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se ter disseminado o boato de que teria
sido acordado entre as formações que
este segundo jogo acabasse novamente
empatado, forçando assim a realização duma
terceira partida de forma a aumentar o
dinheiro arrecadado pelas duas direcções na
venda de ingressos.
Este é o primeiro registo que
encontrei de violência em grande escala nos
jogos realizados entre os dois vizinhos, mas
a partir daqui muitos outros episódios se
seguiram, e há inclusivamente relatos dum
aumento exponencial de entrada de utentes
nos hospitais de Glasgow nas horas seguintes
aos dérbis disputados durante a década de
1990.
A rivalidade dentro das quatros
linhas é igualmente titânica e, apesar de
periódicos domínios de uma ou outra
formação, o equilíbrio registado pelos
números é absolutamente revelador do
quanto nenhum dos lados quer perder para
o outro. O primeiro dérbi disputou-se a 25 de
Maio de 1888 e o Celtic acabaria por vencêlo
por 5-2. Realizaram-se no total 436 jogos
entre os rivais, com o Rangers a levar de
vencidos 169, o Celtic 165, e o registo de 102
empates. E se em matéria de campeonatos o
Rangers está igualmente na frente (55 contra
53), o Celtic destaca-se pelo maior número de
taças vencidas (41 contra 34). Os dois clubes
alcançaram também a glória europeia com
um título para cada lado. O Celtic venceu a
maior competição de clubes da uefa, a Taça
dos Clubes Campeões Europeus, em 1967, no
Estádio do Jamor, e o vizinho Rangers venceu
a Taça das Taças apenas cinco anos depois,
em 1972, num período que curiosamente até
foi negro em matéria de conquistas internas,
tendo o Celtic vencido nove campeonatos
consecutivos entre as épocas 65/66 e 73/74,
feito que o Rangers viria a igualar mais tarde,
entre 1989 e 1997.
Apesar de ter sido relativamente
amenizada pelo tempo, a rivalidade políticoreligiosa
está hoje bem viva, com especial
fervor no seio dos grupos ultra locais. Se
os Green Brigade do Celtic são conhecidos
pelas posições progressistas, de apoio à
causa palestiniana e por entoarem cânticos
associados ao IRA, os Union Bears alinham
numa tradição unionista de lealdade à
coroa britânica. Ainda recentemente, logo
após o falecimento da rainha Elizabeth II,
pudemos perceber o quão contrastantes são
as posições dos dois grupos e respectivas
massas adeptas. Os Union Bears prepararam
um bonito mosaico que preencheu toda a
bancada, com as cores da bandeira britânica
e a rainha ao centro. Por seu turno, a Green
Brigade arranjou uma forma criativa de
contornar o minuto de silêncio em memória
da monarca, substituído por um minuto de
aplausos precisamente por se esperar já
alguma acção de boicote. Ora os Ultras do
Celtic, que jogou na condição de visitante no
campo do St. Mirren, hastearam uma frase
em que se lia “If you hate the royal family clap
your hands” entoando um cântico com essa
mesma letra, episódio que se tornou viral na
internet.
Toda esta envolvência torna
este dérbi verdadeiramente especial, e
confere-lhe uma projecção mediática que
vai muito para além da parca dimensão do
futebol escocês. Fica mais uma vez latente
a correlação entre clubes, comunidade e
tradição local, mostrando que a importância
do futebol em muito transcende a do mero
jogo que decorre dentro das quatro linhas.
Por J. Sousa
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