19.03.2018 Views

Catálogo "Tempo Presente"

Catálogo da exposição "Tempo Presente", com textos críticos e fotos das obras dos oito artistas integrantes: Tomie Ohtake, Gisela Motta e Leandro Lima, Laura Vinci, OPAVIVARÁ!, Nazareno, Raquel Kogan e Laura Belém. Curadoria de Amanda Dafoe e Rodrigo Villela.

Catálogo da exposição "Tempo Presente", com textos críticos e fotos das obras dos oito artistas integrantes: Tomie Ohtake, Gisela Motta e Leandro Lima, Laura Vinci, OPAVIVARÁ!, Nazareno, Raquel Kogan e Laura Belém. Curadoria de Amanda Dafoe e Rodrigo Villela.

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

certo estranhamento, diante do desconhecido, do que<br />

não faz sentido.<br />

Para esta exposição, o artista apresenta quatro desenhos<br />

em que explora relações com a infância, com elementos<br />

do cotidiano, de suas condutas e a maneira como se relacionam<br />

umas às outras.<br />

Como no mito de Narciso, as placas de cobre que brilham<br />

de tão lisas, mimetizam o espelho d’água ao permitirem<br />

nos vermos refletidos em suas superfícies. Algo distorcidos,<br />

meio opacos, como nas águas turvas de um rio ou de um<br />

lago, em que se deu o reflexo e encantamento de Narciso.<br />

A imagem refletida é meio fantasmagórica como nos espelhos<br />

da antiguidade que eram metais polidos, como<br />

esses presentes nos desenhos. Faz esse uso hoje com a<br />

chapa de cobre, metal condutor de energia que encontra<br />

o corpo no espelhamento do metal – cria assim uma imagem<br />

‘enérgica’ que o metal conduz.<br />

Visualizável em duas alturas, permite que crianças se vejam<br />

na parte de baixo dos desenhos e que adultos o façam<br />

na parte superior. Une portando os dois mundos nos<br />

desenhos.<br />

A fala de Nazareno quando comenta a própria obra é a<br />

de quem conta histórias que se entrelaçam, umas às outras.<br />

É o que acontece nesta mostra. São quatro desenhos<br />

grandes. Cada qual desencadeando o desenho seguinte.<br />

Mesmo com títulos desconexos, meio absurdos, trazem<br />

justamente uma unicidade temática, desconexa, no<br />

entanto, pelos títulos atribuídos e, por isso também, não<br />

dependentes. Os trabalhos guardam autonomia entre si,<br />

no estranhamento que provocam e nas alturas que foram<br />

pensadas para o público, fora dos padrões das exposições<br />

museológicas vistas nos museus que não levam em consideração<br />

as muitas estaturas do público.<br />

O espelhamento das chapas de cobre faz com que o observador<br />

procure o seu reflexo ao tentar se enquadrar no<br />

desenho emoldurado. O trabalho propõe colocar o público<br />

observador adulto na condição da criança quando é<br />

preciso se curvar para se ver na parte debaixo desses desenhos.<br />

Tudo é meticulosamente composto.<br />

Em E antes os cães que por aqui passaram, de 2017,<br />

Nazareno fala da evolução humana. Do mundo que os<br />

humanos dividem com os cães. Uma relação que se confunde<br />

com a história da própria evolução humana.<br />

lake, where the reflection and enchantment of<br />

Narcissus took place.<br />

The reflected image is quasi-phantasmagoric,<br />

like the mirrors in antiquity which were polished<br />

metals, like those present in the drawings.<br />

Making this use today of the copper plate,<br />

an energy-conducting metal that encounters<br />

the body in the mirroring metal, an “energetic”<br />

image is created which the metal conducts.<br />

Visible at two heights, children can see themselves<br />

in the lower part of the drawings as<br />

adults can in the upper part. Both worlds are<br />

connected in the drawings.<br />

When Nazareno comments on his own work,<br />

he speaks like someone who tells stories that<br />

intertwine with one another. This is what happens<br />

in the exhibition. There are four large<br />

drawings, each leading to the next. Even with<br />

the disjointed, half-absurd titles, what they<br />

bring is a thematic unity, though unconnected<br />

by the assigned titles and, for this reason as<br />

well, not dependent. The works maintain their<br />

autonomy, in the strangeness they provoke, and<br />

at the heights that were intended for the public,<br />

very different from the standard criteria of<br />

museological expositions that do not take the<br />

different heights of the public into account.<br />

The mirroring of the copper plates causes the<br />

observer to look for his reflection when trying to<br />

fit himself in the framed drawing. The work proposes<br />

to place the adult observer in the position<br />

of a child since he needs to bend down in order<br />

to see himself in the lower part of these drawings.<br />

Everything is meticulously composed.<br />

In E antes os cães que por aqui passaram<br />

[And before the dogs that passed through<br />

here], 2017, Nazareno talks about human evolution,<br />

about the world humans share with<br />

dogs—a relationship that merges with the history<br />

of human evolution itself.<br />

A drawing with repetitive lines mimics the hairs<br />

that cover the animal’s hide. They repeat the<br />

gesture of a pointillist brushstroke—in this case,<br />

made by a rigid graphite point, not by a brush.<br />

The metal plate is glued to the lower part, region<br />

preserved in the white of the paper. The<br />

title is drawn off to the side, maintaining the<br />

clean visual and the arrangement’s equilibrium.<br />

There are no mistakes here.<br />

In Aqui, sem aviso você se depara com a luta<br />

pela vida [Here, without warning you are faced<br />

with the struggle for life], 2017, a lot of eyes.<br />

Eyes looking into eyes—a world of animal eyes<br />

that most resemble those of felines, who watch<br />

us from the paper’s white glare.<br />

We are born and the first thing that happens<br />

is that we are being watched—an intrusion<br />

on life from its first moment, and forever.<br />

It is as though we see ourselves with the<br />

eyes of others in the drawing, in search of our<br />

own gaze, overcoming the opacity that covers<br />

life through eyes that observe us closely.<br />

The drawing maintains the same organization<br />

as the previous one. Feline eyes are neatly<br />

distributed on the paper. In this drawing,<br />

the plate is placed in the upper part amid<br />

all these eyes, its reflection causing us to encounter<br />

our own eyes, as observers. The title is<br />

at the base, demanding of the adult a redoubled<br />

effort to read it. One has to bend over in<br />

front of work.<br />

... E em algum lugar está o domínio da ação<br />

apenas esperando ser ativada por você [...<br />

And somewhere the domain of action is just<br />

waiting to be activated by you], 2017. Is the<br />

drawing a target? A time tunnel? Or a whirlwind<br />

that pulls us inside? It is the destabilization<br />

of truth. Letting yourself go through<br />

the unfathomable, the inexplicable, a reality<br />

that is Other, is what is proposed here in this<br />

drawing that extrapolates the sheet of paper.<br />

The copper plate interrupts one of its lines to<br />

compose this spiral.<br />

E se eu não sou nada... posso ser tudo [And if<br />

I am nothing... I can be everything], from 2017.<br />

This is the most enigmatic, most introspective,<br />

perhaps the most abysmal drawing.<br />

Minimalist, it consists of a large surface covered<br />

with permanent black marker. An intense, insular<br />

blackness, where desire, thought and aspiration<br />

are encountered as forms. The metaphorical<br />

title deals with conducting, with the<br />

audience, with the action and with the nothingness<br />

that the black color suggests. The<br />

drawing on the paper divides it into black and<br />

white. A line—a horizon—is created. The blackness<br />

as the hole in the Universe.<br />

The black “pulls” us in, the white leaves us out.<br />

The plate enters like a window over the black to<br />

keep us on the surface of the nothingness.<br />

These are metaphors of life in literary and visual<br />

processes. From reading, the words are reclaimed<br />

and become an enunciation of phil-<br />

Um desenho de linhas repetitivas que mimetizam os pelos<br />

que cobrem o couro do animal. Repetem o gesto de uma<br />

pincelada pontilhista, no caso, feita não por pincel, mas<br />

pela rigidez da ponta de um grafite. A chapa de metal é<br />

colada na parte de baixo, região preservada no branco do<br />

papel. O título é desenhado ao lado, permanecendo a limpeza<br />

visual e o equilíbrio no conjunto. Não tem erros aqui.<br />

Em Aqui, sem aviso você se depara com a luta pela<br />

vida, de 2017, um monte de olhos. Olhos nos olhos –<br />

um mundo de olhos de animais que mais se parecem<br />

com os dos felinos, que nos observam do clarão branco<br />

do papel.<br />

Nascemos e a primeira coisa que acontece é sermos<br />

observados. A vida devassada no seu primeiro instante<br />

e para sempre. É como nos depararmos com os olhos<br />

alheios no desenho, em busca do próprio olhar, superando<br />

a opacidade que cobre a vida pelos olhos que nos<br />

observam atentamente. O desenho mantém a mesma<br />

organização do anterior. Os olhinhos felinos são ordenadamente<br />

distribuídos sobre o papel. A placa nesse desenho<br />

é colocada na parte superior em meio a todos esses<br />

olhos, o seu reflexo faz com que nos deparemos com os<br />

nossos próprios, de observadores. O título vai na base exigindo<br />

um duplo esforço do adulto para ler. Tem que se<br />

curvar aqui, diante do trabalho.<br />

... E em algum lugar está o domínio da ação apenas<br />

esperando ser ativada por você, de 2017. O desenho é<br />

um alvo? Um túnel do tempo? Ou um redemoinho que<br />

nos puxa para o seu interior? É a desestabilização da<br />

verdade. Deixar-se atravessar pelo insondável, o não explicável,<br />

uma outra realidade, é o que propõe aqui nesse<br />

desenho que extrapola a folha de papel. A chapa de<br />

cobre interrompe uma de suas linhas a compor essa<br />

espiral.<br />

E se eu não sou nada... posso ser tudo, de 2017. Esse é o<br />

desenho mais enigmático, mais introspectivo, talvez o<br />

abismal.<br />

Minimalista, é composto por uma grande superfície coberta<br />

de marcador permanente negro. Um pretume<br />

intenso, fechado, onde se encontra o desejo, o pensamento<br />

e a aspiração como formas. O título metafórico<br />

lida com a condução, com a audiência, com a ação<br />

e com o nada que a cor preta nos sugere. O desenho<br />

sobre o papel o divide em preto e branco. Uma linha<br />

66 67

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!