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Assim, diferentes e estranhos, supunham existir entre eles uma<br />
grande solidariedade e amizade. Mas esta era, de fato, frágil, transitória<br />
e superficial. Quando menos se esperava, a neblina encharcada descia,<br />
e ao se tornar mais espessa, emergiam, com força, as motivações e<br />
emoções egoístas. N<strong>esse</strong> instante, cada um d<strong>esse</strong>s homens se fechava<br />
mais e mais no seu canto isolado, voltado somente <strong>para</strong> si, sem laços<br />
que o prend<strong>esse</strong>m aos outros. Preocupado consigo, voltava-se integralmente<br />
<strong>para</strong> seus problemas particulares, não estava mais ligado<br />
aos outros. Quando isso ocorria, o indivíduo podia atacar o ex-amigo,<br />
ameaçar o não-eu, esforçar-se <strong>para</strong> afastá-lo, ou mesmo matá-lo.<br />
Todos se locomoviam se<strong>para</strong>dos pela névoa escura incrustada em<br />
cada corpo. Ao mesmo tempo, supunham estar ligados, compelidos a<br />
realizarem certas caminhadas juntos: o trabalho do campo que executavam,<br />
o meio-ambiente semelhante que repartiam, os mesmos partidos<br />
políticos ou religiões que seguiam. Esses eram os elos que os ligavam.<br />
Todas essas atividades influenciavam cada um deles, que, por sua vez,<br />
influenciava a conduta do vizinho e do grupo. Como conviviam ligados<br />
com os mesmos objetivos em algumas atividades, acreditavam se conhecer.<br />
Mas, se considerarmos a personalidade total de cada um, e não alguns<br />
poucos aspectos dela, eles conviviam com um desconhecido, ignoravam-se.<br />
Estavam ligados e, ao mesmo tempo, isolados uns dos outros.<br />
A adoração por Ana Maria, a ida às procissões e ao bar da rodoviária<br />
serviam de elos, fontes dessa união passageira, superficial, sem<br />
suporte, que unia homens tão diferentes e distantes. Cada um, no fundo,<br />
estava só.<br />
Na marcha em direção à felicidade através da paixão por Ana Maria,<br />
simbolizada pelo pão francês, eles se sentiam conectados pelo objetivo<br />
único, imaginavam ter acabado com a angústia e o mal-estar da<br />
consciência da solidão, inerente ao ser humano. Estavam unidos, por<br />
instantes, porque buscavam um mesmo fim: ir à padaria ver Ana Maria.<br />
Não importavam os motivos e intenções escondidas em cada um deles,<br />
uma força misteriosa os unia e os dirigia <strong>para</strong> um mesmo destino: uma<br />
ligação poderosa e milagrosa, mais inebriante que a cachaça tomada<br />
no boteco.<br />
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