O legado do PAN: uma nova fase para o Rio? - Tribunal de Contas ...
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o <strong>lega<strong>do</strong></strong> <strong>do</strong> <strong>PAN</strong><br />
O <strong>lega<strong>do</strong></strong> social e urbanístico<br />
<strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s eventos esportivos<br />
internacionais: um breve balanço<br />
Gilmar Mascarenhas<br />
Doutor <strong>de</strong> Geografia H<strong>uma</strong>na (USP)<br />
Professor da UERJ, especialista em<br />
geografia <strong>do</strong>s esportes<br />
Ahistória <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s eventos<br />
olímpicos da era mo<strong>de</strong>rna<br />
abriga certamente um capítulo<br />
especial da história mais geral <strong>do</strong><br />
planejamento e das políticas urbanas<br />
no século XX. Muitas lições po<strong>de</strong>mos<br />
colher <strong>de</strong>sta larga experiência<br />
internacional.<br />
Para realizar um gran<strong>de</strong> evento<br />
<strong>de</strong>sta natureza, os investimentos<br />
necessários são volumosos e não se<br />
resumem ao esporte. O chama<strong>do</strong><br />
“urbanismo olímpico” precisa <strong>do</strong>tar<br />
as cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> instalações que atendam<br />
às distintas modalida<strong>de</strong>s. E também<br />
criar condições <strong>de</strong> alojamento <strong>para</strong> os<br />
milhares <strong>de</strong> atletas, pessoal <strong>de</strong> apoio<br />
e membros <strong>do</strong>s comitês olímpicos,<br />
bem como <strong>para</strong> a imprensa. Além<br />
disso, quase sempre a cida<strong>de</strong>-se<strong>de</strong><br />
requer expansão ou melhorias em<br />
sua infra-estrutura (transportes,<br />
telecomunicações, malha viária etc.).<br />
Trata-se, enfim, <strong>de</strong> um amplo conjunto<br />
<strong>de</strong> intervenções urbanísticas; um<br />
momento-chave na evolução e no<br />
planejamento das cida<strong>de</strong>s.<br />
Mas nem sempre foi assim. O<br />
olimpismo da era mo<strong>de</strong>rna, inicia<strong>do</strong><br />
em 1896 pelo Barão <strong>de</strong> Coubertin,<br />
percorreu um penoso caminho até<br />
atingir seus atuais dias <strong>de</strong> glória. Na<br />
primeira Olimpíada da era mo<strong>de</strong>rna,<br />
em Atenas (1896), compareceram<br />
apenas 285 atletas, <strong>de</strong> 13 países<br />
(atualmente os jogos atraem mais<br />
<strong>de</strong> 10 mil atletas, e atraem bilhões<br />
<strong>de</strong> telespecta<strong>do</strong>res). Poucos se<br />
interessavam pelo evento, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong><br />
que nas duas edições seguintes (Paris<br />
1900 e St Louis, 1904), utilizou-se<br />
como estratégia realizar os jogos no<br />
mesmo lugar e momento <strong>de</strong> eventos<br />
bem mais importantes, as exposições<br />
universais.<br />
O <strong>lega<strong>do</strong></strong> urbanístico era mínimo:<br />
geralmente aproveitava-se o conjunto<br />
<strong>de</strong> instalações esportivas existentes.<br />
Em 1924, nos Jogos <strong>de</strong> Paris, alguns<br />
atletas se alojaram em área <strong>de</strong><br />
barracas. Até então normalmente<br />
os participantes das olimpíadas se<br />
alojavam por conta própria.<br />
Após a Segunda Gran<strong>de</strong> Guerra<br />
Mundial, o olimpismo adquiriu força<br />
inédita e crescente apoio estatal,<br />
por conta da famosa bipolarização<br />
esportiva entre URSS e EUA, reflexo<br />
da Guerra Fria. Em 1952, Helsinki<br />
inaugurou a era <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s projetos<br />
habitacionais populares, geri<strong>do</strong>s pelo<br />
po<strong>de</strong>r público, a partir <strong>do</strong>s jogos.<br />
Iniciava-se um novo perío<strong>do</strong>, no qual<br />
este gran<strong>de</strong> evento se estruturava<br />
incorporan<strong>do</strong> <strong>de</strong>mandas sociais,<br />
<strong>de</strong> habitação, transporte e infraestrutura<br />
em geral. Moscou (1980) foi<br />
o ápice <strong>de</strong>sta política <strong>de</strong> construção<br />
<strong>de</strong> habitações populares a partir <strong>de</strong><br />
<strong>uma</strong> vila olímpica: nada menos que 18<br />
blocos <strong>de</strong> apartamentos pré-fabrica<strong>do</strong>s<br />
com 16 andares cada um.<br />
Seul (1988) e Barcelona (1992)<br />
representam o início <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>nova</strong> era,<br />
pois constituem claros exemplos <strong>de</strong> uso<br />
<strong>do</strong>s esportes como po<strong>de</strong>rosa alavanca<br />
<strong>para</strong> o <strong>de</strong>senvolvimento urbano,<br />
em parceria com o capital priva<strong>do</strong>.<br />
Ambas as cida<strong>de</strong>s implementaram<br />
projetos urbanísticos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
envergadura, verda<strong>de</strong>iros marcos em<br />
sua evolução urbana. Des<strong>de</strong> então, a<br />
disputa internacional por sediar estes<br />
eventos cresce vertiginosamente.<br />
Certamente, os Jogos Panamericanos<br />
não mobilizam as<br />
atenções (e os recursos) nesta mesma<br />
escala. Todavia, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> as<br />
condições sócio-econômicas das<br />
cida<strong>de</strong>s-se<strong>de</strong>, a maioria pertencente a<br />
países periféricos, o impacto <strong>de</strong> cada<br />
evento adquire relativamente maior<br />
envergadura.<br />
No Pan <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro,<br />
o volume total <strong>de</strong> investimentos,<br />
oficialmente ainda não divulga<strong>do</strong> (e<br />
sob investigação, por futura Comissão<br />
Pró-inquérito), gira em torno <strong>de</strong> 3,7<br />
bilhões <strong>de</strong> reais. Trata-se, <strong>de</strong> longe, <strong>do</strong><br />
mais caro evento pan-americano em<br />
56 anos <strong>de</strong> história <strong>de</strong>sta competição,<br />
consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong> evi<strong>de</strong>ntemente toda<br />
a variação monetária no perío<strong>do</strong>.<br />
No atual contexto <strong>de</strong> escassez <strong>de</strong><br />
recursos públicos <strong>para</strong> as políticas<br />
locais <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento urbano,<br />
trata-se <strong>de</strong> <strong>uma</strong> rara oportunida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> investimento na infra-estrutura<br />
da cida<strong>de</strong>. Uma questão central é<br />
avaliar quais áreas, quais segmentos<br />
da socieda<strong>de</strong> e quais setores <strong>de</strong><br />
ativida<strong>de</strong>s foram beneficia<strong>do</strong>s pelo<br />
gran<strong>de</strong> projeto.<br />
Do ponto <strong>de</strong> vista urbanístico,<br />
o principal aspecto <strong>de</strong>sta política<br />
58 setembro 2007 - n. 36 Revista TCMRJ