Junior, José Placido da Silva. - Universidade Federal de Pernambuco
Junior, José Placido da Silva. - Universidade Federal de Pernambuco
Junior, José Placido da Silva. - Universidade Federal de Pernambuco
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
58<br />
É importante perceber, também, a parte <strong>da</strong> fala <strong>de</strong> Severino, quando o pai <strong>de</strong>le diz que,<br />
“Se você for ter que ir pra usina você vai ter que sofrer”. Po<strong>de</strong>mos fazer pelo menos duas<br />
observações sobre esta fala. Primeiro, é que os ilhéus buscam uma diferenciação dos <strong>de</strong>mais<br />
trabalhadores e moradores <strong>da</strong> Região, cuja principal ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> é o corte <strong>da</strong> cana. Segundo, é a<br />
distinção, que fora <strong>da</strong>s ilhas e do mangue é sofrimento, enquanto que <strong>de</strong>ntro do estuário é<br />
bom, é fartura. A importância do lugar na construção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> territorial é abor<strong>da</strong><strong>da</strong><br />
por Entrikin citado por Saquet:<br />
O lugar tem centrali<strong>da</strong><strong>de</strong> e significa uma condição <strong>da</strong> experiência humana, que<br />
implica i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> coletiva e individual. A experiência do lugar tem um papel<br />
fun<strong>da</strong>mental na reprodução <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> em socie<strong>da</strong><strong>de</strong> e na construção <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Mesmo com o avanço <strong>da</strong> tecnologia <strong>de</strong> comunicação e transporte, estamos sempre<br />
situados no mundo, em um lugar, numa reali<strong>da</strong><strong>de</strong> objetiva e subjetiva que tem um<br />
significado existencial para os indivíduos (ENTRIKIN apud SAQUET, 2007. p.109).<br />
Assim, acreditamos que a noção <strong>de</strong> lugar, enquanto construção histórica acrescenta<br />
<strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> existencial ao território. Não sendo apenas área apropria<strong>da</strong> pelas relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r,<br />
o lugar guar<strong>da</strong> uma relação com o território, tornando algumas partes <strong>de</strong>ste mais significativo<br />
para os sujeitos sociais do que para outros.<br />
O <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> Maria <strong>da</strong>s Dores, que também é conheci<strong>da</strong> por Graça, confirma esse<br />
sentimento <strong>de</strong> pertence ao lugar, sendo esse, um lugar bom <strong>de</strong> viver, e, que aqui é bom e lá, é<br />
ruim, é incerteza. Ela fala ain<strong>da</strong> <strong>da</strong> importância <strong>da</strong> mãe para transmitir, ou melhor, aprimorar<br />
as práticas <strong>de</strong> se relacionar com o manguezal.<br />
Nossa mãe ia pro mangue levava a gente. A gente tudo pequenininho, tudo atrás<br />
<strong>de</strong>la. Tirava caranguejo, ela pescava tudinho, ensinava a gente, quando a gente<br />
tivesse gran<strong>de</strong> a gente apren<strong>de</strong>r. A gente apren<strong>de</strong>u, eu, minha irmã, meus irmãos. Até<br />
hoje vive no mangue… assim a gente vai vivendo, criando nossos filhos, irmãos,<br />
sobrinho, família, tudo aqui <strong>de</strong>ntro. A gente é criado aqui mesmo no mangue. É<br />
peixe, camorim, esses outros peixes, carapeba, ostra, marisco, sururu, tudo que tem<br />
<strong>de</strong>ntro do mangue, a gente tira do mangue, a gente veve do mangue mesmo… isso é<br />
um lugar bom <strong>de</strong> viver, se sair <strong>da</strong>qui pra rua, eu vou morrer <strong>de</strong> fome. (Informação<br />
verbal 33 )<br />
O conhecimento <strong>da</strong> pesca, Graça e os irmãos, apren<strong>de</strong>ram com a mãe <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
pequeninos, quando ela levava-os para pescar. Hoje, ela repassa esses conhecimentos para os<br />
filhos e filhas. Essa é a forma encontra<strong>da</strong> para transmissão do conhecimento e a permanência<br />
<strong>de</strong> gerações e gerações nos manguezais. Isso fica claro quando ela fala que “Até hoje vive no<br />
33 Maria <strong>da</strong>s Dores. Entrevista realiza<strong>da</strong> em 26 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2007. Fonte: Arquivo CPT.