
analisámos excertos de textos medievais normativos retira<strong>do</strong>s de Constituições Sinodais e<br />
livros de penitenciais, de mo<strong>do</strong> a podermos verificar se os peca<strong>do</strong>s que são enuncia<strong>do</strong>s no<br />
<strong>Horto</strong> <strong>do</strong> <strong>Esposo</strong>, por seu turno, reflectem ou não a mentalidade encontrada nas<br />
Constituições e Síno<strong>do</strong>s elabora<strong>do</strong>s por legisla<strong>do</strong>res <strong>do</strong> clero e, numa fase posterior, se os<br />
Contos Populares e Lendas, compila<strong>do</strong>s já no século XX, ainda apresentam essa mesma<br />
mentalidade.<br />
Os textos normativos selecciona<strong>do</strong>s proporcionam-nos uma exposição<br />
pormenorizada <strong>do</strong>s vícios e peca<strong>do</strong>s da sociedade medieval (particularmente no que se<br />
refere aos sete peca<strong>do</strong>s mortais: soberba, inveja, ira, acídia, avareza, luxúria e gula) e<br />
permitem-nos isolar os principais peca<strong>do</strong>s associa<strong>do</strong>s à mulher, ou seja, a luxúria, a<br />
gula, a soberba e as práticas relacionadas com a feitiçaria, contribuin<strong>do</strong> igualmente<br />
para o nosso conhecimento sobre as relações estabelecidas entre homens e mulheres,<br />
dentro e fora <strong>do</strong> casamento. Após as primeiras leituras, verificámos que os textos<br />
normativos nos apresentam uma mentalidade que discrimina as mulheres face aos<br />
homens, manifestan<strong>do</strong>-se francamente repressiva face aos peca<strong>do</strong>s sexuais de mulheres,<br />
que nos surgem como seres provoca<strong>do</strong>res <strong>do</strong> desejo de luxúria e <strong>do</strong> peca<strong>do</strong> da carne nos<br />
homens clérigos e leigos.<br />
Numa segunda fase deste estu<strong>do</strong> sobre os «peca<strong>do</strong>s de mulheres», debruçámo-nos<br />
principalmente sobre exempla <strong>do</strong> texto <strong>Horto</strong> <strong>do</strong> <strong>Esposo</strong>, nomeadamente <strong>do</strong> Livro IV,<br />
capítulo 57 ao 70, e analisámos algumas auctoritates - citações da Bíblia e <strong>do</strong>s padres- e<br />
rationes - verdades racionais que estavam relacionadas com os peca<strong>do</strong>s de mulheres.<br />
Procurámos também analisar os juízos de valor <strong>do</strong> autor que são reflexo de uma<br />
2