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CAPA REVISTA AGCRJ_4_2010.p65 - rio.rj.gov.br

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ao nascimento de um tipo de urbanidade que iria caracterizar a cidade do Rio de Janeiro.<<strong>br</strong> />

-X-<<strong>br</strong> />

Na década de vinte do século próximo passado, quando a nova sede do Conselho Municipal<<strong>br</strong> />

reluzia na praça Floriano Peixoto, (1) centro da cidade do Rio de Janeiro, inaugurada que fora no<<strong>br</strong> />

ano de 1923, um cidadão encarnou em seu cotidiano o que denomino de pequena política. Seu<<strong>br</strong> />

prenome pouco importa, até porque tratavam-no por um suposto so<strong>br</strong>enome, Peixoto, cu<strong>rio</strong>samente<<strong>br</strong> />

o mesmo do ex-presidente Floriano, a quem coube dar nome à praça principal daquele entorno. O<<strong>br</strong> />

que se sabia é que era um servidor da Casa das Leis. Exemplar em seu trabalho e devotado a causas<<strong>br</strong> />

íntimas das pessoas humildes como ele, era um tipo constante nos arredores do palácio dos<<strong>br</strong> />

intendentes. As andanças desse servidor, nas horas vagas, é que chamavam a atenção dos mais<<strong>br</strong> />

atentos transeuntes. O que faria o senhor Peixoto? Dava curso ao amparo a pessoas sem rumo,<<strong>br</strong> />

desgarradas e marcadas pelas práticas das contravenções toleradas pela sociedade hipócrita de uma<<strong>br</strong> />

época não tão distante dos dias de hoje.<<strong>br</strong> />

Antes de se matar essa cu<strong>rio</strong>sidade, cabem algumas observações. Se, como o dissemos<<strong>br</strong> />

acima, a pequena política consiste num universo distinto da grande política, (2) convém demarcar<<strong>br</strong> />

essas diferenças. Assim, enquanto esta, a grande, se define pela ação das classes dominantes em<<strong>br</strong> />

meio às instituições que lhes dão amparo e poder, a pequena política se processa nas ruas, traduz-se<<strong>br</strong> />

pelos conflitos humanos inerentes à existência dos excluídos das benesses dos poderosos. Nesse<<strong>br</strong> />

espaço, onde transita o cidadão comum, desprovido dos cuidados mínimos do poder público, formase<<strong>br</strong> />

uma cultura política. Esta é assinalada por uma dupla característica: a resistência, mesmo<<strong>br</strong> />

silenciosa, em face da opressão, e pela ironia diante da hipocrisia dos que se julgam supe<strong>rio</strong>res, pelo<<strong>br</strong> />

simples fato de deterem patrimônio e propriedades privadas.<<strong>br</strong> />

O senhor Peixoto pertencera ao universo da pequena política, embora seu ofício o fizesse<<strong>br</strong> />

transitar entre as duas. Indivíduo de pequena estatura, magro a ponto de suas roupas so<strong>br</strong>arem no<<strong>br</strong> />

corpo quase esquelético, negro retinto e, so<strong>br</strong>etudo, de uma amabilidade fascinante, era<<strong>br</strong> />

costumeiramente visto por todos que se aproximassem do prédio do Conselho e de suas<<strong>br</strong> />

circunvizinhanças. Sua voz baixa sintetizava a esmerada educação no trato com as pessoas e a<<strong>br</strong> />

fraqueza aparente de um corpo a aparentar mais tempo de vida do que efetivamente tinha. O andar<<strong>br</strong> />

era vagaroso e não revelava pressa no que fazia ou tinha de fazer. Escrupuloso, só se manifestava<<strong>br</strong> />

quando instado a fazê-lo, hábito incorporado ao seu modo de ser provavelmente em razão das<<strong>br</strong> />

funções das quais se ocupava junto aos intendentes do Conselho Municipal. Fácil era identificá-lo<<strong>br</strong> />

nas imediações do palácio em virtude do dólmã pendurado no pescoço, no qual se destacavam as<<strong>br</strong> />

armas douradas do Município, portado com o garbo e uma não disfarçada ponto de orgulho.<<strong>br</strong> />

Se durante o expediente permanecia o tempo todo no inte<strong>rio</strong>r do novo prédio a assistir os<<strong>br</strong> />

intendentes, após a rotina de trabalho, cumprido com a satisfação costumeira, ia flanar pelas ruas, a

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