O ermitão de Muquen - a casa do espiritismo
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malferi<strong>do</strong> estrangeiro, e esforçou-se com <strong>de</strong>svelo e ar<strong>do</strong>r em restituir-lhe a<br />
vida e a saú<strong>de</strong>.<br />
Ten<strong>do</strong> pois bem recomenda<strong>do</strong> o enfermo aos cuida<strong>do</strong>s <strong>do</strong> pajé,<br />
Guaraciaba <strong>de</strong>ixa a taba, corre à beira <strong>do</strong> rio, banha as faces e os olhos<br />
ar<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> insônia na sua onda límpida e fresca, e com um pente <strong>de</strong><br />
ma<strong>de</strong>ira preciosa e aromática encrusta<strong>do</strong> <strong>de</strong> lâminas <strong>de</strong> ouro <strong>de</strong>sembaraça e<br />
alisa os negros e luzi<strong>do</strong>s cabelos, que se espalham como um véu sobre os<br />
ombros e o seio. Vai <strong>de</strong>pois pressurosa <strong>de</strong>spertar seu pai, e com prazenteiro<br />
e ingênuo sorriso diz-lhe:<br />
— Meu pai, ele vive!<br />
— Quem, filha?... o imboaba?<br />
— Sim, o estrangeiro, meu pai; esta madrugada abriu os olhos e<br />
falou...<br />
— Bem, minha filha! dá graças a Tupá, que nos envia um herói <strong>do</strong>s<br />
imboabas para ser imola<strong>do</strong> no dia em que eu te entregar nos braços <strong>de</strong><br />
Inimá como companheira <strong>de</strong> sua taba. Excelente agouro, que promete a<br />
perpetuação <strong>do</strong>s heróicos caciques <strong>do</strong> sangue <strong>de</strong> meus avós! O sacrifício<br />
<strong>de</strong>sse sanhu<strong>do</strong> e valente imboaba será mais grato a Tupá <strong>do</strong> que se<br />
imolássemos um cento <strong>de</strong> vítimas ordinárias, e os céus serão propícios à tua<br />
união.<br />
— Mas, meu pai, tu te enganas, esse prisioneiro não é um imboaba;<br />
ele é, como nós, filho e Tupá, fala a língua das florestas, e o<strong>de</strong>ia como nós a<br />
raça <strong>de</strong> nossos persegui<strong>do</strong>res.<br />
— E que manitó celeste, ou que pajé inspira<strong>do</strong> revelou-te esse<br />
mistério?...<br />
— Ele; ele mesmo mo disse.<br />
— E acreditaste!... não sabes que a mentira, o embuste, a traição<br />
andam sempre nos lábios <strong>de</strong>ssa gente pérfida e cruel?<br />
— Oh! não... sua voz, suas falas, sua figura não são <strong>do</strong> imboaba; nelas<br />
respira o espírito <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>, e em seu rosto transluz a altivez <strong>do</strong> filho das<br />
florestas.<br />
— De feito, murmurou o velho chefe abanan<strong>do</strong> a cabeça, quem com<br />
tanta <strong>de</strong>streza encurva o arco e vibra tão mortíferas flechadas, quem<br />
combate com tamanho <strong>de</strong>no<strong>do</strong> e valentia, não po<strong>de</strong> ser <strong>do</strong> sangue vil <strong>do</strong><br />
imboaba traiçoeiro. Mas seja como for, é sempre um inimigo e um herói; e<br />
tu, minha encanta<strong>do</strong>ra e querida Guaraciaba, tu és bem digna <strong>de</strong> que tua<br />
união seja consagrada com o sangue <strong>de</strong> um herói soterra<strong>do</strong> pelas mãos <strong>de</strong><br />
teu esposo.<br />
— Ah! meu pai! se para que minha união seja feliz e agradável aos<br />
céus, é mister que corra o sangue <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sgraça<strong>do</strong> prisioneiro, per<strong>do</strong>a-me,<br />
meu pai, eu não serei nunca a esposa <strong>de</strong> Inimá!<br />
— Que dizes, filha! como queres menosprezar a velha e sagrada<br />
usança <strong>de</strong> nossos antepassa<strong>do</strong>s? É sempre grato a Tupá o sangue <strong>do</strong> inimigo<br />
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