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Vamos ver o Irão olhos nos olhos - Fonoteca Municipal de Lisboa

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tónio Gancho que chegou a expor no<br />

Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna, e viveu gran<strong>de</strong><br />

parte da vida e morreu (em 2006)<br />

na instituição psiquiátrica do Telhal.<br />

O povo era representado <strong>de</strong> uma<br />

maneira pelos neo-realistas, <strong>de</strong> outra<br />

pelos surrealistas, <strong>de</strong> uma forma <strong>nos</strong><br />

discursos do Estado Novo e <strong>de</strong> outra<br />

nas intervenções do pós-25 <strong>de</strong> Abril.<br />

Durante a monarquia, diz José Neves,<br />

“a passagem a cidadãos surge com o<br />

liberalismo no século XIX”.<br />

O povo do Presi<strong>de</strong>nte<br />

O que preten<strong>de</strong> mostrar “POVOpeople”<br />

é esse cruzamento <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias,<br />

possível com “gran<strong>de</strong>s palavras” que<br />

transportam “uma história e uma<br />

gran<strong>de</strong> iconografia atrás <strong>de</strong>las”, con-<br />

Exposições<br />

tinua José Manuel dos Santos. A exposição<br />

propõe “um olhar contemporâneo,<br />

<strong>de</strong> como olhamos o povo<br />

hoje, mas também as representações<br />

que ele foi tendo ao longo do tempo”.<br />

A palavra contém nela uma dimensão<br />

social, política e cultural, mas<br />

também erótica, realça o comissário,<br />

que nota o poema “Povo” <strong>de</strong> Pedro<br />

Homem <strong>de</strong> Mello, em que este aristocrata<br />

diz: “Dormi com eles na cama.../<br />

Tive a mesma condição”. “Há também<br />

essa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> erotismo e tudo<br />

está aqui presente” nesse olhar cruzado,<br />

conclui.<br />

“Começámos pelo princípio: o fundamento<br />

da República e da <strong>de</strong>mocracia<br />

é a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> povo. E fomos perguntar:<br />

O que significa esta palavra? Qual<br />

é a história <strong>de</strong>la? Que memória transporta,<br />

quando falamos <strong>de</strong>la? E como<br />

foi ela representada artisticamente?”,<br />

salienta José Manuel Santos. É a primeira<br />

explicação para a escolha do<br />

tema da exposição. A outra: “É como<br />

uma palavra que <strong>nos</strong> persegue ou que<br />

nós perseguimos. No discurso político,<br />

é uma palavra que continua e está<br />

sempre a aparecer. É daqueles visíveis<br />

que se tornam invisíveis.”<br />

Não será preciso ir longe. Quem<br />

ainda este mês disse “Quanto mais se<br />

exigir do povo, mais o povo exigirá<br />

dos que o go<strong>ver</strong>nam” foi Cavaco Silva,<br />

no discurso do 10 <strong>de</strong> Junho, refere o<br />

comissário, como sinal <strong>de</strong> que esta<br />

palavra continua a ser muito utilizada<br />

<strong>nos</strong> discursos políticos, mesmo se<br />

num sentido mais lato do que aquela<br />

que era a sua dimensão social, ligada<br />

aos i<strong>de</strong>ais comunistas.<br />

José Neves concorda que, quando<br />

surge, a palavra “povo” é sobretudo<br />

na sua dimensão social, <strong>nos</strong> discursos<br />

<strong>de</strong> dirigentes comunistas, por exemplo,<br />

ou na sua dimensão cultural e<br />

política, para expressar a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

“nação” ou país” noutros discursos.<br />

Porém, consi<strong>de</strong>ra que “a palavra ‘povo’<br />

caiu em <strong>de</strong>suso”, mesmo se os<br />

seus <strong>de</strong>rivados, como “popular”,<br />

“populismo” ou “cultura pop” são <strong>de</strong><br />

uso corrente.<br />

E se o Presi<strong>de</strong>nte da República evocou<br />

a palavra, foi numa dimensão,<br />

ainda presente, <strong>de</strong> “discurso populista<br />

em que se opõe o povo aos seus<br />

representantes que serão os políticos”,<br />

consi<strong>de</strong>ra José Neves.<br />

Antes e <strong>de</strong>pois do romantismo<br />

Se há uma i<strong>de</strong>ia fundadora, há também<br />

uma obra fundadora. “Ao longo<br />

do período que esta exposição cobre,<br />

Está na<br />

hora <strong>de</strong>,<br />

ao dizer “o<br />

povo”, não<br />

querer<br />

dizer “os<br />

outros”,<br />

mas<br />

“nós”,<br />

todos. Nós<br />

todos.<br />

Nuno Artur Silva<br />

Ficcionista e fundador das Produções<br />

Fictícias<br />

a palavra ‘povo’ ganhou novos significados”,<br />

diz João Pinharanda, comissário<br />

para a parte artística da exposição.<br />

O ponto <strong>de</strong> partida da representação<br />

visual do conceito ‘povo’ é,<br />

para o crítico <strong>de</strong> arte, a pintura <strong>de</strong><br />

Cristino da Silva, “Cinco Artistas em<br />

Sintra” (1855), que instituiu o romantismo<br />

em Portugal, no sentido em que<br />

pela primeira vez os artistas se representam<br />

na paisagem com o povo.<br />

“Aquela obra é a primeira” e “o<br />

ponto <strong>de</strong> partida para tudo o resto”<br />

nesta exposição, continua. No olhar<br />

para trás e para a frente, o comissário<br />

foi <strong>de</strong>pois à procura <strong>de</strong> “povo” na<br />

arte. “Esta visão do ‘antes’ coinci<strong>de</strong><br />

com a História uni<strong>ver</strong>sal ou oci<strong>de</strong>ntal. ci<strong>de</strong>ntal.<br />

A revolução americana e a <strong>de</strong>claração claração<br />

da in<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> 1776 coinci<strong>de</strong>m inci<strong>de</strong>m<br />

com o rococó em França, e o neoclassicismo<br />

com a Revolução Francesa ancesa<br />

<strong>de</strong> 1789.”<br />

Para marcar a política, es-<br />

colheu “Regicídio” <strong>de</strong> Paula a<br />

Rego, que não tinha sido mosstrado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua exposição na<br />

Fundação Gulbenkian <strong>nos</strong> a<strong>nos</strong> <strong>nos</strong><br />

1980, e “Delacroix no 25 <strong>de</strong><br />

Abril em Atenas” (1975) <strong>de</strong> Nikias<br />

Skapinakis, em que a imamagem da liberda<strong>de</strong> aparece dianiante do povo.<br />

Na mesma sala, cruzando dife<br />

Des<strong>de</strong> a Revolução dos<br />

Cravos, feita ao som <strong>de</strong><br />

“Grândola Vila Morena”,<br />

cantada por Zeca Afonso,<br />

“o Povo é quem mais<br />

or<strong>de</strong>na”. Será?<br />

Mário Soares<br />

Antigo Presi<strong>de</strong>nte da República<br />

rentes visões, a instalação <strong>de</strong> imagens<br />

recolhidas pela artista portuguesa<br />

Ana Hatherly, que em 1975 filmou os<br />

cartazes e as imagens evocativas da<br />

revolução do 25 <strong>de</strong> Abril. No mesmo<br />

espaço, o cartaz do 25 <strong>de</strong> Abril, pintado<br />

por Vieira da Silva, com o poema<br />

<strong>de</strong> Sophia <strong>de</strong> Mello Breyner, “A poesia<br />

está na rua” e a intervenção <strong>de</strong> Cesariny<br />

“sempre esteve”, reflecte esta<br />

i<strong>de</strong>ia do poeta <strong>de</strong> que a poesia só podia<br />

emanar do povo, e que exprimiu<br />

a i<strong>de</strong>ia surrealista <strong>de</strong> que não era preciso<br />

estar a i<strong>de</strong>alizar o povo — como<br />

faziam os naturalistas ou os neo-realistas<br />

— e lamentava que tenha <strong>de</strong>ixado<br />

<strong>de</strong> ha<strong>ver</strong> “voz do povo na literatura”.<br />

Mas também os “cartoons” <strong>de</strong><br />

João Abel Manta e <strong>de</strong> Rafael Bordalo<br />

Pinheiro com o “Zé Povinho”.<br />

Está na hora <strong>de</strong> resgatar<br />

a palavra “povo”<br />

“POVOPeople” coloca as várias visões<br />

<strong>de</strong> “povo” em diálogo entre si, numa<br />

mesma sala ou num mesmo livro. A<br />

exposição parte <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> investigação<br />

que levou à publicação <strong>de</strong> três<br />

livros (Tinta da China): “Como se faz<br />

um povo”, ensaios em História Con-<br />

temporânea <strong>de</strong> Portugal sob coor<strong>de</strong>nação<br />

do historiador José Neves,<br />

sobre como era o<br />

povo na Re- Re-<br />

“Povo e<br />

política”,<br />

instalaçãoví<strong>de</strong>o<br />

<strong>de</strong><br />

Diana<br />

Andringa,<br />

Bruno Morais<br />

Cabral e João<br />

Dias (2010)<br />

“Vista Interior”<br />

(2000), Joana<br />

Vasconcelos<br />

que <strong>nos</strong> persegue<br />

” do esquecimento e mostra como ele foi representado, ao longo da História, na arte e na política.<br />

e Rui Gaudêncio (fotos)<br />

Ípsilon • Sexta-feira 25 Junho 2010 • 29

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