Cultura de Bancada, 20º Número
Cultura de Bancada, 20º número, lançado a 12 de dezembro de 2023
Cultura de Bancada, 20º número, lançado a 12 de dezembro de 2023
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Falar de intelectuais, escritos,
homens de cultura e futebol nunca foi
um conúbio que resultou. Durante muitos
anos, a elite intelectual não gostou do jogo
da bola, considerado um ópio dos povos,
aproveitado por governos reacionários e
manipuladores. Aquilo que pairava à volta do
futebol não podia agradar a esta faixa “culta”
da população, desde o analfabetismo e pouca
cultura dos seus praticantes, à violência,
irracionalidade e fanatismo clubístico. Tudo
isto não ajudou para que os intelectuais se
apaixonassem pelo nosso desporto preferido.
Só que há sempre excepções à
regra. Hoje queremos contar como a cultura
se associou ao desporto e ao associativismo
através de uma figura de relevo da cultura
portuguesa dos anos 40/50 - Alves Redol,
escritor considerado como um dos expoentes
máximos do Neorrealismo português. Nascido
num ambiente humilde de trabalhadores,
curioso e empático observador da vida dos
“marginalizados”, Alves Redol desde cedo
revelou preocupações de natureza social e
uma imensa vontade de intervir na realidade
envolvente, procurando encontrar soluções
para os problemas e as injustiças que
identificava, acreditando que as agremiações
desportivas são instrumentos fundamentais
na emancipação do povo e dos trabalhadores
através do desporto e da cultura. O escritor
esteve envolvido em muitas coletividades da
sua terra, Vila Franca de Xira.
Numa entrevista publicada n´A
Bola, em agosto de 1947, encontramos Alves
Redol a falar da sua paixão pelo futebol e pelo
desporto em geral: “O futebol domina-me e
absorve-me, porque encontro nele uma força
extraordinária de emoção”; “falar de futebol
agrada-me tanto como falar de literatura”;
“acho que os grupos desportivos deveriam
ser mobilizados para colaborarem num vasto
plano nacional de luta contra o analfabetismo
- bibliotecas, cursos de aperfeiçoamento,
conferências, representações teatrais,
exposições de arte, entre outras coisas,
deveriam figurar entre as realizações e
atividades culturais destes grupos”
A entrevista é muito interessante
porque focava temas que, ainda hoje,
continuam polémicos, como o desporto
vs espectáculo, e o problema amadorismo
vs profissionalismo, e toca pontos em
pontos como a saúde e higiene. Alves Redol
incentivou sempre a criação de grupos
desportivos como lugar de confraternização
e união dos mais humildes, dos últimos dos
Gaibéus que ele tanto falava.
“Acho que o desporto deve ser
considerado como um meio para que o