Os viventesAs imagens não buscam semelhanças a serem alcançadas, ou reconhecidaspor sugestão. O que faz Nejar é ampliar a noção <strong>de</strong> ‘visibilida<strong>de</strong>’do real. Tudo o que ele diz une aquelas duas experiências antescitadas, <strong>de</strong> forma a que autor / leitor caminhem juntos na compreensãoe interpretação do poema. Mas o conhecimento <strong>de</strong>ssa linguagemnão é tão fácil, quando somos convocados a dar respostas aindagações como estas:Que distância pai, entre a casa e a rua?Há nessa pergunta uma suspensão do pensamento, uma atmosferavaga, imprecisa, já que o verso “se foi <strong>de</strong>smoronada” não é o quese espera da indagação “Que distância, pai, entre a casa e a rua?”. Éuma situação mais apropriada à análise das artes plásticas. Não é só acasa que <strong>de</strong>smorona. Também a rua po<strong>de</strong> <strong>de</strong>saparecer, dando lugar auma praça, um mercado, uma escola, um asilo, ou algo que representaameaça à vida dos vizinhos, por exemplo: um quartel. O poetaprocura romper não só com a idéia <strong>de</strong> ritmo, equilíbrio, unida<strong>de</strong>,mas também com a lógica do pensamento, tal como não a reconheceriaa linguagem da comunicação, para dar lugar à expressão idiomática,poética, portanto. O poema intitula-se “Casa dos nomes”. Eos nomes têm muita importância em poesia, como o comprova opoema <strong>de</strong> Dante, tão clássico e tão mo<strong>de</strong>rno, escrito com os nomes<strong>de</strong> pessoas que efetivamente tiveram vida histórica, aos quais se associaramalguns mitos, que, afinal, como nos ensina o poeta do Ulisses,são “nada” e são “tudo”.A força das alusões e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> associação também estão presentes,quando fala dos avós Georgina e Antônio Miguel, <strong>de</strong>itados, à semelhançados personagens <strong>de</strong> “Evocação do Recife”, ambos dormindoprofundamente. Suas fotografias, ao per<strong>de</strong>rem a cor, alu<strong>de</strong>mà viagem no tempo, a marcar a distância dos olhos e das roupas <strong>de</strong>s-157
César Lealcoloridas. Caladas laranjas junto ao sangue, imagens <strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>ntemo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, ao menos para aqueles que lêem a poesia mundial –que <strong>de</strong>ve ser lida diariamente.Assim, tanto o leitor comum quanto os críticos especializadosterão a seu alcance referenciais seguros, ao avaliar a importância dospoemas escritos no Brasil, país on<strong>de</strong> se escreve boa poesia. E para oseu prazer – do leitor e do crítico – ao ler os mil estilos <strong>de</strong> poesia quese escreve no mundo, não busquem louvar, apenas por capricho ou máconsciência, apenas o lixo que se escreve em língua portuguesa com onome <strong>de</strong> ‘poesia’, às vezes inspirada na filosofia do nada,emumcontextocultural on<strong>de</strong> se cultiva tão pouco a filosofia da arte. A tal pontoque, em breve, sistematizaremos tal filosofia e acabaremos formandodoutores em Teorema do Nada. No Brasil, não há sentimentos fraternaisentre poetas e críticos, mas apenas idiossincrasias, que anulam reciprocamenteos melhores valores <strong>de</strong> nossa literatura, ficando as obrasliterárias entregues a colunistas preconceituosos, <strong>de</strong>spreparados, a serviçoexclusivo <strong>de</strong> grupos sectários, além <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>iros ‘Guardas <strong>de</strong>Sião’ das editoras, como os <strong>de</strong>nominava o gran<strong>de</strong> Ernst Robert Curtius.É tal espírito que Antero <strong>de</strong> Quental viu na poesia portuguesa emsuas Conferências no Cassino Lisboense, ao mostrar o “quadro <strong>de</strong> insignificância”a que chegaram Portugal e Espanha entre os séculos XVII e oséculo XIX. “Saímos <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> homens vivos, movendo-seao ar livre; entramos num recinto sepulcral, com uma atmosfera turvapelo pó <strong>de</strong> livros velhos, e habitado por espectros <strong>de</strong> doutores” – diziaele, acusando a poesia portuguesa <strong>de</strong> haver se transformado em meracópia do passado, interessada apenas em traduções e sem nenhum espíritoinventivo. Claro que precisamos <strong>de</strong> traduções. Todavia, maisimportante é a criação <strong>de</strong> obras sérias e não “brincos <strong>de</strong> crianças”, <strong>de</strong>que falava Quental em seus discursos no Cassino. Tal espírito–oespíritoinventivo – era consi<strong>de</strong>rado um perigo pelos autores da época.Por isso, o poeta <strong>de</strong> Os viventes diz:158
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