Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
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Da Costa e Silva e o sincretismo<br />
Neste livro não encontra o leitor aquele vocabulário ostensivamente simbolista<br />
<strong>de</strong> Sangue, com que o poeta estreou em 1908; aqui, diríamos que o simbolismo é<br />
feito menos <strong>de</strong> aspectos exteriores, com Misereres, Santos Óleos, hortos e aleluias,<br />
e mais <strong>de</strong> recolhimento, refletindo toda uma visão <strong>de</strong> mundo. Por sinal, o poeta<br />
que, em Pandora, se comparava ao rio Parnaíba, o qual tornava triste tudo quanto<br />
refletia em suas águas, tem em Verônica um poema, “Sou como um Rio Misterioso”,<br />
composto <strong>de</strong> dois quartetos em que se alternam versos <strong>de</strong> oito e <strong>de</strong> <strong>de</strong>z sílabas:<br />
Sou como um rio que, <strong>de</strong> tanto<br />
Refletir sombras, se tornou sombrio...<br />
Rio <strong>de</strong> dor, rio <strong>de</strong> pranto,<br />
Ninguém sabe o mistério <strong>de</strong>ste rio.<br />
Rio <strong>de</strong> dor, rio <strong>de</strong> mágoas,<br />
Ocultando as imagens que refletes,<br />
Rolam em meu ser as tuas águas,<br />
Sob a treva e o silêncio, como o Letes...<br />
Às vezes o poeta volta-se para <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si e medita, como na “Litania das<br />
Horas Mortas”, composto em alexandrinos, muitos <strong>de</strong>les trímetros (com ictos<br />
nas sílabas 4 a , 8 a e 12 a ):<br />
Por estas horas <strong>de</strong> silêncio e solidão,<br />
Eu gosto <strong>de</strong> ficar só com o meu coração.<br />
É nestas horas <strong>de</strong> prazer quase divino<br />
Que eu me sinto feliz com o meu próprio <strong>de</strong>stino.<br />
Por estas horas é que a cisma me conduz<br />
Por estradas <strong>de</strong> treva e caminhos <strong>de</strong> luz.<br />
É nestas horas, quando em êxtase medito,<br />
Que sinto em mim a nostalgia do infinito.<br />
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