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COMUNICAÇÕES 248 - VIRGÍNIA DIGNUM: IA RESPONSÁVEL PRECISA DE "REGRAS DE TRÂNSITO"

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Pegando na metáfora do carro: poderá acontecer, no<br />

futuro, tudo isto evoluir para um carro de condução<br />

autónoma…<br />

Os carros de condução autónoma não começam a trabalhar<br />

sem ninguém lhes dar uma ordem para começar.<br />

Nessa altura temos de ter capacidade de garantir<br />

que os carros de condução autónoma têm carta de condução<br />

para saberem o que estão a fazer…<br />

Quem se dedica a estas áreas certamente que, em algum<br />

momento, se há-de interrogar sobre se o ser humano,<br />

em geral, tem idoneidade para lidar com tecnologias<br />

que nos podem levar a situações extremas...<br />

Sim, essa é uma questão extraordinariamente importante<br />

e devemos fazer uma reflexão contínua sobre<br />

esse assunto, mas ao mesmo tempo, também temos de<br />

ter humildade. Com as discussões que surgiram sobre<br />

a OpenAI, a ideia que eu começo a ter é que as pessoas<br />

envolvidas nisto, ao mais alto nível, começam a sentirse<br />

deuses que têm a capacidade de decidir sobre estes<br />

sistemas e sobre a Humanidade. As discussões sobre a<br />

mudança na direção da OpenAI são descritas como um<br />

problema da Humanidade, quando isto é só uma guerra<br />

entre administradores.<br />

Trata-se de manter a atenção<br />

no desenvolvimento<br />

da <strong>IA</strong> de forma exagerada.<br />

Temos de ter a humildade<br />

de pensar que isto não é<br />

bem assim…<br />

2023 foi o ano do boom da<br />

<strong>IA</strong>. Toda a gente acordou<br />

para o potencial desta<br />

tecnologia. E, de repente,<br />

a realidade aumentada,<br />

de que tanto se falava, o<br />

cloud computing, todas essas áreas, saíram do foco.<br />

Parece que a <strong>IA</strong> secou tudo à volta. Como explica este<br />

fenómeno?<br />

Marketing, dinheiro (risos)… A grande diferença do<br />

momento em que estamos agora e o que acontecia há<br />

cerca de um ano é que qualquer pessoa no mundo tem<br />

agora a oportunidade de interagir com sistemas que, à<br />

primeira vista, reagem de uma forma quase humana.<br />

O ChatGPT, o Bard e afins, são aplicações feitas sobre<br />

aplicações de <strong>IA</strong>. Sem essas aplicações, que associaram<br />

a conversação humana à <strong>IA</strong>, a evidência de que estávamos<br />

a falar com uma máquina era muito maior.<br />

Está tudo feito de forma<br />

a aliciar-nos a trabalhar<br />

com os sistemas de <strong>IA</strong>. A<br />

questão é que isto dá muito<br />

dinheiro...<br />

Isso significa o quê?<br />

Estas aplicações que usam a linguagem são feitas para<br />

criar uma ilusão. Por um lado, têm por objetivo mostrar<br />

que é possível interagir com o sistema, da mesma maneira<br />

que interagimos uns com os outros e, assim, podemos<br />

todos beneficiar com isso. Isso é positivo. Mas<br />

também há uma forma negativa de ver a questão: eles<br />

querem-nos viciar e controlar. Porque é que o ChatGPT<br />

diz “desculpa”? A máquina não conhece o conceito,<br />

por isso não devia ter de pedir desculpa. O Google não<br />

diz desculpa quando se engana a dar uma resposta…<br />

Está tudo feito de forma a aliciar-nos a trabalhar com<br />

estes sistemas. A questão é que isto depois dá muito dinheiro…<br />

Em termos de computação, os sistemas de <strong>IA</strong><br />

são extremamente pesados, portanto as empresas têm<br />

toda a vantagem em que haja cada vez mais sistemas<br />

de <strong>IA</strong> para venderem cada vez mais máquinas.<br />

O que é que a preocupa mais?<br />

Estamos a ficar muito dependentes. Já estávamos dependentes<br />

das redes sociais, que são de empresas em<br />

que não temos controlo democrático. Não temos capacidades<br />

democráticas de intervir nelas, porque são<br />

empresas privadas, comerciais, com fins lucrativos.<br />

Podem fazer o que quiserem.<br />

Temos de caminhar no sentido da regulação…<br />

Sim. Tem de ser uma regulação efetiva, que ao mesmo<br />

tempo permita aos reguladores,<br />

às empresas e ao<br />

cidadão comum ter voz<br />

no que está a acontecer.<br />

Não pode ser, como essas<br />

empresas querem, só uma<br />

questão de autorregulação.<br />

Também não podem<br />

ser os Estados, unilateralmente,<br />

a estabelecer<br />

as regras. Temos de caminhar<br />

para um diálogo que<br />

envolva também os cidadãos.<br />

Participou na parte inicial da conceção do AI Act.<br />

Acha que a Europa vai no bom caminho?<br />

Se me tivessem feito essa pergunta há duas semanas,<br />

dizia que sim, mas neste momento estou com imenso<br />

medo do que estas guerras podem implicar. Uma das<br />

grandes bases do AI Act é que temos de regular os riscos,<br />

independentemente da tecnologia. Se existe risco,<br />

o risco tem de ser regulado e garantido. É como com os<br />

carros: não interessa se são a diesel ou elétricos. Têm<br />

de ter travões. O AI Act estava bastante bem definido,<br />

mas há uns meses alguém resolveu modificar o texto e<br />

introduzir uma especificidade tecnológica que só tem<br />

criado confusão. Neste momento, estou preocupada<br />

com o que vai sair daqui. Entretanto, a China já tem<br />

regulação, os EUA também e a Europa está a perder a<br />

vantagem.<br />

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