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FEVEREIRO_2021

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CRÓNICA

Um copo de vinho

antes de morrer

Um desabafo (relato) pessoal e uma notícia

sobre ‘o prazer de beber um copo de

vinho’.

AMILCAR MALHÓ (*)

Este foi um ano em que alguns dos mais velhos dos nossos

queridos familiares e amigos não resistiram aos efeitos, diretos

e indiretos, da malvada pandemia. Não houve tempo

nem condições, quer para os ‘acompanhar’, nem que fosse

com o olhar nos derradeiros momentos, quer para as ‘despedidas’.

Dei comigo a pensar num telefonema que recebi de um

amigo, através do qual fiquei a saber do falecimento de alguém

que havia conhecido numa tertúlia gastronómica no

centro interior de Portugal. Há ocasiões em que, na mesa,

basta uma única vez para sentirmos a tal ‘empatia’. Foi o que

aconteceu. O mensageiro da (má) notícia revelou-me que

o ‘militante da mesa’ agora falecido, sempre foi um gastro-

-enófilo moderado mas exigente no vinho que bebia e que,

poucos dias antes de ser hospitalizado lançou uma daquelas

‘bocas’ para o ar: “descansa que não hei-de morrer sem beber

um copo de vinho, em homenagem às nossas patuscadas”.

A voz ao telefone desabafou: “se não fosse esta merda do covid,

juro que tinha escondido nem que fosse um frasquinho

com um dos vinhos que ele mais gostava e tinha ido lá para

lhe dar este último prazer”. Este telefonema trouxe-me à

memória uma notícia publicada aqui no ‘Jornal dos Sabores’

em 2017. Reli-a, emocionei-me ainda mais e apeteceu-me

terminar este ano filho da p+++ partilhando convosco o que

considero um autêntico ato de amor.

O Hospital Universitário de Aarhus, na Dinamarca

quebrou o protocolo para realizar o último desejo de

Carsten Flemming Hansen, de 75 anos, paciente em

situação terminal.

Com um aneurisma na aorta e hemorragia interna,

Carsten Flemming Hansen, de 75 anos, estava internado

no Hospital Universitário de Aarhus, na Dinamarca,

e poderia morrer em dias ou horas. O doente

pediu que lhe concedessem o prazer de, antes de

morrer, fumar um cigarro e beber uma taça de vinho

branco gelado, enquanto observava o pôr do Sol.

Como o fumo é proibido, as enfermeiras que o tratavam

desafiaram as normas da instituição e levaram

a cama em que o doente se encontrava para uma

varanda onde Carsten realizou o seu último desejo.

“Era o fim que ele queria. Não houve tempo para

pensar, era apenas comprar o que ele pedia”, declarou

Inge Pia Christensen, diretora de enfermagem

no Aarhus, em entrevista à imprensa local.

O facto ficou registado na página do hospital no Facebook

no dia em que Hansen faleceu, e registou em

poucas horas mais de 70 mil ‘gostos’ e quase 5 mil

partilhas. De acordo com as enfermeiras, a família

concordou que numa situação como esta, os últimos

desejos eram mais importantes que qualquer tipo de

tratamento.

Foto: Hospital Universitário de Aarhus

(*) Jornal Sabores - O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

Lusitano de Zurique - Janeiro 2021 | www.cldz.eu

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