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Chicos 67 20.01.2022

Chicos é uma publicação literária que circula apenas pelos meios digitais. Envie-nos seu e-mail e teremos prazer de te enviar gratuitamente nossas edições. A linha editorial é fundamentalmente voltada para a literatura dos cataguasenses, mas aberta ao seu entorno e ao mundo. Procura manter, em cada um dos seus números, uma diversidade temática.

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Chicos

VODUM insiste:

Nã Agotimé, esposa do rei Agonglô,

estufa peito nu apontando mamilos fortes

para colina dos senhores brancos.

Nã Agotimé escrava chega ao porto de São Luiz,

o porto tomado ao rei francês pelos portugueses.

Nos pulsos amarrados por corda brilha pulseira de contas.

Nã Agotimé, mãe de Guezo, herdeiro infante,

anca forte, negra vigorosa avante

encanta o senhor dos engenhos de açúcar e roças de cana.

Em mim, Exu se instala,

fala de caminhos que não trilhei,

em mim fala Exu.

EXU retruca ─ Falo nada. Inda mais fazendo uma negra sofrida e maltratada virar deusa de

orgulho e arrogância. Ninguém fala por mim. Que tenho minha palavra e dela não

me afasto.

IEMANJÁ (se fazendo de desinteressada) ─ Qual o problema? Já está na hora de acabar essa

história. Que mais precisa? A negra já está em terra, desfila por lá suas prendas e encantos.

Vodum descreveu muito bem. Que mais falta?

VODUM se explica ─ Como posso falar da chegada de Nã Agotimé se não for de forma gloriosa.

Essa mulher trazia em si toda a tradição de Daomé, a linhagem dos deuses e

dos antepassados. Trazia em si a história desses que atravessaram o Atlântico.

EXU ─ Trazia? Trazia sim. Trouxe. Mas essa que chega aí é uma derrotada. Seria gloriosa nas

margens do rio Niger enquanto foi predileta de um rei que já morreu. Seria forte se

seu filho estivesse no trono. Agora é nada. É ninguém. É escrava. Não é dona de sua

vontade, não pode dispor nem de seu corpo. E o que precisamos fazer é descobrir

um que cuide desse corpo escravizado.

SENHOR PARDO (um empreendedor) reclama ─ Minha plantação de mandioca está uma beleza.

Nem posso avaliar quantas cestas de mandioca terei para vender. Preciso de

braços para colheita e o transporte até o mercado, até o porto. E não encontro bons

escravos. Os que me chegam já estão alquebrados, dentes podres, barrigas grandes

de vermes. Valha-me, meu Senhor do Bonfim.

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