Diretrizes do culturalismo<strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>s próprias do sujeito cognoscente como tal e que, por seremcondicionantes do saber, ele as <strong>de</strong>clarava transcen<strong>de</strong>ntais ou a priori,isto é, anteriores ao conhecimento mesmo. Noto que não há comoconfundir transcen<strong>de</strong>ntal com transcen<strong>de</strong>nte, visto ultrapassar este as relaçõesentre o sujeito cognoscente e a experiência, sendo, por isso, aseu ver, incognoscível (o absoluto).Em última análise, a partir <strong>de</strong>sses pressupostos, segundo Kant, seriamcientificamente cognoscíveis somente os fenômenos da natureza,havendo uma vinculação incindível entre teoria da natureza e teoriado conhecimento, só po<strong>de</strong>ndo a ética resultar <strong>de</strong> imperativos que emanamimediata e diretamente da consciência como imperativos categóricos.Por outro lado, a história, ou por melhor dizer, os fatos históricossó po<strong>de</strong>riam ser objeto <strong>de</strong> conjeturas, colocação esta que eu iria<strong>de</strong>pois reviver, mas com outra significação, no meu livro Verda<strong>de</strong> econjetura, no qual também analiso o problema da metafísica para alémdo mundo fenomenal.Po<strong>de</strong>-se dizer que gran<strong>de</strong> parte da filosofia, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Kant, sepropôs a superar o impasse por ele criado entre natureza e cultura,ou natureza e história, com a exclusão da ética do plano do experienciável,o que era grave, por ficar a liberda<strong>de</strong> humana insuscetível <strong>de</strong> terseu valor <strong>de</strong>monstrado ao longo do processo histórico. Daí o gigantescoesforço <strong>de</strong> Hegel no sentido <strong>de</strong> tudo englobar em sua concepçãomonista e dialética da história, na qual “o que é real é racional e oque é racional é real”.No meu enten<strong>de</strong>r, superado o monismo hegeliano, por sinal queconvertido por Marx em materialismo histórico, era preciso voltaràs origens da teoria do conhecimento, para revisá-la. Foi o que fezHusserl, que, embora reconhecendo a existência <strong>de</strong> condições subjetivasno ato cognoscitivo, <strong>de</strong>clara necessário indagar também <strong>de</strong> suas condiçõesobjetivas, ou seja, das pertinentes às coisas mesmas, para as quais sedirige a consciência intencional, a qual não as po<strong>de</strong>ria captar se nelasnão houvesse algo que as torna apreensíveis e que constituem o que61
Miguel Realeele <strong>de</strong>nominou a priori material, dando, <strong>de</strong>sse modo, valor tanto ao sujeitoque conhece quanto ao objeto conhecido. Dado esse passo, foipossível a Max Scheler e Nicolai Hartmann reintroduzir a ética nomundo do conhecimento e da cultura, ao mesmo tempo que os renovadosestudos sobre o valor (axiologia), a partir das últimas décadasdo século XIX, permitiram que ele fosse o elemento mediadorentre natureza e cultura, ou, como prefiro dizer, entre o que é e o que<strong>de</strong>ve ser, iluminando o sentido a ser dado ao objeto cultural, que “é enquanto<strong>de</strong>ve ser”. Nem se po<strong>de</strong> esquecer que se <strong>de</strong>ve a Bergson a façanha<strong>de</strong> <strong>de</strong>svincular a liberda<strong>de</strong> dos nexos causais da natureza, sem oque não teria sido possível reconhecer-se a autonomia da cultura.Lembrado, nesse breve escorço histórico, como veio se <strong>de</strong>lineandoo culturalismo – que, no Brasil, teve como precursor Tobias Barretoao correlacionar Kant com o antropólogo Hermann PosteojuristaJhering – cabe-me observar que, segundo minhas últimas meditações,há um terceiro a priori a consi<strong>de</strong>rar, o relativo às condiçõesexistenciais da correlação sujeito/objeto no plano do conhecimento:é o a priori cultural, transcen<strong>de</strong>ntalmente inerente ao ato <strong>de</strong> conhecer.Em verda<strong>de</strong>, a cultura não é algo que vem <strong>de</strong>pois – como geralmentese pensa – mas é coeva e concomitante com o surgimentodo ser humano na face da Terra, como o comprovam seus instrumentose <strong>de</strong>senhos encontrados nas cavernas primitivas. Essa projeçãoda cultura à origem do homem altera radicalmente a problemáticado culturalismo, po<strong>de</strong>ndo-se afirmar que a cultura é “a objetivizaçãodas intencionalida<strong>de</strong>s humanas ao longo da história”, a partir danoção <strong>de</strong> que “conhecer é conhecer algo no mundo”.Husserl, com o seu conceito <strong>de</strong> Lebenswelt (mundo da vida) distinto domundo dotado <strong>de</strong> categorias cognoscitivas, tal como, por exemplo, omundo da ciência – abre caminho à admissão <strong>de</strong> um a priori cultural.Éque o Lebenswelt não representa uma fase anterior da evolução histórica,mas constitui uma realida<strong>de</strong> perene, a qual coexiste com o mundo sujeitoa diversas formas <strong>de</strong> categorização resultantes do po<strong>de</strong>r nomoté-62
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