Eça <strong>de</strong> Queirós e Eduardo Pradopessoas. Foi neste século que o povo <strong>de</strong>generou em massa. Esse é osentido que lhe atribuiu Ortega y Gasset. 10Com sua admirável inteligência, aberta aos fenômenos <strong>de</strong> seutempo, Eduardo Prado afuroou os dias vindouros, ao observar a suapátria retaliada pelas facções, governada, arbitrariamente, pelosusurpadores do po<strong>de</strong>r, e intoxicada pelo jacobismo. Foi contra esseconjunto <strong>de</strong> males que se ergueu, tomado <strong>de</strong> ira santa, e vergastou oregime. Intuitivamente, previa Eduardo, o seu povo se transformariaem massa, para os políticos sem raízes na tradição, sem compromissoscom a História, sem o pundonor, que <strong>de</strong>ve revestir todas as suasfacetas, e o fez com inegável beleza. Prado nunca foi um dândi <strong>de</strong>boulevard, um sibarita, a quem a fortuna havia proporcionado lazerespara as viagens. Era, no exato sentido da palavra, o patriota, que nãohesitou em se indispor com o governo da República, quando viu queesta abalava o antigo edifício das suas mais caras convicções políticase sociais. Eça <strong>de</strong> Queirós também fizera o mesmo na sua pátria. Des<strong>de</strong>os trabalhos da mocida<strong>de</strong>, Uma campanha alegre, até As cida<strong>de</strong>s e as serrasEça mostrou sempre o seu robusto patriotismo, o amor ao torrãonatal, que a tempesta<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ológica da Revolução Francesa <strong>de</strong>sfigurara.Usou nos seus primeiros escritos a férula da ironia, em que erafortíssimo, chegando até a repercutir no Brasil, 11 contra os solapamentosjacobinos, herdados das transformações sociais, políticas eeconômicas do século XVIII e primeira meta<strong>de</strong> do século XIX.Cada qual – Eça e Eduardo – em sua esfera, alanceava-se <strong>de</strong> amarguradiante do espetáculo que a mediocrida<strong>de</strong> política exibia nagran<strong>de</strong> cena <strong>de</strong> cada nação. Reagiram como pu<strong>de</strong>ram, como acharammais conveniente para a finalida<strong>de</strong> que se propuseram. Ambospagaram pesadíssimo tributo, durante a vida, pelas atitu<strong>de</strong>s assumidasna área política. Quando Eça escreveu o soberbo perfil <strong>de</strong> EduardoPrado, a República brasileira já tinha nove anos e estava consolidada.Mas Eduardo não ce<strong>de</strong>u em suas convicções. Prosseguiu,10 Ortega yGasset, Larebelión <strong>de</strong> lasmassas. Madri,Espasa-Calpe,1932, pp.1063-1178, inObras completas.11 PauloCavalcanti, Eça<strong>de</strong> Queirósagitador no Brasil.São Paulo,CompanhiaEditorialNacional,1966, passim.79
João <strong>de</strong> Scantimburgo12 EduardoPrado, A ilusãoamericana. SãoPaulo, Ibrasa,1980, passim.combatendo-a, fiel aos seus princípios. Eça, monarquista, partilhavaos dissabores do amigo caríssimo. Cultuando a História, esse estudo“<strong>de</strong>senvolveu nele um dos seus fortes sentimentos inatos – o amordo Passado”. Eduardo amava, efetivamente, o passado, com o seucortejo <strong>de</strong> glórias e <strong>de</strong> reveses, <strong>de</strong> tristezas e alegrias, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>za emiséria, mas amava-o para ter do presente visão mais segura. “Esteculto do Passado não só atua sobre o <strong>de</strong>senvolvimento incansável dasua cultura – mas dirigiu docemente a evolução da sua consciência”;e acentua poeticamente: “... a Beatriz Teológica que no meio da sua‘estrada’ (...) o tomou pela mão, o iniciou, era criatura toda <strong>de</strong> beleza– e a augusta Poesia do Passado cantava na sua voz persuasiva.”Eduardo foi, por isso, um revoltado contra a nacionalida<strong>de</strong> americanaque, sem ter compromissos com a História, com o passado,com eras pretéritas, concorrera, <strong>de</strong>cisivamente, para aluir o formosoedifício da monarquia bragantina. Panfletário <strong>de</strong> talento, Eduardoinvestiu contra os Estados Unidos, e <strong>de</strong>u a público libelo <strong>de</strong>scarnandoos males do republicanismo norte-americano em A ilusão americana.12 Quando os Pais Fundadores criaram os Estados Unidos, comorepública, dotando-a <strong>de</strong> um presi<strong>de</strong>nte eleito a prazo certo, puseramem movimento uma formidável revolução que, em poucos anos,conquistaria o mundo. Na lista negra <strong>de</strong> Eduardo, os Estados Unidosentravam em primeiro lugar, não por um preconceito racial, <strong>de</strong>que foi argüido maliciosamente por inimigos encapuçados ou ostensivos– pois freqüentou os Estados Unidos antes <strong>de</strong> conhecer a Europa–, mas por ver neles o fator prepon<strong>de</strong>rante das transformações,em cuja esteira seriam arrastadas as monarquias, centros <strong>de</strong> estabilida<strong>de</strong>,<strong>de</strong> permanência, <strong>de</strong> respeito à tradição. Eduardo observavaque o mundo se pusera a mudar <strong>de</strong>pois que os Estados Unidos passarama ostentar uma vitalida<strong>de</strong> sem paralelo no mundo, fruto <strong>de</strong> variadascircunstâncias, já <strong>de</strong>masiado estudadas por seus contemporâneos,que os Estados Unidos haviam aberto, por osmose, essa força80
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