Chicos 45
e-zine literária de Cataguases - MG
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<strong>Chicos</strong> <strong>45</strong><br />
Só o óculo, no topo da cúpula, oito metros de<br />
diâmetro. Fico abobado com a abóbada,<br />
‘cimentada’ com lava do Vesúvio e gordura de baleia,<br />
coisa de 2100 anos, e inteirinha. Este, sim, é o<br />
maior espetáculo da Terra. No chão, túmulos de<br />
Rafael, Vittorio Emmanuelle, o unificador da Itália,<br />
rainha Margherita e outros. Perto, a igreja de<br />
San Luigi dei Francesi, que possui uns belos quadros<br />
de Caravaggio, e Fontana delle Tartarughe,<br />
tudo cor de ferrugem, o mármore como que imitando<br />
o interior do casco delas, os prédios em volta,<br />
vou acabar ficando doido. Entardece, o jeito é<br />
procurar um bar e descansar os meus ossos.<br />
Próximo ao hotel, vejo noiva negra e familiares<br />
indo à igreja próxima, pro casório. Cortejo<br />
nupcial a pé, só vi na roça, mas entende-se: negros,<br />
aqui, devem viver mal, ainda que, por certo,<br />
melhor do que na África. Entro numa trattoria<br />
e me encharco de vinho, minestrone, bife de porco<br />
grelhado, ao limão, gorgonzola, tudo bom.<br />
Elogio o limão e o velho garçom diz, orgulhoso:<br />
‘Si, naturalmente, è italiano!’. Limão casca grossa,<br />
amarelo, suculento, azedocicado, já elogiado<br />
por Goethe (e hoje vendido em mercado de Cataguais).<br />
O pão também é melhor, como na Espanha,<br />
farinha pura. E mais um vinho e outro.<br />
Dia seguinte, vou conhecer as principais<br />
ruínas. Quase me dou mal ao cortar caminho para<br />
o Coliseu, descendo por uma escadaria em que<br />
umas dez ciganas me cercam, pedindo un denaro<br />
per mangiare. Desço correndo e elas me xingando,<br />
não sei em que língua. Neste lugar deserto<br />
poderiam depenar-me com facilidade, porca miseria!<br />
O Coliseu, coitado, tão depredado pelos<br />
bárbaros, servindo seus mármores também para<br />
ornamentar igrejas, até o altar do papa. Contudo,<br />
imponente como ele só. Ao lado, o Arco de<br />
Constantino, em bom estado, ainda que ‘in restauro’,<br />
como quase tudo, na Itália, sinal de prosperidade.<br />
O Fórum Romano: era daqui que comandavam<br />
o império. Subo a colina palatina e descubro<br />
que não gosto de ruínas, fico angustiado,<br />
muito pouco para os olhos e muito demais para a<br />
imaginação. Gosto de coisas inteiras, como o Pan<br />
theon. Ruínas eram tidas como lugares malassombrados<br />
até que Petrarca lhes deu valor, já<br />
no fim da Idade Média. Foi também o primeiro a<br />
valorizar as paisagens, ao escalar uma montanha<br />
em Avignon, na França.<br />
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