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Livro Mídia, Misoginia e Golpe

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Mídia, Misoginia e Golpe<br />

O texto é uma peça de como a mídia passa a usar da pessoalização, argumentos<br />

e análises extra-políticas para demolir a pessoa, o caráter, construindo um personagem<br />

de ficção em que a Presidenta é comparada com “Maria, a Louca”, uma “autista” com<br />

uma retórica “cretina” e cuja permanência significa uma ameaça de “volta do terror”.<br />

Passam de um estereótipo, “a gerentona masculinizada”, para outro: o da<br />

mulher acuada e descontrolada que responde a um ataque político não com<br />

articulação, atos, ações e discursos, mas como uma mulher histérica e furiosa<br />

quebrando móveis.<br />

Os adjetivos utilizados para desqualificar a Presidenta mulher fazem parte de<br />

um extenso vocabulário moral, científico, médico e psicanalítico de destituição do<br />

feminino como força política, como sujeito social e como modo de ser e existir:<br />

mulheres irascíveis, fora de si, vingativas, destemperadas e moralmente e<br />

psicologicamente condenáveis! “Elas” seriam incapazes de conduzir a política e estar<br />

no comando de um País.<br />

|Você considera que o impeachment de Dilma Rousseff terá algum impacto na<br />

participação feminina na política? Em que sentido?<br />

Acho que o impeachment de Dilma Rousseff ativou a preocupação com a baixa<br />

representação feminina em todas as esferas de poder e de decisão. Ficou claro que<br />

para mudar a cultura política misógina será preciso mais do que a Lei de Cotas que<br />

estabelece uma proporção mínima e máxima de candidatura por gênero a cada pleito<br />

nos partidos. Ou seja, a Lei de Cotas para as mulheres não é cumprida porque não<br />

bastam medidas de cima para baixo (são um avanço, mas a mudança não acontece por<br />

lei nem decreto), tem que mudar a mentalidade de uma sociedade patriarcal, de uma<br />

mídia que dá pouca visibilidade às mulheres ou as deixa em um lugar secundário e que<br />

reforça estereótipos sobre “o lugar das mulheres”, seus papéis sociais e toda uma série<br />

de preceitos, etiqueta e comportamentos restritivos para as mulheres, narrados e<br />

repetidos cotidianamente. A forma como a mídia e o jornalismo cobrem as ações<br />

políticas das mulheres, seu reforço de estereótipos, e o modo como cobriram o<br />

processo de impeachment de Dilma Rousseff produziu todo um campo de análise dos<br />

discursos e ativou grupos, redes de solidariedade e sororidade entre as mulheres. Uma<br />

empatia entre mulheres que ganhou força e visibilidade nas redes sociais e nas ruas e<br />

pode se traduzir em um aumento da atenção a questão da participação das mulheres<br />

na política.<br />

|Qual a sua avaliação sobre a forma como a deposição da presidenta repercute nas<br />

políticas públicas voltadas para as mulheres e nos protagonismos femininos em<br />

diversos campos da sociedade civil?<br />

A deposição da presidenta e a consolidação do processo do impeachment,<br />

comandado por homens, se refletiu negativamente nas primeiras ações do governo<br />

Temer, extremamente criticado por compor seu governo com uma maioria de homens,<br />

o que foi considerado um retrocesso. Nesse sentido o golpe foi duplamente misógino,<br />

contra uma mulher e diminuindo a visibilidade e participação das mulheres no governo<br />

ilegítimo. Essa situação, por outro lado, fez emergir muitos movimentos de resistência<br />

e ação feministas.<br />

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