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Livro Mídia, Misoginia e Golpe

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Mídia, Misoginia e Golpe<br />

gente sabe que a Dilma foi torturada, que já sofreu esse tipo de violência. E aí o tom é<br />

de um ódio dela, da figura dela, mesmo na boca das mulheres, não só na boca de<br />

homens. No caso da mídia também, porque obviamente essas mídias hegemônicas têm<br />

lugares mais masculinos do que femininos na nossa sociedade. O jornal, por exemplo, é<br />

pensado como algo masculino. A gente vê essa imprensa hegemônica usar apelos<br />

misóginos, usando recursos de uma violência contra a mulher que é muito naturalizada<br />

na sociedade brasileira. O tipo de crítica que se faz à Dilma —‘ela é uma louca’, ‘ela é<br />

uma vaca’, ‘merece ser estuprada’—, é algo que está muito naturalizado na nossa<br />

sociedade. Não quer dizer que toda a sociedade pense igual, mas é algo que faz eco a<br />

formas de pensar muito misóginas, que ainda operam no Brasil. O Brasil é muito<br />

grande e muito heterogêneo, não estou dizendo que todo mundo concorda com isso,<br />

de jeito nenhum, mas eu diria que a mídia pegou carona nesse machismo difuso que<br />

nós temos e operou a partir daí. Isso fica mais evidente quando a gente vê o que eles<br />

fizeram com a primeira-dama [Marcela Temer] pós-impeachment. Eu acho que a<br />

misoginia fica muito marcada, porque tratar a moça como ‘bela, recatada e do lar’, não<br />

me importa qual é a história da Marcela Temer, eu estou falando dessa construção<br />

absolutamente retrógrada de ‘vamos colocar as mulheres no seu devido lugar’. Do meu<br />

ponto de vista, a revista Veja dizendo ‘olha, que linda, que moça bonitinha’ e depois<br />

Marcela faz o anúncio do Criança Feliz (quer dizer, ela é infantilizada e ridicularizada no<br />

próprio nome do programa) com aquela roupinha de Cinderela. Aquela imagem está<br />

dizendo ‘moças, o bom é vocês se comportarem’. Isso quando a gente tem, desde<br />

2014, um crescimento de denúncias de violência contra as mulheres, de estupro, de<br />

violência doméstica, um número cada vez maior de violências brutais contra jovens,<br />

adolescentes, as meninas assassinadas em viagem, a menina assassinada em Buenos<br />

Aires. Tem aparecido mais a violência contra a mulher, porque tem um crescimento do<br />

movimento feminista jovem, que está nas universidades, que está nas escolas e que<br />

está funcionando pela internet também. No momento em há mais visibilidade de uma<br />

luta por igualdade, por respeito, etc., a mídia promover a imagem dessa moça como<br />

primeira-dama, com todo o histórico do que é a figura dela, é exatamente o sinal do<br />

retrocesso que está materializado em projetos de lei como o Estatuto do Nascituro, que<br />

impede o aborto pós-estupro, que é um dos raros casos legalizados, quando nós do<br />

movimento feminista estamos lutando para melhorar o atendimento, para garantir este<br />

direito que nos parece ainda restrito. O que eu imaginava há cinco anos, ‘estamos<br />

lutando para melhorar o Brasil’, agora a gente está lutando só para não voltar atrás na<br />

questão de gênero. A nossa luta feminista agora é uma luta para não caminhar para<br />

trás, não piorar a situação das mulheres. Infelizmente, a nossa sensação é de que está<br />

piorando.<br />

|Você considera que o impeachment de Dilma Rousseff terá algum impacto na<br />

participação feminina na política? Em que sentido?<br />

Eu não sei se vai ter impacto, qual impacto exatamente tem. O que eu acho é<br />

que o Brasil tem muito pouca participação feminina na política. A gente já parte de<br />

uma situação muito desvantajosa, muito desigual. Eu vejo dois movimentos<br />

acontecendo ao mesmo tempo, tanto essa luta feminista crescendo, e aqui eu estou<br />

pensando nessa eleição que a gente teve em São Paulo para vereador, o fato de que<br />

pelo menos duas vereadoras se elegeram com uma pauta abertamente feminista, a<br />

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