Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Esther <strong>de</strong> Figueiredo Ferraz<br />
Júnior, Francisco Venancio Filho, Vicente Licínio Cardoso, Gilberto Freyre,<br />
Sílvio Rabelo, Franklin <strong>de</strong> Oliveira, Olímpio Leite, Herbert Parente, Antonio<br />
Candido, João <strong>de</strong> Scantimburgo, Geraldo Mello Mourão e muitos mais. E foi<br />
preciso, diz este último, que aparecesse alguém como Miguel Reale, para fazer<br />
a exposição “da vera e completa imagem da figura poliédrica e perturbadora<br />
<strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s”, pois “só um espírito que tem lavrado todas as glebas do saber”,<br />
como o <strong>de</strong> Reale, po<strong>de</strong>ria, afinal, revelar-nos “a face oculta – todas as faces –<br />
do gênio <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s, lavrador também ele <strong>de</strong> todas as áreas do saber humano<br />
<strong>de</strong> seu tempo, até as mais avançadas, como a lógica matemática <strong>de</strong> Boole”.<br />
E se tantos intelectuais da mais alta envergadura tanto e tão bem escreveram<br />
sobre o fluminense <strong>de</strong> Cantagalo, o monstro sagrado que, embora <strong>de</strong>saparecido,<br />
e tragicamente, aos 43 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, legou ao País uma obra <strong>de</strong> imortal valor,<br />
que po<strong>de</strong>ria eu dizer ainda, a respeito, em condições <strong>de</strong> interessar um auditório,<br />
como este, altamente qualificado<br />
Limito-se, assim, a recorrer a um episódio <strong>de</strong> infância para falar sobre o<br />
“Meu Eucli<strong>de</strong>s da Cunha”, relatando como e quando a menina que eu fora,<br />
com nove anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, resi<strong>de</strong>nte em Mococa, cida<strong>de</strong> mojiana do interior paulista,<br />
teve o seu primeiro encontro espiritual com o gran<strong>de</strong> escritor que sabia<br />
haver residido por alguns anos na vizinha cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São José do Rio Pardo,<br />
construindo uma ponte e escrevendo um livro.<br />
Morávamos, então, meus pais, meus irmãos e eu, num casarão do Largo da<br />
Matriz, e minha literatura <strong>de</strong> ficção se limitava a um pequeno livro <strong>de</strong> Monteiro<br />
Lobato recém-publicado: Lúcia, a menina do narizinho arrebitado. Eu o <strong>de</strong>vorava,<br />
encantada, comparando as cenas <strong>de</strong>scritas no sítio <strong>de</strong> Dona Benta com as vividas<br />
por nós na Fazenda Sant’Ana da Serra que possuíamos em Cajuru, on<strong>de</strong><br />
passávamos as férias escolares.<br />
Mas chegou o momento em que eu já sabia <strong>de</strong> cor o texto <strong>de</strong> “Narizinho”, e<br />
ansiava por algo novo que me satisfizesse a insaciável curiosida<strong>de</strong> infantil. E<br />
um dia, pé ante pé para não <strong>de</strong>spertar a atenção dos adultos, dirigi-me ao escritório<br />
<strong>de</strong> meu pai, on<strong>de</strong>, numa bela estante <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira, se alinhavam os compêndios<br />
que ele utilizara em seu curso feito na Escola Politécnica <strong>de</strong> São Paulo, e os mais<br />
162