COMUNICAÇÕES 248 - VIRGÍNIA DIGNUM: IA RESPONSÁVEL PRECISA DE "REGRAS DE TRÂNSITO"
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PEDRO FAUSTINO:<br />
Paixão controlada<br />
Começou a vida profissional, imagine-se, a contar ovelhas.<br />
Uma experiência que jamais esquecerá. Depois foram outros<br />
os “bichos” que lhe tomaram os dias, as noites e os fins de<br />
semana. Mas com regras, porque a vida não se passa só em<br />
frente a um ecrã de computador.<br />
Texto de Teresa Ribeiro | Fotos de Vítor Gordo/ Syncview<br />
Foi, como todos os miúdos que se<br />
tornaram adolescentes na década<br />
de 80, um apaixonado pelo<br />
ZX Spectrum. E lembra-se bem de<br />
ficar a jogar o Pac Man e o Jet Man,<br />
os seus jogos favoritos, madrugada<br />
adentro, às escondidas dos pais:<br />
“Apagava a luz do quarto e punha<br />
o computador ligado por detrás da<br />
cama, para não se ver a claridade<br />
que irradiava”, recorda, divertido.<br />
Com essa experiência, o atual managing<br />
director da Axians aprendeu<br />
precocemente quanto o ecrã de um<br />
dispositivo eletrónico pode viciar e<br />
alienar os seus utilizadores. Uma<br />
lição que lhe ficou para a vida.<br />
Apesar daquele fascínio que sentiu<br />
na adolescência, na hora de<br />
escolher o que queria ser quando<br />
fosse grande optou pela área de<br />
economia e gestão. Licenciou-se<br />
em Economia, em 1994, em pleno<br />
boom do financiamento comunitário<br />
a Portugal e, na altura, surgiu-lhe<br />
a oportunidade de trabalhar como<br />
auditor no INGA (Instituto Nacional<br />
de Garantia Agrícola), a agência estatal<br />
que geria os fundos que eram<br />
canalizados para a agricultura. A sua<br />
função era, como lhe explicaram no<br />
primeiro dia, fazer a auditoria aos<br />
agricultores que recebiam subsídios<br />
comunitários ao abrigo da medida<br />
“Ovinos e Caprinos”. Aquilo soou-lhe<br />
a missão de grande responsabilidade,<br />
que o encheu de orgulho, mas<br />
quando perguntou qual era o protocolo<br />
a seguir, percebeu que, afinal,<br />
o que lhe pediam era para ir para<br />
o campo… contar ovelhas: “Como<br />
cada agricultor recebia em função<br />
do número de ovelhas e cabras que<br />
tinha, explicaram-me que o controlo<br />
era feito mesmo assim”, conta<br />
Pedro Faustino, por entre risos. Diz<br />
que correu o país de norte a sul, de<br />
exploração em exploração, a contar<br />
ovelhas. Uma experiência que jamais<br />
esquecerá, mas que o colocava<br />
muito aquém das suas expetativas.<br />
Quando se apercebeu de que o<br />
financiamento comunitário, em vez<br />
de contribuir para a modernização<br />
da agricultura, só servia para estimular<br />
o consumo, nomeadamente<br />
dos jeeps que na época inundaram<br />
o parque automóvel nacional, desiludiu-se<br />
de vez.<br />
Pouco tempo depois, surgiu-lhe<br />
uma oportunidade para mudar de<br />
vida. Despediu-se das paisagens<br />
bucólicas do campo, passou pela<br />
Sinfic, Movensis e GE, e entrou por<br />
uma porta igualmente inesperada,<br />
a de uma empresa de software,<br />
a Novabase. Na faculdade tinha<br />
aprendido uns rudimentos de programação:<br />
“Fazíamos umas coisas,<br />
sem muita graça, no quadro das<br />
aulas, em Pascal”, recorda. Antes<br />
disso, também tinha feito um curso<br />
de programação, através do qual<br />
conseguiu, com grande satisfação<br />
sua, pôr um jogo do galo a funcionar<br />
em Basic. Eram estas as suas<br />
skills técnicas. Mas tal não o impediu<br />
de se tornar gestor de produto:<br />
“Tive a sorte de encontrar naquela<br />
pequena tecnológica portuguesa<br />
muita gente que me ajudou. Ainda<br />
hoje, passados 30 anos, uso muito<br />
do que aprendi nesse tempo, até<br />
porque (brinca) as leis da física são<br />
as mesmas”.<br />
Desde então, a tecnologia e ele<br />
nunca mais se deixaram. O que o<br />
fascina nela, acima de tudo, é a capacidade<br />
que tem de transformar o<br />
mundo. Sabe também que pode tornar-se<br />
“numa arma e num enorme<br />
fator de desequilíbrio social”, mas<br />
defende que “cada um de nós tem a<br />
responsabilidade de contribuir para<br />
atenuar e combater esse efeito”.<br />
Pedro Faustino admite que, se tivesse<br />
feito o seu percurso profissional<br />
noutra área, “teria, certamente,<br />
uma mundivisão diferente, menos<br />
abrangente”, porque trabalhar em<br />
tecnologia permite-lhe contactar<br />
“com todas as indústrias e todos os<br />
setores, todas as formas de pensar”.<br />
Ele gosta disso, gosta que a tecnologia<br />
lhe abra os horizontes e lhe dê<br />
ferramentas para contribuir para<br />
um mundo melhor. Mas a lição que<br />
aprendeu em garoto nunca esqueceu:<br />
“Não sou um geek, um adicto<br />
tecnológico, ou gadget dependente.<br />
Aliás, até há oito meses, tomava os<br />
meus apontamentos num caderno<br />
em papel, por muito que me<br />
tentassem convencer a usar um<br />
ipad (risos). Também sou incapaz de<br />
ler um e-book. Este fim de semana<br />
fui à livraria e trouxe dez livros<br />
num saco. Gosto de manusear, de<br />
marcar os livros, de os colocar na<br />
estante”, confessa. São exemplos<br />
que revelam que, apesar de ser um<br />
apaixonado por tecnologia, o managing<br />
director da Axians faz questão<br />
de viver fora da bolha tecnológica.<br />
Porque a vida é para desfrutar em<br />
pleno: online e offline.•