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Livro Mídia, Misoginia e Golpe

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Mídia, Misoginia e Golpe<br />

ascensão dos excluídos, das classes mais pobres. O ódio dessa classe média é à<br />

pequena ascensão que esses pobres tiveram entre nós. Só não vê isso quem não quer.<br />

|Em algum aspecto você acha que a questão de gênero foi relevante junto à<br />

imprensa e à opinião pública a influenciar a cobertura do processo de impeachment?<br />

Dê exemplos.<br />

Eu acho que sim. Mas eu tenho uma opinião e sei que eu não vou agradar muita<br />

gente dizendo isso. Mas, enfim, meu primeiro compromisso é com a verdade. Eu acho<br />

que a questão de gênero é sempre importante nesses casos. Obviamente, o fato de<br />

Dilma ser mulher permitiu um determinado tipo de violência, mas isso não foi o<br />

aspecto principal e eu acho que retira, inclusive, a clareza do que aconteceu ao ficar-se<br />

concentrando nesse aspecto. Eu acho que esse aspecto deu uma virulência adicional ao<br />

processo e criou um tipo de ódio peculiar, mas ele não foi decisivo para o ponto<br />

principal, que é o quê? Sempre o ponto principal é: distribuição de riqueza e poder.<br />

Distribuição de riqueza e poder é classe social, não classe percebido de modo<br />

superficial como renda, mas classe como uma criação familiar, escolar, de pessoas que<br />

vão ter acesso diferenciado a todos os bens e recursos escassos e que está ligada a uma<br />

forma simbólica, ou seja, a gente percebe quem é pobre e quem não é por mil razões,<br />

a roupa, por exemplo, e há toda uma hierarquia montada para que a gente perceba<br />

isso e trate diferencialmente o pobre e o rico. Então, a classe, para mim, é o elemento<br />

principal e o racismo de classe é muito mais importante. Com isso não nego o racismo<br />

de cor e a questão de gênero, que dão virulência adicional a isso. Mas eu acho que a<br />

gente não conhece o lobo, a gente não percebe o principal se a gente não tocar na<br />

questão de classe, é ela que vai estruturar a chance de todos os indivíduos para ter<br />

acesso à riqueza e ao poder, que é o que importa, isso é o aspecto essencial. Acho que<br />

para clareza da exposição é importante essa hierarquia das causas, porque se a gente<br />

confundir a questão machista vira o principal, mas não é. O principal é que esse pessoal<br />

quer vender as nossas riquezas, quer deixar a população pobre sem acesso à saúde e à<br />

educação, e o que vai acontecer aqui vai ser uma terra arrasada para os mais frágeis<br />

socialmente, e aí, claro, as mulheres, os negros vão ser ainda mais penalizados. Mas o<br />

aspecto principal é sempre a distribuição de riqueza e poder, onde entra a questão de<br />

gênero também, de um modo extremamente importante, mas ela entra subordinada à<br />

questão do acesso de classe inteiras, pois obviamente a posição de mulheres que estão<br />

em uma classe alta é muito distinta das mulheres que estão em uma classe baixa. As<br />

coisas são muito mais complexas e muitas questões são relevantes, não estou negando<br />

isso, mas no caso da deposição da presidenta tem aspectos que são mais importantes<br />

do que a questão de gênero. Se todas as causas forem importantes, o que a gente tem<br />

é uma confusão.<br />

|Então, você considera que a questão de gênero não foi determinante para o golpe<br />

de 2016?<br />

Claro, aliás, os outros golpes foram dados em cima de homens que estavam<br />

defendendo causas sociais semelhantes. Getúlio Vargas era um homem e foi colocado<br />

em uma situação que ele teve que se suicidar, digamos assim. Jango [João Goulart] era<br />

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