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O cinema político<br />
Mataram meu irmão, de Cristiano Burlan<br />
Aquilo que fazemos com as nossas desgraças, de Arthur Tuoto<br />
Há toda uma vertente de um cinema-de-garagem brasileiro<br />
que busca uma reflexão sobre os processos sociais que nos formam,<br />
afastando-se de um cinema de motivação intimista individual<br />
para buscar um painel coletivo, que revela ao espectador<br />
a desigualdade da estrutura social brasileira. No entanto, aqui<br />
apresentamos dois filmes com uma forte pulsão política mas<br />
que se revelam não somente pela urgência de seus temas mas<br />
sobretudo pela forma inventiva como pensam a política contemporânea<br />
através das imagens, através das possibilidades<br />
contemporâneas da linguagem audiovisual.<br />
O filme-ensaio de Arthur Tuoto busca uma política das imagens,<br />
através de imagens de arquivo capturadas pela internet.<br />
Reflete sobre o uso e a manipulação das imagens como estratégia<br />
de um discurso de poder. Com isso, dialoga com a tradição<br />
dos filmes-ensaio, como os de Jean-Luc Godard, Harun Farocki<br />
e Guy Debord, entre outros. Ainda, o filme de Tuoto é notável<br />
por apontar uma possibilidade econômica para a realização de<br />
filmes hoje no país: é todo realizado por uma única pessoa. Sua<br />
"assinatura" no filme vem, portanto, desse diálogo improvável: o<br />
realizador apodera-se de imagens que não são suas, e seu olhar<br />
se revela na forma precisa como seleciona e reorganiza essas<br />
imagens para o espectador, através da montagem.<br />
Mataram meu irmão, de Cristiano Burlan, aponta para as<br />
cicatrizes do processo crescente de violência em que vivemos.<br />
No entanto, sua contundência está em mostrar como esse painel<br />
atinge diretamente a vida de uma família, de um ponto de<br />
vista intimista. O próprio título anuncia a frontalidade das intenções<br />
do filme. Como um dos personagens diz durante o filme,<br />
as consequências de um assassinato são para quem fica,<br />
muito mais do que para quem se vai. O inferno é aqui. Burlan<br />
não está propriamente preocupado em fazer uma radiografia<br />
das causas do estado de violência, nem mesmo investigar os<br />
motivos da morte de seu irmão. O que é belo em seu filme é que<br />
Mataram meu irmão não é um "filme policial", não está preocu-<br />
24 O cinema de garagem