Chicos 45
e-zine literária de Cataguases - MG
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<strong>Chicos</strong> <strong>45</strong><br />
Luiz Ruffato<br />
Nasceu em Cataguases MG, reside em São Paulo SP. Entre<br />
tantas obras de sua autoria destacam-se: Eles eram muitos cavalos,<br />
de 2001, ganhou o Troféu APCA oferecido pela Associação<br />
Paulista de Críticos de Arte e o Prêmio Machado de Assis da<br />
Fundação Biblioteca Nacional. Esse livro o tornou um escritor<br />
reconhecido no país. Em 2011 concluiu o projeto Inferno Provisório,<br />
com a publicação do romance Domingos Sem Deus,<br />
iniciado com Mamma, son tanto Felice em 2005, composto por<br />
cinco livros sobre o operariado brasileiro.<br />
Luiz Ruffato ocupa um lugar especial na<br />
literatura brasileira. Eles eram muitos cavalos<br />
tornou-se um romance cultuado, que registrou<br />
numa prosa incomum as muitas vozes da cidade<br />
de São Paulo.<br />
O projeto Inferno provisório, saga composta<br />
de cinco volumes, tem poucos paralelos nas<br />
nossas letras: ambicioso, vasto e singular,<br />
acompanha por décadas a trajetória de vários<br />
personagens de classe média baixa. De mim já<br />
nem se lembra trata de assuntos caros ao autor:<br />
a família, o tempo, a memória. Mais uma<br />
vez, Ruffato irá transformar um pequeno episódio<br />
familiar em oportunidade para falar de<br />
seu país e de sua sociedade. Ao abrir uma pequena<br />
caixa encontrada no quarto da mãe falecida,<br />
a caixa na qual ela “abrigara seu coração<br />
esfrangalhado”, o narrador se depara com um<br />
maço de cartas cuidadosamente atadas por um<br />
cordel. Escritas pelo irmão, vitimado por um<br />
acidente automobilístico, e dirigidas à mãe,<br />
essas cinquenta cartas reconstituem um passado:<br />
ao mesmo tempo que ilustram as mudanças<br />
políticas, econômicas e culturais durante a<br />
ditadura militar brasileira, convidam o leitor a<br />
espreitar a memória de uma família com<br />
“olhos derramando saudades”.<br />
Neste livro, o autor recupera a antiga tradição<br />
do romance epistolar, transfigurando-a - em<br />
vez de uma troca de correspondência ordenada<br />
cronologicamente, em De mim já nem se lembra<br />
há apenas uma voz, no espaço e tempo imprecisos<br />
da ausência.<br />
DE MIM JÁ NEM SE LEMBRA<br />
Autor: Luiz Ruffato<br />
Editora: Companhia das Letras (144 p., R$34,90)<br />
TRECHO:<br />
"No quarto, escancarei o guarda-roupa: pendurados<br />
em cabides de arame, desolados vestidos<br />
abraçavam-se pânicos, compreendendo<br />
que aquela a quem um dia haviam servido, essa<br />
não regressaria jamais. E pus-me à tarefa,<br />
antes que, apavorado, recuasse. Não dobrei<br />
saias e blusas, camisola e calça-comprida: enfiei-as<br />
maquinalmente em duas bolsas de napa<br />
(...). Surpreendi-me com o mínimo de suas coisas<br />
– eu, que julgava sabê-la. Bateei gavetas,<br />
surgiram lenços-de-cabeça e intimidades, lençóis<br />
e cobertas, toalhas e documentos, fotografias,<br />
lembranças. Sob a cama-de-casal, uma pequena<br />
e ignorada caixa retangular de madeira.<br />
Puxei-a (...) e, ao abri-la, interromperam-se os<br />
preparativos da pachorrenta segunda-feira: ali,<br />
minha mãe abrigara seu coração esfrangalhado."<br />
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