Numa revolução social nas favelas do Rio ... - Comunità Italiana
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Kedson Kede<br />
Andreia<br />
Barbalho não<br />
tem me<strong>do</strong> de<br />
parto normal:<br />
“tenho mais<br />
me<strong>do</strong> de ‘entrar<br />
na faca’”<br />
Uma<br />
escolha<br />
para<br />
poucas<br />
Números oficiais revelam que o parto normal pre<strong>do</strong>mina<br />
no Brasil, especialmente <strong>nas</strong> regiões mais pobres.<br />
Enquanto isso, na Itália, em cinco anos, o índice de<br />
grávidas que recorreram à cesariana se elevou<br />
de 29,9% para 35,2%. Médicos admitem<br />
que o perfil-sócio econômico <strong>do</strong>s pais<br />
determina como <strong>nas</strong>cem os bebês<br />
nay r a garoFlE<br />
Poucas mulheres têm o poder de decidir<br />
como devem <strong>nas</strong>cer os seus filhos.<br />
O perfil sócio-econômico das<br />
grávidas, de acor<strong>do</strong> com as estatísticas<br />
oficiais, determina a técnica utilizada<br />
pelos médicos. Se na rede pública de<br />
saúde pre<strong>do</strong>mina a prática <strong>do</strong> parto normal,<br />
nos hospitais priva<strong>do</strong>s a maioria <strong>do</strong>s<br />
bebês vem à luz em cesaria<strong>nas</strong>. Obstetras<br />
admitem a preferência pelo procedimento<br />
cirúrgico, que representa economia de tempo,<br />
além de ser mais bem pago.<br />
Não bastasse livrar os médicos de correrias<br />
inesperadas às maternidades e da espera de prazo<br />
imprevisível pelo término <strong>do</strong> parto normal, as cesaria<strong>nas</strong><br />
ainda envolvem menos risco de ações judiciais,<br />
por eventuais erros no procedimento, segun<strong>do</strong><br />
constata a professora Rosiane Mattar,<br />
da Escola Paulista de Medicina da Universidade<br />
Federal de São Paulo (Unifesp):<br />
— O parto cesáreo é mais rápi<strong>do</strong>,<br />
pode acontecer no momento em que<br />
não atrapalha o médico e nem o casal.<br />
Na visão da maioria <strong>do</strong>s obstetras,<br />
este também é mais seguro<br />
no senti<strong>do</strong> de proteger a<br />
criança de anoxia [falta de<br />
oxigenação] ou de traumatismo.<br />
A técnica protege<br />
o médico de ações judiciais<br />
porque quan<strong>do</strong><br />
uteSaúdeSaluteSaúdeSaluteSaúdeSaluteSaúdeSaluteSaúdeSaluteSaúdeSalut<br />
dá algo erra<strong>do</strong> no parto, o médico<br />
da esquina, o advoga<strong>do</strong> e o<br />
juiz vão perguntar por que não<br />
foi feita a cesariana.<br />
Se há alguns aspectos positivos<br />
na cesariana, a obstetra reconhece<br />
que a cirurgia envolve riscos mais<br />
graves <strong>do</strong> que o parto normal:<br />
— Se a vantagem da cesariana<br />
é ser rápida, a desvantagem se<br />
refere aos riscos muito maiores de<br />
mortalidade materna e fetal, além<br />
da possibilidade de eventuais complicações<br />
posteriores. O parto normal,<br />
como o termo indica, é normal<br />
e o seu principal valor está na emoção<br />
que o casal sente ao ver o filho<br />
<strong>nas</strong>cer. Sem contar que (pelo méto<strong>do</strong><br />
natural) a criança <strong>nas</strong>ce somente<br />
quan<strong>do</strong> está madura, tem menos<br />
complicações respiratórias e a amamentação<br />
dá muito mais certo.<br />
Diante de tantos prós e contras<br />
de cada méto<strong>do</strong>, os números<br />
oficiais revelam que a opção final<br />
depende menos da vontade da<br />
grávida e mais da sua condição<br />
financeira. No brasil, pesquisa<br />
<strong>do</strong> Ministério da Saúde, de 2005,<br />
mostra que em três milhões de<br />
partos no país, 57% foram <strong>do</strong><br />
tipo normal. No Nordeste brasileiro,<br />
este ocorreu em 67,8% de<br />
922 mil casos. No Sudeste, onde<br />
o padrão de vida, em média, é<br />
mais alto, verificou-se o inverso:<br />
51,6% de um milhão de mães se<br />
submeteram à cesariana.<br />
Enquanto isso, na Itália, pesquisa<br />
<strong>do</strong> Istituto Nazionale di<br />
Statistica (Istat), de 2006, mostra<br />
que, de 2000 a 2005, elevou-se<br />
a média de cesaria<strong>nas</strong> de<br />
29,9% para 35,2%.<br />
As estatísticas não são os<br />
únicos sinais da relação direta<br />
entre o méto<strong>do</strong> emprega<strong>do</strong> nos<br />
partos e a condição financeira<br />
“Acho até que o<br />
médico deveria<br />
receber mais<br />
pelo parto<br />
normal porque<br />
este exige<br />
mais a sua<br />
disponibilidade”<br />
da n i e l l a ca s t e l lO t t i,<br />
O B s t et r a<br />
das grávidas: as tabelas de pagamento<br />
pelo serviço, na saúde<br />
pública e na rede privada, revelam<br />
que cesaria<strong>nas</strong> custam, normalmente,<br />
mais caro.<br />
Na rede privada, a variação<br />
de preços flutua entre três mil<br />
e 15 mil reais. Já os planos de<br />
saúde repassam às equipes de<br />
900 a 10 mil reais, conforme a<br />
modalidade. Na tabela <strong>do</strong> Sistema<br />
Único de Saúde (SUS) <strong>do</strong> governo<br />
federal, o valor repassa<strong>do</strong><br />
aos hospitais convenia<strong>do</strong>s também<br />
varia: por partos normais,<br />
maternidades recebem de 283,60<br />
a 306,73 reais, de acor<strong>do</strong> com o<br />
nível de risco <strong>do</strong> procedimento.<br />
Por cesaria<strong>nas</strong>, o valor oscila entre<br />
435,86 e 621,68.<br />
— Na rede privada, a diferença<br />
<strong>do</strong>s valores de um para o outro<br />
é muito pouca. Acho até que o<br />
médico deveria receber mais pelo<br />
parto normal porque este exige<br />
mais a sua disponibilidade.<br />
É impraticável para um médico<br />
que faz muitos partos só realizar<br />
o normal — assume a obstetra<br />
Daniella Castellotti, que já trabalhou<br />
na rede <strong>do</strong> SUS: — trabalhei<br />
em hospital público e, para<br />
quem está de plantão, tanto faz<br />
um méto<strong>do</strong> ou outro.<br />
E ainda há interesses econômicos<br />
indiretos a permear o processo<br />
de decisão. Médicos reclamam,<br />
por exemplo, <strong>do</strong> dinheiro que deixam<br />
de ganhar, estan<strong>do</strong> “presos” à<br />
realização de um parto normal.<br />
— O trabalho de parto pode<br />
durar até 12 horas e este acaba<br />
sen<strong>do</strong> um inconveniente para o<br />
médico, principalmente para os<br />
que fazem o parto por convênio.<br />
Para os obstetras, o parto normal<br />
deveria ser mais bem pago pelos<br />
convênios, visto que, não raramente,<br />
temos de ficar mais de 10<br />
horas no hospital, enquanto num<br />
cesáreo ficamos em torno de 2<br />
horas — afirma a obstetra.<br />
O me<strong>do</strong> da <strong>do</strong>r<br />
A técnica de enfermagem Sabrina<br />
de Souza, de 25 anos, está entre<br />
aquelas que, de antemão, escolheram<br />
a cesariana para dar a luz:<br />
— Sempre morri de me<strong>do</strong> de<br />
sentir <strong>do</strong>r e exigi que meu médico<br />
fizesse a cirurgia. Graças a Deus<br />
correu tu<strong>do</strong> bem, antes e depois,<br />
e não me arrepen<strong>do</strong>. Quan<strong>do</strong><br />
eu tiver o meu segun<strong>do</strong> filho<br />
vou querer cesariana novamente<br />
— afirma Sabrina, mãe de Maria<br />
Eduarda, hoje com cinco anos.<br />
Divulgação<br />
A atriz Vanessa Giácomo, aos três meses de gravidez, sonha com parto<br />
normal. Fernanda Fiore não teve escolha e fez cesariana<br />
Segun<strong>do</strong> a obstetra Daniella<br />
Castellotti, antes de optar por<br />
um determina<strong>do</strong> méto<strong>do</strong> de parto,<br />
a mãe precisa se informar<br />
bem sobre os procedimentos:<br />
— Uma paciente que não pode<br />
sequer ouvir falar no parto<br />
normal não tem como realizá-lo<br />
de mo<strong>do</strong> harmonioso e tranqüilo,<br />
assim como aquelas que querem<br />
muito o méto<strong>do</strong> normal tendem a<br />
evoluir melhor.<br />
Indicações médicas de realização<br />
de um parto por um ou outro<br />
méto<strong>do</strong> só têm como ser definidas,<br />
na maioria <strong>do</strong>s casos, mais<br />
para o final da gestação:<br />
— Isso vai depender de fatores<br />
como, por exemplo, a posição<br />
<strong>do</strong> bebê. O importante é esclarecer<br />
a paciente de como será to<strong>do</strong><br />
o processo, o que ela vai sentir,<br />
como são as contrações, anestesia,<br />
entre outros detalhes.<br />
Expectativa frustrada<br />
A brasileira Fernanda Fiore, de<br />
37, acredita que o parto normal<br />
é mais incentiva<strong>do</strong> na Itália <strong>do</strong><br />
que no brasil.<br />
— Me parece que aqui o parto<br />
natural é mais incentiva<strong>do</strong>.<br />
Meu médico renuncia às suas férias<br />
inteiras para poder respeitar<br />
a hora certa de cada gestante.<br />
Não posso generalizar, mas os<br />
filhos das minhas amigas daqui<br />
<strong>nas</strong>ceram de parto normal e no<br />
caso <strong>do</strong>s que <strong>nas</strong>ceram de cesariana,<br />
houve uma razão para isso<br />
— diz Fernanda, casada com um<br />
italiano e há três anos viven<strong>do</strong><br />
em Nápoles.<br />
Embora ela tenha se prepara<strong>do</strong><br />
durante nove meses para<br />
o parto normal, o primeiro filho<br />
da brasileira, Enrico, de um ano,<br />
<strong>nas</strong>ceu numa cesariana:<br />
Arquivo pessoal<br />
— Não tive escolha. Minha<br />
pressão arterial subiu muito. Fui<br />
para o hospital, repeti vários<br />
exames e o meu médico decidiu<br />
que era hora, pois temia a gestose<br />
[manifestação toxêmica que<br />
ocorre durante a gravidez]. Foi<br />
uma decisão correta.<br />
Está quase na hora<br />
Prestes a dar à luz ao primeiro<br />
filho, a designer gráfica Andreia<br />
barbalho, de 34, já aprontou o<br />
quarto <strong>do</strong> bebê e as roupinhas<br />
estão lavadas. Matheus virá ao<br />
mun<strong>do</strong> pelo méto<strong>do</strong> natural, se<br />
depender da mãe.<br />
— Parto normal em primeiro<br />
lugar! O único receio que tenho é<br />
de que eu não consiga ter o Matheus<br />
assim por alguma complicação.<br />
tenho mais me<strong>do</strong> de “entrar<br />
na faca” — conta.<br />
O <strong>nas</strong>cimento de Matheus está<br />
previsto para o final de setembro.<br />
A médica de Andreia a deixou<br />
escolher o tipo de parto.<br />
— A preferência dela é por parto<br />
normal, cesariana somente por<br />
alguma complicação — comenta.<br />
Já a atriz Vanessa Giácomo<br />
curte os primeiros três meses de<br />
gravidez. Ela e o seu mari<strong>do</strong>, o ator<br />
Daniel de Oliveira, estão empolga<strong>do</strong>s<br />
a espera <strong>do</strong> primeiro filho.<br />
— Está tu<strong>do</strong> corren<strong>do</strong> bem.<br />
Fiquei saben<strong>do</strong> da gravidez um<br />
pouco antes de ser convidada<br />
para a novela, quan<strong>do</strong> o Wolf<br />
[Maia, diretor] me ligou. Não estou<br />
enjoan<strong>do</strong>, nunca passei mal!<br />
As gravações estão sen<strong>do</strong> uma<br />
delícia e estou muito feliz, numa<br />
fase especial da minha vida! Ainda<br />
não comprei nada para o bebê<br />
porque estou esperan<strong>do</strong> um pouco<br />
— declara Vanessa, que sonha<br />
com o parto normal.<br />
32 C o m u n i t à i t a l i a n a / ag o s t o 2007<br />
a g o s t o 2007 / Co m u n i t à i t a l i a n a 33