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Ifiroshima•<br />
45 anos<br />
Clóvis Rogge<br />
A humanidade não pode esquecer esta<br />
página negra da sua história. A explosão da<br />
primeira bomba nuclear, lançada sobre Hirosiima<br />
em 6 de agosto de 1945. Este<br />
evento marcou o início do fim da Guerra<br />
Mundial, inaugurando a era nuclear e de<br />
guerra fria, que hoje parece também de fim<br />
próximo.<br />
Após a rendição dos alemães em 08 de<br />
maio de 1945, as cidades japonesas tornaram-se<br />
alvos de intensos bombardeios. Até<br />
agosto de 1945, os americanos ainda não<br />
haviam desembarcado efetivos militares no<br />
território japonês.<br />
Nos Estados Unidos desenvolviam-se<br />
estudos para a obtenção da Bomba Atômica.<br />
A primeira experiência com sucesso, ocorreu<br />
em 16 de julho de 1945, com a explosão<br />
de um artefato nuclear no deserto de Alornogordo<br />
no Novo México. No Japão também<br />
se realizavam estudos para a obtenção<br />
da bomba, porém sem os avanços conseguidos<br />
pelos seus inimigos de guerra.<br />
Duas cidades japonesas, Kyoto e Hiroshima<br />
não haviam sido alvo de bombardeios<br />
convencionais. As razões são desconhecidas.<br />
Todavia, Hiroshima, a sudoeste da ilha de<br />
Honshu, a maior do arquipélago japonês,<br />
apresentava-se como alvo interessante. A<br />
cidade abrigava contingentes militares, traduzindo-se<br />
na principal base militar japonesa.<br />
Haviam ali, numerosas instalações armazenadoras<br />
de provisões e armamentos. A<br />
cidade contava com cerca de 420 mil habitantes<br />
à época. A densidade demográfica era<br />
muito alta, devido à sua localização, tendo<br />
montanhas por um lado e o Pacífico por outro.<br />
Nesta época, contingentes de escolares<br />
eram evacuados da cidade para outras regiões<br />
com menor probabilidade de ataques<br />
aéreos. Em contrapartida, mais de 40 mil jovens<br />
soldados encontravam-se ali estacionados.<br />
Em 27 de julho a bomba foi embarcada<br />
no Cruzador Indianópolis com destino a<br />
bases americanas próximas do Japão. Em 06<br />
de agosto, três aviões americanos irromperam<br />
os céus de Hiroshima. De um deles, o<br />
Enola Gay, a 8.500m de altura foi arremessada<br />
a bomba enfocando o centro da cidade.<br />
O artefato de 3 metros de comprimento,<br />
4 toneladas de peso e capacidade destrutiva<br />
de 20 mil toneladas de pólvora convencional,<br />
converteria-se em poucos segundos<br />
num inferno de chamas e calor.<br />
Eram 08h15 de uma primavera em Hiroshima.<br />
O céu estava claro e não foi dado<br />
alarme de ataque aéreo. Portanto, as pessoas<br />
não procuraram abrigos anti-bombardeios.<br />
A bomba explodiu a uma altura de 600m<br />
desprendendo um estranho relâmpago e<br />
formando uma esfera de fogo de intenso<br />
calor, como se o sol de repente tivesse ficado<br />
próximo. Em seguida, imensas colunas de<br />
fogo caíram sobre a superfície e num abrir e<br />
fechar de olhos se formou o "cogumelo" de<br />
fogo e fumaça que chegou a alcançar 9000<br />
metros de altura. Naquele inferno de calor,<br />
as construções foram destruídas em segundos<br />
e a cidade se viu envolta num verdadeiro<br />
mar de chamas.<br />
Os efeitos destrutivos da bomba atômica<br />
de Hiroshima já foram descritos em documentos<br />
históricos e contados em inúmeros<br />
filmes. É preciso sintetizá-los para perceber-lhe<br />
a gravidade. As vítimas daquele holocausto<br />
localizado chegaram a 400 mil<br />
pessoas, sendo cerca de 200 mil vítimas faiais.<br />
Raios térmicos, radiatividade e deslocamento<br />
de ondas de ar provocando fortes<br />
ventos, de formas combinados, provocaram<br />
a fatídica tragédia. Com temperaturas de até<br />
7.000C, muitas substâncias viraram pó ou<br />
vapor. Cerca de 92% da superfície da cidade<br />
foi arrasada. Pessoas sofreram queimaduras<br />
graves até 3.000m do local da explosão. Até<br />
a 1.200m, os órgãos internos das pessoas<br />
foram afetados provocando-lhes a morte em<br />
poucos dias. Os ventos de fortíssima intensidade<br />
literalmente varreram as construções<br />
e a vegetação. Quem não pereceu no exato<br />
momento certamente viveu o inferno em vida.<br />
Há 16 km do epicentro da bomba, vidros<br />
de janelas foram destruídos. Até hoje persistem<br />
pessoas com pedaços e fragmentos de<br />
vidros ou outros materiais encravados pelo<br />
corpo.<br />
Sem assistência médica adequada para<br />
aquele evento desconhecido, muitas pessoas<br />
pereceram. Muitos foram afetados quando<br />
da busca de seus entes queridos sob os escombros<br />
restantes, ou no contato com a<br />
água dos rios, ou ainda, pela "chuva negra".<br />
Detritos radiativos em suspensão caíram em<br />
largos pingos negros da chuva radiativa,<br />
"black rain" como ficou conhecida. A radiação<br />
atômica provocou alterações sangüíneas<br />
e orgânicas de nefastas conseqüências à saúde.<br />
Manchas na pele, depilação total ou parcial,<br />
diarréias, náuseas, câncer, problemas<br />
pulmonares e digestivos foram sintomas que<br />
levaram muitas pessoas à morte por muito<br />
tempo. Alguns destes efeitos tornaram-se<br />
hereditários.<br />
Hiroshima viveu a noite de 06 de agosto<br />
num inferno interminável. Clarões de fogo<br />
iluminavam o céu e explosões remanescentes<br />
geraram infindável estado de pânico e pavor.<br />
Imagine-se o cenário dos sobreviventes,<br />
implorando por água, fugindo do inferno<br />
e esperando socorro. Nos dias seguintes,<br />
brigadas de civis e militares, passaram a<br />
compor pelotões de salvamento. Desconhe-<br />
ciam o inimigo contra o qual se deparava.<br />
Os cadáveres foram jogados em valas comuns<br />
em diversos lugares da cidade. Cena<br />
inimaginável.<br />
Hiroshima ficou conhecida pela História.<br />
Hiroshima é um brado de alerta à História.<br />
Hoje, a cidade encontra-se totalmente<br />
reconstruída. A obstinação dos japoneses<br />
devolveu a imponência de importância à sua<br />
cidade. São poucos os vestígios da catástrofe.<br />
Os que existem são para exortação<br />
à lembrança do que se deve esquecer. No<br />
coração da cidade está o Parque Memorial<br />
da Paz onde neste 06 de agosto, certamente,<br />
milhares de pessoas comparecerão para relembrar,<br />
protestar e chorar. Ali está o Museu<br />
Memorial da Paz expondo detalhes, explicando<br />
fatos e provocando memória.<br />
Diante da construção semidestruída do<br />
edifício que abrigava a entidade representativa<br />
do fomento industrial, fui surpreendido<br />
por uma atmosfera de profunda reflexão.<br />
Medo, pavor, silêncio e lágrimas, ali estava<br />
eu diante do que restou daquele profundo<br />
ato de agressão humana. Revivi a História e<br />
senti a História.<br />
Hoje o Shin Kan Sen, o trem bala japonês<br />
percorre os 900 km entre Tokyo e Hiroshima<br />
em 4 horas e meia. Já à porta da<br />
estação ferroviária, um chafariz de formato<br />
de cogumelo duplo dá ao visitante a primeira<br />
lembrança do passado recente da sua cidade<br />
e seu país. São 1 milhão e 100 mil habitantes<br />
que vivem numa móderníssima cidade com<br />
significativo patrimônio industrial, econômico<br />
e cultural. As marcas da tragédia não<br />
foram esquecidas.<br />
Hiroshima, como de resto todo o Japão,<br />
é o exemplo vivo do que o trabalho de um<br />
povo pode realizar. Após o lançamento da<br />
segunda bomba atômica sobre a cidade de<br />
Nagasaki, em 08 de agosto, o Japão rendeuse<br />
incondicionalmente em 14 de agosto. O<br />
desembarque de tropas norte-americanas em<br />
solo japonês começou em 28 de agosto de<br />
1945. A partir daí, o povo japonês passou a<br />
renascer das cinzas, aprender com o invasor,<br />
crescer em paz e dominar pela produção e<br />
tecnologia. Hoje o Japão é exemplo a ser seguido.<br />
Clovis Rogge é agente fiscal, matemático<br />
e especialista em processamento de dados.<br />
Visitou o Japão a convite da Câmara de<br />
Comércio e Indústria Brasil-Japão do Paraná.<br />
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