Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
Prosa (2) - Academia Brasileira de Letras
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Benedicto Ferri <strong>de</strong> Barros<br />
tido com a rima trai espíritos luxuriantes e mentes pletóricas a acumular imagem<br />
sobre imagem e metáfora sobre metáfora, esquecidas da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar<br />
claro o sentido. Temo assim que com <strong>de</strong>masiada freqüência se encontre o verso<br />
branco para <strong>de</strong>scrições exuberantes, argumentos loquazes e narrativas aborrecidas.<br />
[...] As palavras se multiplicam a ponto <strong>de</strong> obscurecerem o sentido; a atenção<br />
se <strong>de</strong>sloca da inteligência para o ouvido. O leitor divaga na jovial difusão, as<br />
vezes surpreso, por vezes <strong>de</strong>liciado; mas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> numerosas voltas pelo florido<br />
labirinto, sai como havia entrado. Pouco percebeu e nada guardou.” 15<br />
<br />
Chamando <strong>de</strong> ‘verso livre’ aquele em que o metro não é o mesmo para todas<br />
as linhas e <strong>de</strong> ‘verso branco’ aquele que não tem rima, no sentido <strong>de</strong> palavras que<br />
tenham igual terminação sonora ao fim <strong>de</strong> cada linha, a adoção do verso livre e<br />
branco, como recurso <strong>de</strong> maior liberda<strong>de</strong> criativa, não significa autonomia para<br />
indisciplina formal, licença com relação aos cânones e valores da construção<br />
poética, mas só se justifica se com essa liberda<strong>de</strong> se alcança uma forma superior<br />
<strong>de</strong> dicção e eloqüência poética, on<strong>de</strong> as soluções <strong>de</strong> ritmo e musicalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />
a<strong>de</strong>quação entre sentido e som sejam superiores às das formas convencionais.<br />
Em resumo, não se trata <strong>de</strong> abandonar quaisquer regras <strong>de</strong> estilo, mas <strong>de</strong> substituí-las<br />
por regras superiores, mais exigentes e mais apuradas.<br />
Observa Marjorie Boulton: “[...] o verso livre, que sem pieda<strong>de</strong> expõe qualquer<br />
falha psicológica ou estética, é o mais difícil <strong>de</strong> todos. [...] pois não há uma<br />
cadência repetida capaz <strong>de</strong> embotar a faculda<strong>de</strong> crítica do leitor [...] (nos versos<br />
não-livres) o leitor se acha tão impressionado pelo ‘rigor da forma’, que outras<br />
fraquezas, como as <strong>de</strong> inversões forjadas e insincerida<strong>de</strong>s, são <strong>de</strong>sculpadas.” 16<br />
<br />
15 I<strong>de</strong>m, p. 172.<br />
16 Boulton, Marjorie. The Anatomy of Poetry. Londres: Routledge & Kegan Paul, 1977, p. 148-49.<br />
198