a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ

aprofundar mais este caso’, ou mesmo a resignação
fatalista em face do chamado estancamento de um
caso, eram e continuam sendo para mim
inadmissíveis (FERENCZI, 1931/1992, p. 71).
Desta forma, entendemos que as concepções de Ferenczi sobre o trauma se
relacionam a uma certa “população” de pacientes cujo primeiro parâmetro que
poderíamos depreender é de desafiarem a técnica e ética da psicanálise clássica. Esta se
encontra desaparelhada para atender estes pacientes. A partir disto, podemos ir mais
longe compreendendo que estes pacientes não se referem a uma organização neurótica
balizada no modelo da histeria. Se naquela época estes pacientes eram difíceis e,
portanto, considerados inanalisáveis, hoje eles ocupam uma posição privilegiada nas
pesquisas psicanalíticas, e representam aquilo que chamamos de “clínica da
contemporaneidade” (BOKANOWSKI, 2002/3). Neste sentido, o estudo do trauma de
Ferenczi é uma herança e um legado fundamentais para a psicanálise na atualidade que,
longe de afastar estes sujeitos considerando-os impossíveis, os compreende como um
desafio que vale a pena ser enfrentado para dar conta de modalidades de padecimento
psíquico com as quais nos deparamos na clínica hoje.
O que chamaremos aqui simplesmente de sujeitos traumatizados encontram
familiaridades com diversos tipos descritos e estudados na literatura psicanalítica, como
a neurose de caráter, as personalidades narcísicas, a falha básica, o falso self, os
borderlines, os sujeitos melancólicos, etc. (VERZTMAN, 2002; PINHEIRO & VIANA,
2009). A decisão de empreendermos um estudo da teoria ferencziana do trauma nos
afasta da necessidade de ligá-lo a algum destes tipos especificamente. Dois elementos
que, antes de tudo, são essenciais para mapearmos os limites destes sujeitos
traumatizados são: (a) a “dedução” da ocorrência de um trauma precoce; e (b) tal
trauma tendo correlação com um dano narcísico de tal magnitude, que torna a
“problemática da ordem da constituição narcísica” (PINHEIRO & VIANA, 2009)
destes sujeitos central na investigação de sua subjetividade.
Assim, o sujeito traumatizado é um paciente cujo “registro de funcionamento
psíquico se situa entre a neurose e qualquer coisa que se aparente a uma organização nãoneurótica”
(BOKANOWSKI, 2002/3, p. 752) 2 . Esta denominada organização não-
2 No original: “(...) le registre de fonctionnement psychique se situe entre névrose et quelque chose qui
s’apparente à une organisation non névrotique”.
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