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tradas, que se desembaraçam em relação a qualquer programa<br />
que subsuma as singularidades a um todo.<br />
Diante desse desafio de tomar as formas fílmicas em seu<br />
atravessamento com princípios constitutivos de comunidades,<br />
vou tentar aqui caminhar mais de perto com as figuras do comum<br />
inventadas pelas imagens e sons de três filmes que acrescento<br />
agora a essa lista que anunciei. Seriam eles: Lição de Esqui<br />
(2013), de Leonardo Mouramateus e Samuel Brasileiro,<br />
A vizinhança do tigre (2014), de Affonso Uchoa e Branco sai<br />
preto fica (2014), de Adirley Queirós. Filmes distintos em seus<br />
procedimentos, mas ao mesmo tempo com possibilidades de<br />
aproximação, justo pelo desejo de ocupar a polis, de fazer surgir<br />
uma cena fílmica que intervenha na cena urbana e de produzir<br />
diferença capaz de fundar comunidades. Seria o cinema<br />
processando uma cena do comum.<br />
Essas comunidades que os filmes colocam em questão<br />
não são dadas previamente, não existem antes que o próprio<br />
cinema aconteça 1 . É porque existe imagem, é porque se institui<br />
encontro que todo um conjunto de forças passa a se desenhar.<br />
O comum proposto aqui se instaura como acontecimento.<br />
A política desses filmes não se dá pelo fato de eles se dirigirem<br />
a uma situação social de injustiça pressuposta, a um conjunto<br />
de identidades já constituídas e prontas a serem enquadradas 2 .<br />
É em outra operação que se pode pensar a intervenção dessas<br />
obras no mundo, quando elas rejeitam princípios já esquadrinhados<br />
para efetivar o contato com as vidas, tornando o<br />
exercício de fabricar a matéria plástica e sonora uma maneira<br />
de inventar novas possibilidades de experiência coletiva. Em<br />
outros recortes de espaço e de tempo, a escritura pode tornar<br />
sensíveis cenas inéditas, não contadas, irruptivas. Dizendo de<br />
1 Ver a discussão de César Guimarães a respeito da noção de comunidades de<br />
cinema, em conferência no 3º Colóquio Internacional Cinema, Estética e Política.<br />
O vídeo está disponível em: http://3ccep.kuma.net.br/videos/.<br />
2 Ver o texto de Jacques Rancière, “Política de Pedro Costa”, em “As distâncias<br />
do cinema”. Tomo aqui, sobretudo, uma preocupação que ele assinala já no início:<br />
“Uma situação social não basta para fazer uma arte política, nem a evidente<br />
simpatia pelos explorados e esquecidos” (RANCIÈRE, 2012, p.147).<br />
Érico Araújo Lima<br />
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