03.09.2014 Views

a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ

a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ

a teoria ferencziana do trauma - Instituto de Psicologia da UFRJ

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

uscas mais tenazes que Ferenczi empreen<strong>de</strong>u. Confian<strong>do</strong> no analista, o paciente<br />

relaxaria as suas <strong>de</strong>fesas e, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> a sua parte cliva<strong>da</strong> que o protege <strong>de</strong>scansar,<br />

afloraria a outra parte cliva<strong>da</strong> – que precisa ser protegi<strong>da</strong> e que foi violenta<strong>da</strong>. Este<br />

pe<strong>da</strong>ço po<strong>de</strong>ria, assim, vivenciar uma relação diferente com os adultos e, pela primeira<br />

vez, encontrar uma forma <strong>de</strong> se expressar, <strong>de</strong> ser acolhi<strong>do</strong> em suas expressões, e então<br />

amadurecer. Tenhamos em mente o seguinte, portanto: encontran<strong>do</strong> condições <strong>de</strong><br />

confiar no analista, o sujeito passa a se permitir sair <strong>de</strong> sua solidão traumática – à qual<br />

fora violentamente joga<strong>do</strong> após a per<strong>da</strong> completa <strong>de</strong> confiança nos adultos que<br />

cui<strong>da</strong>vam <strong>de</strong>la – e então permite que este analista faça companhia a ele. Pela primeira<br />

vez após o <strong>trauma</strong>, a clivagem que mantinha um cui<strong>da</strong><strong>do</strong>r artificial – porque<br />

intrapsíquico - dá lugar à alguém que cui<strong>da</strong> e que está no mun<strong>do</strong> exterior.<br />

Em 1932, pouco tempo antes <strong>de</strong> sua morte e preocupa<strong>do</strong> em conseguir angariar a<br />

confiança <strong>do</strong> analisan<strong>do</strong>, Ferenczi realizou aquilo que foi uma <strong>da</strong>s experiências mais<br />

radicais na psicanálise: a técnica <strong>da</strong> análise mútua (FERENCZI, 1932/1990). De forma<br />

breve, esta consistiria em tanto o analisan<strong>do</strong> ser analisa<strong>do</strong> pelo analista, quanto o<br />

analista ser analisa<strong>do</strong> pelo analisan<strong>do</strong> – e isto, ao mesmo tempo. Neste senti<strong>do</strong>, uma<br />

atmosfera <strong>de</strong> absoluta franqueza seria disposta no setting, e to<strong>da</strong> a manifestação <strong>de</strong><br />

contratransferência, por parte <strong>do</strong> analista, seria coloca<strong>da</strong> diretamente ali, sem tentar ser<br />

encoberta ou dissimula<strong>da</strong>. Sobre isto - a gênese <strong>da</strong> análise mútua -, Ferenczi escreve que<br />

o “paciente farejava em mim resistências e obstáculos inconscientes: por isso foi<br />

proposta a análise mútua” (FERENCZI, 1932/1990, p. 109).<br />

A análise mútua acaba por propiciar, ao menos em <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s momentos, a<br />

regressão <strong>de</strong> ambos – analista e analisan<strong>do</strong>. É então que Ferenczi <strong>de</strong>senha uma<br />

belíssima imagem: a <strong>de</strong> duas crianças que, não ten<strong>do</strong> encontra<strong>do</strong> amparo nos adultos<br />

para as suas experiências traumáticas, encontram na amiza<strong>de</strong> entre ambos a<br />

possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> confi<strong>de</strong>nciarem, entre si, seus segre<strong>do</strong>s. Aí estaria a única possibili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> se construir uma confiança sóli<strong>da</strong> entre <strong>do</strong>is entes que tiveram a confiança nos outros<br />

completamente aquebranta<strong>da</strong> por conta <strong>do</strong> <strong>de</strong>scrédito. Se esta imagem serve como<br />

metáfora à análise mútua, também é uma explicação psicológica que Ferenczi encontra<br />

para conceber a amiza<strong>de</strong>. Segun<strong>do</strong> suas palavras:<br />

(...) a impressão que se tem é a <strong>de</strong> duas crianças<br />

igualmente assusta<strong>da</strong>s que trocam suas experiências,<br />

22

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!