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Revista edicao #2. - IGC - Universidade Federal de Minas Gerais

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esferas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e à socieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>monstrando sua “eficiência e habilida<strong>de</strong>” no trato<br />

com “grupos marginalizados”.<br />

Os momentos subseqüentes são marcados pela “ampliação” das relações entre a AS-<br />

MARE e o po<strong>de</strong>r público municipal. A nosso ver, sobressaem-se cinco pilares nos quais<br />

se fundaria a construção da cidadania/inclusão social entre os catadores <strong>de</strong> papel na<br />

ASMARE: a) conquista do “direito ao trabalho” pelo catador <strong>de</strong> papel e “efetivação” <strong>de</strong><br />

sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> “trabalhador”; b) po<strong>de</strong>r público e suas instituições correlatas buscando<br />

abrir, aos agentes que têm se ocupado do trabalho com a população <strong>de</strong> rua e/ou<br />

catadores <strong>de</strong> papel – e mesmo para esses últimos –, canais nos quais estes pu<strong>de</strong>ssem<br />

ouvir e se fazer ouvidos; c) criação <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s para um amplo e incentivador<br />

trabalho visando ao processo organizativo dos catadores; d) criação <strong>de</strong> condições objetivas<br />

(através <strong>de</strong> diversos convênios envolvendo o po<strong>de</strong>r público e entida<strong>de</strong>s parceiras)<br />

para a capacitação profissional <strong>de</strong>sses indivíduos, visando à formação e ao fortalecimento<br />

do capital social; 7 e) afirmação, por parte dos agentes <strong>de</strong> mediação envolvidos com a<br />

“causa do catador” (po<strong>de</strong>r público e entida<strong>de</strong>s diversas), <strong>de</strong> que todo o trabalho tem<br />

primado pela efetivação da melhoria das “condições <strong>de</strong> vida” e do “reconhecimento<br />

social” do catador. Sônia Maria Dias (2002, p. 69), em seu trabalho sobre o que ela<br />

consi<strong>de</strong>ra a “construção da cidadania” na Associação, corrobora tais pilares:<br />

Já vimos [...] as dificulda<strong>de</strong>s dos associados em relação à adoção do universo <strong>de</strong> regras e <strong>de</strong>veres<br />

da ASMARE e dos seus espaços <strong>de</strong> trabalho, mas vimos também como a linguagem e a prática da<br />

participação, do compartilhamento, da resolução <strong>de</strong> conflitos através da troca <strong>de</strong> idéias vêm<br />

paulatinamente criando novas sociabilida<strong>de</strong>s entre os catadores, possibilitando o exercício <strong>de</strong> uma<br />

prática cidadã, compreendida aqui no âmbito do estabelecimento <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> co-responsabilida<strong>de</strong><br />

que a gestão do projeto <strong>de</strong> coleta seletiva em parceria supõe.<br />

Em contrapartida, Jacques Rancière (1996, p. 368), em seu seminal ensaio acerca das<br />

formas entonadoras dos termos que perfazem a relação entre Estado e socieda<strong>de</strong> civil,<br />

chegando aos redutos mais triviais da vida social, faz a “crítica do discurso atualmente<br />

dominante que i<strong>de</strong>ntifica a racionalida<strong>de</strong> política ao consenso e o consenso ao princípio<br />

mesmo da <strong>de</strong>mocracia”. Segundo o autor, o discurso entremeador da racionalida<strong>de</strong><br />

política assinalada institui formas consensuais como sendo, por excelência, as condições<br />

celebradoras da razão, em oposição aos mo<strong>de</strong>los instaurados sob o “arcaísmo” e a<br />

“irracionalida<strong>de</strong>” no embate político. O dissenso como base discursiva e ebulidora dos<br />

imobilismos passa a ser entendido como <strong>de</strong>savença e, por isso, pernicioso à política, mas<br />

passível <strong>de</strong> ser superado por outro mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> racionalida<strong>de</strong>. Nesse caso, a política seria<br />

uma prática <strong>de</strong>scolada do campo das relações sociais – movidas, entre outros aspectos,<br />

pelo <strong>de</strong>sejo e pelo conflito –, <strong>de</strong>vendo situar-se numa plataforma objetiva e sem paixões<br />

<strong>de</strong>sestruturadoras do seu curso “normal”. Rancière (1996, p. 368) alerta: “o que chamam<br />

<strong>de</strong> consenso é na verda<strong>de</strong> o esquecimento do modo <strong>de</strong> racionalida<strong>de</strong> próprio à política”,<br />

significando, ao contrário do que se preten<strong>de</strong>, “um certo retorno do irracional”.<br />

A teoria política <strong>de</strong>mocrática que dá o tom da prática política assinalada assenta-se,<br />

assim, no seu contrário: a participação e sua aplicação propostas escamoteiam o seu<br />

7<br />

O capital social, segundo Higgins (2005, p. 3),<br />

são “todos os elementos <strong>de</strong> uma estrutura<br />

social que cumpram a função <strong>de</strong> recurso para<br />

que os indivíduos atinjam a satisfação <strong>de</strong> seus<br />

interesses [...]”.<br />

Belo Horizonte 02(1) 78-92 janeiro-junho <strong>de</strong> 2006<br />

Luiz Antônio Evangelista <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />

Geografias<br />

ARTIGOS CIENTÍFICOS<br />

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