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mArketing & negócios<br />
MysteryShot/iStock<br />
A <strong>de</strong>silusão com<br />
o mo<strong>de</strong>lo Uber<br />
Muitos <strong>de</strong>fendiam que nosso<br />
mercado adotasse o mo<strong>de</strong>lo Uber.<br />
Mas essa posição tem sido revista<br />
Rafael Sampaio<br />
i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> negócios baseado<br />
no Uber tem fascinado muitos se-<br />
A<br />
tores econômicos nos últimos anos e não<br />
faltaram tentativas, via <strong>de</strong> regra malsucedidas,<br />
<strong>de</strong> caminhar em direção a ele.<br />
No caso do mercado publicitário brasileiro,<br />
esse movimento <strong>de</strong>strutivo foi <strong>de</strong>sestimulado<br />
pela combinação <strong>de</strong> imposição<br />
legal e da autorregulação do setor, gerida<br />
pelo Cenp, e isso minimizou a gravida<strong>de</strong><br />
da crise que vivemos nos últimos anos - da<br />
qual começamos a sair. Sem as nossas salvaguardas,<br />
estaríamos em uma situação<br />
bem pior, como tem ocorrido nos mercados<br />
<strong>de</strong> médio e pequeno porte ao redor do<br />
mundo, em gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>sagregação, e até nos<br />
mercados centrais, como Estados Unidos e<br />
Reino Unido, que têm sofrido bastante.<br />
A maioria dos empresários e parte crescente<br />
dos profissionais estão se dando conta<br />
que o tempo passa e o mo<strong>de</strong>lo Uber não<br />
tem gerado riquezas para o sistema, com<br />
exceção <strong>de</strong> uma rigorosa minoria, pois o<br />
processo é como um cassino, no qual poucos<br />
vencedores levam tudo... O Uber é um<br />
exemplo acabado do mo<strong>de</strong>lo econômico digital,<br />
que, apesar do fascínio e <strong>de</strong> ter feito<br />
alguns milionários e bilionários, não distribui<br />
riquezas para o conjunto da socieda<strong>de</strong> e<br />
não se mostra sustentável.<br />
Em seu livro Throwing Rocks at the Google<br />
Bus, Douglas Rushkoff, estudioso e entusiasta<br />
do mundo tecnológico, relata sua<br />
<strong>de</strong>cepção, antevê gran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s e<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma mudança radical no mo<strong>de</strong>lo<br />
que, ao contrário das gran<strong>de</strong>s organizações<br />
capitalistas do século 20, não cria riquezas<br />
para sua ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornecedores, tra<strong>de</strong> e a<br />
própria população, pelo aumento <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong><br />
e redução dos preços <strong>de</strong> produtos e<br />
serviços e a geração <strong>de</strong> impostos.<br />
Rushkoff <strong>de</strong>fine a nova economia digital<br />
como um sistema “extrativista <strong>de</strong> valor” e<br />
uma regressão ao capitalismo em sua fase<br />
mais selvagem, no caso travestida <strong>de</strong> inovadora<br />
e alavancada justamente pela tecnologia.<br />
Voltando à análise do “mo<strong>de</strong>lo Uber”<br />
e suas gran<strong>de</strong>s contradições, vale colocar<br />
preto no branco, sem wishful thinking, e<br />
lembrar a performance falsamente vitoriosa<br />
da organização nesses nove anos e às<br />
vésperas <strong>de</strong> seu esperado IPO, que talvez<br />
venha ser uma das maiores empulhações<br />
da história empresarial.<br />
A empresa e muitos observadores que<br />
ou estão comprometidos ou totalmente<br />
míopes esperam arrecadar até US$ 120 bilhões,<br />
muito acima do valor hoje estimado<br />
para o negócio, <strong>de</strong> US$ 68 bilhões. Mas os<br />
que têm o pé no chão e um razoável senso<br />
crítico recordam que a Uber nunca teve um<br />
ano lucrativo, apesar <strong>de</strong> seu alegado imenso<br />
sucesso.<br />
Em 2018, o prejuízo foi <strong>de</strong> US$ 1,8 bilhão.<br />
Foi bem menor que os US$ 4,5 bilhões <strong>de</strong><br />
2017, mas foi obtido graças principalmente<br />
à redução dos ganhos <strong>de</strong> seus motoristas<br />
colaboradores e ao encerramento <strong>de</strong> operações<br />
em diversos países e cida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>vido a<br />
entraves legais ou feroz competição local.<br />
A cortina <strong>de</strong> fumaça que a Uber vem alimentando<br />
nos últimos anos <strong>de</strong>riva da espetacular<br />
entrada em alguns setores paralelos,<br />
como cargas (Uber Freight), <strong>de</strong>livery<br />
<strong>de</strong> comida, logística, bicicletas elétricas e<br />
até carros self-driving.<br />
Como aponta uma matéria na New<br />
York Magazine, “a Uber nunca apresentou<br />
uma evidência concreta <strong>de</strong> que será<br />
lucrativa, muito menos que vai gerar um<br />
retorno a<strong>de</strong>quado sobre o capital nela investida.<br />
Seus investidores no fundo estão<br />
<strong>de</strong>positando esperanças em um IPO<br />
bem-sucedido, o que significa encontrar<br />
idiotas em número suficiente”. Pior ainda,<br />
uma pesquisa feita pelo site Ri<strong>de</strong>ster<br />
revelou que a média dos motoristas do<br />
Uber nos Estados Unidos ganha abaixo <strong>de</strong><br />
US$ 10 por hora, menos que se trabalhassem<br />
em uma loja <strong>de</strong> fast-food, on<strong>de</strong> não<br />
têm <strong>de</strong> colocar o seu capital na roda. Como<br />
analisou Rushkoff, é o capitalismo no seu<br />
pior perfil.<br />
Rafael Sampaio é consultor em propaganda<br />
rafael.sampaio@uol.com.br<br />
56 <strong>25</strong> <strong>de</strong> março <strong>de</strong> <strong>2019</strong> - jornal propmark