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usca o seu caminho, baseado nessa ideia de um trafegar. Seus<br />
personagens me parecem sempre estrangeiros que buscam encontrar<br />
o seu lugar no mundo, deslocados de seu meio. Seu último<br />
filme, Pingo d´água, é exemplo dessas mutações. Um filme<br />
em busca de si mesmo, passado em várias cidades, entre<br />
São Paulo, Tiradentes (MG) e na Paraíba. Ou ainda, o final de<br />
Onde Borges tudo vê, em que os personagens decidem saltar no<br />
meio da estrada, e repousam em uma árvore.<br />
Em cerca de dois anos, Taciano Valério dirigiu três longas-<br />
-metragens notáveis por ampliar o campo da dramaturgia do<br />
cinema de ficção. São três filmes claramente ancorados na dramaturgia<br />
da ficção, em que se busca uma composição de personagens,<br />
um cinema de ator. Narrativa e ator, base do cinema<br />
clássico. Mas é curioso pensar que, se Taciano é escritor, autor<br />
de contos (Onde Borges tudo vê é uma adaptação de um de seus<br />
escritos), com doutorado em psicologia clínica, com tese que<br />
relaciona os pós-estruturalistas com o cinema de Almodovar,<br />
seus filmes, no entanto, se afastam da narrativa romanesca e<br />
do modelo naturalista da interpretação de atores, de base tipicamente<br />
psicológica. Sues filmes se abrem para o silêncio, para<br />
a investigação dos espaços, para uma atmosfera de sugestão,<br />
para o escorrer do tempo. Ou seja, não são literatura muito<br />
menos ensaio clínico, mas buscam uma atmosfera de cinema.<br />
Os personagens dos filmes de Taciano estão na penumbra,<br />
não desfrutam de muitas certezas mas de dúvidas, caminham<br />
em busca de um lugar, expressam-se mais pelos silêncios do<br />
que pelas palavras, desconfiam das coisas, inclusive de si mesmos.<br />
Talvez esse seja um sinal da própria posição de Taciano<br />
no cinema brasileiro, entre o cinema narrativo e o cinema contemporâneo,<br />
entre os diversos nordestes que habitam dentro<br />
de si. São três filmes em preto-e-branco, interessados mais pelos<br />
matizes de cinza do que pela cor.<br />
Seu último filme, Pingo d´água, talvez seja o mais radical<br />
desse caminho. Filme feito de processos, sobre o processo, sobre<br />
o trabalho de construção do ator. Um filme sobre os processos<br />
do ator. Nele, Taciano abandona alguns dos atalhos narrativos<br />
e dramatúrgicos para se debruçar num cinema feito de pequenas<br />
esquetes que se relacionam de uma forma livre, menos es-<br />
Marcelo Ikeda<br />
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