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Gestão Hospitalar N.º 12 2018

Entrevista a Xavier Corbella, Secretário Geral da International Fedaration Internal Medicine

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Angustiamo-nos diariamente com realidades sociológicas<br />

cada vez mais dramáticas, como idosos que ficam dependentes<br />

e não têm família, idosos maltratados em casa ou em lares, pais abandonados<br />

pelos filhos, pensões miseráveis que sustentam famílias, casas para<br />

onde não temos coragem de reenviar os nossos doentes, famílias<br />

que acham que o Estado tem a obrigação de resolver todos os problemas.<br />

numa residência assistida. Ao mesmo tempo foi feito um<br />

pedido a título excepcional à Misericórdia de Lisboa, que o<br />

recusou por ser doente fora da área. Até ao momento sem<br />

resposta. Foi referenciado a um Centro de Apoio Social mas<br />

foi recusado. Está internado há mais de um ano no serviço<br />

de Medicina de um hospital central.<br />

Dona Lurdes, de 81 anos, autónoma, orientada, com<br />

dois filhos, vivendo com um deles. Os filhos e a doente recusaram<br />

simplesmente sair do hospital depois da alta ou<br />

referenciação a rede. Os filhos continuavam a receber a<br />

reforma dela de 400 euros. Ambos profissionalmente ativos.<br />

Ficou 1 ano no hospital até que acabou por sair para<br />

casa ficando com o apoio de um centro de dia.<br />

Estes são exemplos dos problemas com que nos defrontamos<br />

no nosso quotidiano, nos serviços de Medicina, nós<br />

e as assistentes sociais que integram as nossas equipas.<br />

Uma realidade sociológica<br />

em rápida mudança<br />

Pertenço a uma geração que assistiu e protagonizou<br />

as mais vertiginosas e extraordinárias mudanças<br />

de toda a história da humanidade, das quais fomos,<br />

ao mesmo tempo, agentes e vítimas no plano político e<br />

tecnológico, basta lembrar que o primeiro computador<br />

pessoal foi introduzido pela IBM em 1981, e o telemóvel<br />

em 1992. Ao mesmo tempo temos a triste consciência de<br />

deixar o mundo pior do que o recebemos dos nossos pais:<br />

mais inseguro, mais degradado, mais insustentável.<br />

Também ao nível sociológico as mudanças são impressivas.<br />

Eu vivo nos hospitais há quase 40 anos. Nestes 40<br />

anos assistimos à evolução de uma família trigeracional<br />

para uma família bigeracional e agora, quando as pessoas<br />

divorciadas superam as casadas, para uma família diluída,<br />

múltipla e diversa. Nestes 40 anos assistimos à completa<br />

emancipação da mulher e a uma mudança radical na relação<br />

homem-mulher, assim como a uma mudança na relação<br />

pais-filhos. A esperança de vida passou de 70,5 anos<br />

para 81,2 anos e o envelhecimento inverteu a pirâmide<br />

etária 1 . Há 40 anos tínhamos cerca de um milhão de idosos,<br />

atualmente temos já mais de dois milhões mas as projeções<br />

demográficas apontam para que Portugal tenha,<br />

em 2050, uma percentagem de idosos superior a 35%,<br />

tornando-se o terceiro país da OCDE com mais idosos, depois<br />

do Japão e Espanha 2 . Há 17 anos tínhamos 100 idosos<br />

para 100 jovens, atualmente temos cerca de 150 e dentro<br />

de 30 anos teremos 300 idosos para cada 100 jovens 3 . Em<br />

2011 tínhamos 400 mil idosos a viver sozinhos e 800 mil<br />

a viver na companhia de outros idosos, em 2016 calcula-<br />

-se que esse número terá triplicado. O número de anos de<br />

vida saudável depois dos 65 é de 6,2 anos, inferior à média<br />

da OCDE que é de 9,4 anos e muito inferior à Suécia, onde<br />

os idosos podem contar ainda com 16,3 anos de vida saudável.<br />

A percentagem da população idosa com algum tipo<br />

de incapacidade é de 45,5%, muito superior aos 32,7% de<br />

média nos países da OCDE.<br />

O medo da morte e a mitificação da Medicina, entre outros<br />

fatores, induziu a hospitalização da morte. Há 40 anos<br />

morriam 3 pessoas em cada 10 no hospital, atualmente<br />

esse número duplicou e morrem 6 em cada 10 4 .<br />

A situação atual<br />

Os nossos hospitais foram invadidos por uma população<br />

predominantemente idosa, muitos com<br />

algum grau de incapacidade, e com multimorbilidades. O<br />

impacto desta mudança já foi apelidado de silver tsunami.<br />

A idade média dos doentes internados nos serviços<br />

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