CAPÍTULO 2.SAÚDE SEXUAL E REPRODUTIVA DE MULHERES IMIGRANTES1. Saú<strong>de</strong> e migraçãoSegundo a Organização Mundial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> (OMS), Saú<strong>de</strong> é um estado <strong>de</strong> completo bem--estar físico, mental e social, e não meramente a ausência <strong>de</strong> doença ou enfermida<strong>de</strong>(WHO, 1948). Ao contrário do mo<strong>de</strong>lo biomédico que concebia uma perspectiva redutorado conceito <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, a visão holística e sistémica <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que um conjunto complexo <strong>de</strong>dimensões (física-somática, afectiva e emocional, cognitiva, comportamental, soci ocul tu -ral e ecológica) influencia o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> dos indivíduos (Antonovsky, 1979; Leigh eReiser, 1980; Last e Wallace, 1992). Consi<strong>de</strong>rando a saú<strong>de</strong> como um direito humanofundamental (UN, 1948), a OMS aponta como condições e recursos fundamentais a ali -men tação, habitação, educação, meios económicos a<strong>de</strong>quados, ecossistema estável, re -cursos sustentáveis, justiça social e equida<strong>de</strong> (OMS, 1986).Na primeira Conferência Internacional para a Promoção da Saú<strong>de</strong>, em Otava, a OMS <strong>de</strong> fi -ne Promoção da Saú<strong>de</strong> como o processo que visa aumentar a capacida<strong>de</strong> dos indivíduos edas comunida<strong>de</strong>s para actuarem na melhoria da sua saú<strong>de</strong> (OMS, 1986). No contexto daPromoção da Saú<strong>de</strong>, o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> é resultado da inter<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> factores <strong>de</strong> nívelma crossocial (contexto socioeconómico, político, cultural, histórico), comunitário e indi vi -dual (factores genéticos e biológicos). Adoptando uma visão sistémica, a saú<strong>de</strong> é en caradacomo um processo e um recurso na medida em que po<strong>de</strong> constituir um factor <strong>de</strong> terminantena melhoria do bem-estar e das condições <strong>de</strong> vida dos indivíduos ao nível da edu cação,em prego, cidadania e <strong>de</strong>senvolvimento (Nutbeam, 1998; Tones e Green, 2004).Segundo a OMS, actuar nos <strong>de</strong>terminantes sociais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> representa a forma maiseficaz <strong>de</strong> melhorar a saú<strong>de</strong> das populações e <strong>de</strong> reduzir as iniquida<strong>de</strong>s sociais (CSDH,2007). Os d e ter mi nantes sociais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> incluem factores estruturais <strong>de</strong> nível social,como as instituições po líticas e a estrutura económica, que se reflectem na estratificaçãosocial, nos me ca nismos <strong>de</strong> redistribuição <strong>de</strong> recursos, na educação, nas condiçõesbásicas <strong>de</strong> vida e trabalho, na existência <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> suporte social e na disponibilizaçãoSaú<strong>de</strong> Sexual e Reprodutiva <strong>de</strong> Mulheres Imigrantes Africanas e Brasileiras: um estudo qualitativo (33)
e acessibilida<strong>de</strong> aos ser viços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> (Janssens, Bosmans e Temmerman, 2005; Reij ne -veld, 1998). Os <strong>de</strong> ter mi nantes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> abrangem ainda factores macrossociais, como asnormas sociais, padrões culturais e questões <strong>de</strong> género que orientam o comportamento eatitu<strong>de</strong>s face à saú<strong>de</strong>/doença e às práticas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> (CSDH, 2005). Simultaneamente, apredisposição genética e biológica, bem como os comportamentos individuais e estilos <strong>de</strong>vida, <strong>de</strong>ter minam o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> dos indivíduos (CSDH, 2005; WHO, 2003a). Assim,o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> é resultado <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s complexas <strong>de</strong> múltiplos <strong>de</strong>terminantes que reflectema re lação entre o indivíduo/população e o seu meio.Tem vindo a ser reconhecido que a mobilida<strong>de</strong> das populações po<strong>de</strong> ter implicações di -rec tas e indirectas na saú<strong>de</strong>. Simultaneamente, o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> das populações <strong>imigrantes</strong>, condicionado pela inter<strong>de</strong>pendência dos diversos <strong>de</strong>terminantes <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, temimpacto no processo <strong>de</strong> integração <strong>de</strong>stas populações na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> acolhimento (UN,2003). Neste contexto, a migração internacional é actualmente consi<strong>de</strong>rada um <strong>de</strong>safiopara a saú<strong>de</strong> pública e sistemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> dos vários países (Carballo, Divino e Zeric,1998; Dias e Gonçalves, 2007).A actual realida<strong>de</strong> da migração internacional, a heterogeneida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stas populações, acom plexida<strong>de</strong> dos <strong>de</strong>terminantes em saú<strong>de</strong> dos <strong>imigrantes</strong> e a falta <strong>de</strong> dados consistentessobre estas questões leva a que a investigação na área da migração e saú<strong>de</strong> seja aindain cipiente. Apesar da escassez <strong>de</strong> informação, existem dados dispersos que apontam nosentido <strong>de</strong> que alguns grupos <strong>de</strong> migrantes estão particularmente vulneráveis a problemas<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Estudos indicam que algumas populações <strong>imigrantes</strong> estão em maior risco queas populações autóctones <strong>de</strong> contraírem doenças não transmissíveis, como as doençascar diovasculares (McKay, Macintyre e Ellaway, 2003; Mehler et al., 2001; Rubia et al.,2002). Em relação às doenças crónicas, algumas populações <strong>imigrantes</strong> ten<strong>de</strong>m aapresentar maiores taxas <strong>de</strong> prevalência <strong>de</strong> diabetes e maior taxa <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> asso cia -da a cancro, comparativamente às populações autóctones (DesMeules et al., 2005;Hyman, 2007; Ng et al., 2005). Alguns dados disponíveis indicam também que as po -pu lações que migram estão em maior risco <strong>de</strong> contrair doenças infecciosas, como a tu -berculose, VIH/Sida e hepatites (Coker, 2003; Fennelly, 2004; Saracino et al., 2005). Es -tu dos sugerem ainda que as populações <strong>imigrantes</strong> se encontram em maior risco <strong>de</strong> vir a(34) Saú<strong>de</strong> Sexual e Reprodutiva <strong>de</strong> Mulheres Imigrantes Africanas e Brasileiras: um estudo qualitativo
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Eu fui fazer uns exames (…) e eu
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